[Excertos]
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É uma realidade que o prosseguimento acelerado da política guiada pelo espartilho dos critérios de Maastricht assente nos dogmas neoliberais, tem travado o crescimento económico do País e fragilizado o aparelho produtivo nacional com os consequentes despedimentos e o aumento do desemprego, que as manipulações estatísticas não conseguem disfarçar.
É uma realidade que o cumprimento dos chamados critérios de convergência nominal se opõem ao cumprimento do princípio da coesão económica e social, e são um factor de instabilidade e degradação social no nosso País e na União Europeia.
Ontem, o presidente do PSD afirmou que o Governo pratica uma política de confidencialidade sobre as questões europeias e a moeda única, o que é uma realidade.
Mas então porque razão é que o PSD fez um acordo de revisão constitucional com o PS que não permite que se faça um referendo sobre a moeda única?
Se o PSD está contra a confidencialidade, porque razão é que não quer que seja o povo a decidir?
O PSD e o PS sabem muito bem que um referendo sobre a moeda única permitiria o debate contraditório, a difusão da informação e a participação popular, pondo fim à confidencialidade e à marcha silenciosa para a moeda única que, no fundo, tanto um como outro, defendem.
O PSD e o PS sabem que o caminho para a moeda única é o caminho de mais austeridade e mais desemprego e, por isso andam no jogo do empurra, no jogo do endosso das responsabilidades e da autodesculpabilização.
Se quisessem acabar com a confidencialidade, com a política dos factos consumados, não só estariam a favor de um referendo sobre a moeda única, como seriam os primeiros a dar o seu acordo a debates interpartidários com diversos responsáveis, e com a maior cobertura mediática possível.
Se a preocupação do PSD com a confidencialidade é verdadeira, então proponha ou dê o seu acordo à realização de debates, numa ou em mais que uma estação televisiva, com os partidos que têm assento na Assembleia da República!
A passagem à moeda única não é nem pode ser uma questão somente para especialistas.
Pelas suas consequências na vida de todos e de cada um, pelo seu significado e implicações, ela deve ser colocada à apreciação, ao debate e ao juízo da opinião pública.
A posição dos partidos não nos dá o resultado de um referendo. O PS anda agora a divulgar a sua proposta de duplo referendo. Mas, ao contrário do que alguns têm noticiado, o PS não propõe um referendo sobre a moeda única mas apenas um referendo sobre (questões marginais), alguns aspectos da integração europeia, o que é uma mistificação. É apenas uma manobra, para dizer que não está contra um referendo sobre a moeda única e a União Económica e Monetária, que são as questões determinantes.
Uma política inaceitável
O Governo PS tem andado a vender os anéis para cumprir antecipadamente os critérios de Maastricht.
Enquanto houver património, enquanto houver anéis, vai havendo dinheiro para cumprir os desígnios de Maastricht.
É uma política inaceitável.
Com o leilão, o desbaratamento das empresas públicas, não só a economia se vê privada do controlo de importantes alavancas como, com as negociatas, se acelera a política de concentração da riqueza com o dinheiro dos contribuintes.
O caso da Lisnave é paradigmático.
Não se está apenas perante uma privatização com os saneamentos prévios e outras benesses por conta do Estado.
Com efeito, neste caso, nem tudo é privatizado. Cria-se uma empresa de capitais públicos - a Gestnave - que disporá do pessoal que restar depois da operadora, ou seja, a Lisnave Infraestruturas, S.A., ter procedido à escolha dos 1339 trabalhadores que entende necessitar. Restarão cerca de 2400 trabalhadores para a Gestnave.
Fica assim constituída na Gestnave um reserva de mão-de-obra a que a Lisnave recorrerá quando precisar, correndo todos os encargos por conta do Estado. Taxa de desemprego para a Lisnave, 0%; para o Estado, logo se verá.
Parece poder perspectivar-se a criação de uma Lisnave com um quadro de pessoal que os técnicos terão avaliado ser o adequado para a conjuntura actual; que irá dispor de um estaleiro onde irão ser dispendidos, no mínimo, 15 milhões de contos para o modernizar.
A Lisnave terá associado o Grupo Thyssen com uma participação no capital social de 20% que parece poder contribuir para uma maior segurança na carteira de encomendas. Disporá ainda, como se disse, de uma bolsa de trabalho sem encargos para utilização nos períodos de pausa.
Como já alguém disse, este é um verdadeiro totoloto oferecido aos Mello ou, como disse também, um liberal conhecido escandalizado com tal negociata: «Desta forma praticamente gratuita o Grupo Mello adquire, passando para a nova empresa de reparação aquilo que de melhor existe na Lisnave - a sua marca, os estaleiros, o melhor pessoal, os seus contratos - assumindo, em contrapartida, apenas os passivos correntes».
E assim, o Governo PS, com a sigla PS, com o nome de socialista, quer proceder a um programa de privatizações que ninguém, nem um liberal por mais radical que seja, desdenharia.
Mas há uma outra questão que nesta caminhada tem sido silenciada. Refiro-me ao Pacto de Estabilidade que o Governo assinou, em nome de Portugal, sem qualquer consulta prévia ao País, ou debate público.
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Ao contrário do que se quer fazer crer, há outros caminhos para a construção de uma União Económica e Monetária, há outros caminhos que passam pelo reforço do orçamento comunitário, pela cooperação, pela complementaridade das economias, pelo diálogo das culturas, pela concretização do princípio da coesão económica e social.
É possível uma outra construção europeia, de paz e cooperação, de codesenvolvimento, que faça do princípio da coesão económica e social o seu primeiro objectivo, que ponha em primeiro lugar o emprego e a convergência real das economias, e não a convergência nominal.
Uma Europa plural que ataque um dos seus mais graves problemas: o desemprego, o que passa por uma verdadeira cooperação monetária, pelo reforço do orçamento comunitário, pelo financiamento de projectos comuns, pelo aproveitamento dos recursos de cada país e pela solidariedade recíproca.
Uma Europa social, harmonizando por cima, em vez de nivelar por baixo, ou pelo nível dos países do Terceiro Mundo, as conquista sociais.
E é neste caminho que empenhamos as nossas forças. (...)