Projecto de Resolução N.º 363/XVI/1.ª

Programa de Valorização da Serra da Estrela

Exposição de motivos

O ano de 2017 foi particularmente crítico em termos de incêndios rurais, desde logo pelo número de vítimas humanas, pelos avultados prejuízos provocados em termos de meios produtivos e fontes de rendimento e pela extensão de área ardida – florestal e agrícola. De um total de 442 418 hectares(ha) ardidos (dados do ICNF a 31 de outubro), 177 467 ha correspondiam a terrenos agrícolas e 264 951 ha a povoamentos florestais.

Em 2022 (dados do ICNF a 15 de outubro), foram percorridos por incêndios 110 007 ha, dos quais 54 801 ha correspondiam a povoamentos, 44 114 ha a matos e 11 092 ha a terrenos agrícolas.

O Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) não possui efetivos que possam dar uma resposta satisfatória aos diversos problemas e dificuldades que se sentem nas áreas protegidas, entre as quais o Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE).

O ICNF, integrado numa orientação de minimização da presença do Estado, encontra-se cada vez mais ausente do território nacional que lhe cabe proteger e valorizar. A criação de Áreas Protegidas e a atribuição da sua tutela ao ICNF não correspondeu, nem corresponde, em medida alguma, ao reforço dos seus meios técnicos ou humanos.

A vasta área do PNSE ardida entre 2017 e 2022 requer a adoção de medidas estruturais que permitam a recuperação sustentada dos ecossistemas e habitats, dos valores naturais que se encontram na base da classificação desta área como protegida, das atividades produtivas florestais, agrícolas e pecuárias, algumas das quais específicas desta região.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de

Resolução

Nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a Assembleia da República resolve recomendar ao Governo:

  1. A adoção de um Programa de Valorização da Serra da Estrela, adiante designado por Programa, enquadrador das medidas necessárias para assegurar o planeamento e a gestão adequada do território integrado no Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE) e reforçar a prevenção e combate a incêndios florestais.
    1. O Programa tem como objetivo a recuperação e valorização do PNSE, nas dimensões ambiental, social e económica, estruturando-se em torno de quatro eixos prioritários de atuação, designadamente:
      1. Intervenção em áreas ardidas e defesa e prevenção da floresta contra incêndios;
      2. Identificação de prejuízos e perdas e regime de apoio à reposição do potencial produtivo, à perda de rendimento e à manutenção de atividades agrícolas e pecuárias, em especial no que respeita à ovelha bordaleira, à produção de Queijo da Serra e à apicultura.
      3. Dotação do PNSE com uma estrutura orgânica com direção própria, ligada ao território e às populações, com capacidade para realizar o diagnóstico do estado em que esta área protegida se encontra e intervir no sentido da sua recuperação e valorização, em conjunto com as populações.
      4. Reforço da capacidade do ICNF em meios humanos, técnicos e financeiros, para dar resposta às necessidades de gestão, recuperação, fiscalização e defesa contra incêndios dos territórios incluídos no Parque.
    2. As medidas e ações previstas no Programa aplicam-se aos concelhos abrangidos pelo PNSE – Manteigas, Celorico da Beira, Covilhã, Guarda, Gouveia e Seia – e ainda ao concelho de Belmonte.
    3. No âmbito do Programa, são determinas medidas destinadas à melhoria do estado ecológico e de recuperação de áreas ardidas, incluindo, pelo menos, os seguintes elementos:
      1. Proteção e valorização das áreas com maior valor conservacionista;
      2. Controlo e erradicação de espécies invasoras;
      3. Retirada do material lenhoso ardido e armazenamento da madeira em condições adequadas de segurança e de manutenção do seu estado;
      4. Reposição da cobertura vegetal do solo e a regeneração das áreas de pasto ardidas;
      5. Reflorestação das áreas ardidas, valorizando a sua ocupação com espécies florestais autóctones e características da região da Serra da Estrela.
  2. A apresentação à Assembleia da República, no prazo de 60 dias, do plano de criação de equipas de sapadores florestais para garantir a cobertura total da área incluída no PNSE e nos concelhos limítrofes.
  3. A criação da unidade orgânica de direção intermédia da administração central, associada ao Parque Natural da Serra da Estrela, dotada de meios humanos, técnicos e financeiros adequados à gestão, ordenamento, acompanhamento e fiscalização do território integrado no Parque.
  4. A identificação dos meios humanos necessários para assegurar o cumprimento das atribuições cometidas à unidade de gestão do Parque Natural da Serra da Estrela e são abertos os concursos necessários para a contratação dos profissionais em falta:
    1. São lançados os concursos para preenchimento de todas as vagas consideradas no Mapa de Pessoal do ICNF relativo a 2024.
    2. É assegurada a colocação dos profissionais em falta para preencher as vagas constantes do Mapa de Pessoal do ICNF.
    3. É assegurado o reforço em 20% da contratação de técnicos superiores, assistentes técnicos e assistentes operacionais para iniciar o processo de reposição de efetivos para substituir os trabalhadores em situação de aposentação.
    4. A contratação dos profissionais é efetuada em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.
  5. O desencadeamento do procedimento de Revisão do Plano de Ordenamento do PNSE.
    1. O processo de revisão do Plano deve incluir a consideração e análise dos seguintes elementos:
      1. Análise dos elementos de base constantes dos planos de ordenamento em vigor e identificação das alterações registadas no território do Parque Natural da Serra da Estrela em termos de uso do solo e de atividades económicas, excluindo as atividades tradicionais;
      2. Identificação dos impactes das alterações ao uso do solo e atividades económicas, excluindo as atividades tradicionais sobre os valores naturais, infraestruturas e qualidade de vida das populações;
      3. Avaliação da influência das alterações referidas nas alíneas a) e b) sobre os objetivos de conservação da natureza e biodiversidade definidos para o Parque Natural da Serra da Estrela;
      4. Identificação, qualificação e quantificação das pressões e ameaças à salvaguarda dos valores naturais, da operacionalidade de infraestruturas e qualidade de vida das populações;
      5. Monitorização e análise das densidades populacionais de espécies de fauna e flora com estatuto de proteção;
      6. Atualização da cartografia de habitats e de condicionantes ao uso do solo e atividades económicas, excluindo as atividades tradicionais, com identificação de áreas prioritárias para a conservação da natureza a integrar na proposta de revisão do Plano e demais instrumentos de gestão territorial;
      7. Elaboração de um programa de ação com medidas adaptadas à caracterização e diagnóstico efetuado tendo como objetivo a recuperação, valorização e proteção do Parque Natural da Serra da Estrela;
      8. Estabelecimento de objetivos de conservação e de desenvolvimento regional adaptados à nova realidade que vier a ser caracterizada no processo de atualização do estado do território;
      9. Definição de um programa de monitorização do Plano prevendo a publicação anual de um relatório de monitorização do estado do Parque Natural da Serra da Estrela, a ser disponibilizado no domínio da internet do ICNF.
  6. A adoção das medidas necessárias para assegurar o apoio a todos os projetos apresentados no âmbito das seguintes medidas do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) 2020:
    1. Operação 6.2.2 - Restabelecimento do potencial produtivo, com incidência na área dos incêndios ocorridos na região da Serra da Estrela;
    2. Operação 8.1.4. Restabelecimento da Floresta Afetada por Agentes Bióticos e Abióticos ou por Acontecimentos Catastróficos
    3. Operação 8.1.5. Melhoria da Resiliência e do Valor Ambiental das Florestas
  7. A criação de um regime simplificado de candidatura aos apoios incluídos nas operações na alínea c. do número anterior, para projetos com valor até 10 000 euros e para os beneficiários do Estatuto da Agricultura Familiar.
  8. A abrangência, pelas medidas referidas, de todos os proprietários ou titulares de explorações agrícolas e pecuárias, visando investimentos ao nível do capital fixo da exploração, incluindo a reposição de efetivos animais ou a compra de máquinas e equipamentos agrícolas destruídos, bem como ao nível do capital fundiário da exploração, incluindo plantações anuais e plurianuais.
  9. A disponibilização, em cada um dos concelhos abrangidos, em articulação com as Juntas de Freguesia e com as Organizações de Agricultores e Produtores e Associações de Baldios, de instalações e meios humanos e técnicos para assegurar a todos os proprietários e titulares de explorações o apoio necessário para a elaboração e apresentação das suas candidaturas.
  10. A criação de um regime de apoio excecional para o efetivo pecuário da ovelha bordaleira, da produção de leite e de queijo da Serra da Estrela, que abrange, designadamente:
    1. A perda de efetivos pecuários e a sua reposição;
    2. As despesas com a aquisição de alimentação animal e com a recuperação de áreas de pastagem;
    3. As perdas de produtividade decorrentes das condições geradas pelos incêndios de agosto de 2022;
    4. A perda de rendimentos pela diminuição da qualidade dos produtos agropecuários tradicionais da Serra da Estrela, pelas dificuldades geradas pela destruição de pastagens e culturas agrícolas.
  11. A criação de um procedimento simplificado de candidatura aos apoios excecionais previstos no presente Programa, devendo o Ministério da Agricultura e Pescas definir, por despacho, os critérios de apoio, prazos e procedimentos para apresentação e decisão das candidaturas, sendo os beneficiários do Estatuto da Agricultura Familiar considerados como prioritários.
  12. A criação de uma medida de apoios específica para a atividade apícola afetada pelos incêndios de agosto de 2022 na região da Serra da Estrela, que devem abranger, designadamente:
    1. A recuperação de cortiços e colmeias;
    2. A reposição de efetivos;
    3. A alimentação para abelhas;
    4. A perda de rendimento decorrente da destruição de colmeias e dos locais de alimentação para abelhas.
  13. A definição das entidades responsáveis pelo desenvolvimento dos programas de medidas a considerar no âmbito do Programa e sua execução, envolvendo no processo, pelo menos, as seguintes entidades:
    1. Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas;
    2. Direção-Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural;
    3. Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro;
    4. Os municípios de Manteigas, Celorico da Beira, Covilhã, Guarda, Gouveia e Seia, e Belmonte;
    5. Organizações representativas dos produtores florestais e dos agricultores com intervenção na região da Serra da Estrela e as Associações de Baldios da região.
  14. A garantia de existência de mecanismos próprios para a intervenção de emergência nos territórios afetados pelos incêndios de 2022 na Serra da Estrela, sem prejuízo do direito de retorno.
  15. A inscrição, no Orçamento do Estado, das verbas necessárias à execução do Programa e a previsão, para 2025, da necessária dotação financeira dos programas comunitários, de modo a responder às candidaturas apresentadas no âmbito da sua aplicação.
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