Caso houvesse dúvidas, os nossos trabalhos ao longo desta tarde mostram que o modelo e o sistema que as classes dominantes tentam impor aos povos da Europa não são inevitáveis.
A Europa da paz e da solidariedade nunca poderá ser construída contra os trabalhadores e os povos. Por isso a nossa luta contra esta União Europeia é a luta por uma outra Europa. A resposta dos trabalhadores e dos povos de vários países europeus à violenta ofensiva antisocial em curso demonstra que uma outra Europa é possível e necessária: uma Europa de progresso e paz, que abra caminho à construção de novas formas de cooperação entre Estados soberanos, orientadas para o desenvolvimento social e económico mutuamente vantajoso, respeitadora da soberania nacional nos seus mais variados aspectos, da independência dos povos, dos valores da paz, da solidariedade e da cooperação.
A luta por esta outra Europa exige uma verdadeira ruptura com o processo de integração capitalista europeu. A União Europeia não é reformável.
No Apelo Comum que os nossos partidos subscreveram a propósito das últimas eleições para o Parlamento Europeu, em Abril de 2009, no Chipre, comprometemo-nos a lutar por uma outra Europa, assente em quatro eixos essenciais:
- por uma Europa de emprego com direitos e pela melhoria das condições de vida dos trabalhadores e dos povos,
- por uma Europa de progresso económico e social;
- por uma Europa pela democracia, pelos direitos e a igualdade, contra todas as discriminações;
- por uma Europa pela paz e pela solidariedade com todos os povos do mundo.
Continuamos a considerar válidos e a lutar por estas linhas fundamentais de ruptura com a integração capitalista europeia. Neste debate, avançámos com os eixos que consideramos indispensáveis a essa ruptura:
- A defesa de uma Europa de Estados soberanos, livres e iguais em direitos;
- A rejeição de imposições supra-nacionais que firam o direito de cada povo a decidir as políticas (económicas e outras) que melhor lhe servem;
- A rejeição do federalismo e a defesa do princípio de igualdade entre Estados – um país, um voto – com o direito de veto em questões de interesse vital;
- A reversibilidade dos acordos e tratados que regem a actual integração capitalista e o ajustamento do estatuto de cada país à vontade do seu povo e à sua real situação, salvaguardando as suas especificidades e admitindo as necessárias cláusulas de excepção;
- A salvaguarda da democracia e a defesa de uma efectiva participação dos povos na determinação do seu destino, combatendo e revertendo o esvaziamento das estruturas de poder que lhes são mais próximas e que melhor controlam, designadamente os parlamentos nacionais;
- A recuperação do comando político e democrático do processo de desenvolvimento, com a subordinação do poder económico ao poder político e a afirmação do Estado como estrutura determinante e referencial na economia;
- A propriedade e gestão públicas de sectores estratégicos da economia, como condição para criar riqueza e distribuir de forma socialmente justa a riqueza criada; a defesa de uma banca pública ao serviço do desenvolvimento económico;
- A recuperação pelos Estados de instrumentos de política económica, monetária, orçamental e cambial;
- A imediata suspensão e rejeição do Pacto de Estabilidade, do Tratado Orçamental, da Governação Económica, do Semestre Europeu, do Pacto para o Euro Mais e da Estratégia UE2020 e a sua substituição por um Pacto de Progresso Social e pelo Emprego;
- A salvaguarda e reforço dos serviços públicos; a rejeição dos processos de liberalização e privatização em curso ou já concluídos;
- O reforço dos direitos dos trabalhadores, incluindo o direito à contratação colectiva e a uma reforma digna; a implementação de medidas de combate à pobreza e à exclusão social, incluindo a instituição de um rendimento mínimo;
- A convergência no progresso dos direitos sociais, laborais, económicos e ambientais, com consagração do princípio da não-regressão;
- A rejeição do militarismo e das políticas securitárias; o fim da submissão ao imperialismo e à NATO; o respeito pelo direito internacional e pela Carta das Nações Unidas.
Lutamos por uma outra Europa que respeite a História do continente, que viva da afirmação soberana dos seus países e povos, e da sua diversidade. Uma outra Europa fundada no estrito respeito pela democracia e pelas conquistas históricas do movimento operário no continente. Uma outra Europa que respire os valores da solidariedade e da entreajuda, respondendo aos justos anseios e aspirações dos seus povos. Uma outra Europa que seja um factor de desenvolvimento, segurança e progresso social em todo o mundo. Uma outra Europa que germinará na luta e que se irá construir sob as ruínas de um projecto de integração capitalista esgotado e contrário aos interesses dos povos.
A questão da ruptura com o processo de integração capitalista está assim colocada. Mas, como processos de integração noutros continentes demonstram, existe uma relação dialéctica entre a correlação de forças no plano nacional e a natureza e evolução dos processos de cooperação e integração. A derrota do processo de integração capitalista europeu é por isso inseparável de uma evolução positiva da correlação de forças em cada um dos países, bem como da capacidade dos povos de resgatarem a sua soberania nacional.
