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Compromisso do PCP para as Eleições ao Parlamento Europeu 2024

I. 50 anos do 25 de Abril, 38 anos da adesão de Portugal à CEE/UE

A Revolução de Abril, de que este ano comemoramos o 50º aniversário, empreendeu profundas transformações políticas, económicas, sociais e culturais. Constituiu uma vigorosa afirmação de independência e de soberania nacionais. Rompeu o isolamento imposto pelo fascismo e abriu Portugal à Europa e ao mundo.

O 25 de Abril conduziu ao estabelecimento e ao reforço de relações económicas e culturais com diversos países e povos. Este foi um inquestionável factor de progresso e de desenvolvimento.

A Constituição da República Portuguesa – uma das mais avançadas e progressistas da Europa – acolheu e consagrou as conquistas de Abril, o seu projecto de desenvolvimento. Porém, desde cedo, o processo contra-revolucionário pôs em causa essas conquistas. Interrompeu, e nalguns casos reverteu, esse rumo de desenvolvimento. Procurou fechar caminhos e opções que a Revolução abrira. Empobreceu e degradou, sob vários pontos de vista, o regime democrático.

A adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1986, insere-se neste percurso e foi instrumental para o aprofundar. Deu alento aos objectivos dos que, em Portugal, puseram em causa conquistas e valores de Abril. As regras de adesão e permanência na CEE, mais tarde União Europeia (UE), requerendo a conformação do Estado às ditas «economia de mercado» e «livre concorrência» capitalista no mercado único, comprometeram possibilidades de desenvolvimento, dificultaram o planeamento democrático, fixaram e reproduziram desigualdades relativas entre Estados, contribuíram para estreitar as relações económicas e comerciais de Portugal. Na viragem do século, a adesão à moeda única provocou uma significativa aceleração neste rumo.

O aprofundamento da integração acarretou severas limitações da soberania e independência nacionais. O conceito de «partilha de soberania» é uma grosseira mistificação. Contrariamente aos países do «centro» da UE, as principais potências europeias, Portugal, país da «periferia» da UE, viu sacrificados os seus sectores produtivos, no seu desenvolvimento e coerência, e consideravelmente afectada a autonomia do seu processo de decisão política.

Projectar os valores de Abril no presente e no futuro de Portugal exige rejeitar, combater e reverter a dependência económica e a subordinação política para que o País foi arrastado.

II. Romper com os dogmas neoliberais da UE, romper com a política de direita

As políticas e orientações neoliberais impostas a partir da UE e a política de direita de sucessivos governos em Portugal são duas faces da mesma moeda. Por essa razão, o imprescindível combate no Parlamento Europeu para afirmar os interesses nacionais é inseparável da luta por uma Europa de cooperação, de progresso social, de Paz e indissociável também da luta para romper com a política de direita no nosso País, por uma alternativa patriótica e de esquerda.

É necessário romper com a privatização das empresas e sectores estratégicos nacionais, hoje basicamente nas mãos do capital estrangeiro; com a política de recuperação e restauração monopolista; com os pacotes legislativos da UE de liberalização económica, de «abertura de mercados», subordinando à acumulação capitalista praticamente todas as esferas da vida social.

É necessário romper com a degradação e mercantilização das funções sociais do Estado e dos serviços públicos – saúde, educação, segurança social, habitação, transportes, energia, serviços postais e outros; com o desmantelamento do amplo sector empresarial do Estado, imprescindível alavanca de comando da economia nacional e instrumento de promoção de um desenvolvimento soberano.

É necessário romper com as políticas de compressão salarial, com a redução de direitos sociais e laborais, com a política de referenciais mínimos que procura um nivelamento por baixo das condições de vida e de trabalho, contida no designado «Pilar Europeu dos Direitos Sociais». É necessário romper com o aumento das desigualdades na distribuição da riqueza, com as crescentes injustiças sociais, resultado de sucessivas estratégias desreguladoras e liberalizadoras.

É necessário romper com políticas e regras que se revelaram lesivas e mesmo destrutivas de sectores produtivos nacionais, que contribuíram para fixar a economia nacional num perfil de especialização assente em baixos salários, em empregos pouco qualificados e em segmentos do processo produtivo com fraca incorporação científica e tecnológica – políticas ditas comuns, mas definidas pelas principais potências europeias, em função dos interesses dos seus grandes grupos económicos e financeiros, tal como sucede com as regras do mercado único, incluindo as que condicionam a intervenção dos Estados na economia.

É necessário romper com a Política Agrícola Comum (PAC), que depois de fomentar excedentes de produção nos países do «centro», passou a apoiar a diminuição (o «ajuste») da capacidade produtiva, em especial na «periferia», para onde fluíram os excedentes do «centro», arrasando em Portugal com centenas de milhares de pequenas e médias explorações; uma política cujas sucessivas reformas desmantelaram instrumentos de regulação da produção e dos mercados, mantendo profundas desigualdades na distribuição de apoios entre países, produtores e produções; que fomenta as longas cadeias de produção, com graves prejuízos ambientais.

É necessário romper com a Política Comum das Pescas, que promoveu o abate indiscriminado e o envelhecimento da frota pesqueira – local, costeira e longínqua; que diminuiu o emprego no sector e travou a sua modernização.

É necessário romper com a política comercial da UE, que expôs a uma concorrência destrutiva vários sectores industriais e agrícolas, arruinando milhares de micro, pequenas e médias empresas, incluindo com acordos comerciais que sacrificaram sectores industriais importantes para Portugal como moeda de troca das vantagens obtidas pela produção industrial das principais potências, pelos grupos económicos e financeiros e as multinacionais.

É necessário romper com o aprofundamento do mercado único, incluindo na área dos serviços, que favorece o privado em vez do público, as transnacionais em vez dos interesses nacionais, o grande negócio em substituição da satisfação das necessidades, a uniformização com o estrangeiro em detrimento das especificidades nacionais.

É necessário romper com as restrições orçamentais e ao investimento público, que pouco excede os fundos recebidos da UE, insuficientes e condicionados na sua execução.

É necessário romper com o círculo vicioso em que o País se encontra: como cresce pouco, gera poucos recursos e investe pouco, e como investe pouco, cresce pouco, comprometendo as suas potencialidades e possibilidades de desenvolvimento.

III. 25 anos de moeda única – A recuperação da soberania monetária é uma necessidade estrutural do País

Duas décadas e meia de Euro acentuaram gravosamente o enviesamento neoliberal e federalista da UE.

Para Portugal, em vez do prometido progresso social, o Euro significou contenção dos salários e aumento da exploração, precariedade laboral, desigualdades sociais e pobreza, emigração forçada, desequilíbrios no território e degradação das funções sociais do Estado e dos serviços públicos.

