Como afirmou Marx, com reconhecida validade, o grau de emancipação feminina é a medida natural do grau da emancipação geral. Os avanços notáveis na condição e nos direitos das mulheres no século XX, em Portugal e no mundo, têm uma estreita ligação ao desenvolvimento político, social e civilizacional, parte integrante da sua luta e da luta dos trabalhadores e dos povos pela transformação progressista da sociedade, e vão na esteira das muitas conquistas alcançadas por esta luta mais geral.
Em sentido inverso, o agravamento da exploração, das desigualdades, discriminações e violências que marcam a situação em diferentes países dá-nos a dimensão dos profundos retrocessos na situação e nos direitos das mulheres, e dos males profundos que atingem os trabalhadores e os povos desses países.
A luta emancipadora das mulheres continua a ser um elemento central contra todas as tentativas e retrocessos efectivos na sua situação e direitos.
Retrocessos que são indissociáveis da ofensiva do sistema capitalista e das políticas que o servem, assentes na intensificação da exploração, da precariedade, dos baixos salários, na privatização de serviços públicos e na transferência de importantes recursos para o grande capital económico e financeiro.
Nessa luta insere-se o combate contra os graves problemas da humanidade como a fome, a pobreza, a sub-nutrição, o trabalho escravo, a mercantilização do corpo da mulher na prostituição, traficada ou não traficada ou as «barrigas de aluguer», e a transformação das crianças num bem transacionável que alimentam o negócio das empresas de reprodução.
As políticas ditas de «igualdade de género», são promovidas pelo sistema para estarem ao seu serviço, não dando resposta a problemas e discriminações a que, apesar de tudo, dão centralidade. Problemas e discriminações que o sistema replica permanentemente pelas orientações emanadas pelas suas instâncias, de que é exemplo a União Europeia, cujas soluções não têm qualquer alcance social na resposta aos problemas das mulheres no trabalho, na família e na sociedade, antes são um instrumento ao serviço das opções nucleares das suas políticas laborais, sociais, orçamentais, entre outras.
O que pretendem é apagar as ideologias que estão em ruptura com a sua visão do mundo e a sua dominação na sociedade. Criar a ilusão que a luta organizada das mulheres é dispensável. Ocultando no espaço mediático as que afrontam as verdadeiras causas e responsáveis políticos das discriminações e violências sobre as mulheres, estigmatizando as organizações que as dinamizam, cujos dirigentes muitas vezes são alvo de perseguição, intimidação e repressão. Para, em contrapartida, promoverem e forjarem «novos protagonistas» a quem cabe a tarefa de absolver e iludir as responsabilidades políticas dos governos e das instâncias europeias e mundiais, através da instrumentalização da luta das mulheres, visando conduzi-las para «becos sem saída» porque as suas reivindicações estão à margem daquelas que podem corresponder a um caminho para a sua resolução.
Para o PCP, a emancipação das mulheres significa por um lado a emancipação da mulher trabalhadora da opressão capitalista e, por outro, a libertação das mulheres, em geral, das desigualdades, discriminações e injustiças.
Estes são objectivos plenos de actualidade e de futuro. Ancorado na luta organizada das mulheres por direitos próprios e a sua convergência com a luta mais geral dos trabalhadores e dos povos de que são parte integrante.
Num olhar para os últimos 100 anos há um cordão umbilical que liga a história da acção e luta do PCP à história da luta das mulheres ao saber interpretar e estando sempre na linha da frente no apoio às suas aspirações e direitos e assumindo-as como suas, porque os direitos das mulheres, e a sua emancipação no quadro do socialismo é um projecto e uma causa de actualidade e de futuro.
O papel do PCP ao longo destes anos é indissociável do contributo de sucessivas gerações de mulheres comunistas aos diversos níveis da acção partidária, mas igualmente nas organizações de mulheres, nos sindicatos e noutras importantes organizações sociais como já foi sublinhado.
Permitam-me uma palavra para evidenciar o contributo de Álvaro Cunhal, nesta luta pela emancipação da mulher, desde logo e muito cedo com a sua tese o «Aborto, causas e soluções» defendida em 1940, e posteriormente como dirigente do Partido, o seu contributo no plano teórico e prático para a acção do Partido, o que é exemplificado na Conferência «A Emancipação da Mulher no Portugal de Abril» que agora faz todo sentido recordar: «Como a conferência testemunha o nosso Partido está profundamente empenhado na defesa dos direitos das mulheres e na luta pela sua emancipação. A acção das mulheres é porém um elemento fundamental do processo. Nós dizemos às mulheres e em primeiro lugar às mulheres trabalhadoras que têm no PCP um firme e permanente defensor dos seus interesses, direitos, aspirações e objectivos. Mas, ao mesmo tempo, lançamos um apelo: Mulher! Toma nas próprias mãos a conquista dos teus direitos! Isto é: organiza-te, participa activamente nos sindicatos e em outras organizações unitárias, avança as tuas reclamações e objectivos, luta por eles, mobiliza as massas femininas para a luta.»
