1. O Douro, enquanto Região de excelência na produção de vinhos, tem como característica particular o difícil e instável equilíbrio entre a produção e o comércio. A Casa do Douro, enquanto associação pública representativa dos vitivinicultores durienses, desempenha uma função estratégica essencial na defesa dos produtores de vinhos generosos e de pasto, e especialmente dos cerca de 40 mil pequenos produtores, face ao poder económico e político do comércio, hoje concentrado em 5 grandes grupos/empresas vitivinícolas, com grandes explorações, não apenas na Região Demarcada, mas também noutras regiões demarcadas do País, e até no estrangeiro (Argentina, Brasil, Nova Zelândia, Austrália, entre outros).
O prestígio e a valorização do vinho do Porto e dos vinhos de mesa da região sempre estiveram, nas últimas décadas, intensa e historicamente, ligados à existência da Casa do Douro, como representante unitária da produção face ao domínio dos circuitos comerciais pelas casas exportadoras e à sua capacidade institucional de intervenção reguladora no mercado vitícola regional.
O equilíbrio dos interesses em histórico confronto sempre foi determinado por uma organização institucional, plasmada em lei, arbitrado sempre que necessário pelo Estado, garantindo a prevalência dos direitos legítimos dos que construíram a Região Demarcada, e a qualidade e genuinidade dos seus vinhos, sobre o poder económico e político dos grupos comerciais que, ao longo dos séculos, sempre se apropriaram da maior parte do valor acrescentado da produção vitivinícola de generoso e de pasto.
2. Nunca esse poder económico se conformou com a situação e, sempre que julgou favorável a maré política, levou de vencida os interesses dos durienses. Desde 1986 que têm feito caminho e consolidado posições as suas teses de liberalização dos regulamentos da produção vínica da Região Demarcada do Douro, no sentido de esvaziar progressivamente a Casa do Douro do seu papel regulador, procurando retirar-lhe funções de comercialização, usurpar-lhe a titularidade do cadastro, impedi-la de manter o controlo das contas – depósito – produtor, reduzir direitos dos viticultores e aproveitando erros de gestão, desprestigiar e fragilizar a Casa do Douro, e ainda desvalorizar a experiência e capacidade profissional dos seus trabalhadores. Neste caminho de desestabilização da Região Demarcada, tendo como objetivo a liquidação da Casa do Douro, no seu papel, atribuições e competências, historicamente consagrados na Região Demarcada do Douro, o poder económico das casas exportadoras e da sua associação profissional AEVP, contou sempre com a aliança e cumplicidade ativa de sucessivos governos do PS e PSD (com ou sem CDS-PP). As decisões anunciadas pelo governo PSD/CDS de Passos Coelho e Paulo Portas, pretendem ser a conclusão desse processo de esbulho dos vitivinicultores duriense e destruição da Região Demarcada do Douro.
3. As sucessivas reformas da arquitetura institucional da Região Demarcada do Douro levadas a cabo por esses governos e os partidos que lhes têm garantido maioria na Assembleia da República, conduziram o Douro, e em particular os seus pequenos viticultores e a generalidade das adegas cooperativas, a uma profunda crise, e mergulharam a Casa do Douro numa situação de total instabilidade orgânica, esvaziada de poderes que lhe estavam atribuídos e em estado de quase falência económica.
A Comunidade Intermunicipal do Douro – estrutura associativa dos municípios durienses - avaliou recentemente (26 de Março de 2014) as perdas da atividade vitivinícola nos últimos 13 anos em cerca de mil milhões de euros!
O PCP responsabiliza PSD, CDS e PS e todos os seus governos pela dramática situação que hoje vive a vitivinicultura na Região Demarcada do Douro.
4. O PSD é o principal responsável pelas alterações do enquadramento legal da Região com a reforma institucional de 1995, que visava criar um modelo de gestão interprofissional (CIRDD) e a sua reformulação em 2003, com os Decretos-Lei n.º 277 e 278, de 6 de Novembro.
