Exposição de motivos
Para milhares e milhares de famílias, há uma ameaça que paira sobre o seu futuro imediato e que as coloca perante a incerteza de ficarem sem habitação.
São vários os fatores que se conjugam atualmente, fruto da ausência de medidas do Governo e fruto das opções políticas de PS, PSD, CDS-PP, PAN, CH e IL.
Por um lado, a Lei n.º 31/2012, de 14 de agosto (“novo regime do arrendamento urbano”), ficou até hoje conhecida, e não por acaso, como “Lei dos Despejos”. Tal diploma, com os múltiplos fatores de injustiça, arbitrariedade, conflitualidade que veio trazer ao arrendamento, continua a motivar profundas preocupações e problemas neste sector da vida do país. Para os contratos de arrendamento anteriores a 1990, a perspetiva que está colocada é da liberalização total dos contratos e da expulsão das famílias para fora dos seus bairros.
O regime em vigor suscita preocupações e oposição, não apenas entre os inquilinos, mas também entre todos aqueles que se preocupam em responder ao imperativo constitucional de garantir que todos os portugueses tenham “direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar” (artigo 65.º da Constituição da República).
É um facto que pequenas alterações que foram introduzidas, durante a anterior Legislatura, permitiram atenuar os efeitos mais nefastos da referida lei. Mas não é menos verdade que graves fatores de discricionariedade – de que é exemplo o chamado Balcão de Arrendamento – se mantêm atualmente em vigor.
Por outro lado, não é menos verdade que a epidemia de COVID-19, com o seu cortejo de impactos sociais e económicos (com destaque para o elevado número de famílias a viver situações próximas de exclusão extrema), veio tornar ainda mais gritantes as diferenças entre os fracos recursos da imensa maioria dos inquilinos habitacionais – e os grandes interesses ligados à financeirização do imobiliário.
A presente iniciativa legislativa do PCP estabelece o alargamento do regime extraordinário de proteção dos arrendatários, alterando a Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março com a prorrogação do seu prazo de vigência. Estabelece ainda o alargamento do Regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional.
Finalmente, esta proposta legislativa altera o “Novo Regime do Arrendamento Urbano”), nas suas normas que colocam problemas e ameaças mais prementes e de resposta prioritária, a saber: o prazo de transição do contrato; a proteção do arrendatário com idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade igual ou superior a 60 por cento; e estabelece a não aplicação do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) aos contratos de arrendamento anteriores à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro.
Depois de o PCP ter apresentado o Projeto de Lei n.º 909/XIV (Alteração ao Regime do Arrendamento Urbano), submetido a 9 de julho e debatido a 17 de setembro – e rejeitado nesse mesmo dia, com os votos contra de PS, PSD, CDS-PP, PAN, CH e IL –, a situação atual e a perspetiva que se coloca para o futuro imediato a milhares e milhares de inquilinos deste país exige apesar de tudo uma resposta urgente.
Assim, sem prejuízo da resposta mais abrangente e aprofundada aos problemas que subsistem no acesso dos portugueses ao direito à Habitação, em que a proposta do PCP mantém plena atualidade, é urgente responder a situações particularmente prementes nesta matéria, seja no regime de proteção aos arrendatários e de regularização de pagamentos em mora, seja nas questões mais imediatas e graves da atual “Lei dos Despejos”.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Regime extraordinário de proteção dos arrendatários
(alteração à Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março)
- Mantém-se a aplicação em 2022 do regime extraordinário de proteção dos arrendatários, no contexto das medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, previsto na Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, na sua redação atual.
- O artigo 8.º da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, na sua redação atual, que estabelece medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS- CoV-2 e da doença COVID-19, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 8.º
(Regime extraordinário e transitório de proteção dos arrendatários)
- Sem prejuízo do disposto no n.º 4, ficam suspensos até 31 de dezembro de 2022:
- (...);
- (...);
- (...),
- (...);
- (...).
- O disposto do número anterior depende do regular pagamento da renda devida nesse mês, salvo se os arrendatários foram abrangidos pelo regime previsto nos artigos 8.º ou 8.º-B da Lei n.º 4.º - C/2020, de 6 de abril, na sua redação atual.
- O disposto no número anterior aplica -se às rendas devidas nos meses de julho a dezembro de 2021 e todo o ano de 2022.
- (…).
- (…).
- (…).»
