Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Política Orçamental

Relatório de Orientação da Política Orçamental

Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Ministro das Finanças, gostaria, se não se importasse, de continuar a nossa conversa da passada quarta-feira, na Comissão de Orçamento e Finanças, para verificar se nestes dois dias o Governo utilizou o tempo para nos prestar, bem como ao país, informações adicionais, que são, na nossa opinião, muito úteis.
E fique descansado, Sr. Ministro, que não vou voltar a questioná-lo sobre as implicações jurídicas da nomeação de António Castro Guerra para a CIMPOR!
Venho falar-lhe de outra coisa e, de novo, sobre o plano de privatizações incluído quer no PEC quer neste Relatório de Orientação da Política Orçamental.
Atentemos, então, no que o senhor disse, em nome do Governo, na passada quarta-feira: que vai continuar a privatizar aquele pacote de empresas, ou seja, independentemente do que o Sr. Primeiro-Ministro disse sobre as perspectivas neoliberais desta União Europeia, o senhor acha que isso não é neoliberalismo e, portanto, sabemos que esta é a opinião do Governo.
Sabemos também — e o Sr. Ministro disse-o, na quarta-feira, em resposta a uma pergunta que lhe fiz — que não vai utilizar novamente as golden shares. Então, diga-nos uma coisa, Sr. Ministro: na REN, na ANA, na TAP e na CTT não há interesses estratégicos nacionais a defender? Há ou não há, Sr. Ministro? E, se houver, como é que o Governo vai defender esses interesses nacionais sem golden shares e privatizando? Esta é uma questão central a que o senhor não respondeu na quarta-feira.
A minha segunda questão tem a ver com os números divulgados pela Associação Portuguesa de Bancos sobre a taxa de IRC que a banca pagou ou vai pagar relativamente aos resultados antes de impostos no ano de 2009.
Refere a Associação Portuguesa de Bancos o seguinte: «Resultados antes de impostos — 1725 milhões de euros; impostos a pagar — 275 milhões de euros; taxa — 15,9%; imposto a recuperar — 201 milhões de euros; imposto possível para pagar, de facto, pela banca em 2009 — 74 milhões de euros.»
Sr. Ministro, isto representa 4,3% dos resultados antes de impostos! O que é que o Governo tem a dizer sobre estes números verdadeiramente escandalosos? Não acha que isto é um escândalo inaceitável? Não acha o Governo que não é possível aumentar o IRS, o IRC em Junho, voltar a aumentar o IRS em Janeiro e manter esta taxa escandalosa de pagamento de IRC da banca?
(…)
Presidente,
Srs. Deputados:
O Relatório de Orientação da Política Orçamental é a «versão 3» do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC).
Se o Relatório fosse para votar, iria ser, seguramente, aprovado pelo PS e pelo PSD, a parelha sempre unida pelas posições mais ultra-liberais da União Europeia, desta União Europeia de Durão Barroso, Angela Merkel e José Sócrates, que impõe a privatização de sectores e empresas estratégicas para Portugal e para os portugueses e a sua transferência para o capital privado nacional e internacional.
Este é, de facto, o PEC 3, que fixa tectos para as despesas sociais, que não quer critérios mas que impõe tectos e que, assim, dá ao CDS a grande oportunidade para Paulo Portas poder também «dançar o tango» com Passos Coelho e José Sócrates.
Este é o PEC que mostra como o Governo fixa tectos nos apoios sociais, num País onde os excluídos e o número de desempregados não param de aumentar.
Em quatro meses apenas, de Março até Julho, desde o PEC «versão 1» até esta «versão 3», o Governo corta para pouco mais de metade o crescimento do País.
É este o resultado inevitável das sucessivas versões do Programa de Estabilidade que, como bem disse o PCP em Março, não é um programa de crescimento, é um programa de estagnação económica e de retrocesso social. É isto o que o PS e o PSD podem voltar a provocar no País: o regresso à estagnação económica completa, inclusivamente o regresso à recessão económica, com ainda mais desemprego, mais pobreza e exclusão social.
A «versão 3» do PEC anuncia mais cortes, verdadeiramente brutais, na massa salarial da função pública. A regra já não é a entrada de um funcionário por cada duas saídas, nem sequer a regra de Passos Coelho,
de uma entrada por cada quatro ou cinco saídas. A regra passou a ser o congelamento total de admissões.
Haja ou não médicos ou enfermeiros nos hospitais, haja ou não professores ou funcionários nas escolas, haja ou não agentes de segurança e polícias nas ruas, juízes, inspectores ou funcionários municipais, a ordem é clara: nem mais um novo funcionário nos próximos anos.
Mas para que, com este bloqueio total de admissões, se possa cortar tudo o que o Governo quer tem de haver milhares de novas saídas para a reforma, o que não é sequer previsível face à onda de aposentações antecipadas já provocada pelas recentes alterações orçamentais. Assim, e por
mais que o Governo desminta, o que pode estar na calha é, seguramente, o congelamento total dos salários nos próximos anos ou, até, a possibilidade de cortes em salários ou subsídios.
É mais este violento esbulho que pode estar na calha das combinações entre Sócrates e Passos Coelho e que o Relatório em debate já anuncia.
Este Relatório confirma também o segundo aumento de impostos em seis meses apenas — aliás, já anunciado na «versão 1» do PEC. Depois do IRS e do IVA já em Junho e Julho deste ano, vamos ter, em Janeiro, novos aumentos de IRS.
Que «distribuição equitativa», Sr. Ministro, prepara o Governo para anunciar agora? A resposta a esta pergunta deu-a, nesta semana, a Associação Portuguesa de Bancos no boletim em que informa sobre os impostos pagos pela banca em 2009.
Ficamos a saber que a banca pagou 275 milhões de IRC em 2009, isto é, menos de 16% de taxa de IRC; ficamos a saber que a maior parte desse imposto, 201 milhões de euros, podem ser recuperados pela banca.
Isto mostra que a banca, em Portugal, pode pagar, em 2009, apenas 74 milhões de euros, isto é, 4,3% de taxa de IRC.
Sobre isto, o Governo nada diz, nada comenta; insiste apenas na tentativa de mostrar um papel que é enganador, que frustra e tenta enganar os portugueses. E sobre isto o PSD e o CDS também ficam calados, convenientemente calados, cúmplices de uma situação verdadeiramente
escandalosa.
Estes números escandalosos, de facto, mostram a enorme injustiça do PEC e das suas diferentes versões. Falam por si. Mostram bem, mesmo a quem tivesse alguma dúvida, que interesses serve e defende este Governo, sempre, sempre, de braço dado com o PSD.

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