Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Pela renegociação urgente da dívida pública e a denúncia do Memorando de Entendimento

(projeto de resolução n.º 793/XII/2.ª)

Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Cecília Honório,
De facto, dois anos e dois meses depois da troica e do Memorando, a renegociação da dívida pública portuguesa continua a ser um imperativo nacional.
Já debatemos este tema várias vezes, nomeadamente em julho de 2011 e em setembro de 2012. No início das duas sessões legislativas desta Legislatura, o PCP trouxe a discussão, neste Plenário, a emergência nacional de renegociar uma dívida pública que hoje atinge cerca de 130% do PIB e que é, cada vez mais, impagável e insustentável por vontade da maioria.
Aliás, como bem sabe a Deputada Cecília Honório, o PCP lançou o debate público sobre a renegociação da dívida quando ainda ninguém em Portugal o fazia. Curiosamente, recordei-me há pouco, fê-lo nos dias 4 e 5 de abril, isto é, exatamente na véspera do pedido de emergência de José Sócrates à troica e, como é evidente, muito tempo antes da assinatura do Memorando da troica, que ocorreu, como se sabe, em 17 de maio de 2011, essa data fatídica para Portugal.
Porém, a verdade é que este tema continua na ordem do dia e, há dois anos, o CDS, o PSD e o PS, pela voz dos Deputados João Almeida, Paulo Batista Santos e Fernando Medina, diziam aqui, em uníssono, que as propostas do PCP eram absolutamente populistas e irresponsáveis.
Há quase um ano, em setembro de 2011, a situação era um pouco diferente. Fernando Medina, do PS, já dizia o seguinte: «A renegociação pode ser uma necessidade que se imponha» e João Almeida dizia o seguinte: «Se as propostas são só para alargar prazos, se são só para reduzir taxas de juro, então isso é fazer o que fez a Grécia, e na Grécia não correu bem». Pois, é verdade que não correu bem, nem podia ter corrido, porque foi uma renegociação imposta pelos credores, ao sabor dos credores e ao serviço da banca, sobretudo das bancas alemã e francesa.
Por isso, gostava de lhe perguntar se está ou não de acordo com o PCP sobre aquelas que devem ser as bases de uma verdadeira renegociação global da dívida, se deve ou não envolver a definição de montantes e definir períodos de carência, se deve ou não envolver toda a dívida e não apenas o empréstimo da troica, se deve envolver o alargamento geral e global das maturidades e, sobretudo (e aqui respondo também ao Sr. Deputado Miguel Frasquilho), se está ou não de acordo que o serviço da dívida deve ser uma percentagem das exportações, tal como foi fixado para a dívida pública da Alemanha nos anos 40 e 50.
Pergunto-lhe se isso é ou não possível fazer em Portugal.
Finalmente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles…
Perdão, queria dizer Sr.ª Deputada Cecília Honório. É que estas perguntas são importantes e têm que ver com o CDS. E já vai perceber porquê.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, acha que este Governo, recauchutado, estará em condições de negociar seja o que for?
Acha que, depois do verdadeiro chelique político de Paulo Portas, este Governo vai ser capaz de ser mais alguma coisa do que um conjunto de delegados permanentes da troica em Portugal?
Finalmente, não acha que o Presidente da República não pode nem deve dar uma nova oportunidade a este Governo recauchutado em que parece ter havido uma OPA hostil do CDS sobre o PSD?
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr. Deputado Carlos Silva,
Vamos ver se conseguimos falar claro. Os senhores estão perante um fracasso total e completo do Memorando da troica, das políticas da troica e das vossas próprias políticas. Quem o diz, Sr. Deputado, nem sequer sou eu, é a carta que tenho à minha frente, que é do seu anterior Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que diz o seguinte: «Não cumprimos objetivos, enganámos-mos nas estimativas, houve uma queda brutal da procura interna, o desemprego é grave, falhámos repetidamente». Repetidamente, Sr. Deputado Carlos Silva!
Esta carta não deixa peça sobre peça, linha sobre linha, parágrafo sobre parágrafo da intervenção que o senhor acaba de fazer da tribuna.
O PSD e o CDS, em vez de, em nome do interesse nacional, dizerem «falhámos, vamo-nos embora, damos a voz ao povo», sabe o que é que fizeram? Obedeceram aos senhores a que faz referência este título de jornal: «Empresários e banqueiros recusam eleições antecipadas». Foi isto que os senhores fizeram. Isto é, os senhores fazem o que os banqueiros e os empresários mandam!
O Dr. Paulo Portas teve um chelique político? Pois teve. Qual é a surpresa? Vai ter outro um dia destes! O Dr. Paulo Portas diz que é sustentável o que ontem era politicamente insustentável?! Diz hoje que é revogável o que ontem era irrevogável?! Ó Sr. Deputado Carlos Silva, qual é a surpresa?! O Sr. Dr. Paulo Portas dirá sempre uma coisa e o seu contrário mesmo que os senhores lhe inchem o umbigo com a vice-presidência do Governo.
O Governo é estável, Sr. Deputado Carlos Silva?! Mas, antes do chelique do Dr. Paulo Portas, ele não era estável?! Só descobriram isso agora?!
Sr. Deputado Carlos Silva, o Governo tem apoio maioritário? Mas só agora é que tem apoio maioritário?! Só descobriram isso depois do chelique do Ministro Paulo Portas?!
Disse o Sr. Deputado que o Governo agora vai apostar no crescimento. Diga-me uma coisa, Sr. Deputado Carlos Silva: o senhor está a brincar connosco?! Com 4700 milhões de cortes nos próximos dois anos, com os despedimentos na função pública, com a TSU dos reformados, com os cortes no subsídio de desemprego e nas prestações sociais vai haver alguma espécie de crescimento possível, Sr. Deputado Carlos Silva?!
Quanto à sustentabilidade da dívida e à sua renegociação, os senhores tornaram a dívida impagável e agora estão a preparar-se para um segundo resgate, embora lhe vão chamar «medidas cautelares». Mas será sempre um segundo resgate.
Sr. Deputado Carlos Sila, fiz muitas observações, mas termino com um conselho: não será melhor o senhor e os outros Deputados do PSD lerem bem a carta do Dr. Vítor Gaspar para verem se, finalmente, entendem que o mal está na troica e no Memorando da troica e que é com a troica e com o Memorando que o País tem de correr?

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