Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral, Sessão de Abertura das Jornadas Parlamentares do PCP no distrito de Beja

«É preciso e urgente uma política alternativa que abra um caminho de progresso e desenvolvimento soberano para a Região e para o País»

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Realizamos estas jornadas parlamentares partindo da realidade nacional, dos problemas que os trabalhadores, o povo e o País enfrentam, mas também olhando para o que neste distrito de Beja e nesta região trava o seu desenvolvimento e condiciona o viver da sua população.

Uma realidade nacional marcada pela acção de um Governo que insiste em opções erradas, de décadas de política de direita, opções que avolumaram problemas, agravam as condições de vida, as desigualdades e injustiças, atacam salários e pensões, ao mesmo tempo que criam as condições para a acumulação de lucros. A realidade, como sempre, impõe-se e aí está, perda de poder compra imposta por uma inflação insuportável, acompanhada pela recusa de aumentar salários e valorizar pensões de reforma. Uma situação que o Governo do PS – com o apoio e aplauso do PSD, Chega e IL – opta por não enfrentar, e prova disso foi a rejeição destes partidos às propostas do PCP para travar e fixar preços de bens essenciais ou taxar os lucros dos grupos económicos.

As jornadas parlamentares que agora se iniciam têm lugar aqui em Beja, distrito com tantas potencialidades mas que é em si mesmo um exemplo do que tem sido a política de direita, a política da alternância, a política dos que mudam os rostos para que tudo fique na mesma e do desinvestimento público e de desmantelamento do tecido produtivo, com as consequências também para a Região.

É preciso e urgente uma política alternativa que abra um caminho de progresso e desenvolvimento soberano para a Região e para o País. 

Uma política que aposte na produção nacional, condição essencial para combater os défices estruturais com que estamos confrontados, capaz de  capacitar o País, que aposte na sua soberania, capaz de criar emprego e riqueza.

Aqui no distrito, perdem-se explorações agrícolas, terras aráveis, áreas de produção para grão e batata, ao mesmo tempo que alastram as culturas permanentes, em regime superintensivo. 

A produção de cereais, em particular o trigo, atinge níveis preocupantes de autoaprovisionamento, de 6,4%.

É preciso e urgente uma política alternativa que valorize os trabalhadores e os seus direitos, que aumente os salários, que imponha horários regulados e vínculos efectivos. Direitos que estão, em geral, em falta, mas que conhecem na situação dos trabalhadores imigrantes, como aqui se vê, neste distrito, uma situação intolerável que acrescenta mais exploração à exploração de todos os dias.

Empresas de trabalho temporário, contratadas pelas grandes empresas ou grupos económicos na área da agricultura ou da grande distribuição, empregam milhares de trabalhadores imigrantes a quem não são garantidos direitos e que vivem em condições da maior precariedade, muitos deles são angariados a partir de redes de auxílio à imigração ilegal e tráfico de seres humanos. Isto não pode continuar.

É preciso e urgente uma política que olhe para o investimento, e em particular para o investimento público, como factor de desenvolvimento. 

Um investimento que vá para lá das promessas e da conversa. Que  construa o IP8, que electrifique a linha ferroviária para ligações a Lisboa e ao Algarve, que aproveite nas suas diversas dimensões e potencialidades o aeroporto de Beja, potencialidades essas reconhecidas com a aprovação de uma importante proposta do PCP na semana passada.

Um investimento público que reforce os serviços públicos, que garanta os direitos sociais. Condições para combater o despovoamento. O Interior do País, ao contrário do que querem fazer passar, não está condenado à desertificação. 

Está é sujeito à política de direita, essa velha política que encerra serviços de saúde e urgências, que deixa ao abandono centros de saúde, que não respeita os profissionais de saúde e não cria estímulos para que se fixem no Interior, nem sequer no SNS.

Essa política velha que não investe na habitação, que não trava a subida das rendas e o aumento das prestações.

Essa política de direita e velha que dá pouco mais que nada à cultura, à investigação e à ciência, e que aposta também aqui na precariedade e falta de apoios.

Sabemos o que está em causa e não estranhamos a intensa ofensiva ideológica e a sua diabolização sobre tudo o que é púbico e o endeusamento do “mercado”.

Mas aí estão os resultados, o crime das privatizações, as suas consequências na vida das pessoas em benefício dos lucros colossais que os grupos económicos acumulam.

Veja-se o exemplo dos CTT. Uma empresa pública que tinha resultados positivos, foi entregue aos grupos económicos cujos accionistas ficam com um riquíssimo património e elevados lucros e já ganharam bem mais do que aquilo que o Estado recebeu pela venda.

A realidade aí está, mais estações encerradas, serviço pior e cada vez mais caro. E com um anúncio de novo aumento de 6,5% dos serviços postais para este ano. As queixas crescem a olhos vistos, os trabalhadores mais sobrecarregados de horários e com vínculos menos seguros. 

