Intervenção de Paulo Raimundo, Secretário-Geral do PCP, X Assembleia da Organização Regional de Vila Real

Não estamos nem queremos estar sós nesse caminho e nessa construção da alternativa nova

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Gostaria desde já saudar de forma fraterna a Assembleia e a nova Direcção Regional eleita. 

Uma Assembleia que, com as intervenções feitas e com a resolução aprovada, traçou a realidade da região de forma tão detalhada e informativa e que deixa o Partido mais apto a intervir.

Podemos dizer que a primeira parte da Assembleia, e podemos acrescentar a própria Conferência Nacional, já está cumprida e com sucesso, agora é preciso passar para a segunda e decisiva parte – a concretização das conclusões definidas.

Prosseguir reforçados com os novos militantes, para somarmos força à força que precisamos para as muitas tarefas que se nos colocam.

Desde logo, tarefas de reforço de organização, com os objectivos que aqui foram traçados de  responsabilização de 30 camaradas até final de 2024 e de 30 recrutamentos até ao final do próximo mês de Março.

Assim como a criação de um núcleo de trabalho colectivo em cada um dos concelhos, que seja adequado à realidade local, para conhecermos com maior profundidade a realidade em que agimos e para sermos mais capazes de intervir nos locais de trabalho, nas escolas, nas comissões de utentes.

Conhecimento que nos faz ter propostas concretas para os problemas concretos com que somos confrontados.

Problemas que existem a nível local e precisam de resposta, mas que não estão desligados das escolhas políticas que têm reflexo em todo o território nacional e nas suas assimetrias.

A região de Vila Real é um exemplo claro disto, um retrato de desertificação galopante do Interior.

O distrito de Vila Real perdeu população em todos os seus concelhos, quase 21 mil residentes face a 2011, uma perda de 10%.

Gostaria de deixar aqui bem claro que não contarão com o PCP para o discurso de que o Interior está condenado. Não damos para esse peditório, não desistimos do Interior assim como não desistimos do País. 

Mas esta opção obriga a opções diferentes, exige coragem e medidas concretas, isto não vai lá com conversa e muito menos com hipocrisia.

Não vai lá seguramente com o encerramento de serviços públicos, de perda de capacidade produtiva, cortes nos apoios à agricultura familiar, de encerramento de escolas, postos da GNR, estações e postos dos CTT, redução e eliminação de carreiras rodoviárias, falta de investimento na ferrovia.

Este é o caminho que vai sendo seguido e que temos combatido um pouco por todo o País. Mas o ritmo com que se verifica no Interior não tem paralelo.

Por aqui, com este caminho os resultados estão à vista.

Pode um País desenvolver-se com parte significativa do seu território empurrado para o despovoamento e a desertificação?

E depois é ouvi-los e vê-los, discursos profundos, lamentos hipócritas, lágrimas de crocodilo.

Quem se preocupa realmente com o interior, quem se bate pelo fim da desertificação, quem está genuinamente empenhado pelo presente e futuro, também do País, não pode dormir descansado com o caminho que paulatinamente empurra gente para fora do distrito e da região.

A todos esses que genuinamente se preocupam, daqui lhes dizemos, venham connosco, exijam e ajam pelo aproveitamento dos recursos que temos; pelo desenvolvimento produtivo e pela industrialização, pela criação de emprego com direitos, defesa do ambiente, floresta, dos recursos naturais, pela defesa e reforço dos serviços públicos, pelo desenvolvimento científico e tecnológico, pelo bom uso dos fundos comunitários.

Venham connosco, exijam e ajam pela regionalização, em vez de se transferir para as autarquias locais competências que estas não estão em condições de assegurar e põe em causa a universalidade de acesso a funções sociais do Estado, a educação, a saúde, entre outros. 

Venham e connosco exijam e ajam pela soberania e pelo desenvolvimento. 

A todos os que se preocupam com o brutal envelhecimento no distrito, com 11 dos 14 concelhos a terem mais do triplo das pessoas com mais de 65 anos em relação às que têm menos de 15 anos e onde em 2020 a taxa de natalidade foi de 5,9 no distrito, em contraste com a média nacional que foi de 8,2, a todos esses apelamos, juntem-se a nós, não aceitem como inevitável o défice demográfico com que nos deparamos, lutem connosco por salários dignos, vínculos permanentes, boas condições e horários de trabalho estáveis, acesso à habitação, creche, escola, transportes, acesso aos serviços de saúde e ao acompanhamento das grávidas e ao direito a nascer em segurança numa maternidade. 

Condições fundamentais para optar por ter filhos e garantir a sua educação.

Como referiu o camarada Pité no XXI Congresso: «não é pobre a região onde os comunistas transmontanos lutam e agem, é sim uma região empobrecida pela política de sucessivos governos. Nem tão pouco requer um estatuto de interioridade, esse argumento que serve para branquear as responsabilidades de PS, PSD e CDS. Requer sim o cumprimento da Constituição e a concretização de uma política alternativa, patriótica e de esquerda.»

