Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral, Jornadas Parlamentares do PCP «O Orçamento do Estado e as soluções de que o País precisa»

O Orçamento do Estado e as soluções de que o País precisa

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Este é o momento, na abertura das Jornadas Parlamentares dedicadas ao Orçamento do Estado e às soluções que são necessárias à resolução dos problemas prementes que afectam a vida do povo e do País, para relembrar que o PCP, desde o primeiro momento, afirmou claramente que não alimentava ilusões ou falsas esperanças em relação ao Governo, ao seu programa, às suas opções e a quem servia.

Mais, sempre dissemos que o Orçamento do Estado seria, como o é, mais um instrumento ao serviço dos grupos económicos e financeiros.

Alguns foram considerando como precipitado, mas o tempo foi-se encarregando de demonstrar que afinal, uma vez mais, tínhamos razão.

Um Governo e um Orçamento que, para lá de uma espessa cortina de propaganda e manobras de distracção, prossegue e aprofunda ainda mais a política do governo anterior, de maioria absoluta do PS, política ao serviço dos grupos económicos e financeiros, que agrava as condições de vida, que aprofunda injustiças e desigualdades.

É, aliás, significativo que PSD e CDS continuem a governar e sem nenhuma dificuldade com o orçamento aprovado pelo anterior governo.

E não deixa de ser curioso que o PS, independentemente do que venha a ser a sua votação final, se identifique com a generalidade da proposta do Orçamento.

Para Chega e IL, a voz grossa e o aumento de decibéis têm servido para aparentar diferenças que não existem. 

Estão de acordo em tudo o que é fundamental, separa-os o ritmo com que querem implementar as políticas neoliberais de aumento das injustiças e desigualdades, concentração de riqueza, privatizações e destruição de serviços públicos.

Mas este também é o momento de sublinhar que finalmente há um conteúdo concreto do Orçamento do Estado, e isto é importante porque durante meses se discutiu a forma e, agora que há conteúdo, ainda há quem queira continuar a discutir tudo e mais alguma coisa menos o Orçamento do Estado

O Orçamento que o Governo vem agora propor segue o modo de operar que tem tentado estabelecer.

Muita propaganda, muita diversão, hipervalorização de medidas que foi e é obrigado a tomar graças à luta desenvolvida pelos trabalhadores e por camadas e sectores da população, na generalidade dos casos medidas limitadas que, não resolvendo de facto os problemas, os vão empurrando para um futuro próximo.

Veja-se os insuficientes aumentos do subsídio para as forças de segurança, mas também a contagem de tempo de serviço para os professores, que deixa de fora milhares de docentes que nada irão recuperar ou que irão recuperar apenas parte do que lhes é devido.

É assim com o Complemento Solidário para Idosos, cujas alterações são limitadas e deixam de fora a larga maioria dos reformados e pensionistas. 

Assistimos, por outro lado, à ilusão de intenções em relação a medidas anunciadas para parecer o que não são, que ainda agravarão os problemas, como é o caso do que se propõe no Orçamento para a saúde, para a habitação ou na área da fiscalidade.

A narrativa de que não havendo Orçamento o que nos resta é uma instabilidade caótica, associada a uma outra, de que não há alternativa substancialmente diferente que seja possível, tem contribuído para instalar e cimentar a ideia da inevitabilidade.

Uma ideia que é promovida a par das forças mais retrógradas e reaccionárias, para a elas recorrer caso necessário nesta alternância de rostos e de partidos submissos às orientações da UE, ao serviço do grande capital, de destruição dos serviços públicos, de ataque aos valores de Abril.

Numa altura em que a generalidade dos salários e das reformas são baixos e não respondem às necessidades essenciais dos trabalhadores e dos reformados; numa altura em que se acumulam os ataques aos serviços públicos e se põem em causa direitos fundamentais; numa altura em que se esvaem riquezas do nosso País ao mesmo tempo que se repete a patranha de que não há dinheiro para resolver os problemas e ultrapassar os défices estruturais com que estamos confrontados; fica claro que a instabilidade que existe, aquela que importa, não é uma qualquer eventual instabilidade política, mas uma instabilidade que já é real e que deteriora as condições de vida do nosso povo.

Essa é que se faz sentir, a essa é que é preciso dar resposta.

O que este Orçamento faz é tentar travar o aumento dos salários, atirar para o fim da legislatura o que deveria ser fixado já em Janeiro, apontando para um aumento na Função Pública abaixo da inflação prevista para 2025, e limita o aumento das pensões de reforma, optando por medidas pontuais e insuficientes, quando 1 milhão de reformados recebe menos de 510 euros por mês.

O que faz é canalizar para os grupos privados o investimento, os meios e os profissionais que tanta falta fazem ao Serviço Nacional de Saúde. Nenhuma propaganda faz apagar que cerca de metade dos 16,7 mil milhões de euros previstos para a saúde vão para os grupos económicos que ganham com o negócio da doença. 