O PS, sempre contestando na oposição essas alterações, é, sempre que chega ao governo, o executante zeloso da legislação dos governos PSD.
Um e outro partido não cumpriram sucessivos protocolos negociados e contratualizados entre a Casa do Douro, a Associação das Empresas do Vinho do Porto (AEVP) e o Estado Português, que visavam garantir e salvaguardar a sustentabilidade económica da Casa do Douro.
Um e outro partido, fazendo no governo exatamente o contrário do que afirmavam e defendiam enquanto oposição, tomaram decisões e assumiram políticas que conduziram a Casa do Douro e a Região Demarcada à situação atual, cujos principais traços são bem conhecidos e duramente sofridos pelos durienses. A saber:
• Uma profunda, intrincada e contraditória regulamentação legal, sobrepondo poderes de diversas entidades, perturbando equilíbrios existentes, fragilizando gravemente atribuições e competências da Casa do Douro, subordinando-as aos interesses dos exportadores, e particularmente ao IVDP e ao poder discricionário dos governos;
• Uma complexa, burocrática e antidemocrática legislação eleitoral para a Casa do Douro, eliminando a eleição direta da sua Direcção pelos vitivinicultores, eliminando a incompatibilidade eleitoral dos representantes do comércio e afrontando a igualdade eleitoral dos vitivinicultores por intervenção do fator volume de produção;
• A expropriação da Casa do Douro de direitos, competências e atribuições tão decisivas quanto as do registo oficial dos vitivinicultores e propriedade e atualização do cadastro das vinhas – hoje apropriado pelo IVDP – o fornecimento da aguardente vínica, eliminado pela sua liberalização a favor das casas exportadoras;
• A eliminação da capacidade de intervenção na comercialização de vinhos, no que se inclui a intervenção, em última instância, na retirada da produção dos vinhos da vindima não comercializados e aquisição em cada campanha dos quantitativos necessários à manutenção do stock histórico;
• O afundamento da situação económico-financeira da Casa do Douro pelo não cumprimento dos já referidos Protocolos livremente negociados, a não assunção das indemnizações compensatórias resultantes da cessão de obrigação e as contrapartidas financeiras resultantes da reforma institucional devidas à Casa do Douro;
• Em consequência de todos estes processos profundamente negativos para a imagem, capacidade e operacionalidade da Casa do Douro, resultou num evidente reforço, ao longo dos últimos anos, das posições das grandes empresas do Comércio/Casas Exportadoras face ao Douro e aos vitivinicultores durienses.
5. No quadro da ruinosa política levada a cabo, contra o Douro e os durienses, por sucessivos governos um papel central coube aos governos do PS / Sócrates e à maioria PS na Assembleia da República que, ao longo da X e XI legislaturas os suportou e apoiou politicamente.
Podem caracterizar-se essas legislaturas nas questões da Região Demarcada como uma permanente guerra contra a Casa do Douro e a vitivinicultura duriense. A saber:
a) Pela completa recusa de retificação do quadro legislativo que tinha sido imposto pelos anteriores governos PSD/CDS-PP, de Durão Barroso/Santana Lopes/Portas, na legislatura 2002/2005;
b) Pelo assumido incumprimento dos Protocolos negociados com a Casa do Douro;
c) Pela ameaça e chantagem feitas em torno de umas pretensas e outras reais dívidas da Casa do Douro para com o Estado;
d) Pela reconfiguração do IVDP feita sub-repticiamente através do Decreto-Lei n.º 47/2007, de 27 de Fevereiro, liquidando o «interprofissionalismo», governamentalizando o IVDP, transformado num órgão desconcentrado do Ministério da Agricultura, com perda de poderes do Conselho Interprofissional e agravamento do défice de democratização e representatividade dos 40 mil vitivinicultores da Região Demarcada do Douro, ao acentuar-se o critério «volume de vinho» e a redução do número de membros na composição dos representantes da produção nas secções especializadas;
e) Pelo assumido confronto e afastamento do Douro e da Casa do Douro em matéria de representação e reconhecimento institucionais, aquando da visita da Comissão de Agricultura da União Europeia à região, na repetida falta de presença e diálogo em visitas do ministro à região, para mais em contraposição à «familiaridade» assumida com a AEVP;
f) Pela cumplicidade no afastamento da Casa do Douro, e fundamentalmente da UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), da instalação de um cluster vitivinícola na região duriense, entregando a sua promoção e gestão à ADVID, Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense, associação dominada pelas casas exportadoras.