E assim reforçamos a ideia de que a nossa luta concreta em cada país, contra a exploração e o empobrecimento, pela democracia e a justiça, é indispensável para construir uma outra Europa. A luta pela concretização de uma ruptura com a política de direita e, no tempo presente, pela rejeição do Pacto de Agressão, é condição essencial para a afirmação e defesa dos interesses nacionais.
No XIX Congresso realizado há poucos meses, o PCP afirmou e renovou o seu compromisso de lutar por um Portugal independente e soberano, por um projecto europeu de cooperação entre Estados soberanos e iguais, que assuma a ruptura com o processo de integração capitalista na Europa e promova a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo e o progresso do país, a paz e a solidariedade internacional. Um compromisso consentâneo com o nosso projecto de desenvolvimento democrático, patriótico e internacionalista.
No Programa Uma Democracia Avançada – os Valores de Abril no Futuro de Portugal que aprovámos no XIX Congresso do Partido referimos:
“A situação criada por esta evolução (da UE) torna indispensável uma política que se desenvolva em seis direcções principais e interligadas: defender sempre firmemente os interesses portugueses, designadamente nas instituições europeias, combatendo decisões que os prejudiquem; minimizar com medidas concretas os condicionalismos e consequências negativas da integração; lutar contra as imposições supranacionais e as limitações à democracia e à vontade dos povos; reclamar e utilizar a favor do progresso de Portugal e do bem-estar dos portugueses todos os meios, recursos e possibilidades; agir especificamente e em articulação com os trabalhadores e os povos de outros países para romper com o processo de integração capitalista europeu e promover uma Europa de paz e cooperação baseada em Estados livres, soberanos e iguais em direitos; lutar por um desenvolvimento soberano de acordo com os interesses nacionais dos trabalhadores e do povo, cuja concretização deve prevalecer face a condicionamentos ou constrangimentos, assumindo as exigências, caminhos e opções que a situação coloque como necessários”.
Consideramos que é direito inalienável de cada povo e de cada país lutar em defesa dos seus interesses e direitos. Nada pode obrigar Portugal a renunciar ao direito de optar pelas suas próprias estruturas socio-económicas e pelo seu próprio regime político. Nada pode obrigar Portugal a aceitar a posição de Estado subalterno no quadro da UE e a alienar a sua independência e soberania nacionais.
O PCP reafirma o inalienável e pleno direito do povo português decidir do seu próprio destino e escolher os caminhos que entender, mais conformes com a sua identidade histórica, os seus direitos e aspirações, para ver salvaguardados os interesses nacionais em relação a quaisquer outros projectos que os atinjam. Direito este que nenhuma integração, por mais adiantado que seja o seu estado de desenvolvimento, pode expropriar.
Direito de que o povo português não pode abdicar face ao irreconciliável conflito entre a natureza da integração europeia, e a indispensável defesa da soberania nacional e dos interesses dos trabalhadores e do povo.
Mas tal ruptura não é um acto súbito, um momento, mas sim um processo de acumulação de forças que evolui consoante a conjugação dos factores internos e externos da luta contra o grande capital, pelo progresso social e o socialismo.
É por isso que a nossa estratégia de luta não passa nem por embarcar em engodos reformistas, como o da «refundação da União Europeia» ou do «mais Europa para sair da crise», nem por alimentar soluções fáceis e aparentemente correctas que, desligadas da realidade da correlação de forças, podem conduzir a luta a becos sem saída.
Será na concretização da política alternativa, patriótica e de esquerda, que as decisões necessárias para assegurar a indispensável afirmação dos interesses nacionais – nomeadamente a decisão sobre a saída da União Europeia – serão colocadas. Sempre de acordo com a realidade existente, de acordo com os interesses do povo e do país e de uma verdade que é já hoje inegável: a Democracia Avançada que o PCP preconiza para Portugal não pode ser desenvolvida no quadro dos condicionamentos e imposições da União Europeia.
Na democracia avançada que o PCP propõe ao povo português, Portugal desenvolverá uma política externa diversificada, de paz, amizade e cooperação com todos os povos, na base dos princípios da igualdade, reciprocidade de vantagens, respeito mútuo e não ingerência nos assuntos internos, que terá como vectores, entre outros:
– as relações com os países da Europa, tendo como princípios básicos a cooperação, mutuamente vantajosa, a salvaguarda dos interesses, da cultura e da soberania nacionais, o desenvolvimento de relações equilibradas e não discriminatórias entre os seus Estados e com todos os povos e países;
- a contribuição activa para a criação de uma Europa de paz, progresso, amizade e cooperação entre povos e países soberanos e iguais em direitos, com o avanço do processo de desarmamento, a dissolução da NATO e a desmilitarização da União Europeia, a criação de um sistema de segurança colectivo que respeite e assegure a soberania dos Estados e a livre opção dos povos.
Será com a luta dos povos dos nossos países, com a solidariedade e a cooperação das forças progressistas, e em particular dos Partidos comunistas, que ultrapassaremos a grave situação que estamos a viver decorrente do aprofundamento da crise estrutural do capitalismo. E será com a luta e afirmando a alternativa de fundo de que os comunistas são portadores – o socialismo – que construiremos uma Europa que seja verdadeiramente de paz e solidariedade.