I - A aprovação pela Assembleia da Republica da revisão da Constituição ditada pelos acordos AD-PS marcará, a manter-se a AD no Governo e em maioria na Assembleia da Republica, a abertura de uma nova fase na vida política nacional caracterizada por enormes perigos para a sobrevivência do regime democrático.
A AD não conseguiu transformar a Constituição da Republica na cobertura jurídica para a restauração do poder dos monopólios e agrários, a liquidação das liberdades e das outras conquistas de Abril, o regresso ao passado de exploração, opressão e ditadura.
Entretanto, graças à cumplicidade e aos votos do PS/Mário Soares, a AD conseguiu introduzir, nocivas e perigosas alterações na organização do poder político e no sistema de controlo de constitucionalidade das leis.
Designadamente, a extinção do Conselho da Revolução sem que sejam asseguradas soluções substitutivas para as suas funções em termos de eficaz defesa da democracia; a transferência da escolha das chefias militares do Presidente da Republica para o governo; a atribuição ao governo de outras competências militares ate aqui pertencentes ao Presidente da Republica e ao Conselho da Revolução; a consagração de soluções atentatórias da autonomia das Força Armadas e do seu compromisso constitucional com a democracia; a diminuição de outros poderes do Presidente da Republica com a adulteração do princípio da dupla responsabilidade do governo e o condicionamento dos poderes presidenciais de demitir o governo e dissolver a Assembleia da Republica; a composição de um Tribunal Constitucional que não dá garantias de uma fiscalização democrática da constitucionalidade das leis; a criação de um novo período de transição, com a acintosa e antecipada extinção do Concelho da Revolução e com a consequente criação de uma situação de efectivo vazio quanto a algumas das suas atribuições capitais - traduzem-se para a AD na conquista de poderosos meios e instrumentos institucionais para o aprofundamento do seu plano de subversão e destruição da democracia travado e interrompido pela derrota de Soares Carneiro em 7.12.80.
Confirmando integralmente a razão e o fundamento das constantes advertências e denúncias do PCP, são os próprios dirigentes da AD que em múltiplas declarações, anunciam os traços fundamentais do desenvolvimento do seu plano subversivo, para o período "imediatamente a seguir" à aprovação da lei de revisão; controlo do Tribunal Constitucional e governamentalização e instrumentalização das Forças Armadas; apresentação de nova lei dos sectores visando o desmantelamento das nacionalizações e a restauração do poder do grande capital, de nova lei contra a Reforma Agrária e de nova legislação do trabalho para drástica restrição dos direitos e conquistas dos trabalhadores. Diversos factos e acontecimentos passados e recentes, justificar ao mesmo tempo, que entre os próximos objectivos das forças reaccionárias se inclua a agudização da guerrilha institucional contra o PR com vista a tornar a sua posição insustentável.
Nenhuma ilusão é consentida aos democratas portugueses. Estimulada pela revisão oferecida pelo PS/M.Soares, a AD, se a deixarem, lançará a grande ofensiva de liquidação de tudo o que o povo português conquistou com o 25 de Abril.
II - O PCP salienta porém que, apesar da aprovação na Assembleia da República da revisão da Constituição na base dos acordos AD-PS, o regime e as instituições democráticas continuam a dispor de força política, apoio social e mecanismos constitucionais suficientes para enfrentar com êxito os perigos acrescidos que se adensam sobre a liberdade e a democracia.
A demissão do Governo AD, a dissolução da Assembleia da Republica, a formação de um governo de gestão isento e a realização de eleições legislativas antecipadas, constituem uma exigência democrática e nacional que conserva plena actualidade e se apresenta como ainda mais imperiosa depois da aprovação na Assembleia da República da lei de revisão.
A situação estaria extraordinariamente simplificada se, na altura própria antes de consumada a aprovação da lei de revisão tivessem sido tomadas estas medidas que o PCP a muito propõe. Mesmo agora, antes da promulgação tais medidas seriam eficazes.
