A União Bancária e a conclusão da UEM
Estivemos há algumas semanas nos estaleiros do Mondego onde uma empresa de capitais portugueses procura relançar o setor da construção e reparação naval, tentando juntar os cacos que restam do longo processo de de destruição de um setor Vital da nossa economia e que foi completamente aniquilado pelas políticas da UE. Entre os diversos problemas que nos forma colocados pela administração da empresa, destacou-se a questão do financiamento como a questão chave que condiciona a atividade da empresa e impede a consolidação de uma carteira de encomenda que lhe de um horizonte de estabilidade. Como é sabido a construção naval implica um longo ciclo produtivo, durante o qual é necessário avançar com enormes recursos financeiros a fornecedores e trabalhadores. Serve este exemplo para ilustrar o fosso existente entre a realidade concreta da economia e a propaganda da UE que nos procura vender uma Europa de futuro, dirigida para os cidadãos, para as PMEs. Uma Europa na qual o Plano Juncker estaria a inundar os países e as empresas com créditos e garantias para estimular o investimento. Uma Europa com a União Bancária destinada a dar mais robustez ao sistema financeiro e por os bancos a dinamizar a economia. Como vimos e observamos todos os dias, estes são os embustes que nos são impingidos há já várias décadas. Mas cada vez menos conseguem disfarçar a realidade.
Mas hoje, infelizmente , e apesar das evidências, o que preenche a agenda da UE não é um parar para pensar, refletir sobre o passado, avaliar as suas políticas e considerar alternativas. Antes pelo contrário. O que as instituições da UE estão neste momento é fazer é pegar na crise e nos seus sintomas, que são evidentes e não podem ser escondidos, e justificá-los com o caráter incompleto de pilares fundamentais da integração europeia. E portanto, o discurso da UE, retomado num grande coro muito bem afinado que inclui a direito do PP, os liberais, a social democracia mas também os verdes e até parte da dita esquerda radical, consiste na necessidade de acelerar e aprofundar o processo de integração capitalista da UE. E neste quadro que surge o documento dos cinco presidentes que aponta o caminho da conclusão da UEM e da União Bancária e que lança o livro Branco hoje em discussão.
Completar a UEM
A UEM ou o euro, sendo reconhecidamente um fracasso em termos económicos, foi sem dúvida um grande sucesso do ponto de vista dos seus grandes objetivos subjacentes. Com efeito, a moeda única, ao contrário das grandes proclamações panfletária que profetizavam uma era de desenvolvimento e prosperidade para todos, foi, de facto, um instrumento de divergência social económica, cavando o fosso entre ricos e pobres que supostamente deveria ter mitigado. No entanto, para o PCP que, desde a primeira hora denunciou o caráter de classe da UEM, importa reconhecer que o euro cumpriu o seu papel de domínio sobre as soberanias nacionais, impondo a agenda neoliberal da UE. Privando os países da sua capacidade de emissão monetária, lá foi impondo as privatizações, as ditas reformas estruturais e os ataques às funções sociais do estado.
Desde da criação do euro, com o tratado de Maastricht, assistimos a várias reformas, todas elas destinadas a cercear a autonomia dos estados na sua política orçamental e através desta em praticamente todas as outras. Tivemos o pacto de estabilidade em 1997 e depois eu 2010, na sequência da crise de 2008, um enorme avanço ao nível da governação económica e do reforço do pacto de estabilidade. Na sequência destes avanços, temos hoje um escrutínio permanente sobre as nossas contas públicas e sobre á elaboração do orçamento de Estado. Todos nós recordamos o episódio das sanções em 2016. Hoje a chantagem continua, com tudo suspenso sobre a saída do Procedimento por défice Excessivo, ao qual se soma o pedido do BCE para que se aplique o procedimento por desequilíbrios macroeconómicos.
É evidente que expressão completar a UEM tem um valor mais ou menos simbólicos, porque o processo não para, prossegue, com fases mais aceleradas ou mais lentas. Estamos ainda numa fase de consolidação das grandes reformas de 2010, com acertos que resultam muitas vezes de pressões de alguns governos ou de evidências sobre o caráter contraproducente de determinadas medidas. Tal foi o caso de alguma flexibilidade introduzida nas regras, que não passam, na verdade de mera cosmética. Contudo, o relatório dos cinco presidentes aponta para avanços concretos para os quais devemos estar atentos.
