1 - Referendar as soluções do actual Código Penal, da Lei 6/84 e do Projecto Lei do PCP relativamente à Interrupção Voluntária da Gravidez, seria pôr em Referendo o próprio foro íntimo da mulher, correspondendo a uma atitude contra o sexo feminino e a preconceitos em matéria do estatuto social das mulheres.
2 - Referendar a IVG corresponderia a desviar as atenções da realidade dramática do aborto clandestino, realidade que tem de estar presente nas opções do legislador.
3 - Referendar o alargamento da IVG proposto pelo PCP seria adiar a resolução das angústias vividas pelas mulheres das classes e camadas mais desfavorecidas, que por falta de apoio à maternidade se vêm obrigadas à dolorosa decisão de recorrer ao aborto clandestino. Com graves riscos para a sua saúde física e psíquica e mesmo para a sua vida.
4 - Referendar, nomeadamente o alargamento do prazo, de 16 para 22 semanas, do aborto motivado por malformações graves do feto resultaria no adiar de alterações de uma lei hipócrita, provado que está que o prazo de 16 semanas não permite com segurança a detecção daquelas malformações.
A Lei actual para além de hipócrita, desprotege o feto, uma vez que na dúvida sobre a saúde do mesmo se podem realizar IVG.s, quando no prazo que a ciência médica aconselha podia resultar a inexistência de motivos para a sua efectivação.
5 - Referendar a IVG seria desviar as atenções da necessidade da efectivação do Planeamento Familiar, de uma política de apoio à maternidade e à paternidade baseada sobretudo na melhoria da qualidade de vida das mães trabalhadoras. Por forma a que as mães e os pais possam concretizar o direito a uma maternidade/paternidade felizes.
6 - A Lei Penal restritiva relativamente aos primeiros projectos do PCP sobre a IVG, manifestou-se totalmente ineficaz para pôr cobro ao flagelo do aborto clandestino. Daí a necessidade urgente da sua alteração para legitimação da própria Lei Penal.
7 - É inteiramente pertinente observar que as sucessivas reclamações de referendos sobre múltiplas matérias se tornaram um dos instrumentos preferidos pelo PSD para distrair a opinião pública nacional da evidência de que este partido, nas matérias mais importantes e decisivas, está de acordo com o PS.
8 - Em matéria de referendo, é aliás de sublinhar a profunda hipocrisia do PSD, que já em 1992, (ao lado do PS), se opôs à realização de um referendo sobre o Tratado de Maastricht, e que já se voltou a entender com o PS no processo de revisão constitucional em curso no sentido de impedir a realização de um referendo sobre a revisão do Tratado de Maastricht e sobre a participação de Portugal na moeda única, embora se trate de matérias com profundas consequências para o presente e o futuro de interesses essenciais de Portugal e da própria soberania nacional.
9 - É uma evidência que a proposta de Marcelo Rebelo de Sousa, embora formulada a pretexto das alterações defendidas no projecto de lei do PCP, obedece na verdade ao reaccionário intuito de fundo de contestar e pôr em causa os passos positivos mas manifestamente insuficientes que foram dados com a legislação aprovada em 1984.