Pergunta ao Governo N.º 1656/XIV/1

Situação do sector da gestão de resíduos face à pandemia associada à COVID-19

Destinatário: Ministro do Ambiente e Ação Climática

A situação de pandemia associada à doença provocada pelo novo Sars-Cov-2, coloca desafios não antes sentidos no País, com repercussões nos diferentes sectores da actividade humana. A evolução da progressão da COVID-19 mostram que, para além das medidas necessárias para responder aos muitos infectados, será necessário adoptar as medidas para contenção da doença, quebrando os mecanismos da sua disseminação pela população, nomeadamente através daqueles que se encontram mais expostos à infeção.

Como o PCP tem vindo a afirmar e a defender, as medidas que têm de ser implementadas, precisam de ser acompanhadas por outras que garantam a manutenção dos postos de trabalho, os rendimentos da população, a salvaguarda das pequenas e médias empresas e a manutenção das actividades produtivas e a manutenção de serviços públicos essenciais.

Entre os serviços públicos essenciais, cujo funcionamento não pode parar, merece referência a recolha e tratamento de resíduos, sector em que os trabalhadores podem estar particularmente expostos a fontes de contágio da COVID-19.

Tendo presente as características deste serviço público, a Agência Portuguesa do Ambiente apresentou um conjunto de recomendações e orientações visando garantir a proteção da saúde pública, dos trabalhadores e prevenir a disseminação da doença, compatibilizando-a com a necessidade de uma gestão eficaz e eficiente dos resíduos.

Neste âmbito, no que respeita à gestão de resíduos produzidos nos domicílios e alojamentos locais foram estabelecidas orientações diferenciadas para situações em que haja suspeita de infecção por COVID-19, recomendando-se que neste caso os resíduos devem ser colocados em sacos de lixo resistentes e descartáveis e serem depositados no contentor de resíduos indiferenciados, não devendo ser realizada a recolha seletiva, devendo os resíduos recicláveis ser depositados com os resíduos indiferenciados e nunca no ecoponto.

Nos casos em que não existe suspeita ou confirmação de infeção por COVID-19 é recomendado que a recolha seletiva seja mantida, evitando sobrecarregar os tratamentos de destino final incineração e aterro. Porém as luvas, máscaras e outros materiais de proteção, mesmo que não estejam contaminados, não devem em caso algum ser colocados no contentor de recolha seletiva nem depositados no ecoponto, devendo ser encaminhados com a recolha indiferenciada em saco bem fechado.

Contudo, sabendo que neste momento não há um rastreio massivo da população para detecção de infecção por COVID-19, que muitas vezes a infecção não provoca manifestações facilmente identificáveis, com relato de muitas situações assintomáticas, não há qualquer garantia de que os resíduos produzidos nos domicílios estejam a ser devidamente acondicionados e encaminhados para recolha, salvaguardando a saúde pública e a saúde dos profissionais.

É também recomendado pela APA que os Sistemas de Gestão de Resíduos Urbanos procedam ao encaminhamento dos resíduos indiferenciados, diretamente e sem qualquer tratamento prévio que possa romper os sacos com material potencialmente contaminado, preferencialmente para incineração, ou para aterro, sendo de encerrar o tratamento mecânico de resíduos indiferenciados, reduzindo assim a exposição dos trabalhadores destas unidades.

A APA define ainda que no caso dos resíduos colocados em aterro, seja aumentada a frequência de cobertura dos mesmos, a qual deve ser efetuada no mais curto espaço de tempo possível no mínimo, diária e que a frequência de higienização de contentores e veículos de recolha seja aumentada, sendo no último caso realizada com recurso a um desinfetante, no mínimo após cada jornada de trabalho.

Quanto às unidades de triagem, a APA estabelece que, quando não for possível assegurar o armazenamento dos resíduos por períodos de pelo menos 72 horas previamente à submissão a esta operação, a mesma só deve ser realizada apenas em modo automático, sem intervenção manual, de modo a proteger os trabalhadores de potenciais contaminações.