Deve concluir-se que pior era difícil!
Para memória futura ficam mais uma vez registadas as palavras dos que foram deputados do PS na oposição ao governo PSD/CDS-PP entre 2002 e 2005.
O então deputado Ascenso Simões e depois secretário de Estado, em 1 de Julho de 2003, invetivando o governo por não cumprir as prometidas «contrapartidas financeiras devidas à Casa do Douro de 11 milhões de contos» afirmava: a «Casa do Douro vive momentos difíceis decorrentes da cessação de competências delegadas e de decisões pouco ponderadas; a Casa do Douro tem umas dívidas a bancos de cerca de 17 milhões de contos, mas tem vinhos e propriedades que ascendem a mais de 27 milhões de contos; a Casa do Douro não precisa do governo para que este lhe pague as dívidas, precisa do governo para que este a ajude a liquidar, com o seu património, essas mesmas dívidas, sem pôr em causa o mercado, sem fazer diminuir os preços e sem criar uma situação de instabilidade social e económica na região.» E posteriormente, em 19 de Março de 2004, dirigindo-se, numa Interpelação, ao governo PSD/CDS-PP, repete a acusação: «Quando é que o governo transfere 55 milhões de euros (promessa de Durão Barroso quando deputado na oposição) para a Casa do Douro?»
O então deputado Rui Vieira, a 1 de Julho de 2003: «(...) a proposta que aqui nos apresentam (o governo), é a liquidação efetiva e objetiva da Casa do Douro. (…) É ou não é verdade que quando se transfere para outro organismo, para o IVDP, o núcleo de competências que dava razão de ser à Casa do Douro, tais como a organização e a regulação da Região Demarcada do Douro, impedindo a Casa do Douro de intervir no escoamento dos vinhos excedentários, apoiando efetivamente a produção, deixando-lhe apenas a tarefa residual da gestão e da atualização do cadastro das vinhas e ainda com a obrigação de facultar todos os elementos ao IVDP. (…) Portanto, retirar todas as competências ao organismo é ou não acabar com ele? (…) O Sr. Ministro disse que decidiu impedir a Casa do Douro de intervir no escoamento do vinho – o que é uma opção política do governo. Sabe o sr. Ministro que essa possibilidade tem sido o estabilizador, o garante de um equilíbrio social e económico na região que se tem mantido ao longo das últimas décadas?»
O então deputado, depois ministro da Presidência do governo PS/Sócrates, Pedro da Silva Pereira, na mesma data de 1 de Julho de 2003, a propósito da retirada pelo governo das competências da Casa do Douro de intervenção no escoamento de excedentes: «É que a regulação na Região do Douro passa por esta intervenção em matéria de comercialização, porque é ela que defende os produtores das vontades económico-financeiras do grande comércio» (…). O que é verdadeiramente extraordinário é que o governo apresente uma proposta de lei que pode significar uma sentença de morte para a Casa do Douro que pode significar a miséria para muitos agricultores daquela região, e o venha fazer nesta Assembleia, procurando sustentar que o que afinal está a fazer é a salvar a Casa do Douro. Isso já não é apenas grave, isso releva da pura e simples hipocrisia política.»
