Exposição de motivos
A frota de pesca nacional tem sofrido uma significativa redução ao longo dos anos. O último relatório anual da frota de pesca portuguesa – 2020, refere que a frota de pesca nacional era constituída por um total de 7718 embarcações, das quais 6170 com motor e 1548 sem motor. Estes números mais recentes mostram que nos últimos 10 anos a frota de pesca nacional perdeu 769 embarcações, com predominância para a perda dos segmentos com motor, registando-se que em 2020 o número de abates à frota nacional ascendeu a 80 unidades enquanto os novos registos ficaram apenas por 36.
No que respeita à atividade da frota de pesca, das embarcações registadas em 31 de dezembro de 2020, 3561 embarcações encontram-se ativas, enquanto 4180 não tiveram atividade, na sua maioria, embarcações com comprimento de fora a fora até aos 10 metros.
Neste segmento, os rácios de atividade são menos satisfatórios, devido, em grande parte, a situações relacionadas com condições atmosféricas adversas que impedem as embarcações mais pequenas de operar de forma regular durante o inverno. No caso das embarcações destinadas à pesca do cerco, os rácios de atividade encontram-se condicionados pelas restrições de pesca estabelecidas no essencial para as espécies sardinha e biqueirão.
Os dados provisórios para 31 de março de 2022, publicados pela Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos (DGRM) mostram que o percurso de redução do número de embarcações se mantém, com a contabilização de 7645 embarcações registadas, das quais 6527 no continente, 409 na Região Autónoma da Madeira e 709 na Região Autónoma dos Açores.
Da frota de pesca referida, a sua distribuição por segmento mostra que 25 embarcações se destinam à pesca polivalente, 177 estão afetas à pesca do cerco e 82 à pesca de arrasto. 6883 embarcações, tendo menos de 12 metros, estão afetas à pequena pesca e 478 embarcações, com mais de 12 metros, utilizam artes fixas.
Quanto à idade da frota nacional de pesca, segundo a DGRM, em 2020, a frota registada apresentava uma idade média de 36 anos, enquanto a frota de pesca licenciada detinha uma idade média ligeiramente inferior, da ordem dos 26 anos.
Estes dados vêm demonstrar que a idade média da frota licenciada corresponde, em termos gerais, ao horizonte de vida da maioria das embarcações, podendo o seu estado efetivo depender de um vasto conjunto de fatores, nomeadamente do material de construção, e das ações de manutenção e beneficiação que tenham sido realizadas ao longo da sua vida útil.
No que respeita ao material de construção, destaca-se que as embarcações em madeira apresentam em regra um envelhecimento mais precoce, requerendo igualmente um maior esforço de manutenção, sendo que estas correspondem a cerca de 58% da frota nacional de pesca. Neste caso merece particular referência o segmento correspondente à pesca polivalente costeira, com embarcações em madeira de envergadura entre os 9 e os 18 metros, algumas com cerca de 40 anos ou mais, onde se coloca uma maior necessidade e urgência em termos de renovação da frota.
De igual modo, as embarcações de pesca do espada-preto na Região Autónoma da Madeira necessitam de renovação urgente, tendo em conta a idade avançada desta frota e o tipo de pesca exercida que requer grande distanciamento da costa.
Merece ainda referência a necessidade de melhorias em parte das embarcações da frota do cerco, tendo em conta que algumas destas embarcações contam com algumas dezenas de anos.
Este quadro ilustra o caminho de abandono do setor por parte dos sucessivos governos, que têm vindo sempre a rejeitar a disponibilidade de apoios para a renovação da frota de pesca nacional, deixando este importante sector produtivo à sua sorte.
É preciso destacar que as capturas nominais de pescado representaram em 2021 mais 140 mil toneladas a que corresponde um valor de 335 milhões de euros, empregando esta atividade 13 156 trabalhadores. Do valor global correspondente ao pescado descarregado no continente, mais de 46 milhões de euros resultaram do arrasto, 67 milhões de euros correspondem à pesca do cerco e 170 milhões de euros foram obtidos no segmento polivalente.