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 4- C/2020, de 6 de abril
O artigo 4.º da Lei n.º 4- C/2020, de 6 de abril, na sua redação atual, que estabelece o Regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, no âmbito da pandemia COVID-19, na sua redação atual, com a seguinte redação:
«Artigo 4.º
(Mora do arrendatário habitacional)
- Nas situações previstas no artigo anterior, o senhorio só tem direito à resolução do contrato de arrendamento, por falta de pagamento das rendas vencidas se o arrendatário, tendo diferido o pagamento da renda, não efetue o seu pagamento, no prazo de 24 meses contados do termo desse período, em prestações mensais não inferiores a um vigésimo do montante total, pagas juntamente com a renda de cada mês.
- O período de regularização da dívida tem início a 1 de janeiro de 2022 e termo a 31 de dezembro de 2023.»
Artigo 3.º
Alteração ao NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano)
Os artigos 35.º e 36.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que aprova o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 35.º
Arrendatário com RABC inferior a cinco RMNA
- (…).
- No período de 15 anos referido no número anterior, a renda pode ser atualizada nos seguintes termos:
- (…);
- (…);
- (…);
- (…).
- (…).
- Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o valor atualizado da renda, no período de 15 anos referido no n.º 1, corresponde ao valor da primeira renda devida.
- (…)
- Findo o prazo de 15 anos referido no n.º 1, o senhorio pode promover a transição do contrato para o NRAU, aplicando -se, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 30.º e seguintes, com as seguintes especificidades:
- (…).
- (…).
Artigo 36.º
Arrendatário com idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade igual ou superior a 60%
- (…).
- (…).
- (…).
- (…).
- (…).
- (…).
- (…):
- (…);
- O valor da renda vigora por um período de 15 anos, correspondente ao valor da primeira renda devida;
- (…).
- (…).
- Findo o período de 15 anos a que se refere a alínea b) do n.º 7:
- (…).
- Revogado.
- Revogado.
- Revogado.
- Revogado.
- No caso previsto no n.º 9, o arrendatário pode ter direito a uma resposta social, nomeadamente través de subsídio de renda, de habitação social ou de mercado social de arrendamento, nos termos e condições a definir por diploma próprio.»
Artigo 4.º
Aditamento ao NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano)
São aditados os artigos 14.ª B, 34.º A e 36.º A ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na sua redação atual, com a seguinte redação:
«Artigo 14.ºB
Apoio e proteção nas situações do procedimento de despejo
- A notificação de procedimento de despejo deve conter informação concreta relativa aos serviços públicos a quem o arrendatário se possa dirigir caso não tenha alternativa de habitação.
- Os serviços de segurança social que acompanham o procedimento de despejo mantêm, até ao final do processo, ligação com o tribunal e com o agente de execução, com obrigatoriedade de elaboração de relatório sobre a situação social do arrendatário.
- Constitui motivo de suspensão excecional do processo de despejo a conclusão, no relatório previsto no número anterior, ada situação de fragilidade por falta de alternativa habitacional ou outra razão social imperiosa do arrendatário.
Artigo 34.º A
Novos Contratos
Aos contratos habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e que tenham transitado para o NRAU, cujo arrendatário, à data da entrada em vigor da presente lei, resida há mais de 20 anos no locado e tenha idade igual ou superior a 65 anos ou grau comprovado de deficiência igual ou superior a 60 %, o senhorio apenas pode opor-se à renovação ou proceder à denúncia do contrato com o fundamento previsto na alínea b) do artigo 1101.º do Código Civil havendo lugar à atualização ordinária da renda, nos termos gerais.
Artigo 36.º A
Não aplicação do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) aos contratos de arrendamento anteriores à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro
- Aos contratos de arrendamento celebrados até à entrada em vigor da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, independentemente da idade ou do rendimento dos inquilinos, e que ainda se mantenham em regime vinculativo ou de perpetuidade, não são aplicáveis as normas do Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU).
- As alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2019, de 12 de fevereiro, aos artigos 1097.º e 1101.º do Código Civil aplicam-se aos arrendamentos existentes à data da entrada em vigor da presente lei.»
Artigo 5.º
Norma revogatória
São revogados os artigos 15.º, 15.º- A, 15.º- B, 15,º- C, 15.º- D, 15.º- E, 15.º- F, 15.º- G, 15.º- H, 15.º- I, 15.º- J, 15.º- K, 15.º- L, 15.º- M, 15.º- N , 15.º- O, 15.º- P, 15.º- Q, 15.º- R e 15.º- S do NRAU (Novo Regime do Arrendamento Urbano), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, na sua redação atual.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.