Declaração de Rui Fernandes, membro da Comissão Política do Comité Central, Conferência de Imprensa

Sobre a denominada Reforma da Estrutura Superior das Forças Armadas

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«O Governo anunciou aquela que considera ser a mais profunda reforma da política de defesa e das Forças Armadas, com a criação do Comando Operacional Conjunto. O PCP não pode deixar de considerar tal decisão como o prosseguimento das medidas de padronização das nossas Forças Armadas com o modelo que predomina no quadro da NATO e assente numa cada vez mais estrita concepção de emprego das Forças Armadas em missões externas. Por outro lado, aprofunda a governamentalização das Forças Armadas, com o reforço das competências do Ministério da Defesa em detrimento do papel dos diferentes Ramos».

Esta citação de uma declaração do PCP feita em Março de 2008, a propósito das alterações legislativas nas Forças Armadas promovidas pelo então governo do PSD, com o apoio do PS, mantém uma pertinente actualidade e confirma o acerto da análise do PCP que, desde os anos 90, vem chamando a atenção para o desenvolvimento de um processo de centralização e governamentalização da instituição militar. Demonstra ainda que não se trata de iniciativas tomadas casualmente por este ou aquele governo, mas de um processo com o seu epicentro a montante, envolvendo o bloco central e a que Cavaco Silva também deu voz, nomeadamente na intervenção feita em Dezembro de 2006, na tomada de posse do então Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, quando defendeu a «reestruturação da estrutura superior da defesa» e o «reforço das competências do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas».

Tal como o Governo afirma, as iniciativas legislativas que apresentou na Assembleia da República, em particular a Lei Orgânica de Bases da Organização das Forças Armadas (LOBOFA), visam uma alteração significativa na estrutura do comando superior das Forças Armadas. Mas, sobretudo, correspondem a um processo de continuidade em relação a reformas anteriores, que não só não deram resposta a problemas que persistem há largos anos como também não melhoraram o resultado do produto operacional, a qualidade da formação, do treino e não acrescentam eficiência à administração, já que se mantêm intocáveis disfunções já apontadas entre o Ministério da Defesa Nacional e o Estado-Maior General das Forças Armadas.

Um processo de governamentalização que, através de sucessivas alterações legislativas, tem afastado os conselhos superiores dos ramos do processo de nomeação das chefias militares, inibindo mesmo os chefes dos ramos de nomearem toda a cadeia hierárquica respectiva. De que terão os governos medo, considerando que, a partir do posto de coronel, todas as promoções são objecto de aprovação pelos ministros da Defesa Nacional e de homologação pelo Presidente da República, num processo de afunilamento de opções em que tende a esbater-se a já muito ténue linha que, pelo menos aparentemente, ainda separa a carreira de oficial general dos partidos do “centrão”?

Nesse sentido, não quisemos deixar de intervir neste processo, por um lado, com sentido crítico em relação aos projectos do Governo e, por outro, com as propostas de alteração que se nos afiguram mais justas e adequadas à situação actual.

Assim, em relação à Lei de Defesa Nacional, e em coerência com a competência do Presidente da República de declarar a guerra, propomos que o Comandante Supremo das Forças Armadas tenha a última palavra no emprego das Forças Armadas em missões contra agressões e ameaças transnacionais ou em operações militares no exterior do território nacional.

Em relação aos direitos dos militares na efectividade de serviço, as propostas que apresentamos visam adequar as regras gerais do exercício desses direitos ao quadro constitucional, em linha com os projectos que entregámos na Assembleia da República, no final do ano passado, relativos ao exercício do associativismo militar. Mas, também, aproximar a legislação portuguesa à da esmagadora maioria dos países da União Europeia, no que respeita ao exercício dos direitos, liberdades e garantias dos militares.

Quanto à Lei de Bases de Organização das Forças Armadas, as propostas do PCP visam contribuir para a estabilidade e a autonomia das Forças Armadas, num quadro em que continua por fazer um amplo e aprofundado debate sobre o que queremos da nossa instituição militar. Aliás, consideramos que a discussão em torno da LDN e da LOBOFA deveria ter sido precedida de um debate sobre o Conceito Estratégico de Defesa Nacional, do qual se deveria concluir que Forças Armadas precisa o País para cumprir a missão constitucional que lhes está acometida, a derivada conceptualização da Condição Militar a impor aos cidadãos militares e consequentes requisitos na sua organização, no dispositivo e no sistema de forças a concretizar em calendário definido.

Em qualquer caso, estas alterações legislativas propostas pelo Governo passam ao lado de um vasto conjunto de problemas com que as Forças Armadas se confrontam há largos anos, nomeadamente relativas ao meios humanos, materiais e financeiros, mas também ao sistema retributivo, às promoções, à saúde militar, às carreiras e à avaliação dos militares. São estes, e não outros, os problemas prementes com que se confrontam os militares. Problemas que geram injustiças, lesam a carreira com tudo o que daí decorre, criam insatisfação e contribuem para a baixa atractividade no ingresso das fileiras. Problemas resultantes de sucessivas alterações da legislação ignorando as recomendações aprovadas na Assembleia da República e os alertas das associações militares.

Por fim, regista-se o argumento do Governo de que tal reforma visa pôr Portugal em linha com os outros países da NATO. Sobre este estafado argumento cabe registar que o mesmo nunca foi utilizado para transpor para Portugal direitos de cidadania e sociais, perfis de carreira e funcionais, critérios de certificação e equivalências de cursos tirados nas Forças Armadas com a vida civil, especialidades e acesso a postos e cargos, mesmo na carreira de oficiais, entre outros aspectos.

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