Áudio
Uma vez mais estamos aqui a prestar homenagem a Catarina Eufémia e ao seu exemplo de luta, de coragem, de militância comunista – um exemplo que permanece como referência de todos os dias na vida e na actividade do nosso grande colectivo partidário.
Uma vez mais estamos aqui a lembrar aqueles dias de Maio de 1954, dias de luta acesa do heróico povo de Baleizão, em greve por melhores jornas e contra a opressão e a exploração do latifúndio sustentáculo do regime fascista – dias de luta que punham à prova a notável consciência política e de classe do heróico proletariado rural alentejano.
Uma vez mais estamos aqui a recordar os acontecimentos daquele dia 19 de Maio, que ficaram para sempre gravados na memória dos trabalhadores e do povo português – aquele dia em que Catarina – mulher, mãe, militante comunista – enfrentando corajosamente a força bruta fascista, tombou às balas assassinas e regou a terra com o seu sangue mártir.
Relembrar tudo isto, hoje, não é – ao contrário do que propalam os politólogos de serviço permanente ao anti-comunismo – um acto de saudosismo e, muito menos, o aproveitamento político-partidário de uma situação.
Fazemo-lo por três razões essenciais:
- em primeiro lugar, porque jamais esqueceremos os nosso heróis e os nossos mártires, bem pelo contrário, como diz a canção Heróica, «os mortos não os deixamos/ para trás, abandonados/fazemos deles, bandeiras/ guias e mestres/ soldados/ dos combates que travamos»;
- em segundo lugar, porque é a pensar nos dias de hoje, na situação dramática criada pela política de direita aos trabalhadores, ao povo e ao País, e na necessidade de derrotar essa política e de a substituir por uma política patriótica e de esquerda, que trazemos à memória esses acontecimentos ocorridos há quase sessenta anos.
Acontecimentos carregados de lições e ensinamentos de gritante actualidade – hoje como ontem, a luta de massas, a sua intensificação e ampliação, constitui o instrumento essencial da acção dos trabalhadores na sua resposta à exploração capitalista; e hoje como ontem o PCP tem um papel determinante a desempenhar na organização e direcção dessa luta;
- em terceiro lugar, relembramos tudo isto porque Catarina tem a ver com tudo isto, pois como afirmou o camarada Álvaro Cunhal, aqui em Baleizão, em Maio de 1974, «Catarina tornou-se uma lendária heroína popular, orgulho do glorioso proletariado rural alentejano, orgulho de todos os trabalhadores portugueses, orgulho do Partido» – e é com esse orgulho comunista que hoje prosseguimos a luta travada por sucessivas gerações de comunistas, das quais nos orgulhamos de ser fiéis herdeiros.
Na verdade, o sacrifício de Catarina não foi em vão: o seu exemplo de luta ficou gravado na memória do proletariado rural da zona do latifúndio e foi bandeira das muitas lutas que se sucederam nos anos seguintes e que viriam a desaguar na maré alta da luta do proletariado rural do Alentejo e do Ribatejo.
E oito anos depois, em Maio de 1962, aqui em Baleizão e em toda a zona do latifúndio, os assalariados rurais alcançaram a sua mais significativa vitória de sempre: a conquista do horário das oito horas, pondo assim termo a essa forma de escravatura que era o trabalho de sol a sol e assim infligindo uma pesada derrota ao fascismo.
A conquista das oito horas, de que este ano estamos a comemorar o 50º aniversário – e que hoje aqui assinalamos, num local que não poderia ser mais ajustado para o efeito – foi alcançada no quadro da jornada de luta do 1º de Maio desse ano, que foi a mais ampla, a mais participada, a mais poderosa iniciativa do movimento operário português até então realizada, o que é por demais significativo se tivermos em conta que a montante desse acontecimento histórico havia todo um vasto conjunto de importantes lutas que marcavam impressivamente a longa resistência ao fascismo.
Na preparação do 1º de Maio de 1962 e da conquista das oito horas que se lhe sucedeu – organizando, mobilizando, dirigindo, construindo a unidade dos trabalhadores – estava o partido da classe operária e de todos os trabalhadores, o partido da resistência e da unidade antifascista: o nosso Partido Comunista Português.
Mais de duzentos mil assalariados rurais, fortalecidos por uma determinação inabalável, dando provas de uma coragem indómita, unidos como os dedos da mão e conscientes de que só com a luta conseguiriam alcançar os seus objectivos, fizeram, nesse mês de Maio, dos campos do Alentejo e do Ribatejo o cenário da mais importante e significativa luta alguma vez levada a cabo no nosso País no tempo do fascismo.
Por isso venceram, por isso, naquela situação concreta, derrotaram o odioso regime fascista – assim lançando à terra as sementes das quais viria a brotar, anos mais tarde, aquela que foi a mais bela de todas as conquistas da Revolução de Abril: a Reforma Agrária; e assim demonstrando que com a luta tudo é possível, por mais difíceis que sejam as condições que se nos deparem.
