Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral do PCP, Romagem a Catarina Eufémia

Estamos aqui porque honramos e não esquecemos os nossos lutadores, os nossos heróis

Estamos aqui porque honramos e não esquecemos os nossos lutadores, os nossos heróis

Uma vez mais aqui estamos a prestar homenagem a Catarina Eufémia e ao seu exemplo de luta, de coragem, de militância comunista – um exemplo que permanece como referência na vida e na actividade do nosso grande colectivo partidário e de todo o povo trabalhador, que luta por um mundo melhor e mais justo.

Uma vez mais estamos aqui a lembrar aqueles dias de Maio de 1954, dias de luta acesa do heróico povo de Baleizão, em greve por melhores salários e contra a opressão e a exploração de que era vítima.

Aqui estamos a recordar os acontecimentos que ficaram para sempre gravados na memória dos trabalhadores e do povo português, aquele dia 19 de Maio em que Catarina Eufémia, enfrentando corajosamente a força bruta fascista, tombou às suas balas assassinas e regou a terra com o seu sangue mártir.

Estamos aqui porque honramos e não esquecemos os nossos lutadores, os nossos heróis e os nossos mártires.

Porque nutrimos um profundo respeito e admiração pelos que, à luta por uma sociedade liberta de todas as formas de opressão e exploração, dedicaram as suas vidas.

Respeito e admiração pelos seus exemplos que nos dão ânimo, força e coragem para prosseguirmos essa luta, sempre em defesa dos trabalhadores, do povo e do país.

Ao homenagear Catarina e ao evocar o seu nome, é a luta por uma terra de justiça, por uma sociedade nova e fraterna que se renova no seu exemplo inspirador, na sua lição de militante revolucionária.

Homenageamos Catarina e ao invocar o seu nome, é a longa e heróica luta dos trabalhadores agrícolas do Alentejo que temos presente. A sua luta por melhores condições de vida, pela democratização do acesso à terra, pela Reforma Agrária, pelo bem-estar de todo um povo.

Essa longa luta contra a opressão, a miséria, pelo direito a trabalhar a terra e os que, como Catarina Eufémia, aspiravam a ver liberta de exploração.

Evocamos o nome Catarina Eufémia e ao evocá-lo é a história e a luta do PCP que se projecta na nossa memória. Essa história que se confunde com a história e a luta do nosso povo.

Evocando a memória da camponesa Catarina, permitam-me que aqui invoque também no momento em que comemoramos o centenário do seu nascimento, o nome de Álvaro Cunhal, referência incontornável do nosso Partido, da luta do nosso povo pela liberdade e a democracia. Esse revolucionário de uma vida inteira dedicada à luta da emancipação dos trabalhadores e dos povos, ao socialismo e ao projecto comunista.

E o invoque, não apenas porque acabamos de prestar uma homenagem com o descerramento de uma placa alusiva ao seu centenário na Praça que tem o seu nome, mas para que através das suas próprias palavras escritas e aqui ditas, tinha a Revolução de Abril apenas alguns dias, o ligue a esta homenagem que anualmente prestamos a Catarina Eufémia.

É significativo da profunda ligação afectiva do Partido a Catarina que no meio do mar revolto de um processo revolucionário que acabava de dar os primeiros passos, no meio de tantas tarefas a exigirem resposta imediata e tanta atenção, Álvaro Cunhal, como Secretário-Geral do PCP, não tivesse adiado, nem por um momento, e se tivesse apressado a vir aqui, a Baleizão, prestar uma justa homenagem a Catarina Eufémia.

Algumas das suas palavras de homenagem a Catarina, aqui ficam e são também uma homenagem a quem as proferiu, nesse dia 19 de Maio de 1974, afirmava então o camarada Álvaro Cunhal:

«É com profunda emoção que aqui, nestas terras onde viveu Catarina Eufémia, vemos unidas as massas trabalhadoras alentejanas na homenagem àquela que se tornou exemplo e símbolo da trabalhadora de vanguarda e da mulher comunista. (…) Catarina tornou-se uma lendária heroína popular, orgulho do glorioso proletariado rural alentejano, orgulho de todos os trabalhadores portugueses, orgulho do Partido. O sacrifício de Catarina não foi em vão. Da terra portuguesa começam a brotar flores das plantas que Catarina regou com o seu sangue. Começam a alcançar-se objectivos pelos quais lutou e deu a vida Catarina. Catarina lutou pela liberdade e a liberdade foi alcançada. Os outros ideais por que Catarina, a militante comunista, lutou, serão alcançados. Chegará o dia em que a Reforma Agrária entregará a terra dos grandes latifúndios a quem a trabalha. Chegará o dia em que no Alentejo não mais haverá senhor e escravos».