Em vez de investimento, expansão comercial e crescimento, significou desinvestimento e degradação produtiva, perda de competitividade, endividamento externo e estagnação económica.

Em vez de ajudar a substituir importações por produções nacionais, ajuda a substituir produções nacionais por importações. O Euro estimula o endividamento nacional, porque enfraquece a produção nacional e porque incentiva a saída de rendimentos e capitais.

Em vez da modernização, da racionalização, de um novo modelo de especialização da economia, significou desindustrialização, privatização e desnacionalização das empresas estratégicas, enfraquecimento da intensidade tecnológica das exportações, um perfil produtivo debilitado, dependente e periférico.

Em vez de um «escudo protector contra as crises», revelou ser um detonador e intensificador de crises, como mostrou a especulação com as dívidas soberanas dos países da «periferia» do Euro.

Em vez da convergência no seio da UE, em termos gerais, tivemos divergência económica, social e salarial entre os seus membros.

O momento actual é particularmente revelador das consequências, para Portugal, da perda de soberania monetária. As opções de fundo da UE e do Banco Central Europeu (BCE), a pretexto de combater a inflação, aumentaram e mantêm altas as taxas de juro, encerram os programas de aquisição e reduzem os títulos de dívida pública no balanço dos bancos centrais, reforçam as políticas orçamentais restritivas. Estas opções acrescentam dificuldades às que resultam do aumento do custo de vida (que acentuam), inviabilizam empresas pela compressão do consumo, lesam o investimento produtivo, acentuam insuficiências e estrangulamentos da oferta, afectam o crescimento, agravam os problemas que dizem combater.

A permanência na moeda única quando não os exacerba, dificulta a recuperação dos nossos défices estruturais mais graves – os défices produtivo, tecnológico, alimentar, energético e demográfico.

O Pacto de Estabilidade, o Semestre Europeu, a Governação Económica, o Tratado Orçamental, consagram a contenção permanente da despesa pública, sobretudo no investimento público, nas funções sociais do Estado e nos serviços públicos. Limitam o crescimento dos salários na Administração Pública e desincentivam-no na generalidade dos trabalhadores, quando não impõem mesmo a sua descida, em termos reais. Promovem uma distribuição do rendimento em favor do capital e em desfavor do trabalho.

Seria irresponsável ignorar as consequências de 25 anos de moeda única.

Portugal precisa de se libertar dos constrangimentos da integração monetária. Precisa de estar preparado para acautelar os seus interesses próprios, mesmo em face de desenvolvimentos ditados por decisões alheias ao País.

Precisa de uma moeda adequada à realidade e às potencialidades económicas do País, aos seus salários, produtividade e perfil produtivo, que concorra para os promover, ao invés de os desfavorecer.

Precisa de uma gestão monetária, financeira, cambial e orçamental autónoma e soberana, ajustada à situação nacional e que aproveite todas as margens de manobra para fomentar a produção, o emprego e o crescimento.

Precisa de contar com um verdadeiro banco nacional que suporte o seu projecto de desenvolvimento, nomeadamente como fonte de financiamento de último recurso, que o liberte seja da chantagem dos especuladores no mercado da dívida, seja da chantagem do BCE, da UE e do Fundo Monetário Internacional (FMI) no financiamento do Estado e da banca.

Para o PCP, a necessária libertação do Euro será um processo democrático, responsável, cuidadosamente preparado, que se insere numa alternativa política que defenda os interesses do povo e do País e que deve contar com a participação e o apoio maioritário da população, protegendo os seus rendimentos, poupanças e níveis de vida, e defendendo e promovendo a economia e produção nacionais.

O desenvolvimento do País necessita, como solução estrutural, da recuperação da sua soberania monetária.

IV. O carácter decisivo da soberania nacional

A transferência de poder e de competências do plano nacional para a UE reforçou o poder das principais potências, que controlam as instituições da UE, e diminuiu o poder decisório de países como Portugal.

Os sucessivos reforços da supranacionalidade acentuaram o pendor federalista da integração, sob a batuta das principais potências. Este é um caminho que alguns querem levar mais longe. O fim das decisões por unanimidade, nos poucos embora relevantes domínios em que ainda persiste, a verificar-se, acentuaria a desigualdade de poder entre os Estados no processo decisório.

A experiência portuguesa é elucidativa sobre as consequências deste processo. A amputação de soberania nacional correspondeu não a um alargamento, mas a uma redução do alcance dos direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa; o que se alargou, sim, invariavelmente, foi o espaço de actuação do grande capital, nacional e transnacional. Não por acaso, este reclama, com frequência, novos condicionamentos à soberania nacional e novos reforços da supranacionalidade.

A defesa e afirmação dos interesses e da soberania nacionais – que não é contraditória, antes pelo contrário, com a procura de concertação de posições e de convergências com países em situações semelhantes e enfrentando problemas e bloqueios idênticos – assume-se como fulcral, nas actuais condições, para quebrar com o rumo de subjugação e dependência do País, para combater as desigualdades entre países no seio da UE e para avançar na construção de uma Europa de Estados soberanos e iguais em direitos, que estabeleçam e aprofundem relações assentes no benefício mútuo.

A submissão nacional é, para o grande capital, uma forma de reforçar a sua dominação de classe. Por isso procura incessantemente transferir a deliberação política para a esfera supranacional, que tão bem lhe tem servido. Inversamente, a soberania nacional é no terreno da luta social uma trincheira da resistência dos trabalhadores e dos povos.

V. Os fundos da UE: parca e interesseira compensação

Os fundos da UE voltaram a estar na ordem do dia. Não só os designados fundos estruturais, no âmbito da política de coesão, mas outros também, com um carácter excepcional, como é o caso do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

Normalmente apresentados como expressão de uma suposta «solidariedade europeia», a lógica que lhes está subjacente é, na verdade, bem diferente. Os «fundos comunitários» sempre tiveram associada uma função de compensação. É esse o sentido da política de coesão e dos fundos que a sustentam: uma compensação monetária pelo impacto assimétrico da integração. Dado que o mercado único, a moeda única e as políticas comuns (agrícola, de pescas, comercial, entre outras), beneficiam relativamente alguns países e prejudicam relativamente outros, estes seriam compensados.

Será a compensação suficiente?

O caso de Portugal é paradigmático: nos últimos dois quadros financeiros plurianuais (2007-2013 e 2014-2020), o saldo das transferências orçamentais da UE para Portugal foi sempre bastante ultrapassado pelo saldo das transferências de Portugal para os países da UE, sob a forma de juros, rendas, dividendos e lucros. O que evidencia a dependência do País, produtivamente debilitado, comercialmente submetido, empurrado para o endividamento, dominado pelo capital estrangeiro. Uma situação que a «política de coesão» não logrou sequer atenuar, quanto mais inverter: a «periferia» empobrecida é contribuinte líquido do «centro» rico.

