A preparação de um Congresso do PCP tem características únicas, inseparáveis do Partido que somos, da nossa identidade comunista, da nossa história e ligação aos trabalhadores e ao povo, do nosso ideal e projecto de transformação da sociedade. Desde logo porque todos os militantes do Partido são chamados a contribuir e a dar a sua opinião. Aqui, os congressos não são um espectáculo montado ou uma luta entre facções para escolher o chefe. Aqui, cada um tem não apenas o direito mas o dever de dar a sua contribuição para o debate, para a reflexão colectiva, para o apuramento das principais orientações, como aliás estamos aqui a fazer, e vamos continuar até ao final de Novembro, com centenas e centenas de reuniões e assembleias, envolvendo milhares de membros do Partido mas também muitos amigos com os quais queremos partilhar preocupações e discutir o futuro.
Um Congresso do PCP distingue-se também pelo olhar de classe que temos sobre a evolução da situação nacional e internacional. O nosso ponto de partida são os interesses dos trabalhadores e dos povos, dos explorados e oprimidos. Aqui não assimilamos, antes combatemos os interesses, a ideologia e os objectivos do capital. Aqui assumimos a nossa visão patriótica e os nossos deveres internacionalistas. Este é um Congresso de um Partido que quer transformar a sociedade, que quer romper com injustiças e desigualdades em vez de as promover, que quer romper com décadas de política de direita e abrir caminho a uma alternativa para o País, que está comprometido com os valores de Abril e é com eles que quer construir o futuro.
Um Congresso que será preparado com uma profunda ligação à realidade, às dificuldades e injustiças que marcam o dia a dia do nosso povo. Em que, ao mesmo tempo que iremos debater e aprofundar a nossa reflexão, não deixaremos de responder à evolução da situação nacional. Em que não deixaremos de tomar a iniciativa em torno dos salários e dos direitos, da solidariedade e da paz, estimulando o desenvolvimento, e intensificação por todo o País, da luta de massas. A preparação do Congresso no PCP faz-se aliando a discussão e o debate à necessária intervenção política que os trabalhadores e o Povo esperam do nosso Partido. E é isso que vamos fazer.
O trabalho de elaboração das Teses partiu de um valioso património de apreciação e análise, traduzido no Programa do Partido, nas resoluções de Congressos anteriores, nas avaliações e orientações estabelecidas pelo Comité Central ao longo dos anos, expressas nos seus vários comunicados mas também da Conferência Nacional – “Tomar a iniciativa, responder às novas exigências, reforçar o partido” cujo conteúdo foi, em larga medida, apropriado pelas teses que agora se apresentam.
Quando se partiu para a elaboração deste projecto de Teses colocou-se a questão de saber qual a melhor forma de responder às exigências que se colocam à intervenção do Partido num mundo que está a enfrentar rápidos e inquietantes desenvolvimentos, e em que, no nosso País, o processo contra-revolucionário ganha um novo fôlego, com o crescente domínio do grande capital sobre a vida do País, a prolongada acção da política de direita, agora pela mão do Governo PSD/CDS, em que são promovidas concepções e forças reaccionárias, ao mesmo tempo que se acentua o ataque ao Partido, ao regime democrático, aos direitos e condições de vida, à soberania e à independência nacionais.
Como contribuir para uma maior e mais larga compreensão no Partido sobre as condições de luta que enfrentamos?
Como resistir ao quadro ideológico dominante, aos seus poderosos instrumentos e à forma como estes condicionam e tentam atrasar a necessária elevação da consciência social e política a um patamar que enfrente e recuse o pensamento único que querem impor?
Como realçar o que significa o domínio do grande capital sobre a vida nacional, no plano económico, social, político e cultural, articulado com um processo de integração capitalista europeia que condiciona o desenvolvimento do País?
Como responder a genuínas preocupações do colectivo partidário, face à necessidade de resistir e recuperar posições, alargar não apenas a influência política mas também eleitoral, de reforçar o Partido?
No fundo, como, com que forças e de que forma é que interrompemos a actual política, e abrimos caminho a uma política alternativa que responda aos problemas nacionais?
Olhamos para a evolução da situação internacional com uma grande preocupação. Tal como afirmamos no capítulo 1 o capitalismo revela todos os dias a sua natureza exploradora, opressora, agressiva e predadora. O agravamento da exploração e a degradação das condições de vida, a instabilidade e as sucessivas crises nas principais economias capitalistas, as grandes disparidades no desenvolvimento, o aprofundamento de problemas ambientais, a promoção de forças reaccionárias e fascistas, o carácter sistémico da corrupção - não só confirmam as insanáveis contradições do sistema como confluem para uma crise estrutural que põe em evidência os limites históricos do capitalismo e a necessidade da sua superação revolucionária pelo socialismo.