Resultado deste crime económico e social, perdem os utentes, os trabalhadores, o Estado. Ganham os accionistas desta empresa.

Os CTT são um exemplo ilustrativo, mas antes fosse o único. O controlo público dos sectores estratégicos é uma urgência que não pode esperar mais.

Não podemos continuar a ter serviços absolutamente essenciais à população nas mãos de accionistas e administradores que se estão literalmente nas tintas para a vida e os direitos de cada um de nós. 

Mas o combate também se trava pela defesa do que permanece público.

É vê-los, Governo e a direita, lamuriar os gastos com o que interessa e é de todos. 

Lágrimas e lágrimas pelos gastos do Estado em empresas públicas, mas nem uma única gotinha, uma única lágrima que seja com os mais de 16 mil milhões que foram para a banca privada desde 2008.

Nem uma lamúria que seja com os benefícios fiscais, mais de 1,1 mil milhões só em 2021 que se perdeu em IRC, mais de 10,6 mil milhões entre 2012 e 2021.

Nem um pequeno lamento com os encargos líquidos com as parcerias público-privadas, que só nas rodoviárias levaram do bolso de todos nós 1250 milhões de euros em 2021, mais de 10,2 mil milhões entre 2012 e 2021.

Quando se investe no que é público é a berraria que se conhece, quando se trata de transferir do Estado para a negociata, aí estão eles caladinhos. Veja-se a TAP. Sabemos bem o que a direita quer com estas comissões de inquérito. Está desejosa de ver mais esta empresa, a maior exportadora nacional, estratégica, com um potencial único, nas mãos dos grupos multinacionais. 

E que não haja dúvidas, a TAP é apetecível e muito apetecível para os abutres que por aí andam. 

Não abdicamos da TAP como empresa pública e de bandeira, para a qual se exige uma gestão de serviço público e não uma gestão a partir de critérios privados, tal como tem sido nos últimos 20 anos em que se encontra em processo de privatização. E assim o é, por opção do PS e do PSD e pela cega submissão ao processo de liberalização do sector aéreo imposto a partir da Comissão Europeia. 

Aqui chegados, o que fazer?

Abandonar o rumo da privatização que já cheira a bafiento, assumir a TAP  como uma grande empresa pública e nacional e levar por diante uma gestão liberta dos constrangimentos impostos pela Comissão Europeia. 

A TAP precisa de garantir a oferta necessária para satisfazer as necessidades estratégicas do País; reforçar a qualidade de produção própria, particularmente na Manutenção e Engenharia; valorizar os trabalhadores e a contratação colectiva, desde logo anulando o pedido de caducidade feito pela actual administração.

Este é o caminho a seguir, o caminho verdadeiramente preocupado e comprometido com os interesses do País.

Virá o Governo dizer, com uma grande dose de cinismo,  que agora não dá para isso.

Que não consegue resolver a guerra e a inflação. A verdade é que o que pode fazer, não quer e não faz.

O Governo pode aumentar os salários, pensões e apoios sociais, de maneira a que a generalidade dos trabalhadores e dos pensionistas não perca poder de compra. Mas não o faz. Em 2022 a subida dos preços foi igual à soma dos dez anos anteriores. Alguns bens alimentares essenciais custam hoje mais do dobro do que custavam em 2021. Nenhuma propaganda do Governo consegue apagar essa realidade. 

O Governo pode travar o aumento dos preços de bens essenciais, na alimentação, na energia, de maneira a pôr um travão de uma vez por todas na especulação. Mas não o faz. Estes aumentos não chegam a produtores, agricultores, pescadores. Vão direitinhos para as grandes distribuidoras e outros grandes grupos económicos.

O Governo pode taxar os lucros extraordinários, obtidos à custa da especulação e do acentuar da exploração. Mas não o faz. Opta por manobras propagandistas com medidas que além de serem insuficientes, quer nos montantes, quer nos visados, ainda enchem mais os grupos económicos.

O Governo pode, cumprindo a Constituição, levar por diante uma acção pela paz com vista ao fim dos conflitos. Mas não o faz. Prefere ser porta-voz daqueles que alimentam a guerra e adicionam gasolina ao fogo.

O Governo pode deixar de transferir verbas do Orçamento do Estado para os grupos económicos e os seus accionistas e passar a usar os recursos públicos nos serviços públicos, que tanto necessitam de mais investimento, de mais trabalhadores, de mais direitos laborais, na saúde, na educação, na cultura, nos transportes e na recuperação de sectores estratégicos para o País. Mas não o faz.

O Governo pode fazer valer os interesses de Portugal e defender a sua soberania. Produtiva, alimentar, energética, monetária. Capacitar o País dos recursos de que necessita para melhorar o nível de vida da sua população. Recuperar para o domínio público os sectores estratégicos. Mas não o faz.

