É evidente que o tema do ambiente e que nos traz aqui todos a este Seminário está muito presente no seio da juventude.
Como poderia não ser assim?
Alguns exemplos daquilo que têm sido os títulos nos órgãos de comunicação social sobre este tema:
«Pára de negar, a Terra está a morrer»; «O Planeta está a mudar, mas nós não»; «Para quê ir à escola se não haverá futuro?»; «Portugal vai ser dos países mais afectados pela subida do nível do mar»; «2030 o ponto sem retorno».
Poderia passar aqui a tarde a enumerar títulos como estes, que de uma maneira ou de outra se vão enraizando nas mentes da população e particularmente dos jovens, que são confrontados com um cenário de futuro hipotecado.
Depois existem ainda as ferramentas do Estado, tal como o Parlamento dos Jovens, que junta centenas de jovens estudantes do ensino secundário todos os anos das várias escolas, e depois numa sessão com deputados na Assembleia da República, cujo tema este ano foi precisamente «Alterações climáticas salvar os oceanos».
Esta dinâmica internacional tem mobilizado milhares nas chamadas «greves climáticas», o mesmo acontecendo no nosso país. Movimentos que encerram contradições, mas que sobretudo traduzem disponibilidade para a acção de muitos jovens.
Chegados aqui, é essencial separar o trigo do joio, as preocupações justas (e que merecem a consideração e o empenho da organização), de operações montadas, de circos mediáticos, de instrumentalização da disponibilidade para a acção.
É necessário separar também a tomada de consciência para problemas ambientais de forma «artificial» mas não necessariamente «errada», isto é, não quer dizer que estes não existem.
E contrariamente a outros problemas que a juventude enfrenta (falta de professores, chuva na escola, os transportes) e com os quais contacta de imediato, os problemas ambientais não têm esta »característica», o que transforma totalmente a abordagem, permitindo e ajudando à manipulação e instrumentalização, exemplo da rapariga que, no telejornal, destacava os 40 e tal graus em Santarém, em Agosto, por culpa das alterações climáticas.
É necessário, pois, separar e denunciar todos aqueles que utilizam os graves problemas ambientais e os justos sentimentos da juventude para acumular mais, para poluir mais. Só o podemos fazer afirmando uma real visão alternativa sobre as alterações climáticas e a degradação ambiental.
Temos um património de intervenção ímpar que a juventude precisa de conhecer e temos muito potencial de intervenção, de consciencialização de importantes camadas que, reconhecendo os problemas e demonstrando disponibilidade para acção, podem desenvolvê-la de forma consequente contra o «verdadeiro culpado». É também nossa responsabilidade dar resposta a isto.
Uma resposta que só nós podemos dar.
O capitalismo não é verde! Um sistema incapaz de arranjar soluções que permitam mais do que fôlegos temporários e que vê aqui também a sua oportunidade para perpetuar e aprofundar a sua ofensiva ideológica.
Por que é que o impacto ambiental da conquista do passe social inter-modal a preço reduzido passou ao lado de todos?
Por que é que se insiste na entrega a privados da exploração do lítio sem a necessária avaliação dos problemas ambientais para que se possa promover a compra de carros eléctricos?
E o amianto nos edifícios públicos e particularmente nas escolas não é algo dramático?
Porque a sua resolução também vai contra os grandes interesses económicos, contra a política de direita que ataca o direito a educação de qualidade no qual se inserem as condições materiais para o estudo.
Depois temos ainda a linha do desligar os problemas ambientais de tudo o resto. Por exemplo: «ecologia é a nossa ideologia», é uma causa que «une todos».
Escondendo que a resolução dos graves problemas ambientais só é possível com uma visão integrada, com uma política alternativa, política patriótica e de esquerda, a única que é «verde», que dá real resposta aos problemas da juventude e às suas preocupações ambientais.
Só no programa eleitoral e nos 12 Compromissos que o PCP e o PEV apresentam para as eleições legislativas constam as seguintes propostas:
A promoção da utilização do transporte público, em detrimento de soluções que apontam para manter o paradigma do transporte individual (desta vez em modo eléctrico);
A aposta na utilização racional da energia;
Uma política de resíduos que privilegie a sua redução e promova a reciclagem e reutilização, entre muitas outras.
Com tudo isto é claro que os problemas ambientais complexos, e de grande impacto económico e social, não se resolverão sem pôr em causa a própria natureza do capitalismo.
