1. A situação que o país atravessa exige que, no Orçamento e para além dele, sejam tomadas medidas urgentes de valorização do poder de compra e aumento de salários e pensões, controlo e fixação de preços, reforço dos serviços públicos e da sua capacidade de resposta, dinamização do investimento público, apoio aos sectores produtivos e às MPME, tributação efectiva dos lucros extraordinários dos grupos económicos, garantia do direito à habitação. Medidas que devem ser consideradas no âmbito de uma resposta mais alargada aos problemas nacionais e aos défices estruturais que se acumulam e que deixam Portugal mais exposto e vulnerável ao sentido negativo de evolução da situação internacional.
Perante isso, o Governo apresenta uma proposta de Orçamento que recusa a resposta necessária e se constitui como factor de agravamento das desigualdades e injustiças, uma proposta de Orçamento que utiliza a incerteza da situação internacional como justificação para corresponder aos objectivos e interesses dos grupos económicos e do grande capital ao mesmo tempo que impõe a perda de poder de compra e a degradação das condições de vida aos trabalhadores e ao povo em nome da submissão às imposições da União Europeia e do Euro e aos seus critérios das designadas "contas certas" que apontam para a redução acelerada do défice e da dívida.
2. A proposta de Orçamento do Estado apresentada pelo Governo PS não responde aos problemas que atingem os trabalhadores e o Povo e constitui-se como um factor de agravamento das desigualdades e das injustiças. Não é um orçamento de confiança no futuro, como diz o Governo, mas um OE de comprometimento do futuro.
A proposta de orçamento apresentada, articulada com o designado “Acordo para os rendimentos”, aprofundará o empobrecimento da maioria da população, incluindo dos trabalhadores e dos reformados que irão continuar a perder poder de compra; agravará a injustiça fiscal aumentando os benefícios fiscais para os grupos económicos e não aliviando como seria necessário os impostos sobre os rendimentos do trabalho; continuará a degradação do SNS e o favorecimento do negócio da doença; aprofundará a desresponsabilização do Governo pela Escola Pública. Esta é uma proposta de orçamento sem respostas de fundo aos problemas da habitação, aos direitos das crianças e dos pais, ao sector da cultura, às dificuldades de milhares de micro, pequenos e médios empresários.
Os trabalhadores e o Povo português estão confrontados com uma nova vaga de ataque aos seus direitos. Foi assim com os PEC e o Pacto de Agressão da troika, foi assim a pretexto da epidemia, é assim agora a pretexto da guerra e das sanções. No fundo, mudam os pretextos, mantém-se o objectivo: agravar a exploração, concentrar riqueza no grande capital.
A proposta de Orçamento traduz a opção de reduzir a dívida e o défice por conta da redução do valor real dos salários e das pensões, pela desvalorização dos serviços e do investimento público, pelo agravamento das injustiças fiscais.
O PCP não pode deixar de considerar lamentável que o Governo PS insista na farsa da «revalorização salarial» e do «trabalho digno» quando é uma evidência a desvalorização salarial, no privado e no público, continuando inclusive a negar aos trabalhadores a contratação colectiva; que o Governo PS insista na fraude de fazer contas a partir de uma previsão da taxa de inflação de 4% em 2023 e 2% em 2024.
Mas se, em relação aos salários e pensões, o Governo assume a perda de poder de compra e a limitação das funções sociais do Estado, já em relação aos grupos económicos, a proposta de OE abre a porta a escandalosos benefícios fiscais, a uma nova redução do IRC (que beneficia sobretudo as grandes empresas), a novas transferências de recursos públicos que se juntam aos milhares de milhões de euros que, por via do PRR, lhes estão a ser entregues. Ou seja as contas certas são apenas para o capital que tem, na maioria absoluta do PS e na promoção do PSD, CDS, Chega e IL, instrumentos ao seu serviço.
3. O PCP destaca ainda como aspectos particularmente negativos inscritos nesta proposta de Orçamento as seguintes questões:
- A desvalorização do valor real dos salários, das carreiras e profissões na administração pública;
- O corte na actualização das pensões e reformas que está previsto na lei, impondo a perda de poder de compra;
- A possibilidade dada aos grupos económicos de reduzirem drasticamente (ou mesmo anularem) os impostos que têm obrigação de pagar, utilizando sem limite temporal o reporte de prejuízos fiscais, entre outros favorecimentos fiscais;
- O alargamento do financiamento pelo Orçamento do Estado aos grupos privados da doença, designadamente com mais de 9 mil e 700 milhões de euros para aquisição de serviços de saúde pelo Ministério da Saúde, aumentando estas verbas em cerca de mil e 700 milhões de euros em dois anos;
- A recusa da contratação de trabalhadores para os serviços públicos, com destaque para o SNS e a Escola Pública, e a opção pela precariedade laboral e pelo recurso à externalização de serviços e às horas extraordinárias;
- A manutenção de níveis baixos de investimento público face ao que seria necessário para relançar a economia e melhorar os serviços públicos, deixando para o PRR o essencial do investimento. Mantém-se praticamente a mesma previsão para o investimento (7,5% em 2023; 7,3% em 2022), o que é agravado pela prática recorrente de não execução do investimento previsto, como se verifica em 2022, com o Governo a prever uma execução mais de 1.000 milhões de euros abaixo do orçamentado;
- A não actualização dos limites dos escalões do IRS à taxa da inflação que se verificou em 2022;
- A recusa do combate à especulação com os preços como a que se verifica na energia (e também noutros sectores como a grande distribuição) optando pela mobilização de recursos públicos que asseguram e dão suporte aos lucros extraordinários destas empresas.
4. A proposta de Orçamento do Estado para 2023 apresentada pelo Governo PS não só aprofunda todos os aspectos negativos do Orçamento que está em vigor como se propõe agravar desigualdades e injustiças, pelo que merece a oposição do PCP. Uma oposição que se fará também com propostas que marcam a opção por uma política alternativa e que confrontarão o Governo com as soluções que existem para responder, de facto, aos problemas que atingem os trabalhadores e o povo.
O PCP intervirá com essas soluções concretas para defender, em especial, o aumento geral dos salários e das pensões, recuperando o poder de compra perdido e valorizando-o, tal como todas as prestações sociais; o reforço dos serviços públicos em toda a sua extensão, reforçando a capacidade de atrair e fixar trabalhadores; a promoção de uma justa política fiscal com a tributação efetiva do grande capital e o alívio da tributação sobre os rendimentos do trabalho e do consumo; a promoção de mais investimento público respondendo a necessidades urgentes como a habitação, os transportes, a rede de creches, lares e outros equipamentos. Uma intervenção que abrangerá as principais dimensões da vida nacional, incluindo a Segurança Social, a cultura, a justiça, as forças e serviços de segurança, a proteção civil, as MPME e os sectores produtivos.