Intervenção de Duarte Alves na Assembleia de República, Reunião Plenária

Querem a legalização do lobbying, passando uma esponja sobre a promiscuidade entre o público e o privado

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Com este agendamento, o Chega faz um enorme favor ao sistema.

Sim, ao sistema de interesses privados que vivem à custa da promiscuidade entre o público e o privado, o mesmo que financia o Chega, e que tem todo o interesse em que, a propósito das investigações judiciais em curso, se discuta tudo menos a causa de fundo da promiscuidade.

Querem que se discuta a legalização do lobbying, passando uma esponja sobre o que promove as situações de promiscuidade. 

Sim, foi o caminho de privatização e liberalização de sectores estratégicos, como é o caso da energia e dos recursos minerais, altamente dependentes de decisões políticas, que criam as condições para os lucros milionários de empresas como a Galp, a EDP, ou as multinacionais mineiras, lucros esses sempre dependentes de decisões políticas que os favorecem.

Não querem discutir que os projetos do hidrogénio vão ter financiamento público, mas os lucros serão dos acionistas da Galp – os tais que iam levar uma “lição exemplar”, e que afinal, são os principais beneficiários do PRR e das agendas mobilizadoras. 

Não querem discutir que o país fica na mão das multinacionais mineiras para conhecer os seus recursos. 

Que a Lei das Minas do Governo PSD/CDS, regulamentada pelo PS, diz que o Estado, ao atribuir direitos de prospeção, dá automaticamente direitos de exploração, e o país deixa de poder decidir se quer ou não explorar determinado recurso, como o lítio, de acordo com critérios de interesse público. 

Passa-se uma esponja sobre as políticas de privatização e liberalização para apresentar a legalização do lobbying como panaceia para a corrupção e a promiscuidade.

Nada disto é novo. Aliás é estranho como, havendo há anos uma ampla maioria – da qual o PCP não faz parte – que defende a legalização do lobbying, esta lei não esteja em vigor! Uma maioria que em 2019 juntou PS, PSD e CDS, a que agora se juntam a IL e o Chega.

Sr.as e Srs. Deputados,

Há várias razões para que o PCP se oponha à legalização do lobbying.

Por um lado, em nome da transparência, aquilo que se acaba por fazer, é legalizar o tráfico de influências. 

Veja-se uma coisa: este debate foi espoletado com a divulgação pública de um processo em que alguém, por ser amigo de um PM é suspeito de tráfico de influências. A pergunta que fazemos é se o mesmo amigo, caso atuasse exatamente da mesma forma, mas em nome de uma agência de comunicação inscrita como lobista: nesse caso, estava tudo bem? Estaria acima de qualquer suspeita?

Ou seja, aquilo que hoje é feito contra a lei, continuaria a ser feito, mas ao abrigo da lei. 

Por outro lado, é sabido que, quem há muito anos tem vindo a defender, e a fazer lobyying, pela legalização da “representação organizada de interesses”, mais conhecida por lobbying, são as agências de comunicação e grandes escritórios de advogados que querem autonomizar uma nova frente de negócio, para melhor poderem publicitar e vender os seus serviços. E, que serviços são esses? Influenciar os decisores políticos para tomar decisões de acordo com os interesses dos seus clientes. Numa palavra: influências. 

O que querem é que as entidades que hoje são ouvidas, envolvidas, no processo legislativo, passem a ter de ter intermediários pagos a peso de ouro.

A Assembleia da República tem dado passos muito relevantes para assegurar a total transparência sobre o envolvimento de todo o tipo de entidades no processo legislativo – sejam elas associações, ONG, empresas privadas, sindicatos, personalidades que individualmente se queiram dirigir à Assembleia da República. Todos os pareceres, todas as audições, até mesmo as reuniões dos grupos parlamentares com entidades que solicitam audiência, são publicadas no site da Assembleia da República, para qualquer pessoa poder ver. É verdade – não há negócio, mas há transparência.

Estas são as razões de fundo para que o PCP não acompanhe a ideia de legalizar o lobbying. 

E depois, existem outro tipo de problemas, que estiveram presentes em anteriores iniciativas, e que estão também na que hoje apreciamos. 

Perguntamos: que sentido faz que um sindicato tenha de se registar como lobista, para exercer os seus direitos constitucionais de participação e consulta sobre processo legislativo que envolva legislação do trabalho? 

Faz sentido que uma associação de defesa do ambiente, ou um movimento de cidadãos de uma região que queira por exemplo lutar pela salvaguarda do seu património natural, tenha de se registar como lobista, ou contratar um lobista, para fazer valer as suas ideias? Para ser ouvido pela Assembleia?

Para se criar um negócio, o que se está a fazer é limitar os direitos de participação democrática na vida pública.

Não é com a regulamentação do lobbying que se ataca o problema da corrupção. O combate à corrupção faz-se com medidas que fechem as portas giratórias entre cargos públicos e grandes empresas; que acabem com a promiscuidade entre o interesse público e interesses privados; que garantam a subordinação do poder económico ao poder político democrático.

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