Os fundos da UE foram instrumentais na criação das infra-estruturas capazes de “olear” o funcionamento do mercado interno, facilitando o domínio dos mercados da «periferia», mais atrasada. Uma boa parte dos fundos tem como verdadeiro destino final os países do «centro», os mal chamados «contribuintes líquidos» do orçamento da UE, a que os países da «periferia» adquirem bens e serviços –, tantos mais quanto mais sacrificados os seus próprios sistemas produtivos no altar da dita «concorrência não falseada».

Os fundos da UE foram e são uma parca compensação, porque bastante aquém do real impacto negativo da integração. São também uma compensação interesseira, porque condicionados ao cumprimento de objectivos políticos da integração capitalista, que acentuaram défices, dívidas e dependências.

Como se não bastasse, os fundos destinados aos objectivos da «coesão económica e social» têm vindo a encolher significativamente e a perspectiva é que sejam ainda mais reduzidos no futuro, enquanto aumentam substancialmente os fundos dedicados a outros objectivos, como o incremento das despesas militares, de que beneficiam sobretudo os países mais industrializados e as suas empresas de produção de armamento.

Países como Portugal são, desta forma, duplamente prejudicados. Por este andar, arriscam-se mesmo vir a pagar mais do que a receber do orçamento da UE.

Importa contrariar esta tendência. Defender a mobilização dos fundos a que o País tem direito. Defender o reforço dos fundos alocados à «coesão económica e social», a objectivos sociais e ambientais, ao desenvolvimento dos sistemas produtivos mais debilitados. Combater o desvio de fundos destas áreas para o militarismo, para alimentar a guerra e a política de intervencionismo externo da UE.

VI. A evolução recente da UE

A situação na UE, nos últimos cinco anos, foi marcada por desenvolvimentos particularmente negativos.

A pandemia de Covid-19 e o arrastar das suas consequências económicas e sociais, a par dos desenvolvimentos em torno da guerra na Ucrânia, criaram um contexto que foi usado como justificação de mais uma fuga para a frente no aprofundamento dos pilares neoliberal, federalista e militarista da UE.

Importa recordar a obstinada recusa da UE em levantar as patentes de vacinas desenvolvidas com financiamento público, impossibilitando a partilha do conhecimento e a sua produção em mais larga escala, colocando, miseravelmente, os lucros dos consórcios multinacionais farmacêuticos à frente da saúde e da vida de milhões de pessoas. É elucidativo que, até hoje, a Comissão Europeia continue a recusar revelar o conteúdo integral dos contratos celebrados com esses consórcios.

Um dos mais inquietantes desenvolvimentos destes anos diz respeito à impetuosa e muito acelerada militarização da UE, assumindo-se crescentemente como o pilar europeu da NATO.

A deriva militarista absorve cada vez mais recursos do orçamento da UE. Os responsáveis da UE assumem, sem reserva, que nenhum dinheiro pode faltar para a guerra, para a indústria do armamento, mesmo que isso implique desviar recursos que fazem falta na promoção da coesão económica e social, no combate à pobreza, na protecção ambiental ou no apoio ao desenvolvimento. Alguns destes responsáveis vão ao ponto de admitir o envolvimento directo dos países da UE na guerra na Ucrânia, abrindo as portas ao confronto directo entre potências nucleares, numa escalada de consequências imprevisíveis. Ao mesmo tempo, anunciam uma «economia de guerra», cujas consequências devastadoras sobre os trabalhadores e os povos se prolongam sempre muito além do campo de batalha, – na degradação imposta das condições de vida, com o pretexto da guerra.

Intensificou-se a política externa de cariz intervencionista, assente na ingerência e na instigação de conflitos internacionais, com a generalização da política unilateral de sanções. Reduz-se ostensivamente o campo da diplomacia e do multilateralismo. Ao mesmo tempo que se alimenta a política de confrontação e de guerra, criam-se permanentemente obstáculos a uma solução pacífica dos conflitos internacionais.

Esta ofensiva no plano externo coincide com uma ofensiva no plano interno contra direitos, liberdades e garantias, que corrói a democracia. Pratica-se a censura. A teoria do «inimigo interno» volta a alimentar uma nova caça às bruxas, a todos os que desafiam o pensamento único, que condenam o militarismo e a guerra e defendem a Paz.

Evidenciando concepções e práticas típicas da extrema-direita, aprofundou-se a visão criminalizadora das migrações e dos migrantes, procurando simultaneamente adaptar os seus fluxos às necessidades de mão-de-obra do capital, utilizando os trabalhadores imigrantes, fragilizados e sobre-explorados, para pressionar todos os trabalhadores, independentemente da sua nacionalidade, e baixar as suas condições remuneratórias, de trabalho e de vida.

Agrava-se a lógica de mercantilização, que transforma direitos em negócios. É sintomático o que se está a passar na área da saúde, com o intuito de criação de um «mercado interno» nesta área, ou na segurança social, com as constantes tentativas de avançar na sua privatização. Ao mesmo tempo que, em ambas as áreas, se pretende cortar a despesa dos Estados.

As teorias dos «campeões europeus», segundo as quais os grandes grupos económicos das principais potências europeias terão de ser cada vez maiores, para ganharem competitividade na concorrência capitalista à escala internacional, promovem uma crescente concentração e centralização de capital. As sacrossantas regras da concorrência, que durante anos serviram para inviabilizar a intervenção dos Estados (ou de alguns Estados) na economia – fosse para capitalizar um banco público (como a Caixa Geral de Depósitos), fosse para defender uma companhia aérea de bandeira (como a TAP), fosse ainda para defender um sector de actividade estratégico (como a construção e reparação naval) –, são agora abertamente postas em causa, no quadro de ajudas de Estado redefinidas em função da promoção dos tais «campeões europeus». O próprio orçamento da UE é cada vez mais canalizado para o apoio directo ao grande capital, incluindo com desvios de fundos estruturais e de coesão.

A reforma do Pacto de Estabilidade e da Governação Económica da UE acentua constrangimentos hoje existentes, acrescentando à ditadura do défice e da dívida o foco directo na contenção ou redução da despesa pública.

A propaganda da UE na frente ambiental, especialmente no que se refere à luta contra as alterações climáticas, tem servido mais para justificar novas frentes de negócio do que para enfrentar e resolver problemas candentes, que aliás se vão agravando.

VII. Uma Europa dos trabalhadores e dos povos, é possível

São necessários caminhos alternativos para enfrentar, de facto, os problemas e as dificuldades sentidos pelos povos da Europa, inseparáveis, na sua génese ou desenvolvimento, das orientações, das opções e das políticas da UE.