Os últimos anos foram marcados pela intensificação da ofensiva do imperialismo com a escalada de confrontação e guerra – como vemos na Palestina e no Médio Oriente, na Ucrânia e noutras partes do mundo. Aí está o avanço de forças reaccionárias e fascistas, o exacerbar das tensões internacionais, o fomento do militarismo e as crescentes ameaças de um conflito mundial que, a não ser travado, poderá assumir proporções catastróficas. Intensificam-se à escala global os mecanismos de condicionamento e controlo ideológico ancorados em gigantescos oligopólios que controlam os meios de comunicação e as redes digitais. Ao mesmo tempo que as grandes potências capitalistas procuram atrasar a sua perda de domínio hegemónico, desenvolve-se um amplo processo de rearrumação de forças, com um papel destacado da China mas também de outros países em desenvolvimento, que convergem, num quadro muito heterogéneo, na resistência à subordinação ao imperialismo.
Num contexto de resistência e acumulação de forças no plano mundial, coexistem sérios perigos mas também potencialidades para o desenvolvimento da luta. Luta e resistência que se desenvolve nas mais variadas condições e que requer o fortalecimento dos partidos comunistas – cada vez mais necessários - e da sua cooperação, a convergência de diversificadas forças numa ampla frente anti-imperialista, que trave e faça recuar os intentos do imperialismo e abra caminho a uma nova ordem internacional capaz de assegurar a paz e a justiça nas relações entre os povos.
O nosso País não é alheio ao mundo que o rodeia. Meio século depois da Revolução de Abril o Portugal em que vivemos e intervimos é marcado pelo aprofundamento da política de direita e pelo processo de integração capitalista na União Europeia. Verifica-se o crescente domínio do capital sobre quase todas as esferas da vida nacional suportado num poder político que, no essencial, está capturado e ao serviço dessa estratégia. A presença do capital estrangeiro estende-se a mais de 50% das grandes empresas, o modelo económico imposto despreza a produção nacional, vira-se para actividades de baixo valor acrescentado, como o turismo, promove crescentes desigualdades no território e na sociedade. A dependência externa acentuou-se e o País está hoje limitado também na sua soberania económica, monetária e orçamental.
Os trabalhadores e o povo pagam a factura dessa política de classe. Baixos salários e pensões, ataque aos direitos, degradação dos serviços públicos, crescentes dificuldades no acesso à habitação.
Nas teses é feita uma avaliação das opções dos governos PS nos últimos anos e as suas consequências, incluindo o regresso do PSD e do CDS ao poder, e o ascenso de forças reaccionárias, Chega e IL que, no conjunto, dominam o poder político.
Os primeiros meses deste Governo confirmam a intenção do aprofundamento da política de direita, num contexto em que o grande capital encontra no plano institucional melhores condições para a concretização dos seus objectivos. Perante a convergência entre PSD, CDS, Chega, IL e também o PS, naquilo que é essencial para os interesses dos grupos económicos, a afirmação do PCP como a verdadeira força de oposição e de alternativa é cada vez mais um imperativo.
Tal como afirmamos nas teses, estamos num momento decisivo da vida nacional. Onde o confronto que opõe os que ambicionam concluir o processo contra-revolucionário e as forças que, ancoradas em Abril e na Constituição, lhe resistem, marca e determinará a evolução do País nos tempos mais próximos.
Um rumo que exige o enfrentamento com as imposições da União Europeia, como é retratado no capítulo 3 das teses. Uma UE que se assume como instrumento e espaço de domínio dos monopólios, orientada para a concentração de poder nas grandes potências capitalistas europeias e simultaneamente alinhadas com o imperialismo americano. Uma realidade que tem sido marcada pelo acentuar do carácter federalista, neoliberal e militarista da UE e que mostram não ser possível uma política alternativa sem enfrentar e romper com essas imposições.
Nas teses avaliamos também as condições de luta nas quais o PCP intervém e que hoje são mais exigentes. Procura-se nesta parte contribuir: para a compreensão dos aspectos que determinam a influência geral do Partido - incluindo a eleitoral - na sociedade portuguesa; o quadro ideológico prevalecente e a base material em que assenta; a desigualdade de meios nesse confronto. No capítulo 4 damos particular atenção à ofensiva ideológica que está em curso, com destaque para a promoção de expressões diversas de anti-comunismo, que, tendo o PCP como alvo preferencial, têm um alcance mais vasto contra a democracia e o regime democrático. Aliás, a virulência da campanha anti-comunista – com a calúnia, o silenciamento, a mentira e a deturpação – é inseparável daquilo que o PCP representa enquanto principal obstáculo à política de direita e aos projectos reaccionários.