Prevendo inclusivamente que centros de saúde possam ser geridos por privados, num claro benefício para quem faz da doença um negócio, num novo e perigoso passo em direcção à privatização e consequente desmantelamento dos cuidados de saúde.

Só em parcerias público-privadas, não só na saúde como também na ferrovia e na rodovia, prevê desviar 1538 milhões de euros para os grupos económicos.

O que este Orçamento faz é manter sem resposta as reivindicações dos professores, continuando a contribuir para o abandono da profissão e para o enfraquecimento paulatino da Escola Pública.

O que faz é manter os problemas no acesso à habitação, mantendo inaceitáveis favorecimentos à banca e aos fundos imobiliários, enquanto milhares de famílias são apertadas por prestações ou por rendas incomportáveis.

O que faz é continuar a deixar milhares de crianças de fora da creche gratuita, porque se recusa a implementar uma rede pública de creches e a criar vagas suficientes.

O que faz é continuar a empurrar milhares de jovens para fora do País porque se recusa a dar-lhes condições para aqui viverem, trabalharem ou estudarem.

O que faz é persistir nos crimes económicos das privatizações, como é o caso da TAP, ou na cínica degradação das empresas públicas como querem fazer na RTP.

O que faz é aprofundar ainda mais a injustiça fiscal, com 1800 milhões de euros em benefícios fiscais, que favorecem sobretudo 0,1% das empresas, grandes empresas, com lucros milionários. 

A verdade é que as medidas de que o País precisa não as encontramos nesta proposta de Orçamento do Estado, mas lá estão de facto as medidas que servem aos grupos económicos e financeiros, medidas a que nem Chega, nem a IL, nem tampouco o PS, se opõem. 

Ao mesmo tempo que com todo o cinismo se afirma que os recursos são limitados, transferem-se milhares de milhões de euros de recursos públicos para os grupos económicos e financeiros.

Como sempre dissemos, e continuamos a dizer, esses recursos existem. 

E o seu valor será ainda maior se usado para aumentar salários e pensões e fomentar o mercado interno.

Quando forem usados para substituir importações por produção nacional, como nos alimentos, medicamentos ou meios de transporte que tanta falta fazem.

Quando forem usados para assegurar uma gestão equilibrada das contas públicas, combatendo o desperdício, a corrupção e a cedência aos grandes interesses.

Quando forem usados para tributar o grande capital, o património de elevado valor e o luxo.

Quando forem usados para se apostar no crescimento económico, reduzindo também a dívida por essa via, em vez de sacrificar investimento e serviços públicos como está a acontecer.

O que precisamos é de uma política, de opções e de um orçamento que respondam às reivindicações, aos anseios do nosso povo e dêem resposta aos seus problemas que se vão acentuando cada vez mais. 

Nas jornadas parlamentares que agora iniciamos, vamos denunciar e demonstrar as opções erradas da política de direita, mas acima de tudo vamos construir e afirmar as soluções, as medidas e as respostas que se exigem.

Vamos discutir com outros os conteúdos e as saídas, vamos afirmar o caminho que responde aos interesses e direitos dos trabalhadores, do povo, da juventude e do País.

O caminho do aumento dos salários e das reformas; da valorização do SNS, da escola pública, dos serviços públicos, o caminho do acesso à habitação, à creche e ao pré-escolar; o caminho da valorização da produção nacional, do investimento público e do desenvolvimento económico.

O caminho que garanta aos jovens as condições para aqui viverem, estudarem e trabalharem. 

O caminho de mais justiça fiscal e de valorização das micro, pequenas e médias empresas.

O caminho ao serviço de quem trabalha e trabalhou uma vida inteira e que dê combate às injustiças e desigualdades e trave a subordinação do País aos interesses dos grupos económicos e às ordens da União Europeia.

O facto de este ser um Orçamento desejado pelo grande capital garante-lhe que, para lá do Governo, outros se mostrem disponíveis para o aprovar. Da parte do PCP votaremos contra. Votaremos contra as injustiças e desigualdades que o Orçamento contém. Votaremos contra a transferência de milhares de milhões de euros de recursos públicos para os bolsos do capital. Votaremos contra a política de baixos salários e degradação dos serviços públicos, de privatizações e concessões. Votaremos contra porque nos opomos a este Governo e à política de direita. E votaremos contra porque sabemos que há alternativa.

Um outro caminho, um outro orçamento, uma outra política é possível, é necessária e é urgente.

O PCP aqui está, não apenas a denunciar as opções deste Governo vertidas nesta proposta de Orçamento. 

Aqui está a afirmar essa alternativa e determinado na mobilização dos trabalhadores e do povo para abrir o caminho para a pôr em prática.

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