Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados
O projecto de resolução relativo à apreciação parlamentar da participação de Portugal na União Europeia - e que aborda o 14.º ano de integração - apresenta uma formulação que é, de uma forma geral, factual e descritiva e, portanto, relativamente consensual quanto aos temas que aborda.
Os termos deste projecto são prudentes e, diria mesmo, discretamente laudatórios, designadamente quando abordam os resultados da negociação da Agenda 2000 e as respectivas repercussões na recuperação dos atrasos estruturais relativos a Portugal. São igualmente prudentes os seus termos quando comentam a intervenção da Assembleia da República no acompanhamento do processo de integração que, em nossa opinião, importa, de facto, reforçar.
Mas, sublinhe-se, o diploma em apreciação também é crítico, em especial quando refere a necessidade de serem adoptadas políticas que possam contribuir para a convergência real. De facto, esta constatação é tanto mais importante quanto, actualmente, se verifica que existe uma paralisação e um retrocesso no processo de convergência real. Importa, assim, que volte a ser central um objectivo - o da coesão económica e social - que aparece cada vez mais virtual nas orientações e nas políticas nacionais e comunitárias.
O projecto de resolução não pode, porém, Sr.as e Srs. Deputados, ser analisado de forma isolada e desligada do relatório que o enforma, e aí é que «a porca torce o rabo!», como costuma dizer-se.
O relatório aborda questões que ocorreram ao longo de 1999, insistindo em tónicas parciais, em abordagens limitadas e mesmo partidarizadas, em análises que não se coadunam com os interesses políticos, económicos e sociais de Portugal. Vou dar três exemplos apenas.
Em primeiro lugar, é citada a questão da Agenda 2000 sem abordar nem questionar a questão central da determinação dos meios financeiros necessários para continuar a enfrentar os problemas da coesão e do desenvolvimento económico e social numa Europa a 25, a 27 ou a 30.
Em segundo lugar, no relatório, foge-se, «como o diabo da cruz», a enfrentar as razões profundas que levaram, em 1999, à demissão da Comissão Europeia. Sobretudo, não se aborda o posicionamento do Governo nem das forças políticas maioritárias nesta Câmara quando defenderam que a Comissão Europeia se deveria manter, apesar do inegável rol de factos que comprovavam o compadrio, o nepotismo e a corrupção no seio do Colégio de Comissários.
Finalmente, o relatório consegue este fenómeno exemplar: refere-se, e cito, ao «problema do Kosovo», «aos acontecimentos do Kosovo» e à «busca de soluções para o Kosovo», cometendo a proeza de nunca referir, nem uma vez!, a guerra no Kosovo nem a NATO, quanto mais a agressão militar ocorrida em 1999 e na qual Portugal, infelizmente, participou sob a égide e patrocínio do nosso Governo.
Apesar das referências que se fazem à questão de Timor e ao processo da transferência de Macau para a China, entre outros, não podemos, naturalmente, subscrever o relatório em discussão.
Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, aproveito para referir uma questão de actualidade. Nas últimas semanas, esta Casa debateu, em dois momentos, a questão relativa à Cimeira de Nice. O PCP interveio nela de uma forma clara nos diversos momentos em que o debate se processou e, na semana passada, tivemos mesmo oportunidade de, usando alguma terminologia desportiva, dizer que, no intervalo dos trabalhos de Nice, Portugal «perdia por 5 a 0», mas, na segunda parte, conseguimos marcar o «golo de honra», minorando a «goleada»!
Só que parece que as notícias de ontem e de hoje informam, de um modo pouco transparente e pouco criterioso, que existem diversas interpretações sobre o que, de facto, ficou decidido em Nice.
Alguns tentam anular, na secretaria, o «golo de honra» que tínhamos obtido. Os grandes querem mesmo passar a decidir sozinhos, parece!
Importava que a Assembleia tomasse perfeito e completo conhecimento do que está a passar-se relativamente às interpretações diferenciadas do que foi decidido em Nice. Importava que o Governo informasse os Deputados e o País do que está em jogo e se vai haver uma cimeira extraordinária ainda antes do réveillon.
Este podia ser, devia ser, o momento de o Governo informar o País do que está a passar-se.