Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, XI Assembleia da Organização Regional de Braga

«São necessárias medidas para defender a nossa produção nacional e a nossa soberania alimentar»

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Uma calorosa e fraterna saudação a cada um dos delegados e convidados presentes nesta XI Assembleia da Organização Regional de Braga, abraço que estendemos a todos os comunistas, aos democratas, aos trabalhadores e ao povo do distrito de Braga.

Uma saudação pela contribuição que cada um de vós deu ao nosso Partido, nas muitas intervenções aqui proferidas, que revelam ligação aos trabalhadores e às massas populares, conhecimento das realidades do distrito e capacidade para apresentar propostas para superar os problemas.

Uma saudação ainda pelo exemplo de trabalho colectivo realizado na preparação desta Assembleia, que aqui ficou manifestado. A democracia interna é isto, a possibilidade de todos os militantes do Partido participarem na sua vida colectiva, terem espaços para dar a sua opinião, poderem dar as suas contribuições para a orientação que, a partir de agora, é de todos.

Uma saudação particular a todos os camaradas que hoje foram eleitos para a Direcção do Partido no distrito, certo de que, também com a vossa energia, criatividade e dedicação, seremos capazes de enfrentar todas as exigências que o tempo presente nos coloca.

A XI Assembleia decorreu sob o lema «Reforçar o PCP, Desenvolver a luta, Afirmar a Alternativa». A opção de sublinhar a importância do reforço do PCP, dando-lhe a primazia neste momento histórico, é de vital importância.

Sim, precisamos de um PCP mais forte e reforçado, mais capaz de intervir, para responder aos problemas dos trabalhadores e do povo, mais pronto a mobilizá-los para as muitas lutas que a vida exige.

Como se afirma na Resolução agora aprovada, precisamos de um PCP mais forte, desde logo na responsabilização de mais camaradas por tarefas e responsabilidades permanentes, particularmente trabalhadores e jovens, alargando a nossa capacidade de direcção.

Mais forte nas empresas e locais de trabalho, assegurando a constituição de mais células nas muitas empresas que caracterizam este distrito como um dos mais industrializados do País.

Mais forte com mais recrutamentos, levando tão longe quanto possível a Campanha Nacional em curso e assegurando a sua integração na vida partidária.

Mais forte na organização de sectores e camadas específicas, agricultores ou reformados, pequenos e médios empresários, ou na intelectualidade.

Mais fortes, dedicando mais esforços ao alargamento da JCP que, nos últimos meses, tem tido um assinalável acréscimo na sua organização e acção diária, e à intervenção do Partido junto da Juventude.

Mais fortes, assegurando a independência financeira do Partido, condição indispensável para garantir a sua independência política e ideológica, para o que é necessário alargar o número de camaradas a receber e a pagar quotas levando até ao fim a campanha pelo aumento das quotizações e pela quota em dia, e dinamizar todas as outras fontes de receitas próprias do Partido.

Se aqui referimos, sem hesitação, a importância do reforço do PCP, matéria a que temos dedicado, aliás, atenção central em todos os Congressos e nas reuniões do Comité Central do Partido.

Quem, com verdade, queira falar do PCP tem de dizer que sempre dedicámos a estas matérias uma parte determinante das nossas energias.

Se aqui insistimos em que é necessário cuidar da organização do Partido, é porque temos a firme convicção que um Partido mais forte, mais reforçado faz falta ao povo português. Porque sabemos que as múltiplas tarefas que a rápida degradação da realidade nacional nos coloca, exigem mais capacidade para mobilizar os trabalhadores e o povo e para intervir. Porque não ficamos parados a olhar para êxitos ou insucessos, antes pegamos na força que nos dá aquele Campo Pequeno a transbordar de determinação, nessa memorável jornada que foi o Comício de 6 de Março, para fazer frente a cada novo dia. Porque temos confiança que, com este Partido, que agora comemora 101 anos de vida e que trás consigo um inigualável património de luta em defesa do povo e do País, é possível uma vida melhor.

Sabemos, ainda, que precisamos de um PCP mais forte porque olhamos para o nosso País e para o mundo e vemos o rol de injustiças, de desgraças e de miséria a que o capitalismo, esse sistema injusto, predador, antidemocrático e agressivo, tem condenado os povos e vemos o quanto são precisas forças para o superar.

