Professores, pessoal da saúde, artistas e trabalhadores da cultura, trabalhadores da comunicação social, advogados e outros profissionais do direito, trabalhadores sociais, homens e mulheres das forças de segurança e defesa, lutam hoje com maior ou menor determinação para evitar a desqualificação das suas funções e estatutos, para tentar preservar-se das consequências da política de direita ao serviço dos grandes grupos económicos e não irem engrossar as fileiras dos desempregados.
Pequeníssimos, pequenos e médios industriais e comerciantes desamparados perante a constante degradação da sua actividade e olhando com inquietude para o exemplo das portas fechadas dos seus vizinhos de há pouco, e que começam a compreender o quanto dependem da capacidade de consumo dos passantes que, cada vez menos endinheirados, se não detêm.
Todo este caudal de inquietação e lutas começa agora a convergir com as fileiras dos trabalhadores que, ricos da sua antiga e dura experiência de resistência e luta, organizados nos seus sindicatos e no seu partido de classe, nunca deixaram de ser a vanguarda das lutas sociais.
Estas camadas integraram e integram ainda os aparelhos ideológicos e culturais que servem de esteio ao domínio das classes possidentes sobre a sociedade. Hoje, vêm-se em maior ou menor grau “relegadas” para o campo dos trabalhadores directamente explorados pelo capital.
Ante este agudizar de contradições, a manutenção do “statuo quo” revela-se cada vez mais impossível: ou bem o sistema se mantém, e isso implicará o aprofundamento da exploração do trabalho, o acelerar da mercantilização de vastos sectores até aqui relativamente poupados ao estatuto de mercadoria vulgar – educação, cuidados de saúde, cultura, segurança social, funções de soberania –, o agravamento da pilhagem das economias nacionais mais débeis ou bem os trabalhadores e os povos abrem caminho a uma ruptura com o sistema e à concretização de uma economia e uma sociedade que se baseie na satisfação das necessidades sociais da grande maioria.
Que as classes dominantes estão decididas a tudo para manterem os seus privilégios é cada vez mais óbvio. Que as classes dominadas, as de sempre e as que agora se vêem relegadas para este estatuto, não podem mais consentir passivamente sofrer o agravamento da exploração é igualmente uma evidência. Mas para estas põem-se o problema da capacidade para propor uma organização socioeconómica alternativa que satisfaça as aspirações de todos e impeça as manobras de recuperação dos possidentes.
Como exemplarmente o demonstraram as intervenções até agora produzidas neste seminário, a actual crise do sistema capitalista global está já provocar um retrocesso civilizacional e reclama a acção - consciente - dos trabalhadores e dos povos para evitar a marcha para o abismo que as classes dominantes orquestram.
Esta é para os comunistas uma premissa que muitos outros vão integrando nas suas análises: em última instância, só a acção consciente dos homens pode modelar as formas das transformações das sociedades e do mundo.
E aqui reside o problema e a importância da consciência e, por isso, da cultura e da ideologia - quadros através dos quais os homens lêem as suas reais condições de existência e que condicionam as respostas que a elas vão dar.
Trata-se para os trabalhadores e para o seu partido de saber transformar a novas condições concretas de existência das camadas agora atingidas pela crescente mercantilização de toda a actividade social em consciência do seu novo estatuto, em assunção desse estatuto e da sua irreversibilidade, em determinação de se juntarem à luta geral dos trabalhadores contra os interesses do grande capital e por um sistema socioeconómico baseado na satisfação das legítimas necessidades das diferentes camadas sociais.
A descredibilização crescente do “pensamento único” que ainda há pouco parecia dispor de um domínio avassalador é o reflexo destas novas condições concretas e abre a via para uma tomada de consciência da necessidade e da possibilidade de construção de uma alternativa real.
Em Portugal a proximidade histórica do episódio maior da vida nacional que foi o processo revolucionário do 25 de Abril, facilita a sua reavaliação por todos aqueles que dele beneficiaram e num ou noutro momento para ele contribuíram, em confronto com o longo processo contrarrevolucionário que nos trouxe até à amarga situação presente.
Outro elemento favorável é o da posição progressista de uma importante e prestigiada parte da intelectualidade portuguesa que, ao longo dos anos, soube assumir e dar voz aos anseios populares e às lutas dos trabalhadores e do povo. Para esta circunstância não é de menor importância a política de relacionamento exigente e aberto com os intelectuais posta em prática pelo PCP.
Nada está ganho à partida, mas é mais real que nunca a possibilidade de criar uma larga frente de recusa desta política, ou de outra que mais relutantemente prossiga os mesmos objectivos.
Nada está garantido à partida, mas é mais real que nunca a possibilidade de conciliar as aspirações de diferentes camadas num programa que ofereça a cada um a perspectiva de um futuro construído na base do respeito pelo trabalho, da garantia das condições de vida das populações, da democracia política, económica e cultural que tem o seu mais firme esteio no programa político do PCP.