Se houve algum descontrolo na atribuição da nacionalidade portuguesa tal deve-se a dois fatores:
Primeiro: o escândalo da manutenção em vigor por muitos anos de uma chamada “lei dos sefarditas” que, tendo partido da ideia de uma reparação histórica, que se pensava ser simbólica, da expulsão dos judeus sefarditas de Portugal há 500 anos, acabou por se tornar num expediente para a atribuição fraudulenta da nacionalidade portuguesa a dezenas de milhares de pessoas sem qualquer ligação à comunidade nacional.
Num processo que está nas malhas da justiça, envolvendo a comunidade israelita do Porto, a nacionalidade portuguesa era vendida nas agências de viagens em Telavive a quem a quisesse obter por conveniência e dinheiro, ao ponto de chegarmos a saber que até o oligarca russo Roman Abramovich tinha obtido a nacionalidade portuguesa por essa via.
Sobre isso não vimos o Chega levantar um só dedo. Mais: o que vimos o Chega fazer foi votar contra o projeto de lei do PCP há dois anos, que propunha a cessação de vigência desse regime.
O segundo fator de descontrolo chama-se vistos gold. Ou seja: um milionário que venha a Portugal comprar uma casa de luxo, a que a esmagadora maioria dos portugueses e dos imigrantes não podem comprar, obtém uma passadeira vermelha para a autorização de residência que, com o decorrer do tempo, pode levar à obtenção da nacionalidade. Para a obtenção dos vistos gold o Chega, e também o PSD, o CDS e a IL, não querem saber de critérios, nem de ligação à comunidade, nem de registos criminais, nem de conhecimento da língua. Haja dinheiro, é o que basta.
Depois vem o Chega pretender limitar o reagrupamento familiar, mas apenas para os pobres.
As alterações recentemente anunciadas pelo Governo em matéria de imigração, mais do que uma cedência ao Chega, o que revelam é a materialização da agenda do PSD e do CDS. Para lá das legítimas dúvidas constitucionais que tais opções suscitam, constituem um retrocesso no plano dos direitos humanos, deixando os imigrantes que cá trabalham e descontam, mas vulneráveis e expostos à exploração e às malhas das redes de tráfico.
Limitar o acesso ao reagrupamento familiar por parte dos imigrantes que vêm a Portugal para trabalhar e que, com toda a legitimidade, pretendem ter consigo os seus filhos e cônjuge e isentar de tais limitações ao abrigo do cartão azul ou os titulares de vistos gold, não corresponde a qualquer princípio humanista. Diferenciar imigrantes em função das qualificações ou em função da carteira, estes com direitos assegurados, enquanto os imigrantes que procuram uma vida melhor no nosso País, muitas vezes angariados por entidades patronais e quando já não precisam são abandonados à sua sorte, já não são assegurados direitos. É desumano! Mas é este o critério do PSD, do CDS, do CH e da IL: para os ricos direitos sem deveres, para os pobres deveres sem direitos.
O reagrupamento familiar é um elemento central de uma efetiva política de integração social das comunidades imigrantes.
Limitar e restringir só favorece a imigração ilegal, as máfias e o tráfico de mão-de-obra barata.
A direita não quer imigrantes que tenham condições dignas de trabalho e de vida e de inserção social e familiar. O que a direita quer são trabalhadores para explorar, de preferência ilegais, a ganhar mal, a viver sem os seus familiares em barracões que compartilham com outros trabalhadores na mesma situação, para que possam ser explorados sem protestar e expulsos como bodes expiatórios dos problemas nacionais quando o grande patronato os quiserem descartar.
Sendo verdade que a capacidade não é ilimitada, o que é preciso é uma política de acolhimento e integração, o reforço dos serviços públicos, de entre eles o reforço de meios da AIMA que resolva os processos em atraso e proceda à regularização da situação dos imigrantes que vivem e trabalham no nosso País.