E, de facto, nem temos uma região pobre nem, ainda menos, um País pobre.

O que temos tido são opções políticas, essas sim pobres e ultrapassadas que nos empurram diariamente para o empobrecimento.

Não podemos continuar confrontados com os lucros milionários das grandes empresas de energia enquanto milhões de pessoas passam frio em casa, adoecem e morrem de doenças derivadas simplesmente porque não têm dinheiro para pagar os cada vez mais escandalosos preços da energia. 

É preciso acabar com este crime social e económico. Somos nós que temos direito ao aquecimento, não são eles que têm direito a lucros milionários.

Não podemos continuar confrontados com uma realidade em que a inflação pesa de forma tão desigual com  sacrifícios aos que menos têm e com tantas benesses com quem tudo pode.

De acordo com o INE, a inflação atingiu no final de Novembro os 9,9%. 

Número que nos foi vendido como um sinal de esperança, face aos 10,1 do mês passado.

Com este novo valor, agora conhecido, é garantido que a taxa de inflação do ano de 2022 não será abaixo dos 8%, o que significa que no decurso deste ano os trabalhadores, os reformados e pensionistas irão perder seguramente o equivalente a mais do que um salário e a mais do que uma pensão.

Um roubo directo nos salários de quem trabalha.

É preciso ainda ter em conta que se a taxa de inflação é de 9,9% isto significa que é o que corresponde à média a partir dos índices que estão estabelecidos para o cálculo.

Mais de 70% dos trabalhadores ganham menos de mil euros brutos por mês. 

Ora, uma parte significativa dos trabalhadores e reformados concentram todo o seu rendimento nos bens fundamentais, alimentação, energia e habitação.

Os mesmos bens onde se concentram os mais elevados efeitos da inflação, com os produtos energéticos a aumentarem 24,8% e os produtos alimentares 18,4%.

Significa isto que os que auferem salários mais baixos e têm pensões mais baixas são duplamente penalizados, desde logo pelos baixos salários e pensões que auferem e porque os bens que não podem deixar de adquirir são exactamente os que mais aumentam, alimentos e energia, gás, electricidade, combustível.

A inflação não toca a todos por igual, da mesma forma que a especulação não resulta para todos, basta ver o que tudo isto significa nos nossos salários e os resultados que tem nos milhões de lucros que se acumulam nas mãos de uns poucos.

E como se tudo isto não bastasse, como se fosse coisa pouca a dureza da vida de todos os dias, vieram, a propósito da insignificante redução de 10,1% para 9,9% da taxa de inflação, tentar vender-nos a ideia da espectacular notícia que este número significava. 

Mas foi muito breve a euforia, horas depois foram anunciadas novos aumentos das taxas de juro, aumentos estes que tornam a vida de milhares de pessoas num inferno face aos brutais aumentos dos créditos à habitação.

Quando sabemos, pelo próprio Banco de Portugal, que apenas 10% dos contratos existentes de empréstimos à habitação são de jovens até aos 35 anos.

Não podemos continuar confrontados com uma realidade em que a pobreza afecta 2 milhões e 300 mil pessoas no nosso País, 700 mil dos quais que trabalhando todos os dias não conseguem sair dessa situação.

É incomportável 388 mil crianças, uma em cada quatro, estarem em risco de pobreza ou exclusão social.

As crianças precisam de brincar e aprender. As crianças precisam e têm direito a viver com dignidade e não num ciclo de pobreza e exclusão social. Isso não é situação para ninguém muito menos para uma criança.

A pobreza e a exclusão social que ameaçam de forma particular as mulheres, a população estrangeira, os idosos, as famílias monoparentais com crianças a cargo.

É urgente travar este rumo de acelerado empobrecimento de amplas camadas da população.

Pois tudo o que é demais cheira mal e esta situação actual já tresanda.

E perante isto o que nos dizem?  “Tenham paciência, aguentem, tudo vai ficar bem, … é a crise, a troika, a epidemia, a guerra… “ e no meio de isto tudo há quem se vá enchendo à grande e como há muito não se via.

Não nos peçam paciência quando assistimos ao aumento dos preços e do custo de vida.

Não se atrevam a pedir-nos calma quando o aumento do cabaz alimentar essencial (leite, ovos, pão..) custa hoje mais 36 euros em relação a Fevereiro, ou seja, custa hoje cerca de 220 euros.

Não nos peçam compreensão quando uma imensa maioria de trabalhadores não ganha mais de mil euros, pensões médias de 400 euros, e milhares de trabalhadores, em particular os mais jovens, se confrontam com a precariedade, recibos verdes e contratos temporários.

