Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

"Se PSD e CDS foram os únicos a perder, não podem dizer que ganharam as eleições"

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Sr. Presidente, às faltas do CDS há sempre uma resposta comunista a dar, não se preocupe.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

22 dias depois de rejeitado o Programa do Governo com que o PSD e CDS se apresentaram à Assembleia da República sem condições para governar discutimos, agora, o Programa do Governo que o Sr. Presidente da República dispunha desde o início, por indicação dos partidos representados na Assembleia da República, mas que se recusou a empossar até que não lhe restou alternativa, como o próprio reconheceu.

Comparando o discurso do PSD e CDS de há 22 dias com o deste debate poderá parecer que está tudo na mesma, mas a verdade é que não está, muita coisa aconteceu nestes 22 dias.

O governo do PSD e CDS, empossado pelo Presidente da República, foi demitido pela Assembleia da República, como já tinha sido anunciado que aconteceria antes de tomar posse. Apesar de demitido, esse Governo PSD/CDS entendeu violar, por uma última vez, a Constituição, desrespeitando os limites impostos a um governo em funções de gestão, dando um novo passo na negociata da venda da TAP.

Assistimos, também, ainda em pleno consulado PSD/CDS e com a participação dos seus representantes políticos à ocupação da Casa do Douro com recurso à força, com arrombamento de fechaduras, expulsão de quem se encontrava no edifício e a entrega do mesmo a quem PSD e CDS tinham já designado como beneficiários do saque. Tudo executado com recurso ao abuso de autoridade para consumar a retirada da Casa do Douro aos viticultores durienses e a sua entrega às grandes casas exportadoras sem que se saiba o que terá, entretanto, acontecido ao valiosíssimo património ali depositado.

Também o Banif foi, entretanto, confirmado como uma preocupação que pesa sobre a cabeça dos portugueses. Por quatro vezes o PCP questionou o ex-Ministro Passos Coelho na Assembleia da República sobre a situação do Banif; por quatro vezes foram dadas respostas que indiciavam o cumprimento pelo Banco das obrigações assumidas perante o Estado português. Foi preciso demitir o Governo PSD/CDS para se ficar a saber que o Banco não vai devolver os 1100 milhões de euros dos portugueses que PSD e CDS ali enterraram, só falta saber quem vai responder por isso.

Num outro plano, os dados do INE vieram, entretanto, confirmar a falsidade da propaganda do PSD e CDS sobre o crescimento económico, o desemprego e a sobretaxa de IRS, cuja devolução em 35%, anunciada pelo PSD e CDS em tempo de eleições, se confirmou como um monumental embuste eleitoral, não havendo, afinal, lugar a qualquer devolução.

Os dados da execução orçamental vieram, também, desmentir todas as promessas feitas pelo PSD e CDS, quanto ao défice para 2015, confirmando que a única meta que o anterior Governo PSD/CDS conseguiu alcançar foi a de falhar todas as previsões económicas e orçamentais durante quatro anos, sem nunca prestar contas pelo destino dado aos milhares de milhões de euros que extorquiram com os sacrifícios impostos aos portugueses em nome dessas metas falhadas.
Ora, perante a gravidade dos problemas que atingem o País, perante a necessidade de apurar responsabilidades de quem tomou estas decisões e tomar medidas para responder às dificuldades que o País enfrenta, PSD e CDS limitam-se a repetir, neste debate, a mesma ladainha da sua falsa vitória nas eleições e do seu direito divino a governar.

Sr.as e Srs. Deputados do PSD e do CDS, no dia 10 de novembro tiveram já oportunidade de confirmar que o que obtiveram nas últimas eleições foi uma pesada derrota eleitoral.

É uma questão de aritmética: 107 são menos do que 122. Dito de outra forma, antes, os dois — PSD e CDS — podiam mais do que todos os outros, nesta Assembleia da República; agora, os dois podem mais do que um, mas não podem mais do que quatro.

Se quiserem, ainda de uma forma mais clara: comparando a Assembleia da República que temos hoje e a que tínhamos antes das eleições de 4 de outubro, quais foram as únicas forças políticas que perderam votos e percentagem nas últimas eleições? O PSD e o CDS!

