Projecto de Resolução N.º 608/XVI/1.ª

Por um Ensino Superior Inclusivo

Exposição de motivos

Consagra a Constituição da República Portuguesa o direito de todos à educação e ao ensino, sendo da responsabilidade do Estado a garantia desse direito fundamental, assegurando o acesso e sucesso de todos os cidadãos aos graus mais elevados de ensino, devendo este ser universal e progressivamente gratuito.

As normas das Nações Unidas sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiência (1993), a Declaração de Salamanca (1994), a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006) são instrumentos jurídicos internacionais, subscritos pelo Estado Português, que vinculam o Governo a garantir dignidade na vida das pessoas com deficiência, nomeadamente das crianças e jovens, bem como a igualdade de direitos no acesso e sucesso escolar para todas as crianças, jovens e adultos com deficiência, e a responsabilidade do Estado nessa matéria.

Os princípios vertidos num conjunto de instrumentos internacionais e em legislação nacional, bem como na Constituição da República e na Lei de Bases do Sistema Educativo, não têm tido a necessária tradução concreta, na vida de todos os dias, das crianças e jovens com necessidades educativas específicas (NEE) e com deficiência, designadamente no que se refere ao direito à Educação.

Ao longo dos anos, sucessivos governos foram responsáveis pelo desinvestimento na escola pública e pelo subfinanciamento do ensino superior público, que tem significado menos condições para garantir a todos o devido acesso e sucesso, em condições de equidade, a todos os graus de ensino.

O PCP considera que importa dar passos firmes e concretizar medidas que garantam a efetiva e plena inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas específicas em todo o ensino obrigatório, mas também assegurar o acesso, frequência e sucesso ao ensino superior.

De acordo com o Parecer do Conselho Nacional de Educação, de janeiro de 2017, sobre Estudantes com necessidades educativas especiais no Ensino Superior, existem “várias barreiras à frequência e conclusão do ensino superior por estudantes com NEE, para além das arquitetónicas, como limitações no material pedagógico, diferentes formas de discriminação, dificuldade e acessibilidade à bibliografia recomendada, a ausência da regulamentação específica e falta de continuidade dos apoios disponibilizados aos estudantes no ensino secundário”. Acrescenta ainda que “tendo em vista o sucesso escolar dos estudantes com necessidades educativas especiais, é necessário prever e programar eventuais reforços orçamentais de qua as instituições públicas de ensino venham a necessitar, quer em consequência de dispensa do pagamento de propinas, quer do planeamento de programas científicos e pedagógicos dirigido a estes estudantes”, para além disto, deverá ainda garantir-se “aconselhamento e acompanhamento por parte de instituições e pessoas especializadas”. Esta recomendação mantém-se atual, reconhecendo a existência de uma rede de gabinetes de apoios a estudantes com NEE, através da rede IncluIES, e do trabalho desenvolvido pelo Grupo de Trabalho para o Apoio a Estudantes com Deficiências no Ensino Superior, a verdadeira inclusão no ensino superior está longe de ser concretizada.

Independentemente dos instrumentos de autonomia de cada instituição, consideramos que é fundamental garantir os necessários meios que permitam concretizar as condições materiais e humanas necessárias para que seja assegurada a equidade nas oportunidades aos jovens com necessidades educativas específicas.

O direito à educação é um direito humano fundamental, devendo ser garantido a todos em equidade de oportunidades e respondendo às necessidades educativas de todos e de cada um, de modo que todos os alunos obtenham, em todos os graus de ensino, designadamente do ensino superior, os grandes benefícios que uma educação inclusiva pode potenciar.

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:

Resolução

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao Governo que:

  1. No prazo de 6 meses proceda ao levantamento e identificação:
    1. das barreiras arquitetónicas e das necessidades de melhoria das acessibilidades em cada Instituição de Ensino Superior Público;
    2. do número de estudantes com necessidades educativas específicas que atualmente frequentam o ensino superior público, identificando as diferentes necessidades educativas específicas, designadamente tendo em conta as categorias definidas pela OCDE:
      1. Categoria transnacional A (CTN. A): inclui os estudantes com deficiências ou incapacidades consideradas em termos médicos como perturbações orgânicas, atribuíveis a patologias orgânicas, por exemplo, associadas a deficiências sensoriais, motoras ou neurológicas. Considera-se que a necessidade educativa emerge primariamente de problemas atribuíveis a estas deficiências;
      2. Categoria transnacional B (CTN. B): engloba estudantes com perturbações comportamentais ou emocionais ou com dificuldades de aprendizagem específicas. Considera-se que a necessidade educativa emerge primariamente de problemas na interação entre o estudante e o contexto educacional.
    3. dos gabinetes de apoio aos alunos com NEE e respetivos meios humanos e materiais.
  2. Proceda à aprovação dos normativos adequados à inclusão de estudantes com necessidades educativas específicas no ensino superior, tendo em conta o resultado do levantamento previsto no número anterior e garantindo:
    1. A criação de mecanismos que facilitem a transição do ensino secundário para o ensino superior, permitindo a preparação atempada da Instituição;
    2. A criação de gabinetes de apoio ao estudante com NEE, cuja regulação seja uniforme a nível nacional e que possuam o número de profissionais adequado e de áreas específicas (educacionais, psicológicos, terapêuticos, sociais e clínicos) que deem resposta a todas as necessidades educativas específicas;
    3. A produção de materiais pedagógicos adaptados e apoios suplementares às aulas;
    4. A plena acessibilidade comunicacional e informativa nas aulas (com o caso dos intérpretes de língua gestual portuguesa e braille) e em todos os serviços (físicos e online) das Instituições;
    5. Da criação de uma rede de bibliotecas e centros de documentação ligados a uma plataforma de recursos e conteúdos acessíveis;
    6. As adequações ao processo de ensino/aprendizagem, incluindo momentos de avaliação, de acompanhamento pedagógico, de apoio instrumental ou tecnológico, nomeadamente, regimes especiais de avaliação, nomeação de tutor, ajuste de horários;
    7. Formação específica para os diversos trabalhadores, incluindo os trabalhadores das valências de alimentação, alojamento, centros de estudo, bibliotecas, serviços académicos, reprografias;
    8. Formação pedagógica para professores, nomeadamente em instrumentos de avaliação dinâmica, planos educacionais individualizados, planos de transição entre disciplinas e ciclos, procedimentos de inovação e intervenção pedagógico-clínica, práticas e estratégias de inclusão efetiva;
    9. A participação de estudantes NEE em toda a vivência académica, social, cultural e desportiva;
    10. Alargamento das situações a considerar no contingente especial e alargamento do número de vagas, garantindo a prossecução de estudos de todos os alunos que tenham obtido sucesso na conclusão do ensino superior;
    11. Uniformização de um Estatuto para alunos com Necessidades Educativas Específicas a adotar pelas Instituições do Ensino Superior;
    12. Cumprimento das normas de acessibilidade em todos os espaços das Instituições, incluindo, alojamento, espaços de lazer e espaços temporários.
  3. Tendo em conta o previsto nos pontos anteriores garanta a dotação orçamental adequada, nomeadamente no que se refere à eliminação das barreiras arquitetónicas, à contratação dos profissionais necessários e à garantia dos materiais pedagógicos adequados às necessidades destes estudantes.
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