Vemos as guerras que se prolongam em vários pontos do mundo, e percebemos a falta que faz um Partido mais forte para promover a luta pela paz, pela cooperação entre os povos e pela sua soberania.

Por estes dias e no quadro da guerra que se intensificou na Ucrânia, os que se julgam senhores do mundo, na União Europeia, na NATO e no selecto clube dos 7 países mais ricos do mundo, andaram a toque de caixa da administração norte-americana, e do Sr. Biden, que quis mostrar quem verdadeiramente manda, multiplicando-se em reuniões ao mais alto nível.

Nós, que estivemos atentos aos resultados e anúncios dessas reuniões – Conselho Europeu, Cimeira da Nato, Reunião do G7 –, não podemos deixar de nos questionar como é possível não haver uma sincera procura da paz, uma inquestionável vontade de acabar com a guerra, uma séria determinação de uma solução de segurança colectiva na Europa e no mundo.

O Sr. Biden veio à Europa, não como agente da Paz, mas como caixeiro-viajante dos interesses dos grupos económicos produtores de gás e do complexo industrial-militar, deitando mais gasolina para a fogueira de uma guerra que, como temos afirmado, não serve aos russos, não serve aos ucranianos, nem aos povos da Europa.

Vivemos no mundo uma situação inquietante, com traços muito perigosos. Todos os dias nos entram pela casa dentro as imagens do horror de uma guerra que nunca devia ter começado.

Pelo nosso ideal humanista, porque vivemos e lutamos para assegurar aos povos uma vida de felicidade, ninguém como nós sente essa dor e essa tragédia. Por isso, lançámos desde a primeira hora dois apelos.

O primeiro, um apelo à Paz, ao cessar-fogo e ao diálogo pela resolução pacífica do conflito. Apelo que decorre da nossa posição de sempre, inequívoca, contra a guerra e de condenação de um processo de ingerência, onde está presente o golpe de Estado de 2014, promovido pelos EUA na Ucrânia, que instaurou um poder xenófobo e belicista, a recente intervenção militar da Rússia na Ucrânia e a intensificação da escalada belicista dos EUA, da NATO e da União Europeia.

O segundo apelo que fizemos foi à mobilização dos povos e em particular do povo Português em defesa da paz e à solidariedade para com todas as vítimas de todas as guerras.

Sim, é preciso uma solução política para o conflito que garanta a segurança colectiva dos povos e a rejeição da escalada belicista e da corrida aos armamentos tão perigosa como negativa para a Europa e o mundo.

É preciso pôr fim ao sofrimento humano dos que são atingidos pelas consequências directas da guerra e das que derivam das sanções que foram impostas pela administração americana e pelos países da União Europeia com graves consequências para as condições de vida dos povos, com o aproveitamento que o grande capital já está a fazer delas.

Basta olhar para a operação em curso visando agravar o custo de vida, com brutais e especulativos aumentos dos preços, para se perceber como a luta pela Paz tem de ser articulada com a luta contra o aumento do custo de vida, contra o agravamento da exploração, por melhores salários e pensões.

Ainda na passada semana, aí vimos o Governador do Banco de Portugal, ex-Ministro das Finanças do Governo do PS, dizer que os aumentos dos preços não se deveriam reflectir nos salários. Ou seja, em Portugal pode aumentar tudo, a factura da electricidade, do gás, os combustíveis, os alimentos, a única coisa que não pode aumentar são os salários.

Nós não o aceitamos e por isso apresentámos, logo nas primeiras horas de funcionamento do novo Parlamento a proposta de aumento do Salário Mínimo Nacional para 850€, enquanto peça para o aumento geral dos salários, que ganha agora ainda maior acuidade.

Durante a campanha eleitoral, todos disseram que eram a favor do aumento dos salários. Veremos agora como se situa cada um. Até agora, e apesar de já terem sido apresentadas mais de 3 dezenas de projectos, ainda só os do PCP se referem aos salários e direitos dos trabalhadores.

Cada um faz as escolhas que entende. Nós olhámos para a realidade nacional e aquilo a que decidimos dar prioridade foi aos salários, ao pagamento do trabalho suplementar, à avaliação dos trabalhadores da Administração Pública e aos direitos dos trabalhadores por turnos.

