Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Petição solicitando que recomende ao Governo a alteração de políticas, solidarizando-se para esse efeito com a carta aberta dirigida ao Sr. Primeiro-Ministro, em 29 de novembro de 2012, e subscrita por um vasto conjunto de personalidades

(petição n.º 235/XII/2.ª)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Em primeiro lugar, depois de cumprimentamos os peticionários, gostaria de dizer que esta petição coloca, de facto, muitas das questões que já aqui foram identificadas como mais relevantes, em particular a da desconformidade, da violação dos compromissos eleitorais, por parte dos partidos que suportam o Governo — o PSD e o CDS —, que, reiteradamente, têm vindo a adotar e a apoiar medidas do Governo, em contradição com aquele que foi o seu discurso em campanha eleitoral.
Essa é uma primeira constatação que queremos destacar do texto da petição, a que se segue uma outra constatação, que é a da realidade do País que vivíamos à data da apresentação da petição e que vivemos ainda hoje, de forma particularmente preocupante, com as evidentes consequências desta política, em termos de empobrecimento generalizado dos portugueses e de recessão do País, de desemprego, desmantelamento das funções sociais do Estado, de privatizações, de cortes nos salários e nas pensões e de incentivo à emigração.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, se esta é uma constatação das consequências da política do Governo, a verdade é que sobre esta realidade há perspetivas diferentes, uma das quais em função do posicionamento de classe.
Quero dizer isto, Sr.as e Srs. Deputados, porque este é um elemento preponderante para a análise que cada um dos partidos e cada um dos Deputados desta Assembleia da República faz da situação que estamos a viver. A verdade é que se para os trabalhadores olhar para esta realidade é ver o retrato da ruina das suas vidas, para os banqueiros, para os acionistas dos grupos económicos, para os especuladores, esta é a desgraça alheia com a qual eles continuam a fazer fortuna, porque, Sr.as e Srs. Deputados, a consequência imediata destas políticas do Governo é a de a infelicidade de uns gerar a felicidade de uma meia dúzia. A infelicidade, o desespero e a ruina de uma grande maioria do povo português servem para satisfazer a fortuna e a felicidade de uma meia dúzia que foi enriquecendo, que foi beneficiando destas políticas de concentração do capital!
Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, a primeira conclusão que queremos retirar do debate desta petição é que as consequências destas políticas não são neutras em termos de classe e são, obviamente, díspares em função daqueles que por elas foram penalizados ou daqueles que delas beneficiaram.
Sr.as e Srs. Deputados, ouvimos hoje, através das intervenções dos Srs. Deputados do PSD e do CDS, a concentração das duas cassetes discursivas que a maioria e o Governo têm utilizado — a maioria e o Governo têm duas cassetes discursivas, consoante seja o tema de que se trata.
Quando estamos a falar do ataque aos trabalhadores, do ataque aos reformados, do ataque aos jovens, as bancadas do PSD e do CDS utilizam a cassete do «tem de ser»: «tem de ser porque não temos dinheiro»; «tem de ser porque estamos dependentes»; «tem de ser porque tem de ser».
Mas, quando tratamos de denunciar e atacar aqui os privilégios dos grupos económicos do setor financeiro, o CDS e o PSD utilizam a outra cassete do «tem de ser»: «tem de ser porque tem de ser»; «tem de ser porque são os mercados financeiros que nos impõem as condições de financiamento do Estado»; «tem de ser porque tem de ser».
Ou seja, há duas cassetes que o CDS e o PSD vão utilizando para justificar ora o prejuízo de quem trabalha, ora o benefício de quem acumula capital.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça o favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, ouvimos hoje, nas intervenções do PSD e do CDS, a junção destas duas versões da cassete: a do «tem de ser porque se tem de continuar a penalizar os mesmos» e a do «tem de ser porque esses têm de ser penalizados para continuar a servir os do costume».
Sr.as e Srs. Deputados, temos uma discordância de fundo relativamente à pretensão dos peticionários, que colocam, diria que não ingenuamente, como conclusão da petição a necessidade de o Governo mudar de políticas ou apresentar a sua demissão. Nós não temos ilusões quanto a isso, portanto temos uma discordância em relação ao resultado final de tudo isto.
Sabemos que a conclusão deste processo tem de ser a demissão do Governo, custe o que custar! Sabemos também que o povo português está, e continuará a estar, empenhado na demissão deste Governo.
Sabemos ainda que a demissão do Governo não chega. É preciso mandar embora não só o Governo mas também as suas políticas! É preciso romper com a política de direita, seja ela executada com a desculpa do pacto da troica, seja ela executada com a desculpa de um programa cautelar, …
Sr. Presidente, peço-lhe apenas que me conceda a mesma tolerância que foi concedida aos partidos da maioria.
Concluo, dizendo que é preciso romper com a política de direita, seja qual for o pretexto sob o qual ela é executada, seja o pacto da troica, seja o Programa cautelar, seja o que for!
Da parte do PCP, continuaremos a trabalhar para que se faça essa rutura política de modo a que, de uma vez por todas, tenhamos em Portugal um governo ao serviço dos trabalhadores, do povo e do desenvolvimento do País.

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