Apesar das recomendações efectuadas, surgem dúvidas quanto ao seu escrupuloso cumprimento por todas as entidades gestoras de resíduos, já que a prática tem vindo a demonstrar que em termos operacionais, muitas vezes as boas práticas não são cumpridas, situação que fica desde logo plasmada nos resultados publicados quanto aos ciclos de avaliação da qualidade do serviço dos sistemas de gestão de resíduos urbanos.

São também relativamente frequentes as queixas das populações presentes na envolvente de aterros sanitários quanto à perceção de odores, o que, de alguma forma, indicia dificuldades de operação potencialmente relacionadas com uma deficiente cobertura diária dos resíduos depositados, com material inerte.

Quanto aos trabalhadores envolvidos nas operações de recolha e tratamento de resíduos, sendo certo que estes devem cumprir escrupulosamente as medidas de segurança, nomeadamente em termos de higiene e utilização de equipamentos de proteção individual (EPI), importa referir que as dificuldades quanto à disponibilidade destes equipamentos, pode causar problemas em termos de salvaguarda da saúde destes trabalhadores.

Para além dos elementos anteriormente referidos, é também motivo de preocupação a questão do movimento transfronteiriço de resíduos. Portugal tem vindo, de forma crescente, a receber resíduos provenientes de outros países, parte dos quais são submetidos a processos de tratamento mecânico e a deposição em aterro. Num cenário em que a infecção se encontra disseminada no mundo, este movimento de resíduos pode vir a constituir mais um mecanismo de disseminação da doença, pelo que deve estar acautelado que não são recebidos em Portugal resíduos que possam constituir meio de propagação deste vírus.

Com este enquadramento e ao abrigo das disposições legais e regimentais, solicita-se ao Governo que, por intermédio do Ministro do Ambiente e da Ação Climática nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:

  1. Tendo em conta que as recomendações e orientações da APA no que concerne à gestão de resíduos não foram amplamente difundidas pela população, considera o Ministério do Ambiente proceder, com urgência, à realização de uma campanha informativa para que a população em geral possa agir em conformidade com estas recomendações, nomeadamente no que respeita à recolha de resíduos?
  2. Considerando que haverá um número de casos positivos de COVID-19 que não estão identificados devido a não terem associadas sintomatologias específicas, entende o Governo ser necessário suspender a recolha selectiva de resíduos urbanos domésticos como forma de prevenir eventuais focos de infecção desconhecidos?
  3. Que medidas estão a ser tomadas para alertar para a necessidade de assegurar que os procedimentos de higienização de contentores e veículos de recolha estão a ser realizados com a periodicidade adequada à situação de pandemia que vivemos?
  4. Que conhecimento tem o Governo da suspensão dos processos de tratamento mecânico de resíduos indiferenciados? Todas as entidades gestoras que operam unidades de tratamento mecânico de resíduos suspenderam o seu funcionamento?
  5. Estão a ser reforçadas as ações inspetivas às infraestruturas de deposição de resíduos para as quais tenham já anteriormente sido identificadas situações de operação deficiente, nomeadamente no que respeita à aplicação diária de material inerte de cobertura nas células em exploração? Que acções de inspecção foram realizadas desde que foram apresentadas as recomendações da APA sobre este assunto?
  6. Que medidas estão a ser tomadas para garantir a manutenção das actividades fundamentais, sejam elas de produção, de comércio ou de prestação de serviços, com níveis de protecção sanitária dos intervenientes, compatíveis com as exigências do actual quadro de pandemia?
  7. Se se registarem quebras acentuadas dos stocks de materiais de protecção individual para os trabalhadores do sector da gestão de resíduos, que medidas de contingência serão tomadas pelo Governo para assegurar a manutenção do funcionamento destes serviços essenciais sem por em causa a saúde dos trabalhadores e população?
  8. Está actualmente suspenso o Transporte Transfronteiriço de Resíduos, como forma de prevenir a propagação de COVID-19 através deste circuito?
  9. A não estar suspenso o Transporte Transfronteiriço de Resíduos, tem o Governo conhecimento dos resíduos que têm sido transferidos para Portugal vindos de outros países? Que medidas de contenção e de salvaguarda da propagação da COVID-19 por gestão de resíduos provenientes de outros países estão a ser tomadas?
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