Quais foram as únicas forças políticas aqui representadas que perderam Deputados? O PSD e o CDS!

Quais foram as únicas forças políticas que viram reduzida a sua expressão parlamentar, perdendo a maioria de que dispunham? O PSD e o CDS!

Se PSD e CDS foram os únicos a perder, não podem continuar a dizer que ganharam as eleições.

E, sobretudo, Sr.as e Srs. Deputados do PSD e do CDS, não podem querer impor a vontade de 107 Deputados a outros 122, como se isso correspondesse a alguma regra da democracia.

A vontade popular expressa nas eleições não atribui aos vossos 107 Deputados a possibilidade de imporem aos outros 122 a vossa pretensão de governar. A vontade popular expressa nas últimas eleições compôs esta Assembleia da República de forma a que houvesse uma maioria de Deputados que rejeita a continuação do Governo PSD/CDS e que criou condições para que haja uma solução governativa diferente, com um Governo do PS.

Insistirem na tese da ilegitimidade de qualquer solução governativa que não passe por um governo do PSD e do CDS é insistirem no desrespeito pela vontade popular.

Ao PSD e ao CDS pode parecer incompreensível terem de deixar de governar, mas os milhões de portugueses que lutaram e fizeram tudo o que podiam para vos derrotar, incluindo os 700 000 portugueses que deixaram de votar no PSD e no CDS, porque não vos queriam mais no Governo, esses milhões de portugueses que quiseram, nas ruas e nas urnas, livrar-se do Governo PSD/CDS fizeram sacrifícios que não podem ser desperdiçados, e é com isso que PSD e CDS devem conformar-se de uma vez por todas.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

PSD e CDS têm preferido entreter-se a descobrir o que nunca foi escondido. Surpreendem-se com diferenças e divergências entre o PCP e o PS que não são de hoje, nem nunca foram escondidas, e procuram concentrar todas as atenções mediáticas em aspetos secundários que durarão tanto quanto a promessa que fizeram de devolução da sobretaxa.

Ainda assim, tivemos já neste debate, em intervenções do PSD e do CDS, uma amostra da visão que teríamos como futuro, se os dois continuassem a governar.

Ambos, PSD e CDS, criticam as medidas de recuperação de rendimentos, de salários e de pensões, porque permitem o aumento do consumo e isso é errado, em termos abstratos.

Sr.as e Srs. Deputados do PSD e do CDS, o aumento de consumo que possa resultar da recuperação de rendimentos que está em perspetiva não é o aumento de consumo que os senhores promoveram e que se traduziu no aumento da venda de produtos de luxo, nomeadamente de automóveis de luxo, em anos de crise. A realidade é outra!

No País, que os senhores já não desgovernam, as vossas políticas deixam mais de um em cada quatro portugueses na pobreza, num total de quase 3 milhões de pobres. Pior do que isso: há um em cada quatro portugueses que se encontra em privação material, o que significa que não tem dinheiro para manter a casa aquecida, para comer uma refeição de carne ou peixe de dois em dois dias, que tem rendas, prestações de crédito ou despesas da residência em atraso, que, por dificuldades económicas, não tem telefone, televisão ou máquina de lavar roupa. E, nas crianças, a percentagem em situação de privação material sobe para quase 30%.

A estes milhões de portugueses, Sr.as e Srs. Deputados do PSD e do CDS, é preciso devolver os rendimentos e aumentar a capacidade de consumo, porque é de falta de consumo de bens essenciais que sofrem.

E para todos os outros portugueses que, vivendo do seu trabalho, têm também em perspetiva o aumento do seu rendimento isso não corresponde a uma opção política errada, corresponde à reposição daquilo que os senhores queriam roubar em definitivo aos portugueses, que é a perspetiva de que é possível derrotar a vossa política de exploração e empobrecimento e melhorar as condições de vida do povo.