Sobre a importância desse histórico 1º de Maio de 1962; sobre a sua ligação à igualmente histórica conquista das oito horas; e sobre o papel desempenhado pelo nosso Partido em todo esse processo, nunca é demais relembrar o que escreveu o camarada Álvaro Cunhal no Rumo à Vitória: «A conquista das oito horas da trabalho pelo proletariado rural é uma vitória histórica. E porque as lutas que a ela conduziram se desenvolveram em volta da grande jornada política do 1º de Maio, o dia 1 de Maio de 1962 será sempre lembrado como um marco fundamental na história da luta do proletariado português pela sua libertação do jugo do capital (…) O Partido Comunista, que dirigiu desde o início a luta, pode orgulhar-se desta vitória dos assalariados rurais como de uma vitória sua».
Também hoje a necessidade da luta se apresenta como questão crucial de resposta dos trabalhadores e do povo face à política de direita e ao seu Pacto de Agressão que transporta um brutal projecto de exploração do trabalho e do nosso povo.
Um projecto de violenta exploração do trabalho como está bem patente na Lei de alteração ao Código de Trabalho que há dias foi aprovado na Assembleia da República pela maioria PSD/CDS -PP, com o apoio do PS.
Uma Lei que é de uma violência desmedida contra o mundo do trabalho e os seus mais elementares e legítimos interesses e direitos.
Uma lei que se traduz num gravíssimo e inaceitável retrocesso às condições de exploração de antigamente.
Uma Lei que promove uma brutal extorsão dos rendimentos do trabalho e um ainda maior desequilíbrio nas relações laborais existentes em desfavor dos trabalhadores com a imposição de trabalho forçado e gratuito, subtraindo milhões de euros aos trabalhadores; a diminuição de salários, designadamente com o corte para metade no pagamento do trabalho em dias de descanso, feriados e horas extraordinárias; a facilitação dos despedimentos sem justa causa, a par da redução do valor das indemnizações; o ataque à contratação colectiva, entre outras.
Uma Lei onde foi indisfarçável o arranjo entre os três partidos da troika da submissão nacional e que ficou patente na votação na especialidade por parte do PS que acompanhou com o seu voto favorável as mais gravosas medidas propostas pelo PSD e CDS-PP.
Votação favorável que tentou disfarçar com o voto de abstenção na votação final global. Tudo o que era pior que mau, teve voto favorável do PS, designadamente: a redução do direito de descanso compensatório e a diminuição para metade do pagamento de trabalho suplementar, o despedimento por inadaptação e a redução das indemnizações por despedimento e entre outras, o roubo de três dias de férias e o ataque à contratação colectiva.
Esta é uma batalha que não está terminada e a luta contra a sua concretização prosseguirá. Neste momento a Lei de alteração ao Código de Trabalho segue para a Presidência da República para promulgação. E como já tivemos oportunidade de afirmar, esta é uma Lei que viola frontalmente direitos constitucionalmente consagrados e, por isso, coloca a Presidência da República diante da responsabilidade da sua rejeição.
Este é o momento em que o PCP não pode deixar de confrontar o Presidente da República com as suas próprias responsabilidades no quadro do compromisso assumido de defender e respeitar a Constituição da República.
A Constituição assume os direitos dos trabalhadores como direitos fundamentais. Esta Lei não só esvazia e fragiliza tais direitos, como provoca um inaceitável desequilíbrio nas relações laborais existentes em desfavor dos trabalhadores, dando um poder discricionário ao patronato.
Se quer verdadeiramente assumir a defesa da Constituição, como o jurou, o Presidente da República não pode deixar de vetar politicamente esta lei. Mas seja qual for o desfecho no plano institucional deste sinistro processo de expropriação dos direitos laborais que está em curso, o PCP, mais uma vez, reafirma a sua determinação em prosseguir a luta em defesa dos direitos dos trabalhadores e pela afirmação de outro caminho que rejeitando o Pacto de Agressão, valorize o trabalho e os trabalhadores, a produção nacional e o emprego.
Esse Pacto que passa agora um ano foi assinado pelo PS, PSD e CDS-PP e cujas consequências desastrosas na vida dos portugueses e do país não param de crescer e de forma cada vez mais trágica.
Vivemos hoje uma situação em que a gravidade dos problemas está para além das previsões mais pessimistas e isso vê-se no aumento do desmedido e alarmante do desemprego que atingiu um novo marco histórico no país e nesta Região do Alentejo onde a taxa de desemprego está acima da média nacional.
Os dados divulgados pelo INE na passada quarta-feira sobre a evolução do Emprego e Desemprego no primeiro trimestre deste ano espelha bem o dramatismo da situação económica e social que milhões de trabalhadores portugueses vivem e desmente todos aqueles que vêem nas variações de uma ou duas décimas do Produto Interno Bruto pretexto para entoar loas a um caminho que se revela cada dia que passa como de desastre social e nacional.
