Intervenção de João Dias na Assembleia de República, Debate com o governo

Precisamos de medidas estruturais para defender e reforçar o SNS

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Sr. Presidente,
Srs. Deputados.

É preciso, é urgente atacar as dificuldades que estão colocadas ao Serviço Nacional de Saúde e isso implica uma ruptura com as políticas que conduziram à atual situação e que criaram no SNS graves problemas que impedem, hoje, que milhares de portugueses tenham acesso aos cuidados de saúde de que necessitam. 

Essa rutura obriga a outras opções políticas, diferentes das seguidas por este e anteriores Governos do PS, do PSD/CDS e também diferentes das opções propostas da IL e CH. É preciso um outro caminho que devolva ao SNS o seu caráter público, universal, geral, gratuito e com capacidade de resposta.
 
É preciso acabar com subfinanciamento crónico do SNS, pôr fim à transferência crescente de recursos para os grupos privados, combater a degradação das condições de trabalho que leva à saída de profissionais e impede a sua entrada em número suficiente, promover a autonomia das instituições, resolver os problemas de coordenação e organização dos serviços de saúde.

Mas, não é este o caminho que está a ser trilhado pelo Governo da maioria absoluta do PS. Antes pelo contrário! 

Por este caminho o Governo da maioria absoluta do PS está a preparar a entrega de ainda mais cuidados e serviços públicos de saúde aos privados.

Por este caminho o Governo da maioria absoluta do PS continua a favorecer ainda mais os grupos privados que fazem negócio à custa da doença dos portugueses.
Precisamos de uma outra política de saúde. Uma política que defenda e dê prioridade ao serviço público de saúde, o que implica ir contra e romper com os poderosos interesses dos grupos económicos da doença.

Precisamos de uma outra política que valorize carreiras e remunerações dos profissionais de saúde, melhore as suas condições de trabalho, que promova a dedicação exclusiva no SNS, com vista a fixar e atrair médicos, enfermeiros e todos os outros profissionais de saúde necessários.

Precisamos de uma outra política que reforce o financiamento e o investimento do SNS, que permita diminuir a dependência do sector privado e garanta os recursos públicos necessários para acudir às necessidades de saúde da população.

Srs. Deputados é a falta de resposta do SNS que cria espaço para que os nossos doentes sejam enviados para o privado. São as carências do SNS que levam a que cada vez mais recursos sejam retirados do SNS e sejam entregues a privados, impedindo o desenvolvimento do SNS e levando à degradação ainda maior da sua capacidade para assegurar os cuidados de saúde aos portugueses.

Sabe este Governo e todos os outros que o antecederam que ao desvalorizarem as carreiras, ao desrespeitarem os profissionais, ao desorganizarem os serviços, estavam a tudo fazer para empurrar os profissionais para fora do SNS e a tornar os serviços públicos menos atrativos principalmente para os que todos os anos se vão formando nas escolas públicas.

A questão que se coloca é: Como poderiam os grupos económicos privados ter conseguido levar do SNS para as suas unidades lucrativas, tantos profissionais de saúde, se estes não vivessem numa situação de desvalorização das remunerações, de desrespeito pelos seus direitos, de elevadas cargas de trabalho e principalmente sem perspetiva de uma real progressão na carreira e valorização do seu estatuto profissional? Sim, como poderíamos ter hoje quase 1 milhão e meio de utentes sem médico de família, ou assistirmos à rutura dos serviços de urgência nas mais diversas especialidades não só em Obstetrícia/Ginecologia? Ou como poderíamos ter os serviços de urgência entregues a profissionais contratados à tarefa, através de empresas de colocação de mão-de-obra, ganhando à hora muito mais do que os profissionais do quadro dos hospitais? 

A resposta é simples, por um lado o Governo assistiu passivamente ao enfraquecimento do SNS, permitindo a degradação das condições de trabalho dos profissionais de saúde, por outro lado as medidas que tomou foram no sentido de tornar o SNS ainda mais dependente do setor privado, como se comprova pelo recém-publicado Estatuto do SNS, que constitui um evidente recuo em relação à nova Lei de Bases de Saúde, aprovada em 2019, agravando a promiscuidade entre o público e o privado.

O novo estatuto do SNS vem incluir como unidades do SNS instituições privadas com quem o serviço público estabelecer contratos. Vem permitir a cedência de exploração de serviços clínicos hospitalares a entidades externas. Mantem a clara intenção de voltar às ruinosas Parcerias Público-Privadas da saúde. 

Podem dar as voltas que quiserem que não conseguirão disfarçar que são os interesses dos grupos privados da saúde que determinam a estratégia de reduzir o serviço público a um mínimo assistencialista que responda aos utentes mais frágeis deixando o restante para favorecer o lucro do setor privado.

Não é que o Governo não saiba o que pode e deve fazer, mais não fosse bastava ter em conta as propostas que o PCP tem apresentado. É mesmo por opção que deixa o serviço público deslizar para a degradação.

As soluções que o Governo vai apresentando não passam de medidas isoladas que não combatem os problemas estruturais e de fundo, é mais um comportamento de quem quer parecer ativo e preocupado, mas que na verdade deixa a situação piorar a cada dia. Como é o caso da desculpa de que o SNS trabalha em rede, escondendo desta forma as indisfarçáveis faltas de recursos humanos na saúde. Ou, a de pôr jovens internos a substituir especialistas, ou colocando médicos sem especialidade a ocupar o lugar de especialistas em Medicina Geral e Familiar, ou como se prepara mais uma vez um governo PS para o encerramento de maternidades, o que é revelador de uma total desvalorização e despreocupação com a qualidade dos cuidados prestados à população.

A solução passa, como o PCP defende, por acabar com o subfinanciamento crónico do SNS, por restabelecer órgãos de administração democráticos e participativos, pela reorganização dos diversos níveis de decisão e da rede de hospitais, de cuidados de saúde primários e de saúde pública com a descentralização, coordenação e autonomia necessárias ao seu bom desempenho.

Passa pelo restabelecimento de carreiras estáveis, com remunerações justas que permitam a realização pessoal e profissional dos trabalhadores do SNS, pelo estímulo à sua opção pela dedicação exclusiva ao serviço público, pelo abandono da gestão empresarial alicerçada numa produção à peça cada vez mais distanciada dos utentes.

Passa pela proibição da gestão privada de serviços públicos e diminuição do recurso a entidades externas ao SNS, pela aposta no maior desenvolvimento e alargamento do SNS, nomeadamente no que diz respeito aos cuidados domiciliários, cuidados continuados integrados e paliativos, na saúde mental, na saúde oral e da visão.

Para o PCP, é por demais evidente que quanto mais tempo passar sem que sejam tomadas as medidas essenciais para defender o SNS, mais se degrada a sua capacidade de resposta e se acentua a dependência face ao privado e mais difícil se torna o acesso da generalidade dos portugueses aos cuidados de saúde.

O PCP defende que é possível garantir o acesso à saúde em igualdade, qualidade e segurança a todos os portugueses, independentemente das suas condições sócio-económicas.

No SNS não há clientes nem objetivos de lucro a atingir, há sim utentes e populações que precisam de ser atendidos e cuidados, seja qual for a sua doença, a sua gravidade ou o seu custo. É esse o Serviço Nacional de Saúde que defendemos e queremos, liberto dos poderosos interesses instalados, a que o Governo recusa opor-se. 

É por esse Serviço Nacional de Saúde que continuaremos a lutar!

Disse.

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