A par disto, PSD e CDS insistem em repetir a pergunta com que procuraram condicionar todo o raciocínio e toda a discussão política nos últimos quatro anos: «onde é que vão cortar para poderem devolver rendimentos e direitos?». Também disto temos de nos ver livres. Esta lógica de que só é possível devolver aos trabalhadores, aos reformados, aos jovens, aos pequenos e médios empresários os seus rendimentos e direitos cortando-lhes, na mesma proporção, outros rendimentos ou direitos é a lógica com que PSD e CDS afundaram o País e viraram os portugueses uns contra os outros.

É verdade que têm de ser feitas opções, é verdade que têm de ser feitas opções a favor dos trabalhadores e do povo, que os senhores tanto se preocuparam em prejudicar e cujas condições de vida afundaram desta forma. Mas é verdade que muitos desses problemas encontrarão resposta não em novos cortes ou em cortes alternativos mas na recuperação do País, na recuperação dos sectores produtivos, para resolver o problema do desemprego, na recuperação dos rendimentos dos salários, das pensões, das prestações sociais, para resolver o problema da pobreza, na recuperação do acesso à saúde, à educação, à segurança social, para resolver os problemas da exclusão que os senhores transformaram em regra no nosso País.

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

Com o Governo PSD/CDS, que aqui foi apresentado há 22 dias, não seria, sequer, possível reconhecer que as políticas do Governo anterior foram erradas, muito menos seria possível dar os primeiros passos para responder aos problemas urgentes do povo e do País.

O Programa do Governo do PS, que aqui discutimos, não é o programa do PCP, mas incorpora matérias que resultam da discussão feita e da convergência que foi possível identificar para responder aos problemas mais urgentes dos portugueses, do emprego, dos salários e rendimentos, das pensões e prestações sociais, dos direitos, das funções sociais do Estado e dos serviços públicos, nomeadamente da saúde, da educação, da segurança social e da cultura.

O alcance desta convergência não pode ser desvalorizado, como se não tivesse significado e como se não tivesse tradução concreta nas questões já aqui referidas ontem, e hoje mesmo repetidas, dos salários e das pensões, das 35 horas de trabalho, do combate à precariedade, da redução da sobretaxa e outras medidas fiscais a adotar, da dotação do Serviço Nacional de Saúde dos meios e recursos humanos, técnicos e financeiros adequados à prestação de cuidados de saúde de qualidade, do reforço das condições de acesso à educação, do desenvolvimento da ciência, do acesso à política de proteção social que este Governo PSD/CDS, que até dia 4 de outubro mantinha uma maioria absoluta na Assembleia da República, negou a milhões de portugueses.

É certo que este Governo do Partido Socialista terá de enfrentar a contradição entre a propaganda do anterior Governo PSD/CDS e a realidade nacional, bem como a contradição entre a concretização dos objetivos inscritos no seu Programa e o quadro de dificuldades e constrangimentos, internos e externos, que estão colocados ao País. Isto porque, ao contrário do que afirma a propaganda do PSD e CDS, Portugal está hoje marcado por problemas económicos e sociais mais profundos do que aqueles que enfrentava em 2011, e já esses eram de grande gravidade.

O aumento da dívida externa e o sufoco orçamental causados pelo peso do serviço da dívida pública são apenas o exemplo mais flagrante dos constrangimentos que se colocam ao País e que este Governo terá de enfrentar, na resposta aos problemas que o País e o povo continuam a sentir. Mas também o agravamento da dependência externa e o controlo dos centros de decisão nacional pelo capital estrangeiro, particularmente em empresas e sectores estratégicos, que este Governo do PSD e CDS acentuou, são problemas que terão de ser, obviamente, identificados e enfrentados, para dar resposta aos problemas estruturais do País.

É certo que este Programa do Governo não corresponde ao programa do PCP, mas, tal como já ontem aqui foi dito, cá estaremos para contribuir para esta mudança de políticas, para que a situação que o povo e os trabalhadores enfrentam possa ser alterada e para que a recuperação de direitos e os avanços nas condições de trabalho e de vida dos portugueses possam chegar a tempo, ao contrário das intervenções do CDS.

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