Intervenção de Hugo Dionísio, Encontro «Os comunistas e o movimento sindical – uma intervenção decisiva para a organização, unidade e luta dos trabalhadores»

Teletrabalho e incremento dos níveis de exploração

Teletrabalho e incremento dos níveis de exploração

Camaradas,

Num tempo em que se agravam as consequências da actual crise, evidenciando a incapacidade do capitalismo para tomar medidas que protejam trabalhadores e suas famílias, o teletrabalho foi apresentado como o remédio milagroso que não apenas possibilitaria o distanciamento físico, mas como abriria portas a todo um novo mundo digital.

Independentemente das vantagens, algumas, que o teletrabalho possa significar em determinados contextos, são, contudo, as suas enormes desvantagens para os trabalhadores, o tornam tão atractivo para o grande capital, aproveitando mais uma crise para concentrar riqueza e incrementar os níveis de exploração e contrariar a descida tendencial da taxa de lucro.

Ao distanciamento físico, que assenta que nem uma luva no modelo de combate pandémico adoptado, o capital adiciona-lhe um conjunto de outras dimensões, mascaradas sob uma capa de modernidade e sofisticação deliberadamente utilizadas para enganar os trabalhadores, fazendo-os crer que são os grandes ganhadores com este regime de organização do trabalho.

Dimensões como:

- A transferência de custos de produção para o trabalhador, energia, água, internet.

- A transferência da responsabilidade pelas instalações e sua gestão, pela manutenção da integridade dos meios de trabalho, e pela criação de um ambiente físico e psíquico adequado para o trabalho.

Dimensões que, quando no local físico sob controlo de empresa, é a entidade patronal que é obrigada a garanti-los.

A estas, adicionam-se ainda:

- o isolamento e o distanciamento social que desumaniza o trabalhador e o afasta da realidade, tornando-o uma espécie de eremita urbano forçado.

- a violação da sua privacidade, através das tecnologias, cada vez mais sofisticadas, que monitorizam a actividade do trabalhador de forma tão invasiva quanto insidiosa.

- a invasão, pelo poder de direcção do patrão, do espaço doméstico do trabalhador, da sua intimidade, bem como da sua família.

- o agravamento da incapacidade para desligar do trabalho, produzindo fenómenos como a tecno-dependência, e o stress tecnológico.

Acima de tudo, o teletrabalho representa a confusão entre o trabalho e a vida pessoal e familiar do trabalhador, sendo que, ao contrário do que o grande capital apresenta, esta forma de organização espacial, não constitui todo um leque de vantagens que liberte o capital das obrigações remuneratórias, organizacionais...

Sempre que se aplica ao trabalhador um regime de organização do trabalho com maior onerosidade, o patrão é obrigado a conciliar as condições de trabalho às exigências dessa forma de organização. A organização da prestação em regime de teletrabalho constitui mais uma forma de flexibilidade laboral ao serviço do patronato - a flexibilidade espacial – que acresce às já conhecidas flexibilidades contratuais, funcionais, temporais ou geográficas.

Às formas mais comuns de flexibilização e desregulação, flexibiliza-se também o espaço físico da prestação.

É assim no trabalho nocturno, por turnos, em que as mais exigentes obrigações em matéria de SST, soma-se um subsídio; é assim no trabalho com dinheiro com o abono por falhas; é assim com a IHT, ou é assim com a disponibilidade 24/7 dos piquetes. Maior onerosidade, deve corresponder a maior retribuição e melhores condições de SST.

Mais do que saber se é a electricidade ou a internet, deve compensar-se o trabalhador por usar as suas instalações, a sua casa de banho, secretaria, sujeitar a sua família á intromissão do trabalho na sua intimidade. Deve compensar-se pelo seu isolamento e pela sua solidão.

E porque a actual realidade torna evidente a necessidade de cumprimento de regras de SST, e tendo vindo, a pandemia, denunciar com toda a evidência aquilo que era o mero cumprimento formal, por parte de muitas empresas, das exigências legais e na CCT em matéria de SST, mais do que nunca, a luta organizada dos trabalhadores por melhores condições de trabalho - das quais, como vimos, o teletrabalho não se exclui - elegendo RT's para a SST, formando-os e mobilizando-os para, em coordenação com os representantes sindicais, intensificarem a necessária acção reivindicativa que obrigue a dignificação do trabalho em todas as sua componentes, é fundamental.

É a luta organizada dos trabalhadores, com uma contribuição decisiva dos comunistas, que resultou nas conquistas civilizacionais que agora o capital quer destruir com a apresentação do seu maravilhoso mundo do digital. Não é o digital que está mal, é o capital, e será com a luta deste partido que serão defendidos os interesses de classe dos trabalhadores

Viva a CGTP-IN
Viva o PCP

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