No final do 1º trimestre a taxa de desemprego em sentido restrito atingia 14, 9% no país e no Alentejo 15,4 %. O desemprego real no país atinge já 1.224.000 trabalhadores.
Os dados revelam uma quebra no emprego no último ano de 203 000 empregos e só nos primeiros três meses do ano de 72 900. Um ano depois da assinatura do Pacto de Agressão aí estão bem à vista os seus resultados, muito menos empregos, muitos mais desempregados e todos os limites do desemprego antes atingidos ultrapassados.
Um agravamento que atinge de forma dramática os jovens, cuja taxa de desemprego ultrapassa os 36% e a continuar esta política de afundamento do país este flagelo social continuará a crescer, fazendo novas vítimas e a acentuar todos os fenómenos negativos que enfrentam regiões, como o Alentejo.
Hoje vemos cada mais jovens a procurar melhor vida no estrangeiro, porque aqui na sua terra e no seu país não encontram resposta. São milhares e milhares que saem, contribuindo para acentuar a desertificação do país interior e desta região, intensificando-se o declínio do mundo rural, num país que apresenta uma enorme dependência alimentar que tem nesta região, enormes potencialidades para a ajudar a ultrapassar e que estão tão desaproveitadas.
Precisávamos de produzir mais, criar mais riqueza e garantir uma vida melhor para todos com uma melhor distribuição dessa riqueza e o que se vê é o país a definhar e mais perigosamente dependente, endividado e hipotecado ao estrangeiro e aos interesses do grande capital nacional e internacional.
Precisávamos de estabilidade e segurança na vida das pessoas e o que temos todos os dias, pela mão dos que têm governado o país e com este Pacto de Agressão, são medidas e políticas que desestabilizam, desorganizam e agravam as condições de vida do nosso povo.
Medidas marcadas pela injustiça e que estão a levar ao empobrecimento da generalidade da população, em resultado da política de corte e congelamento dos salários, das reformas e pensões, de ataque aos direitos sociais, do aumento dos impostos sobre o trabalho e dos preços de todos os serviços e bens essenciais que não param de subir.
Veja-se o que se passa no sector da saúde, com as populações da região do Alentejo com crescentes dificuldades de acesso aos serviços de saúde, cada vez mais longe e mais caros, em resultado das políticas de direita e do Pacto de Agressão de ataque aos serviços públicos de saúde.
Os cortes cegos no financiamento no SNS estão a determinar a degradação do serviço prestado ou mesmo o encerramento de serviços, como acontece com serviços de urgência de proximidade, pelo aumento dos custos para os utentes, pelas escassez de recursos humanos e meios que esta política de ataque aos serviços públicos induz para responder às exigências e necessidades das populações.
Tudo têm feito para destruir o SNS e transformar o direito à saúde num negócio privado.
Há milhares de pessoas cada vez mais longe do médico, sem dinheiro e sem transportes.
Há cada vez mais pessoas com dificuldades em comprar os medicamentos de que precisam. Há cada vez mais dificuldades dos serviços darem resposta às necessidades das populações. E não é porque em Portugal se gaste mais em saúde que nos outros países, antes pelo contrário.
É por isso que nós defendemos perante o risco iminente de desagregação da rede de Cuidados de Saúde que se impõe a adopção imediata de um Plano de Emergência que previna situações de ruptura na disponibilidade dos profissionais para prestação de serviços, nomeadamente em regiões como Alentejo com muita população idosa e de fracos recursos e que assegure as condições de reabertura dos serviços entretanto encerrados sem alternativa eficaz.
Os trabalhadores e o nosso povo estão hoje confrontados com uma ofensiva sem paralelo desde o tempo do fascismo. Também hoje, tal como no passado, o nosso Partido desempenha um papel determinante na organização, no desenvolvimento e no fortalecimento da luta das massas trabalhadoras e populares. Também hoje é possível, lutando, vencer essa política e esse Pacto de Agressão de declínio económico, retrocesso social, saque e de dependência externa que PSD, CDS e PS, com o apoio do Presidente da República, impuseram ao país.
Com a consciência de que a melhor homenagem que podemos prestar aos heróicos assalariados rurais que, há cinquenta anos, conquistaram as oito horas, é a de assumirmos o compromisso de não dar tréguas à política de desastre e afundamento nacional, até a derrotarmos e a substituirmos por uma política patriótica e de esquerda, tendo os valores de Abril como referência básica.
Com a consciência de que a melhor homenagem que podemos prestar à camarada Catarina Eufémia, é a de, aqui, na sua terra de Baleizão, assumirmos o compromisso de prosseguir a luta até alcançarmos os objectivos pelos quais ela deu a sua vida.