Projectos a que agora juntaremos outros para assegurar o reforço da produção nacional de cereais e outros bens alimentares, visando a nossa soberania, apoiando designadamente os agricultores e garantindo maior capacidade de aprovisionamento.

Estamos aqui, numa região com condições excepcionais para a produção agrícola. Terras que produzem milho, leite, vinho verde, fruta, carne. Mas aqui, como por todo o País, a política de desprezo pela produção nacional, de desregulação dos mercados, de distribuição de apoios sem a obrigação de produzir, de especulação nos preços dos factores de produção, de imposição de preços baixos à produção, a que se somou este ano a seca, traz os agricultores no desespero, como ainda na passada semana se viu na grande Manifestação, nas ruas de Braga, promovida pela Confederação Nacional da Agricultura, que daqui saudamos.

Uma situação que, num tempo em que se avolumam as ameaças sobre o povo português, exige medidas para defender a nossa produção nacional e a nossa soberania alimentar.

Assim como exigem medidas de defesa da produção industrial, desenvolvendo novos sectores, mas desde já defendendo a indústria aqui existente, no sector têxtil, vestuário e calçado, na metalurgia, nas cutelarias, nas indústrias eléctricas.

Uma política que passa pela valorização do trabalho e dos trabalhadores e desde logo dos seus salários. É preciso sim, o aumento geral dos salários acompanhado de medidas para conter os custos da energia, dos créditos bancários, dos combustíveis, das comunicações, para defender as pequenas e médias empresas.

Tomou posse, na passada quinta-feira o novo Governo, saído do novo quadro político-institucional em que pesa a maioria absoluta do PS. Um Governo e uma maioria absoluta que o PS procurou, com a cumplicidade do Presidente da República e com os apoios e meios do grande capital, que apostaram na bipolarização em torno dos partidos do chamado bloco central de interesses.

Perguntam-nos a opinião sobre a composição do novo Governo. Nós dizemos que a questão não é saber se são mais ou menos ministros, se as pessoas são estas ou aquelas. A questão é saber qual é a política que vai ser executada, a favor de quem será essa política.

Dissemos atempadamente que o PS queria ficar de mãos livres para retomar os caminhos da política de direita que foi travada pela luta do povo português e pela decisiva intervenção do nosso Partido.

Permitam-me que vos dê dois exemplos de como a mudança de caras não quer dizer mudança de políticas. Mudou o Ministro das Finanças mas o Programa de Estabilidade e Crescimento enviado para Bruxelas, pelo anterior Governo, com que este se compromete, não se altera. É o mesmo. Com as mesmas regras, os mesmos objectivos. A mesma submissão às imposições de Bruxelas e aos interesses do grande capital.

Mudou o titular da pasta das Finanças, mas o anterior, ainda há dias veio vangloriar-se de uma redução do défice das contas públicas para valores mesmo abaixo dos exigidos pela Comissão Europeia e pelo BCE, regras que agora até estão suspensas. O novo Ministro já veio afirmar que esse caminho é para manter, em direcção ao défice zero.

Ora estamos a falar de uma redução de cerca de um ponto cinco no défice. A questão, camaradas, é que cada décima a menos no défice, são quase 200 milhões de euros que podiam ser investidos no Serviço Nacional de Saúde, na Escola Pública, nas creches gratuitas, nos transportes públicos, nos apoios sociais. O défice deles a diminuir, são as dificuldades do povo português a aumentar.

O que o País precisa é de outra política. É da ruptura com um caminho que, não obstante ter sido suavizado pela nossa acção, não responde aos problemas e défices estruturais que assolam o País.

Por esta nossa Assembleia da Organização Regional passaram muitos desses problemas e passou também a política patriótica e de esquerda com as suas soluções para lhes dar resposta.

Portugal precisa de uma outra política que promova o desenvolvimento económico que ponha Portugal a produzir, que assuma a valorização do trabalho e dos trabalhadores, que promova o aumento geral dos salários e das reformas, que assegure serviços públicos de qualidade, valorize a educação, a ciência e a cultura, que defenda o SNS e o salve da estratégia que visa a sua destruição, que garanta os direitos das crianças e dos pais, proteja o direito a viver numa habitação digna, reforce os direitos e protecção sociais, que assegure o direito a um ambiente saudável e ao equilíbrio ecológico.