E depois de quatro anos e meio, no governo e na Assembleia da República, a afundar a situação económico-financeira e organizativa da Casa do Douro, no fim da X Legislatura, e em vésperas de eleições, o PS apresentou um Projeto de Resolução a recomendar ao governo «medidas que contribuam para a sustentabilidade e revitalização da Casa do Douro e um Plano de Reestruturação Organizacional», que foi aprovado, e transformado na Resolução n.º 78/2009 da Assembleia da República! O novo governo PS/Sócrates que tomou posse a 26 de Outubro de 2009, não cumpriu as recomendações da sua Resolução n.º 78/2009, manteve o essencial da sua política para o Douro, sem nada fazer nem resolver até à sua saída, em 21 de Junho de 2011!
6. O PSD, depois de «baralhar» completamente o quadro normativo institucional da Região Demarcada do Douro com as «reformas» de 1995 e de 2003 e não cumprir nenhum dos compromissos assumidos enquanto foi governo, apresentou quando oposição ao governo PS/Sócrates, na X Legislatura, um Projeto de Resolução que se transformou na Resolução n.º 70/2009, a recomendar ao governo que procedesse a uma «clarificação legislativa» no quadro institucional!
O novo governo PSD/CDS, de Passos Coelho/Paulo Portas, tomou posse em Junho de 2011. Questionada em Julho pelo PCP sobre as soluções para a Região Demarcada, a Ministra da Agricultura anunciou, ter solicitado um parecer aos municípios durienses e que os iam envolver na procura de soluções. Posteriormente a Comunidade Intermunicipal do Douro apresentou propostas, que foram auditadas na Comissão de Agricultura em 2012. O Governo e a Ministra pura e simplesmente meteram-nas na gaveta…
Depois, a ministra da Agricultura anunciou na Comissão de Agricultura que tinham reapresentado à Casa do Douro a última proposta que o segundo governo PS/Sócrates tinha feito para a sua viabilização económico-financeira. Nada entretanto tinha chegado à Casa do Douro.
Depois, durante vários meses, referiu que a proposta estava no Ministério das Finanças em avaliação. A maioria PSD/CDS não deixou ouvir na Comissão de Agricultura da Assembleia da República o então ministro das Finanças Victor Gaspar sobre o assunto.
Finalmente, em 13 de Dezembro de 2013, proclama uma grande novidade ‒ a passagem da Casa do Douro a associação privada. Novidade velha, por ocultação pelo governo da Resolução do Conselho de Ministros de 11 de Junho de 2013, que não foi tornada pública no Comunicado da Reunião do Conselho nem publicada em Diário da República, onde se estabelecia que a Casa do Douro seria transformada em «associação de direito privado de inscrição voluntária dos produtores». No fundo, o que o governo PSD/Cavaco Silva tinha proposto em 1986 através do Decreto-Lei 313/86, que depois foi revogado em Apreciação Parlamentar por decisão unânime da Assembleia da República!
A Resolução do Conselho de Ministros teve agora concretização com a Proposta de Lei n.º 234/XII, que diz pretender alterar os Estatutos da Casa do Douro, e de facto, pretende a sua liquidação definitiva, pondo fim às suas capacidades de defesa dos 40 mil vitivinicultores e da Região Demarcada do Douro!
7. O comportamento político do governo PSD/CDS de Passos Coelho e Paulo Portas para com o Douro é não só de uma violência institucional inaudita, de um desrespeito profundo dos milhares de vitivinicultores e das instituições da Região Demarcada, como da total falta de ética política, face aos compromissos, promessas e declarações feitas por responsáveis daqueles partidos ao longo de mais de 30 anos!
