Camaradas
Em Portugal, a banca, desde a sua privatização, distribuiu milhares de milhões de euros em dividendos. Só entre 2000 e 2014, a banca distribuiu 8,5 mil milhões de euros em dividendos aos accionistas. No entanto, os resultados líquidos foram caindo a pique ao longo dos últimos anos, particularmente desde 2009 e as perdas por imparidades implicaram valores acima dos 16 mil milhões de euros. O impacto dessas perdas atirou os bancos que actuam em Portugal para uma situação de falência por falta de capital regulatório. De um total de cerca de 22 mil milhões de capital em falta no sistema financeiro (para já), cerca de 16 mil milhões foram retirados dos recursos públicos. Os restantes 6 mil milhões foram obtidos em parte por créditos garantidos pelo Estado e concedidos aos bancos portugueses ou por créditos circulares aos accionistas, como se verificou em Portugal em vários bancos, alguns deles alvos de comissão de inquérito parlamentar.
Ao longo das últimas décadas, o poder político alimentou o crescimento de um negócio bancário, contribuindo para o florescimento de grandes grupos económicos e financeiros em Portugal que recuperam a tradição monopolista do passado português. Ao invés de cumprir a lei e a constituição, os sucessivos Governos, PS, PSD e CDS, afrontam-na ao contribuir para a consolidação de monopólios e para a concentração do poder financeiro. O caso Banif, entregue ao Santander Totta, é um claro exemplo de intervenção estatal para limpar a dívida de um banco e para o entregar a um outro banco maior. Ou seja, gradualmente, as instituições bancárias vão sofrendo um processo de aglutinação, contribuindo para a criação de monstros financeiros que constituem um risco cada vez mais significativo para o interesse dos povos.
A banca presente em Portugal sempre esteve profundamente descapitalizada, cresceu à sombra do poder político e das opções dos sucessivos governos e geriu o crédito de acordo com os objectivos dos grandes accionistas. Ao mesmo tempo que condicionou o fluxo e a direcção do crédito, a banca arriscou a poupança de milhões de trabalhadores e promoveu uma política de distribuição de dividendos que ignorou os riscos do crédito. Ou seja, em Portugal e em outros países, a História é a mesma: o grande accionista privado do Banco usa os depósitos – as poupanças dos trabalhadores – para atribuir crédito aos grandes grupos económicos dos quais é também accionista. Ao mesmo tempo, o accionista recebe os lucros gerados pela instituição bancária. Quando o próprio accionista não paga a dívida contraída junto do banco, são os depósitos dos trabalhadores que ficam em risco. Até aqui, os Governos desviaram os recursos públicos para salvaguardar esses depósitos. Essa opção tem custos concretos nos serviços públicos e nos direitos. Veja-se o caso do BES: não foi possível salvar o BES sem que milhares de milhões fossem desviados dos recursos públicos, implicando cortes em despesas sociais e no funcionamento básico da Educação, da Saúde, da Cultura, da Segurança das populações, da Justiça, etc... Ou seja, salvar o BES implicou o incumprimento da constituição da república portuguesa. Isso é verdade também para o que se passou com o BPN, o BPP, o Banif e o BCP. É verdade para todos os bancos privados. A actual situação do Novo Banco configura-se, a concretizar-se a sua entrega a um grupo privado, como um novo processo de limpeza da banca para continuar nas mãos dos mesmos.
A banca privada representa, portanto, um risco incomportável em todas as dimensões. Um risco porque determina para onde é dirigido o crédito ao sabor do interesse exclusivo do accionista, independentemente das necessidades nacionais e das necessidades da economia.
Um risco, porque a política de distribuição de dividendos a accionistas privados é orientada para o retorno imediato do capital accionista acrescido de lucros que podem não corresponder aos resultados da instituição. Foi isso mesmo que se passou em Portugal. Foram distribuídos milhares de milhões de euros de dividendos que, na verdade, estavam a ser retirados do capital bancário e não de resultados da sua actividade.
Um risco porque a supervisão bancária é um embuste, uma construção do poder político e do poder financeiro para tranquilizar as massas. A constituição da União Bancária corresponde a uma nova fase dessa construção, dessa ilusão.
É no controlo público da banca que reside a chave para resolver os principais problemas do sistema financeiro.
O controlo público da banca é uma condição necessária, mas não suficiente, como vemos com a Caixa Geral de Depósitos. É contudo uma necessidade política e não pode ser desligado de uma estratégia de construção de uma política alternativa patriótica e de esquerda que recupera a soberania nacional e liberta a democracia das malhas do grande capital monopolista, o que só pode ser feito com a renegociação da divida e a recuperação da soberania monetária.
Controlar a banca, renegociar a divida, preparar a saída do euro, objectivos para saudar, concretizar os valores de Abril. Porque só com os valores de Abril Portugal terá futuro.
Viva o PCP!