Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Sobre a Procriação Medicamente Assistida, a adoção e o apadrinhamento civil por casais do mesmo sexo

Eliminação da impossibilidade legal de adoção por casais do mesmo sexo
(projetos de lei n.ºs 126/XII/1.ª, 127/XII1.ª e 178/XII1.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Regressa com este debate uma questão que ocupou parte de um debate recente, ainda há poucas semanas, nesse caso a propósito da reprodução medicamente assistida. É, sem dúvida, um debate relevante, muito em especial para as pessoas que, não o podendo hoje fazer, anseiam poder ver consagrada a sua aspiração em relação à adoção de crianças, sentimento que naturalmente merece o nosso respeito.
Começando pelo que podia ser o final, sabem todos que, no passado recente, referimos que, em relação à questão da adoção, é necessário — diria, é cada vez mais necessário — olhar de uma forma global para este instituto, para a legislação que o rege e para a prática concreta da sua aplicação, tantas e tão graves são as dificuldades que existem hoje neste campo. Sabem também todos que, para além disso, assumimos em relação a esta matéria a posição de não estarem criadas as condições para uma alteração da lei, como a que hoje é aqui proposta pelas iniciativas do Bloco de Esquerda e de Os Verdes.
Foi por tudo isso que rejeitámos esta alteração no passado, incluindo no ainda recente processo de consagração legal do casamento entre pessoas do mesmo sexo. É uma posição que manteremos neste debate.
Assumimos esta posição com frontalidade e com a legitimidade de termos estado, no passado,
sistematicamente empenhados na consagração legal dos direitos dos casais de pessoas do mesmo sexo.
Alguns poderão já não se lembrar que a primeira vez que a lei em Portugal reconheceu alguns direitos a casais de pessoas do mesmo sexo foi com uma iniciativa e com base num texto proposto pelo PCP, designadamente na questão do alargamento dos direitos das uniões de facto, que veio a traduzir-se numa lei em que não se discriminaram, pela primeira vez, estes casais.
Votámos também favoravelmente a consagração do casamento entre pessoas do mesmo sexo. É, aliás, de salientar que, passados quase dois anos, nenhum problema ou conflito social significativo se gerou com a consagração desta possibilidade. A sociedade integrou esta questão com naturalidade, o que não significa que não continue a haver quem discorde dela. A alteração da lei fez-se num tempo em que estavam reunidas as condições para a sua aplicação.
Pensamos que a situação não seria a mesma se, em simultâneo, se tivesse consagrado a possibilidade de adoção por estes casais.
Quando se legisla, é preciso pensar nas condições de aplicabilidade da lei, o que não quer dizer naturalmente que a lei tenha de ser totalmente consensual. Poucas serão as questões totalmente consensuais numa sociedade.
Mas julgamos que, neste momento, continuamos a não ter esta questão suficientemente debatida e sedimentada na sociedade, em que o PCP também se integra, para que se altere a lei neste sentido.
Assumimos nesta matéria, portanto, aquilo a que se poderia chamar uma posição de prudência construtiva, que pensamos ser boa conselheira quando se legisla em matérias tão complexas como esta o é.
Quero, no entanto, deixar claro que o nosso voto nesta matéria, seguindo idênticas posições anteriores, não significa uma posição de rejeição (e, naturalmente, também não de aprovação) da possibilidade de adoção por casais de pessoas do mesmo sexo, mas expressa apenas a necessidade de prosseguir o debate e o esclarecimento sobre a questão, debate em que, naturalmente, não enjeitamos integrar-nos.
É esta, em síntese, a posição do PCP sobre os projetos que hoje vamos votar.

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