Perante a situação criada pelas condições de oposição ao concurso anunciado pelo Governo, que pode colocar no desemprego um número significativo de professores, o PCP levou hoje à Assembleia da República a proposta do Projecto de Lei que permite que não seja tido em consideração o resultado dos processos de avaliação de desempenho para efeitos de concurso.
Debate de actualidade sobre a inclusão da avaliação de desempenho como critério para o concurso de colocação de professores a decorrer
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
O Grupo Parlamentar do PCP agendou este debate de actualidade com um objectivo essencial de criar todos os espaços que estiverem ao seu alcance para solucionar, com genuína e inequívoca vontade, o problema com que estão actualmente confrontados os professores, particularmente os professores contratados, que, não encontrando soluções para a instabilidade e o desemprego, vão acumulando todos os horários incompletos que podem, sacrificando a qualidade das suas próprias prestações profissionais, a sua vida familiar, o seu bem-estar emocional e, por consequência, a qualidade da escola pública.
Acusar-nos-á, certamente, o Partido Socialista, porque assim nos habituou, de instrumentalização dos professores e de corporativismo. Desde já, afirmamos a todos os Srs. Deputados que a defesa da objectividade na colocação de professores não é, de todo, uma questão corporativa e tão-pouco se pode cingir à esfera laboral da docência; é antes um preceito fundamental para o funcionamento regular da escola pública, para que todos tenhamos a certeza de que os estudantes portugueses terão direito a um corpo docente estável, qualificado e dignificado.
Também, certamente, nos acusará o PS de cavalgar a onda mediática da luta dos professores. Desde já, vos afirmamos também que o PCP tentou, como, aliás, bem sabem, desde o primeiro momento, resolver em consenso alargado a questão da avaliação de desempenho docente para efeitos do concurso que actualmente decorre.
Sabe o PS, principalmente, que foi o primeiro partido contactado e que o PCP tudo fez para resolver este problema com o contributo de todos os que, na comissão, afirmaram preocupação e solidariedade para com as estruturas sindicais no dia em que aqui vieram expor-nos esta situação, entre os quais o próprio Partido Socialista.
Por isso mesmo, o PCP colocou à subscrição de todos os grupos parlamentares um projecto de lei que resolveria o problema, em consenso, sem protagonismos. Também sabe o PS que arrastou por mais de quatro dias uma resposta ao PCP, para que o processo se atrasasse o mais possível. Ou seja: o PCP fez tudo o que estava ao seu alcance para que não se chegasse ao ponto em que estamos!
A possibilidade de votar esse projecto de lei, única forma viável de solucionar as injustiças em curso, no quadro da Assembleia da República, foi, assim, inviabilizada por um partido que, detendo uma maioria relativa, vetou objectivamente uma iniciativa que seria, muito provavelmente, acolhida por todas as bancadas, que não a do próprio Partido Socialista.
Resta-nos, por isso mesmo, recorrer ao debate e ao confronto parlamentar, para que o Governo compreenda a urgência de emendar a mão, tal como, aliás, reconheceu no concurso de 2009/2010, ao não aplicar os resultados da avaliação para efeitos de colocação de professores.
O PCP sempre deixou clara a sua posição de fundo contra a mistura e a interferência entre a avaliação e a colocação. Mas não é essa posição que está hoje aqui em debate.
Na aplicação do actual modelo de avaliação, que não foi suspenso – recordemos! — porque o PSD alterou de um dia para o outro a sua posição, houve alterações importantes; aplicações diferentes de escola para escola; professores com aulas observadas e outros sem elas; professores que nem tão-pouco foram avaliados, como é, por exemplo, o caso de todos os professores das actividades de enriquecimento curricular, do ensino do português no estrangeiro, das escolas profissionais e das escolas do ensino particular e cooperativo; e professores que, embora no plano quantitativo tenham obtido, por exemplo, nota 8, não obtiveram a menção qualitativa de «Muito Bom», por imposição de quotas que os deixaram de fora.
Imaginemos, como exemplo, a seguinte situação: um professor, no agrupamento x, tem acesso à menção de «Muito Bom» com nota 8 na avaliação quantitativa, porque nesse agrupamento a quota o permitiu, e um outro professor, no agrupamento y, tem uma avaliação quantitativa superior a 8, mas, por força das quotas, o seu agrupamento decidiu atribuir «Bom» a todos os professores. O professor do primeiro agrupamento é beneficiado na seriação da lista, enquanto o segundo é prejudicado, embora as avaliações induzissem, precisamente, no sentido contrário.
Não podemos esquecer que é o próprio Governo que cria o regime, a que se chamou «simplex», da avaliação, que varia de escola para escola, ou seja, que permite que as escolas adaptem de formas diferente a avaliação de desempenho. Ora, isto significa que os professores foram avaliados em condições diversas e sob regras distintas, sendo agora confrontados com uma forma de seriação que ignora completamente esse facto.
E, em último caso, a perversidade é tal que pode, inclusivamente, premiar os docentes das escolas em que o processo de avaliação decorreu da forma mais expedita e administrativa possível.
Quem estiver de acordo com estas injustiças faça o favor de pôr o dedo no ar!