A UE é um processo de integração, económica e política, de Estados. Não é o primeiro que ocorre na Europa. Certamente não será o último.

A UE é a super-estrutura política de um processo de integração capitalista. Esta sua natureza determina-lhe a organização, o funcionamento, os objectivos, os impactos económicos, sociais e políticos assimétricos.

O desenvolvimento científico e tecnológico, o desenvolvimento das forças produtivas, a internacionalização da economia, a crescente divisão internacional do trabalho, são dinâmicas objectivas que, historicamente, extravasaram as nações. Mas os processos de integração não são neutros. Dependendo das suas características, da sua orientação, dos seus objectivos, tais processos podem servir os monopólios e as transnacionais, ou podem servir os trabalhadores e os povos.

Numa sociedade atravessada por antagonismos sociais, entre capital e trabalho, a questão essencial é a do conteúdo social (de classe) de cada processo de integração.

O que faz falta é uma Europa de cooperação: ao serviço dos povos e não como instrumento do capital e das grandes potências; assente numa cooperação genuína e solidária entre Estados soberanos e iguais em direitos, ao invés de relações de domínio e subordinação entre os países; orientada para a promoção do desenvolvimento, da Paz e da resolução pacífica dos conflitos, do respeito pelo direito internacional, em lugar da submissão a uma «ordem internacional baseada em regras» estabelecidas pelo imperialismo, de todo e qualquer intervencionismo externo, comercial, financeiro, diplomático e militar.

Exige-se, no imediato, acção e iniciativa política que contrariem o militarismo e a escalada armamentista, defendendo o desarmamento geral, simultâneo e controlado, e a dissolução dos blocos político-militares.

O PCP desenvolve a sua intervenção no Parlamento Europeu em articulação com forças comunistas, progressistas e de esquerda de outros países, pela ruptura com o processo de integração capitalista europeu e pela construção de uma Europa: de direitos sociais e laborais, onde o direito ao desenvolvimento é reconhecido a todos os povos de todos os países, sendo inseparável da preservação ambiental e da sustentabilidade ecológica; de igualdade, liberdade e democracia; de paz e cooperação com todos os povos do mundo.

Uma Europa dos trabalhadores e dos povos, exige o reforço da luta dos trabalhadores e dos povos em cada país, por alterações na correlação de forças, sociais e políticas, que lhes sejam favoráveis, por rupturas democráticas e progressistas, que assumam o confronto com a UE e com as opções vigentes.

A afirmação confiante desses caminhos alternativos e das rupturas necessárias passa também por estas eleições para o Parlamento Europeu.

VIII. Proposta, intervenção e luta dos deputados do PCP no Parlamento Europeu – compromissos por uma Europa em defesa dos trabalhadores, do povo e do País

Direitos sociais e laborais

  • Elaboração de um Pacto de Progresso Social e pelo Emprego, que consagre, entre outros, os seguintes objectivos:
    • Institucionalização do princípio da não-regressão, visando a convergência no progresso das normas sociais e laborais e revertendo a tendência para o nivelamento por baixo das condições de vida e de trabalho na UE;
    • Definição do pleno emprego como objectivo a alcançar em cada país;
    • Combate efectivo ao desemprego, ao subemprego e à precariedade laboral, visando a sua erradicação;
    • Elevação e valorização dos direitos laborais;
    • Defesa da contratação colectiva;
    • Fortalecimento, modernização e diversificação dos serviços públicos, com garantia da sua universalidade e qualidade.
  • Dinamização do emprego público, reforçando os serviços públicos e as funções sociais dos Estados, incluindo com o fim das restrições e condicionamentos no âmbito de procedimentos como o Semestre Europeu e as recomendações específicas por país.
  • Elevação das condições de vida e de trabalho, por via da valorização dos salários, do reforço da segurança social, da melhoria da protecção social, incluindo nas situações de doença, desemprego, maternidade e paternidade.
  • Redução do horário de trabalho sem perda salarial, recusa do aumento da idade de reforma, elevação da participação dos trabalhadores no rendimento nacional.
  • Orientação dos avanços tecnológicos para a melhoria das condições de vida e do emprego, a valorização do trabalho e dos trabalhadores, a redução progressiva da jornada de trabalho, a eliminação de tarefas penosas, insalubres e perigosas.
  • Combate à deslocalização de empresas, designadamente condicionando ajudas públicas, como as provenientes do orçamento da UE, a obrigações de protecção do emprego, de respeito pelos direitos dos trabalhadores e de contributo para o desenvolvimento local e regional.
  • Prioridade aos direitos sociais e laborais sobre as regras de funcionamento do mercado único, designadamente as relativas à «livre concorrência».
  • Rejeição das políticas e normas que colidam com o direito e o dever dos Estados de promover o desenvolvimento sócio-económico, intervindo decididamente em defesa dos sectores produtivos nacionais e da promoção do emprego com direitos.
  • Salvaguarda da possibilidade de intervenção de cada Estado, em graves situações sociais decorrentes de calamidades públicas ou de perturbações no tecido económico, com medidas de apoio aos trabalhadores e à recuperação dos sectores e regiões atingidos.
  • Possibilidade de existência de excepções, derrogações e cláusulas de salvaguarda às regras de funcionamento do mercado único e demais políticas da UE, por razões de natureza económica e/ou social.
  • Reversão de processos regulatórios que dificultem o exercício pelos Estados das suas funções sociais, especialmente através de serviços públicos.
  • Defesa do carácter público da segurança social e combate à sua privatização, total ou parcial, como a tentativa de criação de um mercado transeuropeu de fundos de pensões.
  • Salvaguarda do carácter público e universal dos serviços de saúde, rejeitando e revertendo qualquer passo no sentido da sua privatização, garantindo o direito de todos à saúde, independentemente da sua condição económica.
  • Definição do combate à pobreza e à exclusão social como uma prioridade, incluindo a instituição de um rendimento mínimo em países da UE.
  • Melhoria das condições de conciliação entre a vida profissional e a vida familiar, sem quebra de direitos, com a promoção de políticas e serviços públicos de resposta às necessidades das famílias, como creches gratuitas, escolas, hospitais, centros de saúde, lares, serviços de apoio domiciliário, abonos familiares, licenças laborais.
  • Melhoria dos direitos das crianças e dos pais, reflectidos em melhor regulamentação e protecção laboral, regulação e redução dos horários laborais sem perda de salário, alargamento das licenças de maternidade e paternidade, pagamento a 100% da remuneração de referência, protecção e promoção da amamentação e do aleitamento materno.
  • Promoção da universalidade dos serviços públicos para as crianças e dos seus direitos, incluindo a brincar e à participação.
  • Defesa e promoção dos direitos das pessoas com deficiência, desde logo o direito a uma vida digna e autónoma, promovendo a igualdade de oportunidades, a reabilitação e pensões dignas.
  • Prevenção da sinistralidade laboral.
  • Criação de financiamento adicional e específico da UE para a expansão e requalificação dos parques habitacionais públicos, combate à especulação imobiliária e defesa do direito a uma habitação digna e a preços acessíveis para todos.

