Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República, Reunião Plenária

Combate à precariedade, 35 horas de trabalho semanal, 25 dias de férias e travar despedimentos!

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Senhor Presidente,
Senhores membros do Governo,
Senhoras e senhores Deputados,

O PCP marcou este debate para consagrar e repor direitos que são devidos aos trabalhadores.

Combater a precariedade, fixar as 35 horas de trabalho semanal como limite máximo para todos os trabalhadores, do setor público e do setor privado, consagrar o direito a 25 dias de férias anuais, travar os despedimentos revogando as normas que permitiram a sua facilitação. Estas são as propostas que estão hoje em debate e que constituem algumas das soluções defendidas pelo PCP para a consagração de direitos devidos aos trabalhadores.

Direitos que são devidos porque foram conquistados por décadas de lutas e lhes foram extorquidos com o Código do Trabalho e as suas alterações para pior nos anos de chumbo dos PEC e do Pacto de Agressão, com especial responsabilidade do Governo PSD/CDS, e não foram repostos, como seria justo, dada a resistência dos Governos do PS.

Direitos que são devidos por razões elementares de justiça social e são necessários para resolver os problemas dos trabalhadores com baixos salários e que empobrecem a trabalhar, sujeitos a níveis de precariedade laboral inaceitáveis e às leis da selva que imperam no mundo do trabalho perante uma ACT pouco mais que inoperante, sujeitos à sabotagem da contratação coletiva por parte do grande patronato e à desregulação das relações laborais que impede a conciliação do trabalho com a vida familiar.

Direitos que devem ser consagrados e repostos, por razões acrescidas, num momento em que a pandemia é aproveitada como pretexto para prejudicar os trabalhadores e levar por diante planos de retrocesso, agravando a exploração dos trabalhadores e as desigualdades sociais, aumentando a pobreza e a exclusão.

O contraste entre o aumento chocante dos lucros de algumas grandes empresas e o aumento da pobreza entre os trabalhadores em tempos de pandemia seria, só por si, razão mais que suficiente para a aprovação dos projetos de lei que o PCP trouxe hoje à apreciação desta Assembleia.

Estamos a falar de reivindicações realistas, justas e necessárias.

Estamos a falar, em alguns casos, de direitos conquistados pelos trabalhadores, que estiveram em vigor e lhes foram retirados sem qualquer outra razão que não fosse a própria natureza das políticas de direita de retirar direitos aos trabalhadores para favorecer o grande patronato, aumentando os seus lucros.

Estamos a falar, noutros casos, de direitos dos trabalhadores que numa sociedade que se quer justa e desenvolvida deveriam ser inquestionáveis. O direito a um emprego estável e a não ser despedido sem justa causa. O direito a conciliar a vida profissional com a vida familiar e com as responsabilidades parentais. O direito a conciliar o trabalho com o justo descanso e com o direito ao lazer como condição indispensável para a reposição da força de trabalho.

O ataque aos trabalhadores e aos seus direitos tem sido, desde há décadas, uma marca identitária das políticas de direita. Sucessivas alterações ao Código do Trabalho determinadas por Governos do PSD e do CDS, mas também por Governos do PS, têm vindo a desequilibrar as relações laborais num sentido único: sempre contra os trabalhadores e os seus direitos, sempre a favor do grande patronato e dos seus privilégios.

Quando o povo português derrotou o PSD e o CDS em 2015 foi grande a expetativa de uma alteração das leis do trabalho de sentido favorável aos trabalhadores. Houve uma recuperação de direitos e rendimentos, para que o PCP muito contribuiu, mas não houve entretanto a alteração que se impunha, e impõe, no sentido da recuperação de direitos fundamentais dos trabalhadores.

Foi por opção e vontade do PS que essa recuperação de direitos não se verificou e foi a sucessiva rejeição das propostas do PCP pelo PS que conduziu à situação que ainda hoje persiste.

O grande patronato continuou a poder sabotar a contratação coletiva; foi promovida a caducidade e não foi reposto o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador como matriz da legislação laboral; não foram tomadas medidas no sentido de limitar a extrema precariedade dos vínculos laborais; não foram alterados os mecanismos de desregulação dos horários e jornadas de trabalho através de bancos de horas grupais e individuais ou de imposição de trabalho noturno e por turnos; não foram impedidas as arbitrariedades nos despedimentos coletivos, nos despedimentos por inadaptação, por extinção do posto de trabalho, ou por tudo e por nada; não foi reforçada a capacidade de intervenção da ACT que permanece incapaz de impedir até as violações mais grosseiras da legislação laboral; não foram repostos os montantes de indemnização por despedimento que permanecem aos preços de saldo impostos e, ao invés, ainda foi aumentado para o dobro o período experimental, como se não bastasse a precariedade já existente.

Senhor Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,

O combate à precariedade laboral deveria ser um combate civilizacional, como em tempos foi o combate ao trabalho infantil. Na ciência, nas artes e no espetáculo, na educação e na saúde, nas múltiplas formas de trabalho falsamente independente realizado através de plataformas digitais, nos contratos ao mês, à semana, ao dia ou à hora, no trabalho prestado através de empresas de trabalho temporário, nas plataformas digitais que levam uma parte do magro salário, há todo um mundo de precariedade a que é preciso dizer basta.

O astrónomo e astrofísico português Nuno Peixinho obteve o reconhecimento internacional que lhe permite ter o seu nome atribuído a um asteroide, mas não tem o reconhecimento no seu país que lhe permita ter um contrato permanente como investigador.

Combater a precariedade, fixar as 35 horas de trabalho semanal como limite máximo para todos os trabalhadores, do setor público e do setor privado, consagrar o direito a 25 dias de férias anuais, travar os despedimentos revogando as normas que permitiram a sua facilitação. Estas são as propostas que estão hoje em debate e que constituem algumas das soluções defendidas pelo PCP e de que os trabalhadores precisam para a defesa dos seus direitos e das suas condições de vida.

Ao longo deste debate ouvimos os argumentos do costume para rejeitar as soluções propostas pelo PCP.

Ouvimos a ladainha da concertação social, como se não fosse a Assembleia da República o órgão de soberania competente para legislar sobre os direitos dos trabalhadores. Aqueles que pretendem transformar a concertação social numa espécie de câmara corporativa capaz de condicionar o exercício do poder legislativo, mais não pretendem do que garantir ao grande patronato um direito de veto sobre toda e qualquer alteração da legislação laboral que vá contra os seus interesses imediatos.

Ouvimos a ladainha da competitividade das empresas, como se não estivesse já demonstrado que não é com a política de baixos salários que tem sido posta em prática que se garante a competitividade da economia portuguesa.

Ouvimos a ladainha do negacionismo da luta de classes, considerada como uma coisa do passado, como se os que se opõem a toda e qualquer alteração da legislação do trabalho num sentido favorável aos trabalhadores não soubessem muito bem de que lado estão nessa luta.

O PCP sabe de que lado está, e nunca abdicará do combate que os nossos tempos exigem pela valorização do trabalho e dos trabalhadores.

O PCP, como é seu direito, requereu que a votação dos projetos de lei que debatemos tenha lugar hoje mesmo. É importante que cada força política assuma desde já a responsabilidade das suas opções. Os portugueses que vivem do seu trabalho precisam de saber com quem podem contar. O PCP não lhes faltará.

E por isso nos dirigimos às novas gerações de trabalhadores para que ganhem a consciência de que nada vos será dado. Tudo terá de ser conquistado. Por vós!

Disse.

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