Não nos digam que vai ficar tudo bem quando estamos perante uma situação em que há o risco sério de milhares de pessoas poderem vir a perder a sua casa, quando estão a voltar a casa dos pais ou a partilhar casa com desconhecidos.

E qual é a palavra ou a mensagem que nos aconselham quando, perante este caminho de empobrecimento da maioria, nos confrontamos com os milhões e milhões de lucros acumulados pelos grupos económicos? 

Vão-nos pedir compreensão? Tolerância? Vão-nos dizer que é a vida? Nós temos a palavra certa para isto, injustiça.

Uma injustiça que é urgente travar. Aos que alimentam e se enchem à custa da injustiça, fiquem a saber que isto não pode nem vai ser sempre assim.

A pobreza combate-se acabando com ela, com um rumo e uma política que tenha esse objectivo.

A pobreza combate-se com o aumento de salários, das reformas, das pensões e com a elevação do rendimento disponível para todos.

Perante tudo isto, as nossas propostas e soluções, que já eram necessárias, tornam-se cada vez mais urgentes. 

É urgente  fixar preços máximos de bens essenciais.

É urgente a valorização dos salários e das pensões. 

É urgente a taxação extraordinária sobre os lucros dos grupos económicos, e o combate à especulação.

É urgente a defesa do Serviço Nacional de Saúde, são urgentes incentivos à fixação de profissionais de saúde, é urgentíssima a dignificação das profissões e o respeito que os profissionais merecem.

É urgente defender aqueles que mais em risco estão de perder a habitação.

São urgentes apoios à tesouraria das micro, pequenas e médias empresas que aqui no distrito constituem 98% das empresas.

São urgentes apoios à agricultura familiar, reforço de verbas, apoio técnico, comparticipação de seguros de colheitas.

São urgentes apoio aos estudantes, mais acção social escolar, alojamento, vinculação extraordinária de professores.

Foram 400 as propostas que apresentámos na AR na discussão do Orçamento do Estado. Praticamente todas recusadas pelo PS, sozinho ou com a companhia de PSD, IL e Chega.

O facto de terem sido chumbadas não lhes retira validade e muito menos a sua urgência.

As soluções que apresentamos, as propostas que temos, fazem falta aos transmontanos e fazem falta ao País.

E por isso mesmo vamos continuar a bater-nos por elas.

Mas não estamos sós, temos connosco a força e a garra dos transmontanos porque são eles também os principais beneficiários da política nova de que somos portadores.

Graças à luta dos trabalhadores e à acção do PCP foi possível travar o rumo de destruição seguido pelas troikas, que aqui este distrito sentiu tanto na pele. 

Foi possível, também aqui, aumentar rendimentos, travar o encerramento de serviços públicos, repor a Casa do Douro como entidade pública e de inscrição obrigatória, repor a lei dos baldios, aprovar um Estatuto para a Agricultura Familiar.

Mas como alertámos na altura, todas essas medidas, por importantes que fossem e foram, por muito que devessem ser valorizadas e foram, impunham que se fosse mais além e uma mudança de políticas estrutural. Mais cedo que tarde a urgência dessa mudança de políticas impôs-se, e está a impor-se de forma particularmente violenta.

Tínhamos razão, a realidade está, como sempre, a impor-se, mas não é tarde para agir e construir soluções e abrir novos caminhos.

E não estamos nem queremos estar sós nesse caminho e nessa construção da alternativa nova.

Há forças, recursos, meios e vontades suficientes para levar por diante este processo e de intervir por todos e com todos que ambicionam uma vida melhor também aqui na região.

Intervir para valorizar a UTAD, combater o subfinanciamento, responder às necessidades de alojamento dos estudantes e eliminar as propinas.

Intervir pelo o direito à água e contra a sua privatização,

Intervir na promoção do movimento associativo e cooperativo como elemento fundamental ao escoamento da produção e defesa do sector primário.

Intervir para que a gestão da Casa do Douro volte aos produtores.

Intervir para valorizar e defender a propriedade comunitária, particularmente os baldios.

Intervir pelo fim das portagens nas ex-SCUT e no túnel do Marão, e combater a introdução de portagens na A4.

Intervir pela reactivação e modernização das linhas ferroviárias do Douro e Corgo, com ligação a Espanha.

Intervir para avançar na construção de vias rodoviárias que há muito são necessárias.

Intervir para aproveitar os recursos naturais disponíveis, o bem-estar das populações, e a justa compensação para a região pela riqueza criada.

Intervir para dar firme combate às injustiças.

Façamos então da injustiça força para lutar e para trazer mais injustiçados para esta mesma luta que é a sua.

Com confiança, ânimo e esperança, com outros democratas e patriotas, vamos mesmo trilhar o caminho da alternativa que se coloca ao serviço de Vila Real, dos trabalhadores, do povo e do País.

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