Desenvolvimento e soberania

  • Reforço do orçamento da UE, resultante de contribuições dos Estados, assentes no respectivo Rendimento Nacional Bruto (RNB), com o fim dos rebates aos países que deles beneficiam, visando uma efectiva função redistributiva e o pleno aproveitamento das potencialidades de desenvolvimento de cada país, através do reforço do investimento público, da modernização dos sistemas produtivos, da criação de emprego, da eficiência dos serviços públicos, da luta contra a pobreza e a exclusão social, da preservação e recuperação dos ecossistemas, da mitigação das alterações climáticas.
  • Relativamente ao Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-2027, reversão do aumento de verbas para o militarismo, a indústria de armamento e o intervencionismo externo, com a alocação dessas verbas à promoção de uma efectiva coesão económica, social e territorial.
  • Relativamente às perspectivas financeiras pós-2027, recusa de qualquer diminuição das transferências a receber por Portugal, ao abrigo da política de coesão (fundos estruturais e de coesão) e da PAC, lutando pela reversão e compensação da redução efetuada no QFP 2021-2027 (excluindo verbas do PRR, de carácter excepcional), e recusa de concentração de acrescidos meios financeiros nos países que mais beneficiam do mercado único e da moeda única, bem como em derivas militaristas e securitárias.
  • Oposição a novos «recursos próprios» da UE que abandonem o princípio da contribuição dos Estados em função do seu RNB, subvertendo a função redistributiva do orçamento.
  • Garantia de adequação dos fundos da UE às necessidades e prioridades de cada Estado-Membro, rejeitando mecanismos de «condicionalidade» ou a lógica de financiamento de «reformas» pré-determinadas pela UE, transversal a vários instrumentos e políticas, com particular incidência na atribuição de fundos visando a imposição de preceitos neoliberais.
  • Adopção de um programa de defesa dos sectores produtivos e do emprego, dirigido aos países mais prejudicados pela União Económica e Monetária e pela moeda única.
  • Incremento do apoio às micro, pequenas e médias empresas (MPME), ao sector cooperativo, às autarquias locais, a investimentos públicos no domínio das infra-estruturas de apoio à produção, reforçando e concentrando nesta direcção os fundos destinados a investimento, em detrimento do financiamento de empresas ou de grupos económicos multinacionais.
  • Defesa do apoio à actividade industrial, à sua modernização e diversificação, em especial nos países com economias mais debilitadas e deficitárias, visando o seu crescimento; do apoio ao sector comercial, particularmente ao comércio tradicional, visando a sua modernização; e do apoio ao sector cooperativo, em toda a sua diversidade, visando a salvaguarda da sua função social.
  • Modificação profunda da Política Agrícola Comum, entre outros, com os seguintes objectivos:
    • Fim das desigualdades existentes na distribuição dos pagamentos entre países, produtores e produções;
    • Melhoria dos rendimentos dos pequenos e médios agricultores;
    • Recuperação de mecanismos de regulação da produção e dos mercados, garantindo a cada país o direito a produzir e preços justos à produção;
    • Promoção da segurança e soberania alimentar em cada país, com o crescimento sustentado da produção agroalimentar nos países mais deficitários;
    • Respeito pelas especificidades de cada país e região, apontando a uma regionalização da PAC;
    • Reforço do plafonamento e da modulação;
    • Criação da possibilidade de instauração do princípio da preferência nacional relativamente a importações de países da UE ou terceiros, com adopção de quotas de comercialização obrigatória de produção nacional, nos casos em que tal se revele necessário para defender a produção.
  • Modificação profunda da Política Comum das Pescas, entre outros, com os seguintes objectivos:
    • Assegurar a viabilidade sócio-económica do sector, em especial da pesca de pequena escala artesanal e costeira, no quadro da boa conservação dos recursos;
    • Assegurar a soberania nacional sobre a Zona Económica Exclusiva e sobre os seus recursos haliêuticos, revertendo as disposições relevantes dos tratados, nomeadamente quanto à competência exclusiva da UE sobre a gestão dos recursos vivos marinhos;
    • Melhoria dos rendimentos e das condições de vida dos pescadores e trabalhadores do sector;
    • Reinstituição de mecanismos de regulação do mercado dos produtos da pesca, com garantia da sua estabilidade;
    • Instituição, sempre que se justifique, de uma margem máxima de intermediação ao longo da cadeia de valor, de forma a garantir a melhoria do preço de primeira venda e a contenção de preços no consumidor final;
    • Gestão de proximidade, baseada no conhecimento científico e envolvendo o sector;
    • Modernização do sector, com especial enfoque no apoio à pesca de pequena escala artesanal e costeira, visando a melhoria da sua sustentabilidade nas vertentes económica, social e ambiental.
  • Promoção do reconhecimento internacional da extensão da plataforma continental portuguesa; defesa da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e protecção dos recursos naturais do mar, designadamente das águas internacionais e dos fundos marinhos, do saque de transnacionais.
  • Defesa e valorização do estatuto de região ultraperiférica dos Açores e da Madeira, com meios financeiros, programas e medidas, permanentes e excepcionais, de apoio às economias regionais insulares; reforço das dotações dos programas para fazer face ao afastamento e à insularidade (POSEI), incluindo a reinstituição de um programa POSEI-Pescas e a criação de um novo programa POSEI-Transportes.
  • Formulação de políticas comerciais que tenham em conta os interesses, as especificidades e as necessidades de cada país, pautadas por critérios de complementaridade e não de competição, entre países, produtores e produções; retirada da política comercial da esfera da competência exclusiva da UE.
  • Reversão das políticas de desregulação e liberalização do comércio mundial, com a revogação de acordos de livre comércio da UE já firmados; adopção de medidas efectivas de defesa face a exportações agressivas assentes no dumping social ou ambiental.
  • Rejeição das políticas, orientações e medidas neoliberais da UE que visem impedir ou dificultar o controlo público, democrático, sobre sectores e empresas estratégicos; reversão dos processos de liberalização, nomeadamente nos sectores dos transportes, da energia e dos serviços postais, tendo em vista assegurar o controlo público nacional sobre esses sectores.
  • Cooperação entre os serviços nacionais de saúde, com garantia da sua natureza pública, universal e gratuita; apoio à cooperação no combate a doenças, envolvendo os serviços públicos de saúde e de investigação e desenvolvimento (I&D).
  • Promoção da libertação dos Estados da dependência das multinacionais farmacêuticas, com o levantamento de patentes de medicamentos; fomento da investigação, produção e distribuição pública de medicamentos.
  • Salvaguarda da competência soberana dos Estados em matéria de fiscalidade; rejeição da instituição de «impostos europeus».
  • Eliminação dos offshores e outros paraísos fiscais; consagração da possibilidade de levantamento do sigilo bancário para efeitos fiscais; cooperação na prevenção e combate ao branqueamento de capitais e à fraude, evasão e elisão fiscais; adopção de medidas de limitação da livre circulação de capitais e de penalização das operações especulativas.
  • Promoção da cooperação entre os Estados na instituição de impostos sobre o capital transnacional, – como o imposto sobre as transacções financeiras ou sobre as multinacionais do sector digital, – cujas receitas devem reverter para os orçamentos nacionais; assunção do princípio de que os lucros devem ser tributados no país onde são gerados.
  • Revogação da União Bancária e rejeição do Mercado Único de Capitais, com a defesa simultânea de um sector financeiro público, forte e dinâmico em cada país, ao serviço do seu desenvolvimento económico.
  • Alteração dos estatutos, das orientações e da falsa autonomia do Banco Central Europeu (BCE), garantindo a presença em igualdade dos Estados na sua direcção.
  • Controlo por cada Estado do banco central nacional, com funções de supervisão não delegáveis no BCE.
  • Medidas de mitigação do impacto da elevação das taxas de juro, com particular incidência nos países mais endividados e onde prevaleça a taxa de juro variável nos empréstimos concedidos às famílias e às empresas, como é o caso de Portugal; diminuição substancial das taxas de juro directoras.
  • Revogação do Tratado Orçamental, da Governação Económica, do Semestre Europeu e do Pacto de Estabilidade; rejeição das trajectórias de ajustamento neles previstas relativamente ao défice, à dívida e à despesa pública.
  • Rejeição do aprofundamento da União Económica e Monetária e defesa de medidas que conduzam, a prazo, à sua dissolução.
  • Criação de um programa que enquadre a saída negociada da moeda única dos Estados que voluntariamente o desejem fazer, recuperando a sua soberania monetária, financeira, cambial, orçamental e fiscal; contendo medidas de compensação em caso de evidentes prejuízos causados pela adesão e permanência no Euro.
  • Redução do peso da dívida pública com a adopção de políticas favoráveis ao crescimento; caso se revele necessário, criação de um quadro de renegociação das dívidas públicas, nos seus prazos, juros e montantes, estabelecendo encargos com o serviço da dívida compatíveis com o desenvolvimento económico e social de cada país.

