De acordo com a denúncia e os relatos a que o Grupo Parlamentar do PCP teve acesso, a cadeia de grande distribuição Jerónimo Martins/Pingo Doce está em todo o país a pressionar os trabalhadores a assinarem o banco de horas. Trabalhadores do Pingo Doce em várias lojas foram vítimas de «actos de verdadeiro terrorismo psicológico, ameaças várias e pressões» para aceitar a imposição do banco de horas que a empresa pretende aplicar.
Já se conhecem verdadeiras operações de ameaça aos trabalhadores. Alguns “chefes” são apontados como «verdadeiros carcereiros, ameaçando os trabalhadores com represálias e transferências, transformando secções em prisões». E, sabendo-se que os trabalhadores não têm de justificar o sim ou não ao banco de horas, verifica-se a prática, absolutamente prepotente
e abusiva, de exigir a justificação da opção dos trabalhadores. Segundo a denúncia do CESP, esta prática está a ser seguida em várias lojas Pingo Doce.
Toda esta situação vem mais uma vez confirmar o que é e para que serve este Código do Trabalho: tal como o PCP sempre alertou, a "negociação" individual com o trabalhador seria o abrir de portas a todo o tipo de manobras de chantagem e intimidação por parte do patronato, tal como se está a verificar no Pingo Doce.
Impõe-se no entanto colocar a questão da legalidade deste processo. O artigo 208.º-A da Lei n.º 23/2012 define “banco de horas” como sendo a possibilidade da empresa e o trabalhador acordarem (sublinhado nosso) o aumento da jornada diária de trabalho até 10 horas, semanal até 50 horas e anual até 150 horas. Ora, o que a Jerónimo Martins/Pingo Doce fez foi o seguinte: elaborou um Regulamento Interno, “notificou” os trabalhadores acerca do mesmo, exigiu as suas assinaturas a confirmar que tomaram conhecimento – e a partir daí, considerou o “acordo” como concluído!
A empresa apresenta o documento como Regulamento Interno, o que significa que o assume como imposição unilateral, cujo teor é absolutamente taxativo a impor o trabalho a mais.
Estabelece um aviso de 48 horas de antecedência (mas que pode não acontecer, permitindo que as chefias imponham com efeitos imediatos a prestação das horas a mais); mas quando se trata de compensar os trabalhadores, o processo é indefinido, indeterminado, sempre sujeito à vontade da empresa.
Mesmo quanto à forma de compensação, o Pingo Doce reclama para si o direito “unilateral” de decidir se compensa em tempo ou em dinheiro – mas nunca se compromete com um prazo para compensar. O que significa que um trabalhador pode trabalhar 50 horas numa semana... e 50 semanas depois ainda não gozar a compensação. Aliás, é essa a realidade que se verifica já nos locais onde é aplicado este mecanismo de exploração desumana dos trabalhadores.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, perguntamos ao Governo, através do Ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, o seguinte:
1.Que conhecimento tem o Governo acerca desta situação?
2.Que intervenção tem sido desenvolvida – e nomeadamente a nível nacional, dado que se trata, não de um caso pontual numa loja, mas sim de toda uma cadeia de grande distribuição – pelas autoridades competentes, designadamente a ACT?
Pretende o Governo deixar esta atitude do Grupo Jerónimo Martins/Pingo Doce ficar impune?
3.Que medidas estão concretamente a ser tomadas para averiguar, investigar e punir as práticas de ilegalidade e ataque aos direitos dos trabalhadores acima relatadas?
4.Reconhece ou não o Governo que este Código do Trabalho, tal como o PCP sempre alertou, ao consagrar a "negociação" individual com o trabalhador, promove o abrir de portas a todo o tipo de manobras de chantagem e intimidação por parte do patronato?