As indefinições que marcam a nossa legislação no âmbito da segurança interna são um dos factores que limitam a capacidade de execução das várias, e não pouco importantes, missões a que o sistema de segurança interna tem de responder. A multiplicação de actores envolvidos na mesma missão, ou similares, sem as devidas clarificações, leva necessariamente ao desperdício de meios humanos e materiais, gera atritos num clima de disputa jurisdicional, e, em última instância, traz consequências negativas às populações. As forças de segurança assumem em primeira instância missões de garantia da ordem e tranquilidade públicas, segurança e protecção de pessoas e bens, de investigação criminal e prevenção da criminalidade, ou seja, essencialmente policiais. Podendo intervir em matéria de protecção civil, importa evitar qualquer sobreposição de competências face a outras entidades.
Não é o que acontece por exemplo com a Unidade de Emergência Protecção e Socorro da GNR, criada em 2018, herdando a que existia do anterior Grupo de Intervenção Protecção e Socorro, com atribuições que são em grande medida enquadradas no âmbito da protecção civil, “abrangendo a generalidade das operações de protecção e socorro” conforme diz o decreto-lei que cria o GIPS. O motivo de questionamento aqui não está na existência de uma unidade dedicada a matérias desta natureza, mas antes a sua alocação à GNR, tendo em conta as competências que lhe estão atribuídas. Porque não dotar a Protecção Civil dos meios necessários para tal missão, particulamente no que diz respeito ao combate aos incêndios, ao invés de absorver efectivo e capacidades da GNR para uma missão que tem de tudo menos de policial?
Podemos ainda questionar a pertinência da alocação dos guardas florestais do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) à GNR, que assumem uma missão mais centrada na fiscalização ambiental, essencialmente distinta da da GNR. É por isso que o PCP tem defendido que deixe de assim ser, voltando a constituir-se um Corpo de Guardas Florestais.
As forças de segurança são agentes de protecção civil e têm um papel a desempenhar nesse quadro. Quando necessários devem alocar recursos ao seu dispor para o auxilio às populações e prevenção de cenários de catástrofe. Particularmente a GNR e PSP, pelas respectivas atribuições legais, devem ter um papel de proximidade com os cidadãos, de conhecimento do meio envolvente em que estão inseridos, recursos mobilizáveis para o sucesso de missões nesta área. Têm ainda competências na vigilância preventiva, fiscalização e combate ao crime ambiental que podem impedir o espoletar de incêndios, entre outras catástrofes.
O que não beneficia a resolução de problemas é ter um teatro de operações onde os dedos de uma mão não chegam para contar o número de fardas diferentes, e onde há dificuldade em distinguir uma cadeia de comando. Veja-se o exemplo do incêndio de Pedrogão em 2017 em que a clara falta de coordenação entre forças de segurança e protecção civil também ajuda a explicar o tardio corte do trânsito em determinados locais. Também nos incêndios deste verão assistimos a exemplos de desarticulação entre estas entidades, resultando em evacuações pouco preparadas e precipitadas de populações, acarretando riscos ao invés de os limitar ao máximo. Acresce a presença crescente das policias municipais e a necessidade de articular âmbitos de intervenção e resposta perante problemas que tenham lugar.
O que faz falta é uma política clarificadora e potencializadora do melhor aproveitamento dos recursos disponíveis para cada um dos órgãos até aqui enunciados. Todos eles são agentes de protecção civil. Importa é distinguir bem as funções de cada um, especializá-los e dotá-los das capacidades para responder ao que lhes é exigido.