Preâmbulo
A emigração é um fenómeno social e económico, mas também político, que o povo português bem conhece e à qual recorreu ao longo dos séculos para procurar novas oportunidades e condições de vida, quer de modo voluntário, quer tantas vezes forçado pelas condições que o país lhe oferecia.
O número de portugueses que por diversas razões vive fora do país, embora difícil de contabilização, andará consensualmente, em torno dos cinco milhões, ou seja, a pátria portuguesa é constituída por dois terços dos seus cidadãos residentes no território nacional e o outro terço disperso pelo mundo.
A emigração portuguesa tem como característica uma forte ligação dos seus surtos a períodos de maior dificuldade económica e social do país. Basta ver que os maiores surtos migratórios aconteceram no final do século XIX e princípio do XX, na fase final do regime monárquico e nos anos 60 do século passado, em pleno regime fascista.
Agora o fenómeno da emigração retorna em força. Os dados do Instituto Nacional de Estatística apontam para a saída do país, em 2012, de cerca de 120.000 cidadãos e, nos dois últimos anos, de 250 000. Esta nova vaga de emigração tem contudo uma novidade associada – o intenso apelo por parte do governo para que os cidadãos emigrem, principalmente os que têm qualificações académicas. Já fizeram este apelo, o Secretário de Estado da Juventude, o Primeiro-Ministro e o Ministro-Adjunto. O que se julgou inicialmente ser um lapso, afinal é mesmo uma orientação expressa no discurso oficial do Governo, inscrita até em documentos oficiais. É no relatório do Orçamento do Estado para 2014 que o executivo assume que “será incentivada a internacionalização de jovens licenciados”. Mais claro que isto é impossível!
Este apelo enquadra-se numa perspetiva europeia da mobilidade dos cidadãos e dos mercados de trabalho, em que estes não são de nenhum estado membro em específico, mas sim cidadãos europeus. Logo, no espaço comunitário não há emigrantes, apenas trabalhadores que encontraram as suas oportunidades dentro da União Europeia no contexto da liberdade de circulação. Se verificarmos os casos que se acumulam de portugueses vítimas de exploração laboral, trabalho clandestino e até trabalho escravo em muitos países da Europa, sem que os organismos europeus intervenham (problemas que se verificam em Portugal com naturais de outros países que aqui chegam para trabalhar), percebemos a quem essa concessão da mobilidade serve – o capital. Associado a isto, o apelo do governo português reveste-se de outro aspeto: é que as taxas de desemprego diminuem na direta proporção em que aumenta o número de emigrantes.
São constantes os problemas dos cidadãos que chegam a outros países sem situações definidas o que origina enormes dificuldades como foi o caso dos portugueses que tiveram que dormir nas ruas. Recentemente os conselheiros das comunidades e outros emigrantes alertaram para a falta de apoio que os novos emigrantes sentem nos países de acolhimento, decorrente do défice de técnicos nos serviços consulares, nomeadamente da área social, que prestem esses serviços. Mas também as dificuldades das famílias que emigram com crianças que se integram em sistemas de ensino de países dos quais não conhecem a língua e que deveriam merecer uma atenção redobrada das entidades oficiais, ainda mais quando o sistema de Ensino de Português no Estrangeiro está a ser destruído.
É o próprio Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas que admite que há consulados em situações muito difíceis de carência de pessoal. Quando o Secretário de Estado admite a existência do problema leva-nos a suspeitar que a sua dimensão terá grande extensão.
O PCP não concebe que o governo faça um apelo para a emigração, que milhares de portugueses sejam obrigados pelas políticas do governo a sair do país em procura melhores condições de vida e o Estado português não tenha capacidade ou vontade de adequar os seus serviços externos à realidade em mudança no seio das comunidades portuguesas no estrangeiro.
Os emigrantes não podem servir apenas para o governo se regozijar com o aumento das remessas financeiras, usadas abusivamente para atestar supostos apoios às suas políticas. Os emigrantes têm de ser tratados como portugueses de pleno direito e isto requer outra atenção por parte do Estado português.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, a Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que:
1. Realize uma avaliação da rede consular quanto à sua cobertura e capacidade de resposta tendo em conta os fluxos migratórios e as alterações que os mesmos introduzem nas comunidades emigrantes;
2. Reforce os serviços consulares com os recursos humanos e técnicos necessários, nomeadamente na área social, para que possam dar resposta à solicitação crescente e ao aumento da necessidade de acompanhamento e integração dos cidadãos portugueses que chegam à emigração;
3. Apoie no plano jurídico os emigrantes que trabalhem com vínculos precários e promova medidas de combate à emigração ilegal e tráfico de seres humanos;
4. Crie mecanismos que permitam uma ágil comunicação entre os serviços existentes na administração central que, com competência em matérias relevantes para as comunidades portuguesas no estrangeiro, permitam eficácia na prestação dos serviços.
Assembleia da República, em 20 de dezembro de 2013