Intervenção de Alma Rivera na Assembleia de República, Reunião Plenária

Transição Digital nos Registos só funciona com mais investimento e valorização dos trabalhadores

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Sem dúvida que uma das marcas de quase 50 anos de política de direita, continuada na alternância entre governos do PS e PSD com ou sem CDS, é precisamente a degradação dos serviços públicos.

A justiça e, em particular, os registos e notariado, são caso paradigmático desta opção errada, esta opção de degradação e encerramento dos serviços públicos que infelizmente tem as consequências à vista.

Faltam trabalhadores nos serviços públicos, não são garantidas condições de trabalho, não há valorização das carreiras e das profissões. Não há uma opção pelo reforço da contratação de trabalhadores, mas sim a promoção da precariedade laboral e de recurso à externalização de serviços.

O governo finge que não percebe que sem trabalhadores não há serviços públicos. São os trabalhadores dos serviços que os fazem funcionar.

Mas infelizmente a filosofia seguida por sucessivos governos é oposta.

Hoje estamos aqui a debater um setor que chegou a um ponto de total estrangulamento e rutura.

Srs. membros do governo, os que estão aqui presentes, Srs. deputados,

Há mais de 20 anos que não existe concurso.

Não entra ninguém, não há concursos, não há renovação de pessoal nos registos.

Com a média de idades a rondar os 59 anos, a curto prazo haverá imensa gente a reformar-se.

E se hoje faltam 234 conservadores e 1522 oficiais de registos, amanhã serão muitos mais, mas isto significa inevitavelmente o encerramento de mais conservatórias.

Nestes 20 anos saíram 2000 trabalhadores e não entrou nenhum.

Se a isto somarmos:

Que consecutivamente têm sido remetidas competências sem conferir capacidade e meios, sejam recursos humanos ou meios físicos e materiais, designadamente o desmantelamento do SEF ou o trabalho ligado ao balcão único do prédio e às alterações à nacionalidade, trabalho que só recai sobre os poucos trabalhadores existentes.

O resultado é o desastre. A imagem das pessoas de madrugada a fazer fila para tirar senha diz tudo.

Há quantos anos não alertam e denunciam os trabalhadores dos registos para a situação?

Há quanto tempo não alerta o PCP para isto? Apresentando dezenas de iniciativas, nomeadamente em sede de Orçamento do Estado, com aconteceu este ano.

Há quantos anos também não são rejeitadas todas as propostas para resolver o problema, nomeadamente por quem hoje convoca este debate?

Importa assumir responsabilidades. Mas sobretudo fazer o que tem ser feito.  Não é “para quando?”, é “para ontem”.

E é justo fazer uma saudação à greve que ainda ontem se realizou, à determinação daqueles que, não obstante tudo, continuam exemplarmente a cumprir o seu dever e a corresponder na medida do que lhes é possível, para além do que lhes é possível, às necessidades das pessoas.

Srs. deputados, sempre que se fala neste assunto aparece a conversa do digital.

É não ter a noção do que é procurar fazer uma marcação online e perceber o prazo a que somos remetidos e a vaga mais breve ser a muitos quilómetros do sítio onde estamos?

Mas submetido o processo, quem trata dele? É o digital?

A transição digital é muito necessária, sim, mas podia era começar por cuidar de assegurar os meios informáticos básicos ao funcionamento dos serviços, em instalações decentes, sem isso não há digital que aguenta.

E não pode é ser usada para ignorar as necessidades de quem trabalha e dos próprios serviços.

(É que nem é preciso ir buscar exemplos muito longe.

Na capital do país, em pleno centro de lisboa, no departamento de identificação civil da Rua Nova do Almada, é o caos.)

É fácil perceber que nada disto se resolve sem tratar dos problemas que afetam os trabalhadores.

São os conservadores e oficiais de registo fazem acontecer.

Não é admissível continuar sem encontrar uma situação para as desigualdades salariais, algo que até a Provedoria de Justiça já colocou.

É preciso, de uma vez por todas, não é com eterna conversação, avançar de uma vez por todas na Revisão da carreira, da tabela única remuneratória que é um problema transversal às carreiras especiais.

O abono por falhas está previsto (como a todos os que trabalham com pagamentos e têm essa responsabilidade)  e não foi atribuído, apesar de por exemplo o orçamento do estado para 2021 prever especificamente a transferência dos saldos não gastos para esse efeito.

Os trabalhadores é que nunca receberam.

Não há tempo a perder. A degradação acelera-se, a cada ano de inércia será pior.

Vale a pena deixar a questão para que o Governo responda com frontalidade e honestidade:

O que é que impede o governo de fazer o que tem de fazer? Só depende da sua vontade!

Qual é o intuito disto? Fechar, deixar de haver registo e conservatórias públicas? É fazer aquilo que quer a Iniciativa Liberal e os seus congéneres?

O problema no setor da justiça, é essencialmente de recursos humanos, o de se espezinhar os trabalhadores.

Nem funcionários judiciais, Nem guardas prisionais, nem funcionários das conservatórias e registos, mas afinal o que é o Ministério da Justiça pensa fazer sobre isto? E Mais do que pensar e prometer, ouvir, falar, fazer planos, o que é que faz e o que é que está a fazer?

E nesta, como noutras questões, não vale a pena vir com a lista dos concursos e das entradas e dos aumentos até 2026 que isso já não pega, isto já estamos todos acostumados a ouvir, e sobretudo não serve os trabalhadores em situação limite e os utentes dos serviços públicos que não conseguem tratar do mais simples documento.

Um governo que desbarata receita – repare-se, receita do próprio IRN que é paga por todos os portugueses - a atribuir benefícios a tudo o que é grupo económico e financeiro, que num momento como este que o país atravessa transfere diretamente milhares de milhões do orçamento, por exemplo, para as energéticas, não tem moral, não pode dizer que não tem condições de resolver estes problemas, os problemas da Justiça e da sua dimensão preventiva.

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