A Revolução de Abril haveria de dar passos de gigante na concretização de alguns dos sonhos de Catarina que eram os sonhos do povo trabalhador, desde logo e à cabeça esse sonho de anos e anos de luta que era a Reforma Agrária, realizada sob a consigna de “a terra a quem a trabalha”.

Pela primeira vez na História do nosso país, os trabalhadores decidiram tomar as terras do latifúndio e, com elas nas suas próprias mãos, o seu destino, concretizando um inovador programa de transformações económicas e de justiça social que iria resolver os problemas da produção e do emprego nos campos do Sul do país.

Reforma Agrária que foi, desde o início, alvo de ataques e de uma descarada campanha de mentiras e calúnias.

Sempre atacados violentamente pelas forças reaccionárias, os trabalhadores tiveram que enfrentar uma sistemática ofensiva prosseguida por todos os governos do PS, PSD e CDS, juntos ou separados.

Uma ofensiva que durou 14 anos e a Reforma Agrária acabou por ser destruída e o latifúndio restaurado, trazendo novamente ao Alentejo as terras abandonadas, a desertificação e o desemprego.

Mais uma vez o dizemos: A Reforma Agrária foi destruída, mas não pôs fim ao sonho, nem à necessidade e actualidade de, nas actuais circunstâncias, se concretizar uma Reforma Agrária que garanta o uso e a posse da terra a quem a trabalha.

Esse sonho nunca o abandonaremos, como não abandonaremos a luta pelo desenvolvimento destas terras do Alentejo, pelo direito a produzir, pelo direito ao emprego, pelo direito a uma justa distribuição da riqueza criada.

A luta pela concretização de uma política que ponha fim ao abandono dos sectores produtivos, que seja capaz de tirar partido dos importantes recursos da região, da agricultura aos recursos mineiros, e sua transformação, da produção de energia ao desenvolvimento das indústrias agro-alimentares.

Foi a ofensiva contra as conquistas de Abril que acabaria por conduzir o país de regresso a um passado de exploração e injustiça e a uma crise que se foi ampliando à medida que avançou o processo de recuperação capitalista e latifundista, aqui e no país.

Hoje é bem visível o resultado desse processo na vida nacional de quase quatro décadas de governos e de políticas de direita: ele está patente na crise económica e social dramática que assola o país. Uma crise que se tornou ainda mais aguda e brutal com a decisão do PS, PSD e CDS de vincular o país ao Pacto de Agressão com o FMI/UE/BCE que se traduziu em gravíssimas imposições ao povo e ao País.

Toda a evolução confirma que o Pacto de Agressão e a política deste governo do PSD/CDS estão a conduzir o país para o abismo.

O país está mergulhado numa espiral de austeridade e recessão económica com consequências dramáticas nos planos económico e social.

Vivemos hoje uma situação em que a gravidade dos problemas está para além das previsões mais pessimistas e isso vê-se no aumento desmedido e alarmante do desemprego que atingiu um novo marco histórico no país – mais de um milhão e quinhentos mil desempregados - e na dimensão que atinge há nove meses consecutivos a recessão económica. Neste último trimestre a queda da actividade económica rondou os 4%, uma situação nunca antes verificada!

O governo fala de medidas para o crescimento e o emprego, mas são apenas palavras, pura propaganda! Propaganda para encobrir a nova e brutal ofensiva contra os trabalhadores e o povo que está em curso. Para melhor concretizarem o seu programa de terrorismo social que têm entre mãos e à sombra de uma suposta reforma do Estado.

Um novo programa de terrorismo social que o governo definiu com o FMI e que, independente das manobras e das encenações, significa um novo corte nos rendimentos dos reformados, um novo assalto aos direitos dos trabalhadores, um passo mais na liquidação de direitos, novos e arrasadores cortes na saúde, na protecção social e na educação, um ataque aos militares e forças de segurança.

Um passo mais no caminho do desastre económico e social, uma nova declaração de guerra aos trabalhadores e ao povo. Um conjunto de medidas devastadoras que não são apenas dirigidas aos trabalhadores da Administração Pública e a todos os reformados, mas que se traduzirão em mais recessão, em mais desemprego que atingirão toda a actividade económica, a sobrevivência de milhares de empresas, a vida de milhões de famílias!

O verdadeiro e único programa deste governo de Passo Coelho e Paulo Portas é o da austeridade, isto é, o programa das políticas de concentração e centralização de capitais e riqueza, o da exploração dos trabalhadores, o do empobrecimento generalizado dos portugueses!

Perante uma tão brutal declaração de guerra aos trabalhadores e ao povo, só há uma solução: tudo fazer para que, quem aprova tais medidas não esteja em condições de as concretizar!

Esse é o grande desafio que temos pela frente: interromper este processo e garantir uma alternativa!