Como afirmamos nas teses, sabemos que a luta ideológica é parte do confronto de classe mais vasto com que o Partido está comprometido. Um confronto em que uns procuram condicionar a influência do Partido e em que os comunistas intervêm para a alargar, num quadro muito desigual de meios, mas ainda assim necessária e imprescindível para resistir e avançar.
Nas Teses fazemos o diagnóstico e nas Teses apontamos o caminho. Nos objectivos políticos da acção do PCP que tratamos no capítulo 5 identificamos a luta pela alternativa política patriótica e de esquerda como prioridade.
Nas Teses avançamos com os aspectos centrais da política patriótica e de esquerda que propomos ao povo português. Uma política que garanta a valorização do trabalho e dos trabalhadores, assegure o bem-estar e serviços públicos de qualidade, promova o desenvolvimento económico geral na base de uma economia mista e da aposta no investimento público e na produção nacional, recupere instrumentos de soberania e diversifique as nossas relações externas, garanta um País coeso e equilibrado e a preservação do meio ambiente, reforce a democracia nas suas múltiplas vertentes, promova a paz e a cooperação.
Nas Teses reconhecemos as exigências que estão colocadas para que se consiga romper com a política de direita e abrir caminho à alternativa política. Um caminho que requer a intensificação da luta de massas, factor de resistência, conquista de direitos e transformação social; o fortalecimento das organizações dos trabalhadores e das outras organizações de massas, com o papel destacado que os comunistas assumem em todas estas frentes; a convergência de democratas e patriotas, em torno dos objectivos dessa política e o reforço do Partido e da sua influência. Como afirmamos nas Teses, o reforço da intervenção, organização e influência social, política e eleitoral do PCP, com a sua identidade, o seu projecto, o seu Programa, a política alternativa que protagoniza, o seu compromisso com os trabalhadores, o povo e o País, sejam quais forem as circunstâncias, é condição primeira para a alternativa.
Ao processo de recuperação capitalista e à acção antidemocrática da política de direita contrapõe-se a luta de massas, que demonstra historicamente a sua força para lhe resistir e avançar como avançamos no capítulo 6. Ao papel insubstituível da luta da classe operária e das suas organizações de classe, junta-se a acção convergente de camadas anti-monopolistas na luta contra a política de direita. Assim tem sido mas precisamos de ir mais longe no impulso que damos a essa mesma luta. Valorizamos o decisivo papel que os comunistas desempenham nas organizações e movimentos de massas, para a sua iniciativa, organização e perspectiva.
Uma luta que se estende ao plano eleitoral em que o Partido, participando no quadro da CDU juntamente com o PEV, tem enfrentado evoluções de sentido diverso, com avanços e recuos. O reforço da influência eleitoral do PCP tem de continuar a ser um objectivo indissociável da organização, intervenção e acção políticas.
No capítulo 7, faz-se uma avaliação da intervenção do Partido desde o último Congresso, um período no qual foi particularmente posto à prova. Só um grande Partido, alicerçado na sua identidade e na profunda ligação aos trabalhadores, ao povo, à vida, agindo sobre a realidade que quer transformar, com coragem política, ideológica e de intervenção, com forte militância, é que poderia resistir à dimensão da ofensiva anticomunista que prosseguiu e se desenvolveu sobre si desde o último Congresso.
A sua acção e iniciativa confirmaram o Partido como uma força indispensável à luta dos trabalhadores e do povo português. O reforço da organização do Partido nas suas múltiplas vertentes confirma-se como tarefa de sempre e essencial num partido revolucionário.
Os quadros, a Direcção, as organizações do Partido, o seu funcionamento e ligação às massas, a militância, a intervenção nas organizações de massas, os fundos, a propaganda e a imprensa, os meios e recursos de que dispomos. Sabemos que precisamos de um Partido mais forte. Sem subestimar insuficiências e dificuldades, valorizam-se avanços e apontam-se orientações para o reforço da organização.
Da análise que fazemos à evolução da situação internacional e nacional, às condições de luta e ao quadro ideológico que enfrentamos, coloca-se a pergunta: qual o caminho que se propõe neste XXII Congresso? Qual é a proposta que o Comité Central apresenta ao Partido para enfrentar e ultrapassar a realidade que aí está?