Agora que encerrámos as comemorações do Centenário do Partido e que estamos ainda a comemorar, por todo o País os seus 101 anos, fazêmo-lo com esta certeza de que é cada vez mais necessária, determinante, indispensável a intervenção deste Partido Comunista Português.

Isso fica claro quando olhamos para as injustiças e desigualdades gritantes a que o capitalismo sujeita os trabalhadores e os povos. Basta pensar que, no plano mundial os 10 homens mais ricos do mundo viram as suas fortunas duplicar, enquanto 99% da humanidade sofria os efeitos da pandemia e do aproveitamento que dela fez o grande capital, e mais 160 milhões de seres humanos se viram arrastados para uma situação de pobreza.

Ou no nosso País, em que apenas em 2021, as empresas da Bolsa de Valores de Lisboa distribuíram 2,5 mil milhões de euros em dividendos ou que 17 Grupos Económicos embolsaram 4,6 mil milhões de euros de lucros, enquanto a esmagadora maioria da população se via a braços com dificuldades imensas.

Fica clara a necessidade da intervenção do PCP, da importância da capacidade de resistência, da afirmação de liberdade e da confiança que o caracterizam, quando estamos confrontados com uma violenta escalada da ofensiva antidemocrática, com um forte pendor anticomunista e fascizante, visando criminalizar e mesmo proibir o pensamento diferente, as ideias discordantes do pensamento único que nos querem impor que, se não for travada a tempo, porá em causa a própria democracia.

Intervenção do PCP que é tanto mais urgente quando vemos o capital a festejar a nova maioria e o novo Governo, e reclamando já o retorno do seu empenhamento neste resultado, ao exigir as mais que gastas reformas estruturais, as alterações à legislação laboral que permitam acentuar a exploração, as novas áreas de negócio a partir do retalhar dos serviços públicos e das funções sociais do Estado. Aí os vemos a alimentar os projectos reaccionários, a partir do ataque, de que o PSD se fez porta-voz, à Constituição da República Portuguesa que vêem como obstáculo à sua acção.

A Constituição da República Portuguesa faz hoje 46 anos. Nós que participámos, dentro e fora da Assembleia Constituinte, no riquíssimo processo de construção do seu texto, que a votámos e que a assinámos, sabemos o valor que ela comporta, temos a consciência de que, apesar de alterada, de mutilada em elementos essenciais, ela constitui ainda a base para a resposta que o País precisa e é por isso que é alvo do ódio do grande capital.

Cento e um anos depois, aqui estamos a dizer presente. Alguns viram nas curvas apertadas destes últimos tempos razões para decretar, pela enésima vez, o declínio irreversível do PCP. Exultam perante um desejo que como tantas vezes confundiram com a realidade. Desta XI Assembleia da Organização Regional de Braga, que se insere num movimento mais vasto de Assembleias, reuniões e plenários em todo o País, queremos dizer, aos trabalhadores e ao povo, que podem contar connosco, pois estaremos convosco, na luta, todos os dias.

Lá nos encontrarão na luta pelos salários e pelas pensões, pelos direitos e pelos horários dignos. Lá estaremos na luta contra a precariedade, como na passada Quinta-Feira fizemos na Manifestação Nacional de Jovens Trabalhadores, em Lisboa e no Porto. Não faltaremos à luta pelos Serviços Públicos, em defesa do SNS, das creches gratuitas, ou da Escola Pública gratuita e de qualidade, como ficou evidente a 24 de Março, dia Nacional do Estudante, em vários pontos do País, mas particularmente na manifestação em Lisboa, onde convergiram dezenas de associações de Estudantes e milhares de estudantes do Ensino Superior. Diremos presente na luta em defesa da Habitação, do Transporte Público, contra as discriminações. E já amanhã, e nos próximos dias, estaremos na primeira linha do combate contra o aumento do custo de vida que assola tantas famílias.

Vamos daqui com mais força e confiança. Confiança de que este Partido estará à altura das suas responsabilidades perante o povo português, que saberá honrar o seu património de luta pela democracia avançada que ponha os valores de Abril no futuro de Portugal, que não abdicará, por um minuto que seja, da sua luta pelo Socialismo, pelo Comunismo. Porque o Futuro tem Partido.

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