1. O PCP tem acompanhado, desde o primeiro momento, o processo de atribuição de concessões para prospeção, pesquisa, desenvolvimento e produção de petróleo e/ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana.
Em outubro de 2011, logo após o anterior Governo PSD/CDS ter atribuído, nas costas das populações e das autarquias, duas dessas concessões ao largo da costa algarvia, denominadas Lagosta (entre Quarteira e a Fuseta) e Lagostim (entre a Fuseta e Vila Real de Santo António), o Grupo Parlamentar do PCP dirigiu ao Governo um requerimento (n.º 80/AC/XII/1ª), solicitando a disponibilização dos contratos de concessão, os quais revelaram que a concessionária, após recuperar integralmente os custos de pesquisa e desenvolvimento e após descontar todos os custos operacionais de produção (isto é, depois de atingir um resultado líquido positivo) pagaria ao Estado Português apenas 5% do valor dos primeiros 5 milhões de barris de óleo equivalente, 7% entre os 5 e 10 milhões de barris de óleo equivalente e 9% acima dos 10 milhões de barris de óleo equivalente .
Uns meses depois, em março de 2012, o Grupo Parlamentar do PCP voltou a questionar o Governo, através do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, sobre esta matéria, designadamente, sobre a necessidade de estudar os impactos ambientais logo na fase de prospeção e pesquisa e de determinar as medidas a adotar pela concessionária para minimizar esses impactos e assegurar a proteção do ecossistema marinho (pergunta n.º 2563/XII/1.ª) e sobre a necessidade de indemnizar os pescadores pela privação da sua atividade e consequente quebra de rendimentos devido à imposição de restrições resultantes das operações de prospeção (pergunta n.º 2562/XII/1.ª).
Na sua resposta, o anterior Governo PSD/CDS, revelando uma grande hipocrisia política, declarou-se atento às questões ambientais, mas recusou a realização de uma avaliação de impacto ambiental, já que a legislação em vigor a isso não obrigava, posição que viria a ser reafirmada em abril de 2015 em resposta a uma nova pergunta do Grupo Parlamentar do PCP sobre esta matéria (pergunta n.º 2965/XII/4.ª).
Apesar de na fase prospeção e pesquisa de petróleo ou gás natural não existir uma obrigação legal de realização de estudos de impacto ambiental, o Regime Jurídico da Avaliação de Impacte Ambiental permite a realização dessas avaliações em projetos que, em função da sua localização, dimensão ou natureza, sejam considerados como suscetíveis de provocar impacto no ambiente de acordo com critérios definidos nesse mesmo regime jurídico. As operações de prospeção e pesquisa de petróleo e/ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana são passíveis de se enquadrar nesses critérios, pelo que o PCP entende que devem ser realizados estudos de impacto ambiental sobre os riscos da prospeção e exploração de forma a eliminar ou minimizar esses riscos e a assegurar a proteção dos valores ambientais e a segurança das populações. Estudos que devem incidir também sobre o transporte marítimo de hidrocarbonetos, já que o tráfego de navios ao largo das costas algarvia e alentejana é muito intenso (conforme tem sido sublinhado pelo PCP).
2. Portugal possui recursos geológicos com importante valor económico, em alguns casos com evidente caráter estratégico, todos eles capazes de permitir o lançamento de múltiplas fileiras industriais e de constituir uma das alavancas do desenvolvimento económico nacional. Entre eles, os recursos em hidrocarbonetos, como o petróleo e o gás natural, que podem vir a relevar-se com potencialidades em algumas regiões do nosso território.
Para o PCP, uma política energética soberana, como uma das bases do desenvolvimento nacional, exige necessariamente mais investimentos com vista à melhoria da eficiência energética e da intensidade energética no produto, o inventário tão exaustivo quanto possível dos nossos recursos em energias renováveis e não renováveis, assim como a continuação da redução do nosso défice energético, designadamente através da exploração planeada de tais recursos. A eventual ocorrência de hidrocarbonetos (petróleo e/ou gás natural) em níveis capazes de permitir uma exploração economicamente relevante constitui um dado de enorme importância já que o défice energético nacional é profundo e estrutural, obrigando o nosso país a importar tudo quanto precisa no plano dos hidrocarbonetos.
Desde 1939 que se realizam operações de pesquisa e prospeção de petróleo e/ou gás natural no nosso país, traduzindo-se em 175 sondagens de pesquisa em terra e no mar, em 72.600 km de dados sísmicos 2D, em 10.272 km2 de dados sísmicos 3D e em 26.086 km de dados aerogravimétricos, gravimétricos e magnéticos. Estas operações de pesquisa e prospeção nunca determinaram a viabilidade da exploração comercial de petróleo ou gás natural, mas permitiram um conhecimento mais aprofundado do nosso território e dos seus recursos naturais. O povo português tem direito a conhecer os recursos geológicos energéticos (designadamente os hidrocarbonetos) existentes em território nacional, os quais, a existirem, exigem a ponderação das vantagens e desvantagens, da oportunidade e das condições do seu aproveitamento e devem ser sempre colocados ao serviço do desenvolvimento do país.