Entretanto continuam a existir possibilidades a nível das instituições para evitar que seja levado a cabo aquilo que o PCP tem chamado o golpe de Estado da AD.
O afastamento da AD do poder, através da demissão do seu governo e da dissolução da Assembleia da República, continua a apresentar-se, e agora mais do que nunca como medida de emergência indispensável para impedir que as forças da reacção, instaladas no governo e dispondo de uma maioria artificial na Assembleia da República, utilizem os meios e instrumentos adquiridos através da revisão para - como abertamente proclamam -promoverem a destruição do regime democrático e das conquistas de Abril.
Com efeito, as referidas medidas, abrindo caminho para uma derrota da AD e para uma viragem democrática, constituem um meio eficaz para anular e atenuar os principais perigos decorrentes da revisão acordada entre a AD e o PS.
Por um lado, a dinâmica política resultante da derrota da AD em novas eleições e do restabelecimento de uma maioria democrática na AR, condicionaria de forma positiva a elaboração por aquele órgão de soberania da chamada legislação complementar referente ao Tribunal Constitucional, à Defesa Nacional e às Forças Armadas, e bem assim influenciaria beneficamente a eleição pela Assembleia dos membros do Tribunal Constitucional.
Por outro lado, um governo democrático formado na sequência da derrota da AD, poderia garantir uma cooperação harmoniosa com o Presidente da República, tanto na esfera das nomeações das chefias militares, tendo em vista a salvaguarda do compromisso constitucional das Forças Armadas com a democracia como no plano da responsabilidade política perante o Presidente da República, respeitando na prática o carácter semipresidencialista do sistema político português.
A demissão do governo e a dissolução da Assembleia da República são medidas inteiramente democráticas, constitucionais e ao alcance do Presidente da República, seja antes ou depois da eventual promulgação da lei da revisão, seja antes ou depois da sua entrada em vigor.
Mas uma evidência se impõe com força irrecusável: quanto mais tarde forem tomadas, maiores serão os sofrimentos infligidos ao povo português e os prejuízos causados ao País pelo governo da AD, mais apertado será o cerco das forças reaccionárias ao Presidente da República, mais débeis estarão as linhas essenciais da defesa da democracia.
Em contrapartida, quanto mais cedo essas medidas forem tomadas menor será a capacidade de resistência e contestação das forças reaccionárias, mais seguramente se poderá garantir a defesa e consolidação do regime democrático, mais prontamente se operara a viragem democrática necessária para abrir caminho à solução dos problemas nacionais.
O PCP salienta ao mesmo tempo que, em qualquer caso, com a aproximação das eleições autárquicas previstas para o final do ano, a demissão do governo AD e a formação de um governo de gestão se apresentam como uma condição básica e determinante para assegurar a plena seriedade e democraticidade daquele importante processo eleitoral.
III - O PCP sublinha que as grandiosas lutas de massas ocorridas nos últimos meses contra o governo AD e pela defesa das condições de vida e das conquistas democráticas do povo, contra a revisão acordada entre a AD e o PS e em defesa da Constituição de Abril, constituíram mais uma inestimável contribuição do movimento operário e popular para a defesa da democracia, com sensíveis repercussões tanto no imediato como no futuro próximo.
A acção política do PCP e a poderosa intervenção do movimento operário e popular frustraram completamente os planos da AD e do PS para silenciosa, impune e rapidamente desfigurarem a Constituição da República. Impediram o PS de fazer ainda maiores cedências as forças da reacção. Desmascararam e isolaram politicamente os cúmplices e protagonistas dos vergonhosos acordos consumados contra a democracia. Alertaram outros sectores democráticos, contribuindo para que ultrapassassem a passividade, o conformismo e o derrotismo. Permitiram uma melhor identificação dos perigos resultantes da revisão agora aprovada na Assembleia da Republica. Criaram, finalmente, condições favoráveis para a luta popular e democrática nas próximas e decisivas batalhas para impedir a AD de levar por diante o seu plano subversivo.