Destacaria, de forma sucinta o seguinte:
Perante a situação do País, o caminho que propomos é o da ruptura com a política de direita, é o da intensificação da luta de massas, não apenas em torno de aspirações mais imediatas, mas que confluam para essa grande exigência nacional: interromper a política de direita e abrir caminho a uma política patriótica e de esquerda.
A luta pela alternativa patriótica e de esquerda é a principal questão política que está colocada neste primeiro quartel do século XXI e pela qual o nosso Partido se empenha e luta.
Para lá chegar não há nenhum golpe de asa ou solução mágica. É preciso enfrentar os interesses e o poder do grande capital e as imposições da UE. É preciso resistir e é possível avançar.
É preciso intensificar a luta dos trabalhadores mas também de outras classes e camadas anti-monopolistas. É preciso reforçar as organizações e movimento de massas, a sua capacidade de intervenção, iniciativa e mobilização. É preciso afirmar a política patriótica e de esquerda como elemento agregador de outros democratas e patriotas que projecte uma sociedade em que os valores de Abril estão presentes na Constituição mas também na vida do nosso povo.
É preciso reforçar o Partido, a sua organização, a sua ligação aos trabalhadores, a sua intervenção e iniciativa política, a sua influência política e eleitoral. Sem um PCP mais forte, podem-se fazer umas coisas, mas não se abrirá o rumo que o País precisa. Não confundimos a necessária convergência de forças, personalidades e sectores democráticos, com a diluição do Partido. A alternativa política que propomos ao povo português precisa da clareza, da coerência, da coragem e do projecto político que o PCP comporta.
Têm particular importância a concretização de um movimento geral de reforço do trabalho de direcção e estruturação, articulado com a responsabilização de quadros, tendo nas circunstâncias actuais como maior prioridade os quadros, a sua determinação, resistência, iniciativa, participação militante e preparação política e ideológica, importância que se expressa em medidas apontadas para o reforço do Partido, designadamente a responsabilização de 1000 novos quadros por tarefas a que queremos dar resposta, a constituição de mais 100 células do Partido em empresas e locais de trabalho, o reforço da nossa capacidade de informação e propaganda, o alargamento da difusão do Avante! e da imprensa do Partido em geral, a garantia da independência financeira.
Tal como afirmámos na Conferência Nacional e agora para Congresso, precisamos de tomar a iniciativa. Tomar a iniciativa em torno dos problemas concretos que atingem a vida nos nosso povo em todo o território nacional. Tomar a iniciativa no trabalho que as organizações do Partido devem e podem assumir numa maior ligação à realidade. Tomar a iniciativa como estamos a fazer com a acção nacional “Aumentar salários e pensões para uma vida melhor” com um largo contacto com os trabalhadores e a população. Tomar a iniciativa no alargamento da CDU a muitos homens e mulheres sem filiação partidária, a começar já pelas próximas eleições autárquicas. Tomar a iniciativa na batalha ideológica, na denúncia do capitalismo, da sua natureza e dos seus crimes, e na afirmação do socialismo como exigência da actualidade e do futuro.
Como se disse no início, as Teses não são um documento acabado. Da discussão que realizaremos na preparação deste Congresso sairemos seguramente em melhores condições para enfrentar os desafios do futuro.
O lema do XXII Congresso – “Força de Abril. Tomar a iniciativa com os trabalhadores e o Povo, Democracia e Socialismo”, identifica o que somos, o que nos propomos concretizar e com quem. Somos a força dos valores de Abril. A força da resistência ao fascismo e da luta pela liberdade. A força das grandes conquistas e transformações revolucionárias do 25 de Abril e da luta em sua defesa. A força de oposição à política de direita e os projectos reaccionários e que promove a luta pela alternativa política em Portugal. A força da defesa da soberania e da independência nacional e da paz, da solidariedade e da cooperação entre os povos.
A força que, perante as exigências que marcam o nosso tempo, toma a iniciativa e mobiliza os trabalhadores e as massas populares na luta por uma vida melhor. Estes são tempos de luta e resistência. Tempos para enfrentar o que aí está, com coragem, determinação e iniciativa. Com a confiança de quem ao longo de mais de um século de intervenção sabe que é na luta dos trabalhadores e do povo e no papel determinante do PCP que reside a condição para resistir, avançar e vencer. Tempos para tomar a iniciativa, por Abril, pela democracia, pelo socialismo e o comunismo.