O Conselho Europeu de Estocolmo<br />Conferência de Imprensa do PCP

O Conselho Europeu de Estocolmo Vai iniciar-se amanhã a Cimeira da Primavera, em Estocolmo, sob a presidência sueca da União Europeia, onde irá ser feito o balanço da chamada "estratégia de Lisboa", um ano após a Cimeira aqui realizada durante a presidência portuguesa.1. Ora, como é conhecido, na Cimeira de Lisboa, além de ser definido o novo objectivo estratégico de tornar a União Europeia "o espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo", foram tomadas decisões em três áreas essenciais:

  • acelerar a liberalização, através das respectivas privatizações, em áreas como o gás, a electricidade, os serviços postais e os transportes, além de dever concluir a plena integração e liberalização dos mercados de telecomunicações até ao final de 2001, definir até ao final de 2000 uma estratégia para a supressão dos obstáculos aos serviços, avançar na integração dos mercados financeiros e criar um quadro legal para os contratos públicos com entrada em vigor antes de 2002;
  • intervir na área social, reconhecendo que a União Europeia, na década de noventa, ao dar particular importância à criação da união económica e monetária, visando a introdução do euro, menosprezou a área social, pelo que se distanciou da coesão económica e social, mantendo um nível elevado de desemprego e cerca de 65 milhões de pobres, o que foi considerado como inadmissível, face à pressão cada vez maior da luta dos trabalhadores. Daí a decisão de apresentar uma Agenda Social Europeia, de elaborar um programa comunitário de incentivo à luta contra a pobreza e de fixar objectivos, de reelaborar uma estratégia europeia de emprego com o objectivo de atingir o pleno emprego e de modernizar o modelo social europeu;
  • criar o novo método aberto de coordenação, simultaneamente com o reforço do papel de orientação e coordenação desempenhado pelo Conselho Europeu, designadamente através da realização dos Conselhos da Primavera, onde se pretende fazer a análise da evolução conseguida, socorrendo-se do apoio de indicadores estruturais que, entretanto, foram elaborados.
2. É, pois, tendo por base aquelas conclusões que a Comissão Europeia apresentou um documento que será analisado em Estocolmo a partir de amanhã. Ora, as orientações constantes do documento da Comissão, destinado a preparar o Conselho Europeu de Estocolmo, insistem na prioridade à conclusão do mercado interno através da aceleração do processo de liberalização, ao reforço dos mercados financeiros mediante a instituição dos fundos de pensões, ao aumento da competitividade das empresas assente na redução dos custos salariais, na flexibilidade e na mobilidade do trabalho. Eis os aspectos mais significativos de cada uma destas áreas:
  • aceleração do processo das liberalizações com aumento do processo de concentração e centralização dos grupos económicos e financeiros, fazendo pressão sobre sectores historicamente ligados ao sector público.
Para a Comissão Europeia não basta que já tenham avançado as liberalizações no comércio electrónico, que haja uma concorrência acrescida nos serviços locais de telecomunicações, se tenha concretizado a primeira etapa de liberalização dos caminhos de ferro. Critica os avanços lentos na liberalização dos serviços postais, dos sectores do gás e da electricidade, do transporte de passageiros e do frete ferroviário interior e deseja que antes de 2004 haja a criação de um céu único europeu. De facto, pretende que se transformem os chamados "monopólios estatais" em monopólios privados.Mas, entretanto, já estão no PE novas propostas de liberalização, designadamente, dos transportes terrestres de passageiros e dos serviços portuários de natureza comercial. Em todos os casos, estas propostas são acompanhadas de maior precariedade no emprego, ataques aos direitos dos trabalhadores, incluindo ao emprego, e, em geral, de serviços de pior qualidade ou mais caros pondo em causa a satisfação das necessidades básicas das categorias mais vulneráveis da população. Esta pressão liberalizadora está presente noutros sectores públicos essenciais como a água, o tratamento de resíduos e a saúde. Simultaneamente, avança a pressão para a dinamização dos fundos de pensões profissionais, a criação de um mercado único para as reformas complementares e uma tentativa de alguma privatização dos sistemas de pensões nacionais com o objectivo de criar novas formas de financiamento dos mercados financeiros e da especulação bolsista, enquanto se prepara a sua integração, através da fixação de um calendário, de forma a garantir a execução do plano de acção dos serviços financeiros até 2005.. na área social não avançaram as principais iniciativas legislativas previstas na Agenda Social, designadamente as que previam o reforço dos direitos individuais e colectivos dos trabalhadores e a melhoria das suas condições de trabalho, como, aliás, referiu o próprio presidente da comissão parlamentar do emprego e assuntos sociais e a ministra francesa dos assuntos sociais. Por exemplo, enquanto avançaram com o estatuto da sociedade europeia deixaram para trás a possibilidade de intervenção dos conselhos de trabalhadores nessas sociedades, separando assim a revisão da directiva de consulta dos trabalhadores do processo de regulamentação do estatuto da empresa europeia.Por outro lado, as políticas sociais e de emprego continuam estritamente subordinadas à observância do Pacto de Estabilidade, o que põe em causa os objectivos de emprego de qualidade e com direitos. Apesar da conjuntura económica favorável, a criação de emprego foi diminuta e, no fundamental, precária, subordinada a linhas