Igualdade, liberdade e democracia

  • Defesa de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos, livres e iguais em direitos, com a consequente rejeição do federalismo, de relações entre os Estados com base no domínio das grandes potências.
  • Instituição do princípio da igualdade entre Estados (um país, um voto), com direito de veto em todas as questões consideradas de interesse fundamental.
  • Manutenção e alargamento da regra da unanimidade no Conselho e no Conselho Europeu em todas as decisões que o justifiquem.
  • Representação permanente de cada um dos Estados, em pé de igualdade e com direito de voto, na Comissão Europeia.
  • Defesa do aumento do número de mandatos de Portugal no Parlamento Europeu, que preveja, no mínimo, a recuperação dos quatro mandatos perdidos em anteriores alargamentos; rejeição da redução do número de mandatos, nomeadamente de Portugal, em eventuais futuros alargamentos; defesa de uma repartição dos mandatos que assegure a cada país uma efectiva representatividade plural das diferentes forças políticas.
  • Rejeição de listas transnacionais nas eleições para o Parlamento Europeu.
  • Reversibilidade dos tratados, políticas e normas da UE, tendo em vista o progressivo ajustamento do estatuto de cada país à vontade do seu povo e à sua real situação, salvaguardando as suas especificidades, admitindo as necessárias cláusulas de excepção.
  • Rejeição do princípio do primado do direito da UE sobre o direito nacional e a Constituição de cada Estado.
  • Reforço da capacidade de decisão dos parlamentos nacionais sobre as políticas da UE.
  • Recuperação do comando político e democrático do processo de desenvolvimento, com a subordinação do poder económico ao poder político, e a afirmação do papel do Estado como estrutura determinante e referencial na economia.
  • Combate ao fenómeno das “portas giratórias” entre o poder político e o poder económico, com regras mais apertadas e períodos de nojo mais prolongados; combate à corrupção e aos lóbis institucionalizados.
  • Respeito e salvaguarda da identidade cultural de cada país e de todas as línguas nacionais.
  • Defesa da cultura e da língua portuguesas, nomeadamente não abdicando do uso do português como língua oficial e de trabalho em todas as instituições da UE.
  • Defesa e promoção da diversidade cultural e do intercâmbio cultural entre os povos, e rejeição da hegemonização, da colonização e da mercantilização da cultura.
  • Democratização e promoção do acesso à cultura e ao conhecimento por via de políticas que assegurem o direito à fruição e produção cultural.
  • Reforço de meios dirigidos à preservação do património cultural, material e imaterial.
  • Defesa dos interesses dos agentes que participam nos processos de criação e divulgação culturais; rejeição dos processos de concentração capitalista e dos mecanismos, como a directiva dos direitos de autor no mercado único digital da UE, que visam a uniformização cultural, o impedimento da livre partilha de conteúdos, a exploração pelas grandes multinacionais dos direitos de autor, a limitação da justa remuneração dos criadores e a censura digital.
  • Avanços no sentido da garantia da igualdade de direitos entre homens e mulheres, designadamente nos salários, direitos laborais e direitos sociais, na família e na sociedade, consagrando-os na lei e na vida.
  • Prevenção e erradicação da violência doméstica e no namoro, da violência e assédio no trabalho, bem como de todas as formas de violência e exploração, como a prostituição, o abuso sexual, o tráfico de seres humanos e a escravatura.
  • Combate a todas as formas de discriminação, ao racismo, à xenofobia, ao fascismo, ao chauvinismo, ao nacionalismo, ao anticomunismo e a todas as formas de intolerância e práticas autoritárias e antidemocráticas.
  • Prevenção e combate a discriminações e preconceitos em função da orientação sexual e relativos a questões de género.
  • Protecção dos direitos dos migrantes e dos refugiados; melhoria das condições de acolhimento, com reforço do financiamento da UE para esse fim; rejeição da política de “UE fortaleza” e do seu cariz securitário e repressivo; rejeição de uma visão selectiva, utilitarista e exploradora das migrações, constantes no Pacto em Matéria de Migração e Asilo da UE.
  • Defesa do direito dos cidadãos à segurança e à tranquilidade em liberdade, combatendo derivas securitárias atentatórias de direitos, liberdades e garantias; recusa de prácticas de censura, vigilância e violação da reserva da vida privada dos cidadãos; recusa de serviços de informações de âmbito supranacional no quadro da UE.
  • Proibição da utilização de tecnologias de recolha invasiva de dados pessoais para alimentar sistemas de Inteligência Artificial (IA), nomeadamente vigilância permanente em contexto laboral, devassa automatizada da privacidade, recolha de dados biométricos; limitação do uso de IA, ou outras formas similares de algoritmos, para tomar ou fundamentar decisões com implicação directa na vida de seres humanos (apoios sociais, vistos, asilo, crédito bancário, acesso a um posto de trabalho, decisão judicial, etc.), exigindo que todos os parâmetros e bases de dados usados na decisão sejam públicos e auditáveis.
  • Rejeição do acordo de transferência de dados entre a UE e os EUA.
  • Proibição da censura de conteúdos por motivos políticos e ideológicos, muitas vezes a coberto de outros pretextos, e defesa da neutralidade da internet perante todo o tipo de conteúdos.
  • Respeito pelos princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos, incluindo todos os seus direitos civis, políticos, económicos, sociais e culturais, e pelo seu carácter indivisível.