3. Ao contrário de PS, PSD e CDS, que privatizaram a Galp, destruíram quase completamente setores da indústria básica como a naval e a metalomecânica pesada e destruíram parte importante das estruturas científicas e técnicas públicas, todos eles atividades e setores capazes de ajudar o país nesta matéria, o PCP sempre defendeu que os interesses nacionais e a salvaguardar das atividades económicas e dos valores ambientais estarão tão mais garantidos quanto a prospeção e exploração de hidrocarbonetos seja feita por empresas e estruturas públicas.
Ao contrário de PS, PSD e CDS, que se agitam contra a prospeção e exploração de petróleo ou gás natural, designadamente no Algarve, mas que no Governo praticam uma política de submissão aos interesses de empresas privadas, o PCP não alinha na demagogia fácil sobre este problema.
Recentemente, têm surgido de vários quadrantes preocupações relativamente ao impacto negativo que uma eventual exploração de petróleo ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana poderia ter no turismo. Embora esses impactos negativos não se tenham verificado noutros países e regiões – como, por exemplo, na vizinha Andaluzia –, entende o PCP que se justifica a realização de estudos, com ampla participação dos agentes económicos e das populações, sobre o impacto de uma eventual exploração de petróleo ou gás natural noutras atividades económicas da região algarvia e da costa alentejana.
Nestas regiões do país, sobretudo pela forma opaca como o processo de atribuição de concessões para prospeção, pesquisa, desenvolvimento e produção de petróleo e/ou gás natural tem sido conduzido, surgiram dúvidas e inquietações por parte de setores da população, de alguns agentes económicos e das autarquias. A grande questão que é colocada é da incompatibilidade entre, por um lado, a proteção dos valores ambientais e o desenvolvimento da atividade económica predominante na região – o turismo – e, por outro, a prospeção e a exploração de petróleo e/ou gás natural. Sendo legítimas estas dúvidas e inquietações, o PCP entende que o país não pode, à partida, rejeitar a necessidade de conhecer e ponderar o aproveitamento dos seus recursos energéticos não renováveis, nomeadamente os hidrocarbonetos. É preciso estudar, avaliar, ponderar! Estudar a viabilidade da sua exploração comercial e os potenciais benefícios. Avaliar os riscos ambientais e a possibilidade de os eliminar. Ponderar os impactos noutras atividades económicas. Só com esse estudo, essa avaliação e essa ponderação é que o país estará em condições para, de forma esclarecida, tomar uma decisão.
Os interesses nacionais não podem ser comprometidos junto de qualquer empresa do setor energético, pelo que o PCP considera que não deverão ser assinados novos contratos de concessão de prospeção e pesquisa petróleo e/ou gás natural sem que, previamente, sejam realizados os necessários estudos de impacto ambiental e económico.
Simultaneamente, o Governo deverá tomar todas as medidas adequadas para a recuperação do controlo público sobre o setor energético, assim como para o desenvolvimento das capacidades técnicas e científicas neste setor.
Pelo exposto, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomenda ao Governo que:
1. Promova a realização de uma avaliação de impacto ambiental, determinando os riscos resultantes da prospeção e pesquisa e de uma eventual exploração de petróleo e/ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana e definindo as medidas que devem ser adotadas para eliminar ou minimizar esses riscos;
2. Assegure o reforço das medidas de monitorização e de prevenção de riscos resultantes do intenso tráfego de navios que transportam hidrocarbonetos ao largo da costa portuguesa;
3. Desenvolva as medidas necessárias para o reforço de pessoal e de meios materiais das entidades especializadas da Administração Pública, designadamente do Laboratório Nacional de Energia e Geologia e da Direção-Geral de Energia e Geologia, e para a valorização destas entidades e do seu papel no desenvolvimento das capacidades do Estado no setor energético;
4. Promova a avaliação do impacto que uma eventual exploração de petróleo e/ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana poderia ter noutras atividades económicas, em particular, no turismo;
5. Garanta a intervenção do Estado e o controlo público nos processos de prospeção, pesquisa e exploração dos recursos energéticos não renováveis do nosso país, assegurando que a exploração desses recursos é colocada ao serviço do desenvolvimento económico e do progresso social;
6. Proceda à reavaliação dos contratos de concessão para prospeção, pesquisa, desenvolvimento e produção de petróleo e/ou gás natural no Algarve e na Costa Alentejana, garantindo a proteção do ambiente e a defesa dos interesses nacionais em todos os planos.
Assembleia da República, em 6 de maio de 2016