Apostar no setor da pesca como elemento fundamental da produção nacional e atenuar a forte dependência do país do abastecimento externo de pescado, impõe a adoção de medidas que garantam a renovação da frota.
Para promoção do setor é necessário criar as condições de segurança adequadas ao exercício da atividade no mar, melhorar a eficiência das embarcações, nomeadamente em termos de eficiência energética, e defender a pesca de pequena escala, promovendo a sustentabilidade do uso de recursos, garantindo, ao mesmo tempo, o abastecimento de pescado às comunidades de acordo com as suas necessidades.
O designado Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) prevê algum investimento no que se refere à frota de pesca, enquadrável no investimento relativo à “Transição Verde e Digital e Segurança nas Pescas”, que, entre outros aspetos prevê o apoio a “projetos de desenvolvimento de embarcações de pesca de arrasto, cerco, polivalente e de apoio à aquicultura, demonstradoras de melhor eficiência energética e ambiental”.
Contudo, a forma como este investimento será concretizado e em que medida irá de facto ajudar a pesca nacional, não se encontra definida no PRR, havendo apenas referência a entrega de quatro embarcações de apoio à aquicultura, polivalente de pesca, pesca do cerco e de pesca de arrasto, com apoio a 100% da construção, a estar concluído em 2023 e a 50 projetos aprovados no âmbito do apoio à inovação, transição energética e redução do impacto ambiental, destinado às entidades da fileira do pescado.
Há alguns programas de apoio à modernização das embarcações, tendo em 2020 sido aprovados 307 projetos no valor de 14 M€ com um apoio de 7,2 M€. Todos estes planos são omissos sobre a incorporação nacional neste esforço e ignoram qualquer plano nacional sobre o futuro e desenvolvimento do sector.
Portugal necessita de inverter este caminho, valorizando a atividade piscatória como elemento estruturante da produção nacional, as condições laborais no setor da pesca e apostando na modernização da frota, em particular nos segmentos considerados prioritários, nomeadamente no âmbito da pequena pesca, a que se associa a necessidade de investimento em novas e mais modernas unidades produtivas em terra.
É necessário estabelecer um plano plurianual para apoio à renovação da frota de pesca, criando condições de segurança e trabalho adequadas para o exercício da atividade, bem como as condições de manutenção do pescado a bordo.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
Sendo o setor da pesca, nomeadamente da pesca local e costeira, um dos elementos relevantes para a concretização do desígnio da defesa e incentivo à produção nacional e ao controlo dos desequilíbrios da balança alimentar nacional, é fundamental desenvolver os mecanismos de apoio para a manutenção e o desenvolvimento desse setor, pelo que a Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomendar ao Governo que:
- Até ao final de 2022, através do Ministério da Agricultura e Alimentação, estabeleça um plano plurianual de apoio à renovação da frota – 2023-2025, destinado a melhorar as condições de exercício da atividade piscatória, promovendo, entre outros aspetos, a segurança e as condições de habitabilidade a bordo e a eficiência e desempenho ambiental das embarcações de pesca, contribuindo para a redução das emissões de gases com efeito de estufa.
- Até ao final de 2022 regulamente o plano plurianual de apoio à renovação da frota, especificando os critérios de acesso e seleção, modelo de candidatura, montantes envolvidos e sua distribuição plurianual, de modo a garantir a sua operacionalidade com a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2023.
- No âmbito da preparação da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2023 considere uma dotação orçamental mínima de 20 milhões de euros, necessária para responder às necessidades de apoio para a renovação da frota de pesca nacional, em articulação com o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura (FEAMPA) e com o Plano de Recuperação e Resiliência, procedendo o Ministério da Agricultura e Alimentação à orçamentação e calendarização das medidas e rubricas que o integram o plano plurianual de apoio à renovação da frota – 2023-2025.