IV - O comportamento dos diversos partidos no decurso do processo de revisão constitucional não deixará de repercutir-se, a curto e médio prazo, na sua influencia política, social e eleitoral e, previsivelmente, também na própria evolução da composição do quadro partidário nacional.
O PS, sob a direcção de Mário Soares (acolitado nomeadamente pela extrema subserviência dos dirigentes da UEDS), confirmou-se como uma força empenhada no mais abjecto colaboracionismo com os partidos da AD, em prejuízo do regime democrático, em hostilidade aberta aos militares de Abril e ao Presidente da República eleito com a contribuição dos votos socialista, em atitude de profundo desprezo pelas aspirações da grande maioria dos seus eleitores e pela opinião expressa por mais de metade dos próprios deputados. Por exclusiva responsabilidade da política de alianças à direita da sua direcção, o PS emerge do processo de revisão como um partido profundamente desacreditado perante os trabalhadores, diminuído na sua credibilidade no campo democrático, ruído por divergências e conflitos internos, reduzido na sua influencia eleitoral e do seu papel na vida política portuguesa.
O PCP, que denunciou desde o primeiro momento os perigos contidos nas propostas de revisão da AD e do PS, que converteu a revisão da Constituição num grande tema de mobilização e intervenção popular, que combateu firmemente os acordos da AD-PS, tanto na AR como na luta de massas, que deu expressão no plano político e parlamentar aos sentimentos e aspirações das massas populares e de sectores democráticos muito amplos, e que finalmente votou contra o sentido político fundamental da lei de revisão - confirmou-se como o único grande partido inteiramente fiel aos ideais libertadores do 25 de Abril e ao regime democrático consagrado na Constituição e reafirmou-se como a grande força democrática e patriótica, cujo reforço, incluindo no plano eleitoral, se apresenta como essencial e determinante para a defesa da democracia, para uma viragem e uma alternativa democráticas.
V - O PCP chama a atenção de todos os portugueses e dos órgãos de soberania vinculados à defesa do regime democrático para o extremo, incessante e intolerável agravamento de todos os problemas nacionais que, como resultado directo da acção do governos da AD, empurra o País, ao fim de dois anos e meio, para um desastre de proporções e consequências incalculáveis.
O PCP salienta que, só por si o recurso sistemático a violação da legalidade democrática, dos direitos dos trabalhadores e às restrições das liberdades, a manipulação da comunicação social estatizada, a contínua e acelerada das condições de vida da população, o avolumar dos défices da economia nacional, o monstruoso endividamento externo, a situação de estagnação e recessão da actividade produtiva, a ofensiva contra as nacionalizações e a Reforma Agrária, a agudização de todos os problemas e carências sociais, a crescente corrupção, a política externa de subserviência ao imperialismo americano tornam patente o completo fracasso dos governos da AD e justificam a urgência da sua demissão e a convocação de eleições antecipadas para que o povo português intervenha com a sua opinião e o seu voto para definir e imprimir uma nova direcção a política nacional.
VI - Perante as novas dificuldades introduzidas na situação política pela revisão da Constituição imposta pela AD em aliança com o PS e tendente a esvaziar os efeitos da grande vitoria democrática do 7 de Dezembro de 80, é importante impedir que a impaciência e o nervosismo afastem democratas da linha de acção de massas e é essencial manter a confiança na capacidade de luta dos trabalhadores e do movimento operário e popular, na força da unidade e cooperação de todos os democratas, na capacidade de iniciativa que continua ao dispor das instituições democráticas.
O regime democrático saído da revolução do 25 de Abril tem sólidas raízes na realidade nacional, no coração e na consciência do povo português.
O caminho para a vitória da democracia sobre os planos de regresso ao passado continua a ser o caminho da resistência e da luta.