Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
A detenção na África do Sul e a interposição do processo de extradição do antigo banqueiro João Rendeiro, condenado por crimes de natureza económica e financeira, é um acontecimento de relevo para a aplicação da justiça em Portugal e representa um indesmentível sucesso para a atuação da Polícia Judiciária.
Não tem razão o Dr. Rui Rio quando acusa a Polícia Judiciária de foguetório para favorecer o Governo. Como já afirmou alguém, insuspeito de antipatia pelo PSD, é “não ter noção”.
Diz o Dr. Rui Rio que o Diretor Nacional da Polícia Judiciária é nomeado pelo Governo e que se desdobrou em entrevistas aquando da prisão, quando não o fez aquando da fuga. É não ter noção.
Desde logo porque se a Polícia Judiciária tem a responsabilidade de tentar capturar um fugitivo à Justiça, não tem obviamente nenhuma responsabilidade de evitar a saída do país de quem não está sujeito a qualquer medida de coação que o impeça de sair.
Mas, muito mais importante, o Diretor Nacional da Polícia Judiciária é de facto nomeado pelo Governo, mas não foi só o atual diretor que foi nomeado pelo atual Governo. Foram todos os diretores nacionais que foram nomeados por todos os Governos em funções ao tempo das nomeações, e nunca algum responsável político se atreveu sequer a insinuar que a Polícia Judiciária, que funciona sob a direção funcional do Ministério Público no âmbito de processos cuja instrução é da responsabilidade do poder judicial, se encontra ao serviço de qualquer Governo em funções.
Essa acusação do Dr. Rui Rio é muito grave, pelo menos por três razões:
Primeira, porque lança uma suspeição pública sobre a idoneidade de uma instituição policial que é fundamental para o combate à criminalidade e à qual o país muito deve, não agora, mas desde há muito.
Segunda, porque se fica com a sensação de que o Dr. Rui Rio preferia que o Sr. Rendeiro não fosse detido agora porque pensa que isso pode prejudicar o seu resultado eleitoral e então acha que a Polícia Judiciária deveria ter pedido à sua congénere sul-africana que podendo deter o Sr. Rendeiro agora, só o detivesse na noite do dia 30 de janeiro de 2022 depois de encerradas as assembleias de voto em todo o território nacional.
Terceira, e mais grave, porque o Dr. Rui Rio pensa que, se chegar a Primeiro-Ministro de Portugal, pode dar ordens à Polícia Judiciária sobre quem, quando e como, pode ou não pode ser detido.
E isto já não é falta de noção. Isto é uma clara manifestação de vontade de subverter o Estado de Direito e de controlar politicamente a investigação criminal.
Senhor Presidente,
Senhores Deputados,
A Polícia Judiciária cumpriu o seu dever e é digna do nosso reconhecimento, não apenas pela última semana, mas pelo trabalho que tem vindo a desenvolver ao longo dos anos, apesar da manifesta exiguidade dos meios de que dispõe.
O maior problema do combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira no nosso país não é tanto a falta de leis, que são certamente aperfeiçoáveis, mas a falta de meios ao dispor da Polícia Judiciária e das autoridades judiciárias para exercer as suas funções com a celeridade e a eficácia que certamente desejariam.
Daí que o PCP tenha vindo a propor, insistentemente, o reforço significativo dos meios humanos e materiais ao serviço da investigação criminal e da aplicação da justiça, tendo nomeadamente em conta a importância de combater a impunidade dos crimes de colarinho branco e a complexidade de que se reveste a investigação de crimes dessa natureza.
Em sucessivos Orçamentos do Estado, o PCP propôs o reforço da contratação de inspetores, peritos financeiros, criminalistas e seguranças para a Polícia Judiciária.
O Orçamento do Estado para 2021 consagrou, por proposta do PCP, a incumbência do Governo apresentar até maio um plano plurianual de investimento na investigação criminal. O Governo não o fez.
O processo de recrutamento de inspetores que está em curso é algo que se saúda como absolutamente indispensável em face da manifesta penúria a que se chegou, mas é parte de um esforço que tem de ser prosseguido nos próximos anos para que o país possa continuar a ter uma polícia de investigação criminal digna desse nome.
Do Programa com que o PCP se apresenta às eleições do próximo dia 30 de janeiro consta o forme compromisso de dar resposta cabal e consistente à crónica carência dos mais elementares meios materiais e humanos, principal dificuldade que se coloca no trabalho diário do Ministério Público e da Polícia Judiciária.
O combate firme à corrupção não passa pela adoção de mecanismos como as «delações premiadas» que, em nome desse combate, destruam garantias fundamentais de um Estado de Direito Democrático.
O PCP, na linha do seu património de propostas e de combate político de décadas contra a corrupção, desde o fim do sigilo bancário até à criminalização do enriquecimento injustificado, manter-se-á na primeira linha dessa luta, no respeito pela Constituição, por uma sociedade mais justa e pelos valores da decência e da honestidade na vida pública.
Disse.