Sustentabilidade ecológica, mitigação e adaptação às alterações climáticas

  • Definição de políticas que tenham por objectivo a promoção de uma relação sustentável e harmoniosa entre o ser humano e a Natureza; introdução nas políticas sectoriais relevantes do objectivo da sustentabilidade ecológica e da luta contra as alterações climáticas, visando uma maior coerência de políticas.
  • Melhoria da qualidade ambiental e democratização do acesso e usufruto da Natureza, tendo em vista a melhoria da qualidade de vida das populações; defesa do carácter soberano e público das políticas e meios de preservação do ambiente e dos recursos naturais.
  • Rejeição da mercantilização do ambiente, de que é exemplo o mercado do carbono, no qual se integra o regime de comércio de licenças de emissão da UE.
  • Substituição da actual abordagem de mercado por uma abordagem normativa na redução das emissões de gases de efeito de estufa (GEE), que tenha em conta, além da fixação de imprescindíveis metas de redução, a definição de meios suficientes para as alcançar, no respeito pelo princípio da responsabilidade comum mas diferenciada; articulação desta abordagem com o desenvolvimento de tecnologias hipocarbónicas e a progressiva disseminação das melhores tecnologias disponíveis.
  • Promoção da eficiência energética e de um maior aprovisionamento energético oriundo de fontes renováveis, privilegiando os recursos endógenos de cada país, a par da racionalização dos consumos, no quadro do respeito pelo direito soberano de cada país de definir a sua política energética e o seu combinado de fontes de energia.
  • Promoção de uma mudança de paradigma nas políticas de mobilidade, privilegiando o transporte colectivo em detrimento do transporte individual; criação de um programa da UE de investimento na modernização e melhoria da qualidade dos transportes públicos e das respectivas redes (locais, regionais e nacionais), tendo em vista maior intermodalidade, a redução dos tempos de viagem, a melhoria da segurança e conforto e a tendencial gratuitidade.
  • Correcção das distorções e enviesamentos de mercado existentes na regulamentação da UE, que tendem a favorecer o negócio «verde», mesmo que com sacrifício de objectivos e valores ambientais (como são os casos da destruição de áreas de habitats naturais para instalação de projectos de energias renováveis sem avaliação de impacto ambiental e da legislação tendente à privatização da água).
  • Garantia do direito universal à água e ao saneamento; defesa da água pública, assegurando a propriedade e gestão públicas dos serviços de água e saneamento.
  • Redução, reutilização e reciclagem de resíduos, de acordo com o princípio da hierarquia na gestão de resíduos, aumentando as respectivas percentagens; defesa e promoção da gestão pública dos resíduos.
  • Reforço da protecção da qualidade do ar, do solo e dos meios hídricos, incorporando na legislação a evolução do conhecimento científico e as recomendações de organizações relevantes, como a Organização Mundial de Saúde; promoção de avanços no combate à poluição e em projectos de despoluição e restauração ecológica.
  • Reforço do investimento na investigação e no desenvolvimento tecnológico, visando uma indústria cada vez menos poluente e uma maior sustentabilidade dos meios urbanos, onde se concentra tendencialmente a grande maioria da população.
  • Reforço da dotação dos programas destinados à conservação da natureza, a par da criação de um instrumento financeiro destinado a apoiar a gestão das áreas integrantes da Rede Natura 2000.
  • Alocação mínima de 2% do orçamento da UE ao Programa LIFE.
  • Criação de um quadro financeiro adequado à prevenção de catástrofes, que apoie acções de diminuição de risco, como incêndios florestais, erosão costeira e sismos.
  • Mobilização de meios adicionais para o estudo de espécies exóticas invasoras e o controlo de pragas florestais e agrícolas.
  • Criação de um Observatório Europeu sobre a Seca efectivamente capacitado com meios e recursos adequados, capazes de garantir um apoio científico e técnico aos Estados-Membros.
  • Adopção de medidas que visem a promoção do bem-estar animal, incluindo nos processos produtivos, no transporte e no abate.
  • Rejeição do patenteamento da vida.
  • Adopção do princípio da precaução relativamente aos organismos geneticamente modificados (OGM); estabelecimento de uma moratória sobre novas autorizações e reavaliação das actuais; correcção das perversidades do processo de autorização de introdução no mercado de novos OGM e outros produtos relevantes, dada a promiscuidade existente entre as instituições especializadas da UE e a indústria.
  • Respeito geral pelo princípio da precaução em todas as políticas sectoriais, designadamente na utilização, e desejável redução, de pesticidas e outros agroquímicos na actividade agrícola.
  • Elaboração de um programa de combate à obsolescência programada.