directrizes cujos princípios orientadores são a empregabilidade e adaptabilidade das pessoas numa filosofia de responsabilização individual (e não social) pelos problemas do emprego e do desemprego. E o apoio financeiro para a antiga " iniciativa para o emprego" foi transformada em "programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial (2001-2005)".Entretanto o desemprego de longa duração e a exclusão social mantêm-se muito elevados, afectando em especial mulheres e jovens, e a exclusão social atinge cerca de 65 milhões de pessoas, o que resulta não só do atraso na implementação de medidas de combate à exclusão social e pobreza e das políticas dominadas pela ideologia neoliberal que consideram que o problema do desemprego resulta da insuficiente flexibilização do mercado de trabalho e dos custos do trabalho, insinuando que há custos excessivos com a protecção social. Por exemplo, o programa de que sou relatora pelo PE ainda não está aprovado porque o Conselho recusou propostas importantes do PE e os objectivos já fixados para a luta contra a exclusão são muito gerais, embora se deva dar toda a atenção à elaboração e execução dos planos nacionais que cada país deve elaborar até junho.Está, pois, claro que a chamada "modernização do modelo social europeu" nos documentos da Comissão Europeia visa, por um lado, tentar privatizar partes rentáveis da segurança social e, por outro lado, através do que chamam "equilíbrio entre flexibilidade e segurança" prosseguir com a desregulamentação laboral, flexibilização dos despedimentos, moderação salarial e alterações no processo de formação dos salários, o que só será travado com a luta dos trabalhadores e seus aliados. Como as recentes fusões e concentrações de empresas e grupos económicos internacionais nas áreas financeira, industrial e de serviços têm demonstrado, há cada vez maiores pressões sobre os trabalhadores, incentivando à saída precoce do mercado de trabalho, com novas ameaças de despedimentos e mais desemprego, mesmo que sob o pretexto da necessidade do aumento da produtividade e da competitividade, de que são exemplo as multinacionais J.C. Clark, Simens, ABB, as preocupações crescentes com a Auto-Europa e a Lear, os sucessivos despedimentos de empresas nacionais como a Lisnave, Setenave e Siderurgia, a liquidação da EPAC e da Silopor, e tantas outras tentativas, bem elucidativos da estratégia que o capitalismo está a seguir nos diversos países da União Europeia. Para obter cada vez maiores lucros, concentram-se, fundem-se, despedem trabalhadores, deslocalizam fábricas para países onde podem continuar a pagar salários mais baixos, exercem pressões e fogem ao cumprimento da legislação laboral.Breves conclusões. Afinal a fraseologia da "inovação, do conhecimento e do pleno emprego" tão propagandeada pelo Governo do eng. Guterres, não passou de uma cortina de fumo para escamotear as reais intenções da Cimeira de Lisboa de há um ano: acelerar privatizações de sectores e serviços básicos, insistir em novas tentativas de redução da protecção social com o argumento de que é necessário impedir aumentos de custos, enquanto surgem novas benesses para o capital, sob o pretexto da necessidade do aumento da competitividade, ou seja, acelerar o processo de integração económica capitalista da União Europeia, favorecendo o dumping social, fiscal e ecológico, enquanto os lucros não cessam de crescer.
  • A manutenção do pacto de estabilidade, a prioridade ao cumprimento dos critérios de convergência nominal e às políticas monetaristas, e a aceleração das privatizações secundarizando o objectivo da coesão económica e social, acabou por subordinar as políticas de emprego e a dimensão social da UE às políticas económico-financeiras e à consolidação do mercado interno em todos os domínios. É necessário seguir uma via de ruptura com estas políticas, atacando resolutamente as causas do desemprego, da precariedade, das discriminações e da pobreza.
  • É preciso ultrapassar o défice de emprego a partir de um desenvolvimento duradouro e da promoção de um modelo social que proteja e desenvolva as conquistas e os direitos sociais, incluindo a diminuição do horário de trabalho com manutenção dos salário e sem precarização do emprego.
  • Com novas políticas é possível acabar com o desemprego. É essencial proclamar a tolerância zero para o desemprego, os acidentes mortais de trabalho, a precariedade, os baixos salários e reformas e o dumping social.
Para conseguir avançar na coesão económica e social, com o objectivo de fazer do progresso social e do emprego os motores de um novo tipo de desenvolvimento no quadro de uma Europa social, solidária e democrática, de responder às aspirações dos cidadãos e ter em conta as reivindicações dos trabalhadores e das suas organizações de classe, é fundamental que se adoptem novas políticas macro-económicas de desenvolvimento económico sustentado que respeitem o ambiente e tenham como objectivo atingir o pleno emprego nos próximos anos, criando empregos de qualidade e com direitos, designadamente através da dinamização da procura pelo reforço do poder de compra da população, do aumento dos salários e das pensões e reformas, e do relançamento de investimentos públicos e sociais na educação, saúde, apoio à infância e pessoas dependentes, transportes, urbanismo e habitação social, com serviços públicos dinâmicos, fundamentos de uma sociedade fundada sobre o progresso social.Mantêm-se, pois, actuais, no fundamental, as propostas contidas na Declaração do Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda verde Nórdica divulgadas em Lisboa há uma ano.

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