Às mulheres comunistas atribuímos uma especial responsabilidade na condução da acção e intervenção geral no Partido e em particular e com grande relevo também na sua ligação às mulheres, aos seus problemas específicos, à sua luta, dando atenção ao conhecimento dos seus problemas e anseios, à sua mudança de pensar e de agir, e no incutir a confiança no valor insubstituível da sua luta organizada, quer para a satisfação das reivindicações que são comuns aos trabalhadores e ao povo, de que são parte integrante, quer na exigência de erradicação das desigualdades, discriminações e violências que as afectam no trabalho, na família, na vida social, política e cultural.
No PCP, os direitos das mulheres e a sua emancipação são uma responsabilidade de todos os militantes – mulheres e homens – aos diversos níveis da vida partidária, no trabalho institucional, na Assembleia da República, nas Autarquias ou no Parlamento Europeu. Porque tal é inerente à natureza e projecto deste Partido. Como tal, o nosso papel de vanguarda na luta emancipadora das mulheres não é uma proclamação de retórica política, nem tão pouco se alimenta do património de acção e luta recebido por gerações de mulheres e homens comunistas. É um exercício prático que temos de fazer a todos os níveis, corrigindo insuficiências, valorizando o que alguns teimam em apagar ou em deturpar, intervindo sobre a realidade para a sua transformação, dialogando e cooperando com todos aqueles e aquelas que defendem os direitos das mulheres, na lei e na vida.
O PCP intervém no actual quadro pela concretização da igualdade no trabalho e na vida, exige a ruptura com a política de direita das últimas décadas que alimenta uma igualdade de «faz de conta» dando corpo a uma alternativa política que faça cumprir os direitos das mulheres inserida na política patriótica e de esquerda que preconizamos. Ou seja garantir o trabalho com direitos, acabar com a precariedade laboral, valorizar a progressão profissional e as carreiras; efectivar a igualdade salarial entre homens e mulheres, indissociável da elevação dos salários de todos os trabalhadores; reduzir o horário de trabalho para 35 horas semanais, pôr fim à desregulação dos horários; fazer cumprir os direitos de maternidade e paternidade; repor a idade legal de reforma nos 65 anos e garantir o direito à reforma e a uma pensão digna, bem como o direito à reforma sem penalizações com 40 ou mais anos de descontos; investir nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado salvaguardando os direitos dos seus trabalhadores – a maioria mulheres – e garantindo o acesso em condições de igualdade a todas as mulheres à saúde, à segurança social, à justiça, à educação entre outros.
É ainda preciso ir bem mais longe na prevenção, sinalização e protecção contra a violência doméstica. Ampliando e dando eficácia a uma intervenção de detecção, sinalização e protecção das mulheres que vivem contextos de violência doméstica, a partir de uma estrutura desconcentrada e articulada, com o reforço dos meios necessários aos serviços públicos e outros que devem intervir neste domínio.
É fundamental prevenir e combater a exploração das mulheres na prostituição criando condições económicas e sociais para que as mulheres mais pobres e em situações de desespero não tenham que a ela recorrer, mas criando igualmente programas de saída para as que assim decidam.
Na nova política que preconizamos, damos centralidade ao reforço da participação social e política das mulheres aos seus mais variados níveis, bem como à mudança da mentalidade e de comportamentos de mulheres e homens no vencer preconceitos e estereótipos, e à promoção de informação sobre os direitos das mulheres, promovendo a elevação da sua consciência social e política de que a igualdade no trabalho e na vida é uma condição de progresso e democratização do País.
Assumimos a importância para a luta emancipadora das mulheres à mudança de mentalidades. Aliás, essa luta consubstancia em si mesmo o afrontar de concepções ancestrais, mas abala igualmente os fundamentos económicos, sociais e culturais que estão na raíz desta realidade que discrimina a mulher.
A vida nestes 100 anos prova que o PCP é necessário, indispensável e insubstituível aos trabalhadores, ao povo e ao País, tal como na luta pela emancipação da mulher!
Com a experiência e o valor do seu passado e da sua vigorosa acção presente, haveremos de saber construir um futuro vivido em igualdade!