Declaração de Rui Fernandes , membro da Comissão Política do Comité Central , Conferência de Imprensa

Sobre a acção do Governo na área da Defesa Nacional e Forças Armadas

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A acção do Governo na área da Defesa Nacional está marcada por dois aspectos essenciais:

- a continuidade na desorganização e na desestruturação das Forças Armadas, agora sob o signo da chamada Defesa 2020;

- a continuada ofensiva contra a Condição Militar, visando o enfraquecimento do seu vínculo.

Na verdade, o processo de reestruturação permanente em que a área da Defesa Nacional vive, ou sobrevive, é inaceitável e nada há que o justifique à luz dos interesses e necessidades nacionais. A título de exemplo, refira-se que o Governo se propõe alterar a Lei de Defesa Nacional aprovada em 2009 e a Lei Orgânica do Ministério da Defesa Nacional (LOMDN) aprovada em Dezembro de 2011, com todas as consequências negativas que daí decorrerão, nomeadamente nas áreas operacional e de pessoal.

Com a Defesa 2020, o governo anunciou um processo de reestruturação na área da Defesa Nacional e nas Forças Armadas que não é seriamente concretizável. Isto é, nenhuma reestruturação séria é possível sem investimento e o Governo afirma não ter condições para o fazer.

A Defesa 2020, tal como o Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), são para “NATO ver”, tal é o seu desfasamento com a realidade. Quando, por exemplo, na Resolução do Conselho de Ministros sobre a Defesa 2020 (III – Nível de Ambição), se fala de “capacidade anfíbia, navios de patrulha oceânica e de fiscalização costeira” está o Governo a falar de quê? É que o Governo cancelou todos os projectos nesta área, fechou os Estaleiros Navais de Viana do Castelo e estrangulou o Arsenal do Alfeite, que não só é uma empresa estruturante para a Marinha, como não sobreviverá sem ela. O mesmo se aplica à Força Aérea, fortemente debilitada na capacidade de cumprir as missões, designadamente as de interesse público, como resultado, entre outros aspectos, dos cortes orçamentais que se fazem sentir e na qualificação de novos pilotos do quadro permanente, com graves consequências no futuro operacional deste ramo.

Mas, a Defesa 2020 e o CEDN têm também subjacente o objectivo de agravar a nossa dependência face à NATO e a países terceiros, agora sob a capa dos “modernos” conceitos de smarter defense e pool and sharing, que não passam de velhos e comprometedores acordos, cujos custos se desconhecem, que visam a partilha dos mais importantes instrumentos de acção da nossa defesa militar e a alienação da nossa soberania através da NATO e das suas agências, na sequência do que já se verifica no plano político e económico com o Pacto de Agressão.

As alianças só são verificáveis quando os interesses dos países são convergentes e só nessa situação pode haver partilha, mas nunca de aspectos fundamentais da nossa soberania.

Aliás, a cooperação e a partilha deveriam começar no país, entre os três ramos. Recordamos, por exemplo, que na revisão da Lei de Programação Militar, em 2007, ficou decidida a criação de uma Força Conjunta de Helicópteros que permitiria uma gestão centralizada de toda a nossa frota nas áreas do Ministério da Defesa Nacional (MDN) e do Ministério da Administração Interna (MAI), com a introdução de critérios de racionalidade económica não só na sua aquisição, mas também na sua manutenção, o que não se tem verificado.

É necessário relembrar que, ao contrário do que a “nova doutrina” procura induzir, a razão primeira da existência das nossas Forças Armadas não é “produção de segurança” internacional e a participação em organizações ou forças multinacionais, mas sim a exigência do cumprimento do princípio constitucional da “defesa militar da República”. A organização e a estrutura das nossas Forças Armadas, deve assentar no princípio de que a sua missão fundamental é garantir a soberania do Estado, a independência nacional e a integridade territorial.

É neste quadro que o Governo vem também trabalhando, de forma continuada e sistematizada, com o objectivo de enfraquecer o vínculo da Condição Militar, cujas bases gerais contemplam os especiais deveres e direitos dos militares.

Este objectivo tem-se materializado em múltiplos aspectos, desde as penalizações nos vencimentos aos ataques à situação dos militares na reforma, passando pelo estrangulamento nas carreiras e no processo de promoções, com tratamento desigual entre os três ramos, acrescido de uma nova medida penalizadora que prolonga a permanência por mais um ano em cada posto para efeitos de promoção. Uma medida avulsa no momento em que o MDN está a rever o Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR).

Têm-se agravado as condições na área da saúde e dos apoios sociais, nomeadamente com graves anomalias no processo de fusão dos hospitais militares, a introdução de alterações no sistema de Assistência na Doença aos Militares (ADM), de que resultaram indefinições e alterações na prestação de serviços que atingem os militares e as suas famílias, e causam sérios prejuízos no direito e no acesso a cuidados de saúde.

O Fundo de Pensões, descapitalizado pela política dos sucessivos governos, com problemas diversos nos pagamentos do complemento de pensão aos militares e aos cônjuges sobrevivos, parece não escapar a esta ofensiva. Assim, como resultado de um ano de estudos encomendados pelo governo, que custaram ao erário público mais uns largos milhares de euros e que se somam a estudos de governos anteriores, o MDN anunciou para breve legislação que extinguirá o Fundo de Pensões, legislação que, a consumar-se, o PCP chamará à ratificação na Assembleia da República. Isto ao mesmo tempo que vai anunciando novas medidas de corte no valor das reformas e pensões para as quais os beneficiários descontaram durante os respectivos anos de serviço.

O PCP considera que a Defesa Nacional, mais do que os cortes cegos e a desgastante política de reestruturação permanente a que os governos do PS e do PSD/CDS têm sujeitado as Forças Armadas e os militares nestes últimos anos, necessita de um pensamento estratégico subordinado ao interesse nacional, que projecte o necessário redimensionamento e racionalização da estrutura militar num quadro de evolução progressiva, sem sobressaltos no plano funcional e operacional, sem cortes geracionais abruptos no que respeita ao enquadramento legal da Condição Militar. Portugal não pode continuar sujeito aos calendários políticos das grandes potências da NATO e de outras agências a ela ligadas directa ou indirectamente.

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