A Proposta de Lei nº 234/XII de liquidação da Casa do Douro, culmina três anos de mentiras e decisões políticas inacreditáveis e inaceitáveis. Três anos em que os graves problemas da Região não cessaram de se agravar.
a) O corte do benefício aos pequenos viticultores, com a promessa de melhores preços, e os preços baixaram. Na última década terão perdido 40% a 50% de benefício e uma perda de rendimentos superior a 60%.
b) A vergonha da aguardente vínica. O governo, numa «guerra» que tem tantos anos como a Região Demarcada, sobre a produção ou não de aguardentes vínicas a partir de vinhos da região, cede com total descaramento aos mesmos de sempre, repudiando inclusive a proposta da Comunidade Intermunicipal do Douro (CIM Douro). Proposta, diga-se, feita a pedido do Ministério da Agricultura (ex-secretário de Estado Daniel Campelo). Para cúmulo, o governo autoriza o uso de aguardente vitícola (a partir de subprodutos vitícolas, como as borras), no benefício, fazendo mais um grande «frete» aos principais grupos que dominam o comércio, com grandes plantações fora da Região Demarcada e no estrangeiro, abrindo-lhes um canal lucrativo para o escoamento dos subprodutos dessa produção.
c) A continuação da apropriação de receitas da taxa do IVDP, fazendo os durienses pagar um outro imposto. Isto, enquanto não privatiza o próprio IVDP, conforme promessa do primeiro-ministro no Verão passado, correspondendo ao pedido das Casas Exportadoras.
d) O escândalo de 40 meses de salários em atraso de trabalhadores da Casa do Douro.
e) O desastre da falência e o encerramento das principais Adegas Cooperativas da Região, algumas já servindo de «entreposto» a empresas de vinho.
f) Um comportamento na relação institucional com a Região Demarcada inteiramente similar ao dos governos PS/Sócrates, com a ministra da Agricultura a deslocar-se ao Douro para as «vindimas», ou o primeiro-ministro a discursar na tomada de posse dos Corpos Gerentes da AEVP em Gaia, mas sem nunca terem tempo para aparecer na Casa do Douro e encontrarem-se com os viticultores e os seus representantes associativos.
g) E a culminar, apresentam uma proposta de saneamento financeiro, que finge ignorar que a responsabilidade do afundamento financeiro da Casa do Douro pertence às políticas que a descarnaram de funções, atribuições e competências, que lhe roubaram o cadastro a coberto de um protocolo que não foi cumprido, que não cumpriram sentenças de tribunais, que deixaram escorrer os meses e os anos, engordando a dívida, com o volume monstruoso dos juros de 30 milhões de euros que agora «magnanimamente» diz perdoar! Proposta, onde se insere o escândalo de uma avaliação do património/stocks históricos do vinho generoso da Casa do Douro a preços de saldo, e longe dos compromissos anteriormente assumidos em Protocolos livremente assinados entre a Casa do Douro e o Estado português!
Também para memória futura devem ficar registadas as palavras/propostas/afirmações do então deputado e líder do PSD na oposição, depois primeiro-ministro de um governo PSD/CDS, Durão Barroso, e ainda hoje presidente da Comissão Europeia, no dia 13 de Dezembro de 2000 em Sessão Plenária, com uma manifestação de viticultores durienses à porta da Assembleia da República e em que se debateu o Douro. Discurso inflamado, em que o deputado Durão Barroso, do PSD, contrariava a aplicação que estava a ser feita pelo governo PS/Guterres da legislação que o governo PSD/Cavaco Silva tinha aprovado!
‒ «O Estado como pessoa de bem (...) deve, assim, indemnizações à Casa do Douro por ter decidido cessar tais obrigações», as que correspondem ao assumir «durante mais de 60 anos», atribuições públicas.
‒ «O PSD exige que se proceda às alterações legislativas adequadas para dotar a Casa do Douro de fontes de financiamento próprias e estáveis».
‒ «A ousadia (do governo PS/Guterres) chegou ao ponto de tentar retirar à Casa do Douro, através de despacho governamental, um dos maiores patrimónios da região: o cadastro dos viticultores da Casa do Douro».
O que o governo PSD/CDS de Passos Coelho e Paulo Porta faz, é exatamente o contrário do que reclamava Durão Barroso!