Sublinho duas tendências. A primeira procura despolarizar partes crescentes do processo orçamental, com a introdução de peritos, alegadamente neutros politicamente, mas certamente muito competentes da técnica de impor o neoliberalismo em todas as esferas da economia. Tal e o caso dos conselhos nacionais para a competitividade (junta-se ao conselho das finanças públicas) e do conselho fiscal europeu. A segunda tendência pretende agregar os países da zona euro à volta de um único ministro das finanças a tempo inteiro, com um tesouro e uma espécie de fundo monetário Europeu. Muitos economistas são facilmente seduzidos por esta medida, aderindo a esta ideia que a UEM está coxa e precisa de uma capacidade orçamental para poder corrigir os choques assimétricos, estabilizar a zona euro no seu todo e promover a coesão. Esta ideia constitui uma perigosa ilusão. Ainda que esta capacidade orçamental venha a existir, ela nunca será colocada ao serviços dos trabalhadores e das populações. Constituirá antes mais um elemento de chantagem e de aprofundamento da nossa dependência face aos países mais ricos, e um risco acrescido para a nossa soberania.
Completar a União Bancária
Estivemos ainda não há muito tempo aqui na cidade do Porto a discutir a União Bancária. Concluímos que está, representava desde do euro, o passo mais significativo neste processo de integração capitalista da UE. O tempo veio dar-nos razão. Os pressupostos da criação deste monstro, lidar com as empresas demasiado grandes para falir e evitar que sejam os contribuintes a pagar os prejuízos dos bancos, foram um logro. O povo português continua a pagar pelo buraco do BES e do Banif, e estou só a citar bancos que faliram quando a supervisão bancária europeia já estava em funcionamento. Por outro lado assistimos hoje a uma concentração do sistema financeiro, com o reforço dos maiores bancos, agravando assim o risco de contagio destas instituições. Ou seja, mais um embuste. Mas um embuste que permitiu a implementação de uma teia de instituições (sistema de supervisão e sistema de resolução) que controlam o sistema financeiro a partir do BCE, sem que os estados nacionais tenham sequer uma palavra a dizer. Esta supervisão chega a imiscuir-se na gestão do nosso banco público, em aspetos tão variados que vão da escolha dos as administradores até ao modelo de negócio, com a imposição de encerramentos de balcões entre outras malfeitorias. Registe-se mais este episódio onde foi imposto, no quadro da operação de recapitalização da CGD, a emissão de quase mil milhões de dívida perpétua subordinada a uma taxa de juro superior a 10%. Note que esta emissão que representa um encargo anual de cerca de 93 milhões de euros, irá direitinho para os abutres do costume uma vez que a emissão desde dívida apenas se destina a investidores privados.
Esta portanto visto a quem serve esta União Bancária! Mas diz a UEM, há problemas? Há sim senhora? O que fazer? Completar a União Bancária!
Aprofundando o que está, promovendo a sua política ao serviço dos grandes grupos financeiros e concluindo o chamado terceiro pilar da União Bancária, o sistema comum de garantia de depósitos. Este terceiro pilar, destinado a salvaguardar os depósitos até 100 mil euros acabou por não avançar. Representou no entanto um autêntico isco que muita gente, acabou por engolir por entenderem que este Sérvia as pessoas, o cidadão comum. Pretende-se que avance este ano, não havendo ainda um acordo final sobre os moldes em que irá funcionar. Pela parte do PCP opomo-nos a mais este avanço. Os estados nacionais, inclui do Portugal, têm já o seu sistema de garantia de depósitos. Abdicar de mais esta competência significará sujeitar o país a mais um elemento de pressão e de chantagem, na medida em que o acionamento desta garantia será sempre acompanhado das exigências habituais. Por outro lado, não é possível desligar este pilar os primeiros dois, a supervisão única e a resolução única.
O PCP rejeita a União Bancária no seu todo. Mas não o faz por teimosia ou de ânimo leve. Esta União Bancária mostrou já a sua face. Representa mais uma manobra que pretende resolver problemas reais, mas que serve na prática outros interesses. Deixou aqui um exemplo. O PCP tem apresentado propostas, como o controlo público da banca, ou pelo menos a separação da banca de depósitos da banca de investimento. A UE finge que não houve e propõe mais e melhor supervisão. Mas ao mesmo tempo e à socapa, relança a titularização, promovendo a aldrabice financeira e os bancos sombra. Alimenta todo um sistema prudencial, mas permite que os grandes bancos usem os seus próprios modelos de avaliação de risco para calcular os requisitos de capital.
Uma UE irreformável
A EU está na crise profunda que é inseparável da crise estrutura, do capitalismo. Não há fuga para a frente que disfarce esta realidade. Pela parte do PCP não há cenários ou livros brancos que possam dar resposta a esta crise. Só um rotura com esta UE, permitirá dar passos na direção de uma outra Europa de cooperação, constituída de estados soberanos e livres e na base do respeito pelo direito de cada um poder optar pelo seu próprio modelo de desenvolvimento.