A resposta exige planificação e gestão criteriosa dos recursos naturais e não uma economia guiada pela finança e maximização do lucro. Exige evoluções comuns, solidárias e cooperativas no plano internacional.
E sobre este assunto o Acordo de Paris está longe de ser o que os povos do mundo precisam. Sem prejuízo de este conter justas preocupações com a predação e degradação ambiental, o Acordo visou essencialmente a perpetuação e aprofundamento de mecanismos como o mercado de carbono, que visa mercantilizar o ambiente, transferir os custos e responsabilidades para os povos e as desigualdades entre países industrializados e em desenvolvimento.
A utilização dos recursos naturais pode ser compatível com a defesa do ambiente, desde que não se realize numa lógica de apropriação de matérias-primas sem salvaguarda das necessidades ambientais e sociais, para garantir um desenvolvimento sustentável.
São patentes as contradições das actuais políticas que pretensamente afirmam a defesa do ambiente e mais não fazem que encenações, para ocultar a impossibilidade de tal desiderato no quadro da dinâmica e interesses do grande capital que tentam salvaguardar. De facto, as suas respostas, passando pela mercantilização do ambiente e mecanismos de mercado («fiscalidade verde», «utilizador/pagador», «licenças CO2») mais não farão que agravar problemas e multiplicar agressões ambientais, limitando-se quando muito a deslocar os focos de poluição e de desperdício de uns processos e recursos para outros, sem travar a degradação da Natureza e as desigualdades.
Por exemplo, a atribuição e comércio de licenças de CO2, transaccionáveis, potencia a especulação, prejudica os países e povos mais vulneráveis e não resolve o problema. E são medidas que colhem apoio de muitos porque o perverso reverso da medalha é bem escondido: Ora, «como estamos a correr contra o tempo» qualquer medida já é qualquer coisa. Quando na verdade o que fazemos é permitir que os mesmos poderosos continuem a delapidar recursos, a poluir a seu bel-prazer.
São os que clamam pela preservação dos solos e a poupança da água e depois apoiam as culturas intensivas com grandes consumos de água, químicos e perdas de biodiversidade, na agricultura e na floresta.
São os que denunciam, e bem os combustíveis fósseis, e em particular o gasóleo, mas incentivam o uso do transporte automóvel eléctrico individual, transferindo, os custos ambientais para a exploração dos metais raros decisivos na construção de baterias.
Os que para a produção de energias renováveis, como a fotovoltaica, ou biocombustíveis de produção dedicada, estão disponíveis para apoiar a devastação de milhares de hectares de floresta e sacrificar milhares de hectares de terras aráveis.
Os que colocam uma boa parte da questão em função dos comportamentos individuais, sem questionar as políticas de fundo.
Vejam o exemplo dos manuais escolares. Avançamos na sua disponibilização gratuita. Assim se cumpre um pouco mais a Constituição da República Portuguesa. Falta agora potenciar esta medida no plano ambiental, sem pôr em causa os direitos dos estudantes à utilização responsável dos livros.
O problema não está em que, numa utilização absolutamente responsável, os alunos sublinhem os seus livros, desenhem lá onde diz para desenhar, ou respondam às fichas nos campos para o efeito. O problema está na cedência aos grandes interesses do negócio editorial.
Obrigue-se à produção dos livros escolares em papel reciclado e reciclável, confiram-se os conteúdos para que não haja papel a mais só para dar dinheiro às editoras, e, no limite, assegure-se a produção dos livros por via da Imprensa Nacional, o que garantiria uma importante poupança ao Estado. Medidas que permitiriam poupar dinheiro e assegurar a reciclagem de milhares de toneladas de papel e a reutilização do que estiver em bom estado.
Vejamos ainda o exemplo dos aparelhos electrónicos. As mesmas lojas e cadeias que apoiam as causas ditas ambientais, todos os dias pressionam os jovens para descartarem o telemóvel antigo, para comprarem uns auscultadores novos, para evoluírem para a próxima consola de jogos.
É a lógica do lucro a sobrepor-se sempre às lágrimas de crocodilo que vertem nas cerimónias oficiais e nas publicações nas redes sociais para que conste.
A boa notícia, camaradas e amigos, é que hoje mais gente, e particularmente os jovens, despertam para os problemas, que são reais, do ambiente e dos ecossistemas. A notícia que estamos a construir é que cada um deles perceba que o capitalismo não é verde e, portanto, o caminho para defender o ambiente é superar esse sistema irracional.