E os Srs. Deputados do Partido Socialista deviam pôr o dedo no ar porque, ao inviabilizarem a discussão do projecto de lei assinado em conjunto pelo PCP, por Os Verdes e pelo BE, concordaram com estas injustiças.
Sejamos todos coerentes com o discurso que tivemos perante as estruturas sindicais e assumamos os nossos compromissos com a defesa da qualidade do ensino público. E assim o exijamos também ao Governo que, perante a intransigência do PS no Parlamento, é quem tem, neste momento, a capacidade objectiva de resolver os problemas mais candentes ou assim retire o PS o impedimento para a votação do projecto de lei, subscrito pelo PCP, pelo BE e por Os Verdes.
(…)
Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares:
Queremos apenas registar que o próprio Governo, que fez aprovar ainda ontem, em Conselho de Ministros, um novo regime de avaliação, que reconhece, por isso mesmo, as insuficiências, as injustiças e as assimetrias introduzidas no sistema pelo anterior, é o mesmo Governo que vem aqui dizer que o regime anterior deve produzir os seus efeitos sem qualquer alteração. Esta é uma incongruência evidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados!
Queremos também frisar ou, pelo menos, tentar evidenciar que há um aparente consenso entre as bancadas parlamentares, com exclusão da do PS, sobre a necessidade de não fazer repercutir no concurso de suprimento das necessidades transitórias para 2010/2011, porque é a este que nos estamos a referir neste debate, o regime de avaliação anterior, independentemente das posições que tenhamos sobre os restantes concursos — cada partido terá, obviamente, a sua posição e apresentará iniciativas em consonância com a sua posição, e o PCP assim fará.
O que os Srs. Deputados do Partido Socialista não podem é fazer com que os professores, que são opositores ou potenciais opositores a este concurso, paguem pela teimosia do PS em querer impor um modelo que já foi desacreditado pela prática e que gerou injustiças nas escolas.
Diz o Sr. Deputado Bravo Nico e diz o Governo que assim estamos a premiar o mérito, que estamos a valorizar aqueles que, de facto, entraram com força e com vigor no regime de avaliação que o Governo propôs. Também isto não é verdade, Sr. Deputado, e sabe-o muito bem. E não é verdade, desde logo, porque cada escola aplicou o regime de forma diversa.
E a partir do momento em que os critérios de avaliação, em que a forma como a avaliação é feita é diferente na base, não podemos nivelá-la por cima, como se fosse igual.
O Sr. Deputado sabe perfeitamente que é assim e sabe perfeitamente que não é imputável aos professores o facto de não terem tido acesso à menção de «Muito Bom» ou de «Excelente», em função da avaliação quantitativa que tiveram, por causa das quotas e por força, aliás, do próprio regime que o Governo aprovou, a que chamou «simplex», o qual permite às escolas fazerem esta gestão.
O que o Governo vem, agora, dizer é que, afinal, independentemente de reconhecermos que aquele modelo era injusto e tinha insuficiências, era burocrático e gerou a degradação da qualidade da prestação do ensino nas escolas, vai fazer com que os professores contratados paguem as custas dessas injustiças ao serem prejudicados na colocação no concurso que está a decorrer. Esta é, de facto, uma postura hostil perante os professores, não resta dúvida alguma quanto a isso. E a linha da frente dessa hostilização são precisamente os professores contratados, de quem estamos a falar neste concurso.
Quando o Sr. Deputado Bravo Nico nos vem aqui falar de 105 000 professores e do sistema ignora, ou faz por ignorar, que nos estamos a referir à porção específica de professores que estão a concorrer para suprir as necessidades transitórias do sistema educativo. São precisamente os professores que andam há anos à procura de horários incompletos e a apanhar o que podem para conseguirem ter enquadramento no sistema e a quem o PS, tal como sucedeu em anteriores governos, tem vindo sistematicamente a negar o ingresso na carreira. São esses professores que vão ser também, agora, castigados por um modelo de avaliação que já foi desacreditado na prática.
Temos conhecimento, Sr. Deputado Bravo Nico e Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, de professores e de professoras que foram penalizados porque não concluíram o seu processo da avaliação — por exemplo, devido a licenças de maternidade ou por se encontrarem nas actividades de enriquecimento curricular ou a leccionar português no estrangeiro — ou porque não foram avaliados. Há um conjunto de professores que vão ficar objectivamente prejudicados neste concurso.
O Ministério não dá resposta ao facto de não serem prejudicados, dá resposta à possibilidade de concorrerem. Leia bem a resposta do Ministério.
Para terminar, Sr. Presidente, deixo um apelo quer ao Governo quer à bancada do PS para que, reconhecendo os erros do sistema que foi imposto — e mal imposto, sendo a prova disso o facto de o próprio Governo o ter revisto —, permitam a votação e não usem a maioria relativa para impor uma posição de maioria absoluta impedindo a votação de um diploma que certamente seria aprovado por esta Câmara. Permitam o agendamento deste diploma para as votações a realizar hoje, às 12 horas. Permitam que o projecto de lei subscrito pelo PCP, pelo BE e por Os Verdes seja votado e aceitem a decisão da Câmara! Veremos como se comportam todos os partidos! Não impeçam administrativamente a votação!