Paz, solidariedade e cooperação

  • Respeito pelos princípios da Carta das Nações Unidas e do direito internacional, pelo direito à Paz, a autodeterminação dos povos, a soberania e independência dos Estados, a não ingerência e a solução pacífica dos conflitos internacionais.
  • Defesa da reforma e democratização da Organização das Nações Unidas (ONU), como espaço de cooperação entre os Estados, e consequente rejeição de uma «voz única» da UE na ONU.
  • Defesa do fim da instigação e do prolongamento da guerra na Ucrânia e do início de negociações com todas as partes envolvidas, tendo em vista alcançar urgentemente uma solução política negociada.
  • Fim da corrida aos armamentos e da militarização das relações internacionais; rejeição da militarização da UE, da sua consolidação como «pilar europeu» da NATO, da sua transformação num bloco político-militar imperialista, complementar a esta aliança; defesa da dissolução dos blocos político-militares desde logo da NATO.
  • Implementação de um sistema de segurança e cooperação na Europa baseado nos princípios da Acta Final da Conferência de Helsínquia.
  • Rejeição da «Política Europeia de Segurança e Defesa» e da «Política Externa de Segurança Comum», da «Cooperação Estruturada Permanente» de âmbito militar, da «Bússola Estratégica», da intenção de criação de um denominado «Exército Europeu», da «Estratégia Industrial Europeia de Defesa», do «Programa Europeu para a Indústria de Defesa», da «Estrutura para o Programa Europeu de Armamento» e, em geral, da utilização dos meios financeiros da UE para financiar o militarismo, a escalada armamentista e o intervencionismo externo.
  • Defesa da abolição das armas nucleares e de outras armas de destruição massiva; cumprimento do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares, incluindo pelas actuais potências nucleares; ratificação do Tratado sobre a Proibição das Armas Nucleares.
  • Empenho no relançamento das negociações para o desarmamento geral, simultâneo e controlado, com vista à redução gradual e negociada dos armamentos e das despesas militares.
  • Rejeição e condenação da política de sanções económicas e culturais, que incluem crescentemente disposições de carácter extraterritorial, assim como da utilização das relações comerciais como arma de arremesso contra países e povos.
  • Defesa do fim das bases militares estrangeiras.
  • Respeito pelos inalienáveis direitos nacionais dos povos, nomeadamente: do povo palestiniano a um Estado da Palestina, com as fronteiras de 1967 e com Jerusalém Leste como capital; do povo cipriota, pelo fim da ocupação militar turca e a reunificação de Chipre; do povo sarauí, à autodeterminação.
  • Rejeição das ingerências, sanções e agressões contra povos e Estados soberanos, nomeadamente: contra o povo sírio, por um processo de Paz respeitador da soberania e independência do país; contra o povo iraniano, pelo fim das ameaças e das sanções; contra o povo venezuelano, pelo fim das sanções e a rejeição da interferência estrangeira; contra o povo cubano, pelo fim do bloqueio imposto pelos EUA e da base norte-americana de Guantánamo.
  • Promoção da amizade e da cooperação mutuamente vantajosa entre os povos de todo o mundo; defesa de uma genuína política de cooperação e ajuda ao desenvolvimento, dotada dos meios e recursos adequados e assente numa efectiva solidariedade, que rejeite todas as formas de neocolonialismo, o intercâmbio desigual e a pilhagem de matérias-primas, que combata a fome, a doença, a pobreza, que respeite e garanta o desenvolvimento e a soberania dos povos, nomeadamente de África, contribuindo para a melhoria das suas condições de vida.
  • Anulação da dívida externa dos países em vias de desenvolvimento.
  • Rejeição dos chamados Acordos de Parceria Económica celebrados pela UE com países de África, Caraíbas e Pacífico, assentes na desregulação e liberalização do comércio e serviços e na exploração de recursos em função dos interesses das multinacionais.
  • Reforço da cooperação na garantia do direito à alimentação, à água, à saúde, à educação, à habitação, à energia, à gestão e preservação dos recursos, ao desenvolvimento soberano.
  • Reforço da cooperação no combate ao crime organizado, ao narcotráfico e ao branqueamento de capitais, às redes internacionais de crime económico e financeiro, de prostituição e tráfico de seres humanos.
  • Garantia dos direitos e da inclusão dos migrantes e dos refugiados; promoção de políticas de desenvolvimento que ataquem as causas das migrações.

IX. «A tua voz no Parlamento Europeu»: uma intervenção distinta, indispensável e insubstituível

A intervenção dos deputados do PCP no Parlamento Europeu assume características distintivas, que a tornam indispensável e insubstituível.

Assim é com a afirmação soberana dos interesses nacionais, a defesa intransigente dos interesses dos trabalhadores e do povo, contra as desigualdades e as injustiças, e com a sua articulação solidária com a luta de outros povos por uma Europa de paz, de cooperação, de progresso social.

Assim é na defesa dos sectores produtivos nacionais e na exigência de recuperação de instrumentos de soberania indispensáveis à prossecução de qualquer projecto de desenvolvimento.

Assim é na identificação da natureza de classe da UE, na rejeição da Europa das grandes potências, das multinacionais e do grande capital, no combate às relações de dependência e de subordinação que se estabelecem no interior da UE e na identificação das tentativas de submissão nacional como uma forma de submissão de classe, de aumento da exploração e das desigualdades.

Assim é na afirmação de que a guerra e o militarismo não são solução e de que é preciso abrir caminhos para a Paz, assentes na negociação e na diplomacia, tendentes a uma solução política dos conflitos internacionais.

Assim é na luta pela liberdade e pela democracia e contra as ameaças que sobre elas impendem.

Assim é na certeza de que a luta ambiental, pela resolução de problemas candentes com que a Humanidade se defronta, é inseparável da luta pela transformação económica e social.

Assim é, também, na profunda ligação à realidade nacional, no permanente contacto com o País, com as populações, de norte a sul, do interior ao litoral, do continente às ilhas; na garantia de ligação a sectores e áreas diversas da vida nacional, no contacto com os trabalhadores, os micro, pequenos e médios empresários, os agricultores e pescadores, com os serviços públicos, com os trabalhadores e agentes da área da cultura e da ciência, entre tantos outros. É no conhecimento único que resulta desta ligação permanente à realidade nacional que a intervenção dos deputados do PCP no Parlamento Europeu ganha maior sentido e substância. É isso que possibilita transportar para a intervenção institucional as legítimas preocupações e aspirações populares, apresentando soluções concretas que lhes dão resposta, permitindo afirmar que esta intervenção é, de facto, «a tua voz no Parlamento Europeu».

 

«A situação criada por esta evolução [da União Europeia] torna indispensável uma política que se desenvolva em seis direcções principais e interligadas: defender sempre firmemente os interesses portugueses, designadamente nas instituições europeias, combatendo decisões que os prejudiquem; minimizar com medidas concretas os condicionalismos e consequências negativas da integração; lutar contra as imposições supranacionais e as limitações à democracia e à vontade dos povos; reclamar e utilizar a favor do progresso de Portugal e do bem-estar dos portugueses todos os meios, recursos e possibilidades; agir especificamente e em articulação com os trabalhadores e os povos de outros países para romper com o processo de integração capitalista europeu e promover uma Europa de paz e cooperação baseada em Estados livres, soberanos e iguais em direitos; lutar por um desenvolvimento soberano de acordo com os interesses nacionais dos trabalhadores e do povo, cuja concretização deve prevalecer face a condicionamentos ou constrangimentos, assumindo as exigências, caminhos e opções que a situação coloque como necessários.»
in Programa do PCP.

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