8. O governo PSD/CDS quer enterrar definitivamente a Casa do Douro. Isto é, derrubar o último obstáculo que se opõe a que o grande comércio oligopolista dos vinhos do Douro e Porto, cinco grandes grupos vitivinícolas e mais meia dúzia de grandes proprietários do Douro, dominem total e absolutamente a Região Demarcada mais antiga do mundo, a Região Demarcada do Douro. Isto é, deixar completamente desprotegidos, desapossados, indefesos, 40 mil pequenos viticultores durienses. Transformada em «associação de direito privado de inscrição voluntária dos produtores», a Casa do Douro deixa de ser de todos os vitivinicultores para passar a ser apenas de alguns. Amanhã veremos a Casa do Douro na mão daqueles grupos, ou dos seus capatazes, e da CAP.
O processo legislativo e as medidas dos governos PSD, PS e CDS para a Casa do Douro e a Região Demarcada são politicamente escabrosos, e chegariam para derrubar toda a credibilidade ética e política desses partidos, atingindo a própria Assembleia da República, não fosse a cortina de silêncio e a opacidade de chumbo da cumplicidade poderosa dos media a ocultar, cobrir, as malfeitorias do PSD, PS e CDS no Douro.
Quando alguns hoje perante a enormidade da abstenção eleitoral e a desafeição dos cidadãos face aos partidos, questionam o modo de fazer política e os sistemas eleitorais, aliás num rasteiro oportunismo visando e ocultando interesses partidários e jogos de poder, deveriam começar por olhar e analisar criticamente as suas práticas políticas, as práticas políticas do PS, PSD e CDS, por exemplo relativamente à Região Demarcada do Douro.
O PCP sempre considerou que, independentemente das vicissitudes de percurso da sua gestão, a Casa do Douro enquanto associação pública, representante dos viticultores durienses, com estratégicas funções originárias, é essencial à defesa da produção e dos produtores, ao equilíbrio da organização institucional da Região Demarcada, ao prestígio e valorização de toda a produção vínica.
Defendendo que a definição dos aspetos concretos do funcionamento e da organização interna da Casa do Douro, e em particular, do regulamento eleitoral, deve competir, antes de mais, aos seus associados no âmbito da autorregulação profissional, o PCP entende, no entanto, que a organização da Casa do Douro deve respeitar os princípios constitucionais, em especial quanto aos direitos de todos os associados, e que o Estado não pode demitir-se de definir as suas funções e atribuições estratégicas.
É este o sentido do Projeto de Resolução que o Grupo Parlamentar do PCP apresenta.
Os viticultores do Douro saberão lutar, saberão resistir! A Região Demarcada do Douro resistiu à violência da Majestática Real Companhia e à febre da revolução liberal, aguentou os atropelos da República e o esmagamento dos seus interesses pela corporação da lavoura salazarista, conforme os interesses dos latifundiários alentejanos e ribatejanos.
O PCP segue fiel aos seus compromissos e lutas de décadas pelo Douro e os durienses, porque não acredita que os homens e mulheres do Douro, qualquer que seja o seu partido ou ideologia política, possam estar de acordo com o que este governo, na continuidade dos anteriores, está a fazer ao Douro, ao Douro pertença dos portugueses e Património da Humanidade,
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo:
1. Que o Estado assuma, em articulação com a Casa do Douro, o processo do seu completo saneamento financeiro, assegurando, nomeadamente:
(i) Que, com carácter de urgência, o governo assuma as indemnizações compensatórias resultantes da cessação de obrigações e as contrapartidas financeiras resultantes da reforma institucional efetuada em 1995 devidas à Casa do Douro, procedendo às respetivas transferências financeiras;
(ii) Que o governo, em diálogo com a Casa do Douro, assuma e faça executar os compromissos assinados em sucessivos Protocolos;
(iii) Que, na execução do item anterior, se tenham em conta os possíveis prejuízos decorrentes dos atrasos verificados na concretização dos Protocolos, assumindo o Estado os respetivos encargos.
