Enquanto os trabalhadores se vêm confrontados com o agravamento das suas condições de vida, com a destruição dos seus direitos laborais e sociais, com a liberalização dos despedimentos, outros há, que imunes às dificuldades que o país enfrenta exibem sinais de riqueza que são uma autentica afronta a quem muito embora trabalhe e disponha de salário, vive abaixo do limiar da pobreza.
Esta dicotomia deve-se ao facto de o país estar transformado numa espécie de paraíso fiscal onde proliferam empresas - fantasma, sem rosto nem responsáveis, que apenas servem de camuflagem para a evasão fiscal e para a fuga de capitais que engordam chorudas contas bancárias que permitem aos seus detentores ditar as regras da economia e defender os seus interesses de classe, com prejuízo do desenvolvimento e da riqueza nacionais.
Estes mesmos senhores não se coíbem no entanto de, em nome do interesse nacional, transmitir receitas mais ou menos caridosas, quando na realidade tudo fazem para alienar esse mesmo interesse, obedecendo cegamente às orientações neoliberais da Comissão Europeia, pondo em causa a nossa soberania económica, politica e social de que é exemplo a politica de alteração da legislação laboral, de privatizações e de reestruturação da Administração Pública impostas pela “Troika”.
Peças importantes deste xadrez são os offshore pelo seu papel determinante e activo na fuga e no branqueamento de capitais provenientes de actividades lícitas e ilícitas, zelosamente acarinhados e incentivados e gozando da total complacência de sucessivos Governos, indiciadora de uma real submissão da politica aos interesses do poder económico traduzida objectivamente no aumento galopante das taxas de juro da dívida pública para níveis insuportáveis para qualquer economia.
Outra peça do puzzle tem a ver directamente com a recusa sistemática da efectiva implementação da derrogação do sigilo bancário com o argumento de que aumentaria a fuga de capitais.
Não deixa de ser irónico que servindo-se da economia e do sistema financeiro legal para a prática efectiva de operações que promovem a fuga de capitais, basta para tal pensarmos na vendas de capital das empresas públicas, venham com esse argumento justificar a recusa no levantamento do sigilo bancário, quando é exactamente esta situação que mantém impunes os crimes financeiros e outros de que o grande capital se serve para depauperar a economia em detrimento da promoção do necessário investimento indispensável à criação de riqueza, tão hipocritamente utilizado pelo Presidente da República para enfeitar as suas intervenções quando pretende fazer passar uma imagem de preocupação com a situação do país.
É a nosso ver incompatível combater o branqueamento e a fuga de capitais e ao mesmo tempo manter intocáveis os offshore e o sigilo bancário.
Não menos importante e talvez mais revoltante é a impunidade com que os maiores criminosos nesta área continuam a beneficiar, com a cumplicidade objectiva das mais altas instituições, em que a justiça ao contrário do que acontece com os mais fracos, se mostra ineficiente quando em presença do poderosos. Basta que nos lembremos do BPN, Face Oculta, etc…, que se arrastam anos nos tribunais e no final a culpa morre solteira.
Este caminho tem necessariamente de ser invertido, sob pena de estarmos a hipotecar o futuro dos nossos filhos e netos.
Não podem ser os trabalhadores a continuar pagando milhões pelos erros de politicas económicas movidas pela especulação desenfreada de um sistema financeiro voraz, que delapida recursos, provoca a estagnação da economia conduzindo ao aumento do desemprego, à diminuição dos apoios sociais e ao aumento da carga fiscal, enquanto que os senhores do dinheiro continuam a usufruir de toda a espécie de benefícios contribuindo com tostões e proporcionalmente muito menos que os trabalhadores e que os pequenos e médios empresários para o desenvolvimento da economia.
Várias têm sido as iniciativas do PCP na Assembleia da República e no Parlamento Europeu no sentido da aprovação de instrumentos legais de efectivo combate à fraude e evasão fiscal e ao branqueamento de capitais, bem assim ao levantamento do sigilo bancário, iniciativas estas e propostas que tem esbarrado com a oposição do PS, PSD e CDS/PP, fiéis defensores da manutenção de politicas de classe favoráveis ao grande capital especulativo nacional e internacional.
Neste contexto é com natural apreensão que vejo, enquanto trabalhadora da Direcção-Geral dos Impostos a anunciada fusão DGCI/DGAIEC/DGITA, que com a capa de pretensa racionalização de meios e de recursos e da redução de cargos dirigentes, mais não visa que reduzir de forma deliberada a capacidade do Estado no combate aos poderosos no âmbito da fraude e evasão fiscal.
Se tivermos em conta que a importância das actividades tributária e aduaneira radica na necessidade de arrecadação de receitas para garantir o cumprimento das funções sociais do Estado, fácil é perceber que a desarticulação destes serviços e a extinção de alguns provocada por esta fusão, o que tem em vista é garantir uma mais difícil cobrança de tributos, favorecendo objectivamente a fraude e evasão fiscal e a colocação de trabalhadores em regime de mobilidade especial ou até no desemprego.
Quanto às Alfandegas, esta fusão, a não serem acauteladas algumas questões essenciais, pode conduzir à diluição da missão e do desempenho das funções aduaneiras no controlo e fiscalização da fronteira externa para a segurança da sociedade e defesa da economia da UE e do comércio internacional legitimo, podendo também daqui resultar quebras significativas na receita tributária.
A cooperação que necessariamente tem de existir em termos de coordenação e troca de informação entre as entidades que detêm a obrigação legal de prevenir a criminalidade económica e financeira como é o caso da DGAIEC e da DGCI não implica obrigatoriamente a sua fusão, mas sim uma melhor articulação entre si, sem colocar em causa ou interferir nas competências legais de cada um destes organismos, porque se a lógica fosse essa, então também deveriam ser objecto da fusão todos os outros organismos cuja missão e atribuições tenham a ver com a problemática da criminalidade económica e financeira (Ex: ASAE, PJ, PGR, …).
Não deve o PCP desistir de lutar e propor, como tem feito até aqui, que sejam adoptadas medidas eficazes no combate efectivo à criminalidade fiscal e económica, com vista à implementação de uma politica social mais justa e solidária, cumpridora dos desígnios da Constituição da República Portuguesa.