E o Governo não o faz porque são outras as suas opções, essas opções que marcam a política de direita que trouxe o País à situação que conhecemos. Opções que PSD, CDS, Chega e IL partilham e cinicamente criticam, não por pensarem diferente, mas por ambicionarem serem eles a adoptar e intensificar essa política. Sempre e sempre essa promoção da alternância para dificultar o que é alternativa e solução.

Veja-se quem saiu a ganhar com a chantagem feita nas últimas eleições.

Veja-se quem são os poucos que concentram riqueza à custa das necessidades e privações de milhões de pessoas, a quem sobra cada vez menos salário para comprar o básico dos básicos para viver.

Para esta política de direita lá estão as maiorias absolutas do PS, ou as ambições de poder de PSD, CDS, Chega e IL. Para além da alternância das caras, o que tem a direita a oferecer de diferente?

Ainda maior desregulação das relações de trabalho?

Ainda mais privatizações de empresas estratégicas?

Ainda maior liberalização dos mercados da habitação e da energia? 

Ainda maior descontrolo dos preços?

Ainda mais desinvestimento na saúde, na educação, na cultura, na ciência e investigação?

Ainda mais benefícios fiscais e dinheiro público para as grandes empresas e grupos económicos?

A política de direita não se quer com outros ritmos, quer-se com nenhum ritmo, quer-se que fique no passado, de uma vez por todas.

Faça-se de uma vez por todas o que tem de ser feito.

Controlo público dos sectores estratégicos. Controlo dos preços. Taxação efectiva dos lucros extraordinários. Aumento dos salários e pensões acima da inflação. Não admitimos que nos digam que queremos tudo para todos quando é o Governo, a par de PSD, CDS, Chega e IL que querem tudo para uns poucos.

O processo de revisão constitucional aí está a demonstrar o que querem os projectos mais reaccionários. Sob a capa da neutralidade e da liberdade de escolha, querem eliminar a protecção que a Constituição dá aos direitos dos trabalhadores e da população.

Aí está a neutralidade e liberdade que querem, a da intensificação da exploração e da transferência acelerada do rendimento do trabalho para o capital.

Aqueles que tudo fazem para destruir na prática os direitos dos trabalhadores, da população, querem agora rasgá-los da Constituição. O que urge é cumprir a Constituição, os direitos que ela consagra, as obrigações que cabem ao Estado para que sejam assegurados. 

O que se impõe, com cada vez maior urgência, é a construção de uma verdadeira alternativa, a alternativa patriótica e de esquerda. 

O que a vida mostra é a necessidade e urgência de mudar de política, construir uma política alternativa à política de direita que tem sido imposta, seja pela mão do PS ou do PSD. 

E isso não se faz escolhendo entre quem no essencial partilha dos mesmos critérios e opções. 

Faz-se reforçando o PCP, alargando a base social dos que vêem na política patriótica e de esquerda o caminho capaz de afirmar os direitos trabalhadores e do povo e assegurar o desenvolvimento soberano do País.

O que é preciso é uma outra política capaz de dar solução aos problemas, melhorar as condições de vida dos trabalhadores e do povo, dotar o País dos instrumentos necessários ao seu desenvolvimento.

A política alternativa de que Portugal precisa não pode ser assegurada por um Governo PS, como a realidade demonstra, nem por um governo de direita ou de bloco central como já se demonstrou.

O caminho que está colocado à maioria dos trabalhadores e do nosso povo, é a de levar por diante um governo que assuma e cumpra um compromisso patriótico e de esquerda. Um caminho que depende da força que derem ao PCP e da força organizada dos trabalhadores e do povo. Sem essa força não há política alternativa nem resposta aos problemas. 

A actual situação exige a elevação da força organizada e uma intensa intervenção dos trabalhadores e das massas populares e a convergência dos democratas e patriotas.

É por isso que intervimos para alargar a consciência dessa necessidade. E é também por isso que procuram atacar ou menorizar o PCP. Porque sabem que é o PCP que assume e promove a luta pela verdadeira alternativa à política de direita. E sobretudo sabem que o nosso compromisso, o compromisso do PCP, é com os trabalhadores e o povo. 

É esta perspectiva de futuro, justa e realizável, que assumimos. 

Uma perspectiva traduzida em iniciativa e determinação para desenvolver e ampliar a luta em defesa dos trabalhadores, dos reformados, dos jovens, dos utentes. De todos aqueles que sentem na pele os efeitos da política de direita. Nas ruas, nos locais de trabalho, nas freguesias, nos concelhos, na Assembleia da República, com a segurança e o ânimo de quem age sempre ao serviço dos trabalhadores e do Povo, e dos seus interesses e direitos.

Também aqui em Beja, nestas jornadas parlamentares.

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