Apressar com a luta do nosso povo a demissão de um governo socialmente isolado e politicamente derrotado que procura desesperadamente agarrar-se ao poder.

Um Governo e uma política fora da lei e em confronto com a Constituição da República, que está a impor na prática um verdadeiro estado de excepção. Um governo que há muito pôs em causa o regular funcionamento das instituições perante o apoio activo e cúmplice do Presidente da República.

De um Presidente da República que faz vista grossa à acção de um governo ilegítimo que está a levar o país para o fundo e, enquanto isso, se dedica a discutir em Conselho de Estado o que será o país no Verão do próximo ano, no pós-troika. Uma discussão que tem como objectivo essencial dar credibilidade à política do governo e à sua permanência no poder.

De um governo que o que está a fazer é tirar o pão da boca dos portugueses, para alimentar a gula da especulação e do grande capital económico e financeiro!

Um governo que, ao mesmo tempo que ataca tudo o que são conquistas do povo, mantém milhares de milhões de euros de juros da dívida, rendas ilegítimas do sector da energia, ruinosos seguros de crédito que envolvem milhões de euros e a continuada cobertura dos prejuízos do BPN.

Vêm com a “reestruturação” do memorando e o chamado alargamento das maturidades, isto é, dos prazos de parte do empréstimo do Pacto de Agressão, mas estas não são soluções para responder a nenhum dos problemas fundamentais do país, nem tão pouco visam com tais soluções, como se impunha, romper com a espiral de austeridade e recessão.

Também a posição da direcção do PS, para lá das afirmações de oposição ao governo, a pensar colher em futuras eleições, confirma um partido que não quer afastar-se dos compromissos com o programa de agressão ao país. As juras de cumprimento do “memorando” subscrito com a Troika, vêm na linha das suas responsabilidades na negociação do Pacto e do apoio no corte aos salários e pensões, às privatizações, às alterações à legislação laboral e a todas as outras malfeitorias do Pacto de Agressão.

Alertando para falsas soluções e alternativas, o PCP chama a atenção que só uma política alternativa patriótica e de esquerda está em condições de dar resposta aos problemas do país e às aspirações do povo português.

Uma nova política que tenha como opções fundamentais:

A rejeição do Pacto de Agressão e a renegociação da dívida nos seus montantes, juros, prazos e condições de pagamento e com redução do serviço da dívida para um nível compatível com o crescimento económico e a melhoria das condições de vida;

A defesa e o aumento da produção nacional, a recuperação para o Estado do sector financeiro e de outras empresas e sectores estratégicos indispensáveis ao apoio à economia, o aumento do investimento público e o fomento da procura interna;

A valorização efectiva dos salários e pensões e o explícito compromisso de reposição de salários, rendimentos e direitos roubados, incluindo nas prestações sociais;

A opção por uma política orçamental de combate ao despesismo, à despesa sumptuária, baseada numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos trabalhadores e das pequenas e médias empresas, garantindo as verbas necessárias ao funcionamento eficaz do Estado e do investimento público;

Uma opção que tem que ter em conta o reforço dos meios financeiros das autarquias para que elas possam rapidamente acelerar o investimento público, para além da necessária dinamização do investimento a cargo da administração central;

Uma opção que implica um novo olhar para o território, a concretização de uma efectiva política de descentralização, com valorização do poder local e a reposição dos meios financeiros indispensáveis à prossecução das suas competências;

Uma política de defesa e recuperação dos serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado (saúde, educação e segurança social), reforçando os seus meios humanos e materiais, como elemento essencial à concretização dos direitos do povo e ao desenvolvimento do País;

A assunção de uma política soberana e a afirmação do primado dos interesses nacionais nas relações com a União Europeia, diversificando as relações económicas e financeiras e adoptando as medidas que preparem o País face a uma saída do Euro, seja por decisão do povo português, seja por desenvolvimentos da crise da União Europeia.

É esta a política de que o nosso país precisa e é pela sua concretização que continuaremos a lutar!

Tal como no passado, os trabalhadores e as massas populares travam hoje uma grande batalha para impedir a desvalorização dos seus salários, das suas reformas, dos seus rendimentos e pela defesa das suas condições de vida e de trabalho.

Também hoje, tal como no passado, o nosso Partido desempenha um papel determinante na organização, no desenvolvimento e no fortalecimento da luta das massas trabalhadoras e populares.

Com a consciência de que a melhor homenagem que podemos prestar a Catarina Eufémia é a de continuarmos o combate pelos objectivos pelos quais ela deu a sua vida, aqui reafirmamos que não desistiremos da luta e do papel que nos cabe na defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do país!

Viva o povo do Alentejo!

Viva o Partido Comunista Português!

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