2. Que se proceda à clarificação do quadro institucional da Região Demarcada do Douro, revertendo para a Casa do Douro, anteriores atribuições e competências, promovendo o reequilíbrio entre a produção e o comércio, nomeadamente garantindo à Casa do Douro:
(i) A sua natureza de pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e de património próprio;
(ii) A representação unitária e a prossecução dos interesses coletivos de todos os viticultores, entendendo-se por tal todas as pessoas, singulares ou coletivas, que cultivem vinha na Região Demarcada do Douro;
(iii) A inscrição obrigatória de todos os viticultores singulares ou coletivos, cabendo-lhe a representação exclusiva da produção nos órgãos interprofissionais do Instituto do Vinho do Porto após a remodelação deste, devendo ter em conta a realidade sócio- económica da região e respeitar critérios de equidade no acesso das associações de produtores ao Conselho Regional de Viticultores da Casa do Douro;
(iv) O registo oficial dos viticultores e a conservação da propriedade do cadastro das vinhas, competindo-lhe proceder à inscrição de todas as parcelas para efeitos da sua classificação de acordo com o respetivo potencial qualitativo e no respeito pelas orientações a definir pelo Instituto do Vinho do Douro e Porto;
(v) A intervenção na disciplina, controlo e fiscalização da produção, elaboração e comercialização dos vinhos de qualidade com direito a denominação de origem ou indicação de proveniência regulamentada produzidos na Região Demarcada do Douro;
(vi) A capacidade de intervir na comercialização de vinhos, no que se inclui a retirada da produção dos vinhos de vindima não comercializados e a aquisição em cada campanha dos quantitativos necessários à manutenção do stock histórico;
(vii) Aos funcionários da Casa do Douro, os direitos e regalias adquiridos ou, em alternativa, o direito de requerer a aposentação antecipada;
3. Que se proceda a uma profunda remodelação, em articulação e diálogo com a Casa do Douro, outras associações regionais e os durienses, do quadro dos órgãos e regulamento eleitoral da Casa do Douro, assegurando a sua simplificação, democraticidade e representatividade dos vitivinicultores, nomeadamente:
(i) O Conselho Regional de Viticultores é o único órgão representativo com funções deliberativas e é composto por representantes dos viticultores diretamente eleitos, que constituem a maioria, por um membro em representação de cada uma das adegas cooperativas existentes na Região e por elas designados e por um membro em representação de cada uma das associações de viticultores regularmente constituídas e também por estas designados;
(ii) A Direcção da Casa do Douro é eleita diretamente pelos vitivinicultores;
(iii) O regulamento eleitoral da Casa do Douro deve prever um sistema de representação proporcional face ao número dos associados, garantindo a transparência e democraticidade dos atos eleitorais e a igualdade de tratamento das listas concorrentes;
(iv) Têm capacidade eleitoral ativa e passiva para os órgãos representativos eleitos por sufrágio universal direto todos os viticultores inscritos na Casa do Douro, independentemente do volume de produção e colheita de cada um e da entrega da respetiva declaração;
(v) São inelegíveis para o Conselho Regional de Viticultores todos aqueles que forem comerciantes, gerentes, comissários ou corretores de empresas que se dedicam ao comércio de vinhos e seus derivados, não se considerando como tal todos os que venderam exclusivamente os vinhos provenientes da sua produção vitícola e os que vendam na qualidade de diretores das adegas cooperativas;
(vi) O regulamento eleitoral, que deve aproximar-se, de forma simplificada, da regulamentação vigente para as autarquias locais, em matéria de formação, apresentação de listas e fiscalização do processo eleitoral, e deve prever uma comissão eleitoral com a seguinte composição:
a) Um presidente, viticultor de reconhecido mérito, eleito pelo Conselho Regional de Viticultores;
b) Cinco membros eleitos pelo Conselho Regional de Viticultores;
c) Um representante de cada lista candidata.
Assembleia da República, em 20 de junho de 2014