Intervenção de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral, Comício do PCP em Almada

"A mobilização popular e a unidade na acção de todas as forças democráticas é fundamental para que se derrote a direita e se abram as portas da esperança"

A justeza do objectivo colocado pelo PCP

Este nosso comício tem lugar depois de se ter perdido uma oportunidade decisiva de interromper uma política que levou o país para uma profunda e prolongada recessão e ao seu atraso relativo, com o afastamento da média Europeia. Afastamento que se vai prolongar pelo menos durante este ano e durante 2005, com a fragilização do aparelho produtivo e a dominação crescente do capital estrangeiro e que se tem traduzido no aumento do desemprego, da precariedade, da pobreza e da redução contínua do nível de vida de milhares e milhares de famílias. A crise política podia e devia ter tido outro desfecho.

Mas, para o presente e para o futuro é também de interesse lembrar como é que se chegou a este quadro de crise que propiciou o ter estado em cima da mesa, a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições antecipadas.

Alguns dirão – tivemos esta crise porque houve uma situação de abandono do governo do Primeiro-Ministro, que jurava a pés juntos que iria cumprir o seu mandato e o seu compromisso com os portugueses.

Isto é verdade, mas está longe de ser a explicação cabal.

A verdade é que este abandono se verificou depois de uma estrondosa derrota eleitoral da coligação de direita, a maior derrota eleitoral da direita, depois do 25 de Abril, num quadro de um governo desgastado e desmascarado e de um grande descontentamento que percorre o país.

E como se chegou a esta repulsa generalizada do governo? Chegou-se no fundamental com a luta de massas e com a interligação entre a luta de massas e a luta institucional, com o desmascaramento e isolamento do governo em relação à sua política para a qual o PCP deu uma contribuição determinante.

É hoje importante sublinhar e recordar que o PCP nunca se resignou diante da propalada inevitabilidade da coligação de direita prosseguir a sua obra de devastação e destruição até 2006.

E é necessário lembrá-lo porque o PCP há cerca de um ano, precisamente na Festa do «Avante!», colocou como objectivo essencial a criação de condições para se pôr fim a este governo e a esta política o mais cedo possível e, através da sua intervenção e prática, procurou aproveitar todas as ocasiões para combater e denunciar a sua política classista, a sua política de concentração de riqueza.

E é também de recordar que, no campo das oposições não poucos se distanciaram ou criticaram mesmo a posição do PCP e, mais recentemente, a fórmula usada pela CDU do “cartão vermelho” nas eleições para o Parlamento Europeu.

Como se viu três semanas depois de contados os votos das eleições para o Parlamento Europeu, o “cartão vermelho” esteve à beira de uma indiscutível concretização apoiado por todas as forças de oposição.

Sublinhamos isto hoje porque mais uma vez se comprovou que vale a pena ter coerência, que vale a pena ser persistente, que vale a pena confiar nos objectivos justos em que se acredita e que o caminho é agir, intervir e lutar e não ficar na postura da resignação, da expectativa, do conformismo.

Também agora, apesar desta inaceitável e extremamente negativa decisão do Presidente da República, a nossa postura em relação à continuação do governo de Barroso/Portas, agora com Santana é de prosseguir a luta e de tudo continuar a fazer para lhe pôr fim o mais depressa possível.

E também na nova situação o determinante e decisivo será a luta de massas, conjuntamente com a proposta demonstrando que há outros caminhos e outras medidas, estas sim ao serviço do povo e do país.

E reafirmamos que a luta de massas e a convergência das forças de oposição é decisiva porque houve quem logo a seguir à decisão do Presidente da República viesse a correr dizer que iria apresentar na Assembleia da República uma «moção de rejeição», aconselhando os outros partidos a fazer o mesmo, procurando assim “surfar” a teoria criada por Marques Mendes e pela direita “de força que lidera a oposição”, quando sabia e sabe que, tal como aconteceu em 2002 em relação ao governo de Durão Barroso, todos os partidos da oposição a apresentariam... A necessária convergência na luta contra a direita dispensa estes truques.

A moção de rejeição tem um valor simbólico e político, mas é uma evidência que não é esta que tirará o sono a Santana/Portas e companhia.

O que lhe tirará o sono será a luta de massas, será o combate quotidiano ao populismo e à demagogia, será o combate sem tréguas à continuação da mesma política desgraçada de concentração de riqueza e de regressão social.

O que lhe tirará o sono será o confronto com os problemas concretos, como o desemprego, as listas de espera, as negociatas da GALP e de outras privatizações, os problemas dos trabalhadores, dos reformados, da saúde e do ensino, da segurança e das forças policiais.

A mobilização popular e a unidade na acção de todas as forças democráticas é da máxima importância para que se derrote a direita e se abram as portas da esperança.

Depois de ter recusado dar ao povo a decisão o Presidente da República disse que ia estar vigilante e que continuava a dispor do poder de dissolução! Veremos no que isto se traduz no concreto. No veto legislativo e na intervenção política dissuasiva já vimos os resultados. E para já aceitou o Bagão! Quanto à dissolução depois de se ter perdido esta ocasião de ouro, Santana e Portas não o levam a sério.

O velho governo travestido de novo

O governo de direita e extrema direita agora com Santana, governo de continuação do de Durão/Portas, vai procurar apresentar-se como se fosse um governo novo, como se não tivesse qualquer responsabilidade com a política anterior, como se tivesse acabado agora de chegar, como se tivesse direito a qualquer benefício da dúvida ou crédito de confiança.

Ora é preciso não esquecer que Durão Barroso, para dar um ar de que iríamos ter uma nova política, já pensava remodelar o governo, desembaraçando-se dos ministros mais desgastados.

O que temos agora é a continuação do anterior governo com uma remodelação que abarca o Primeiro-Ministro... e com o seráfico Ministro Bagão, aquele que os trabalhadores chamaram o «Ministro das Seguradoras privadas” e o “Ministro do patrão”, o “Ministro do código laboral», o Ministro que disse que as mulheres que abortaram deviam expiar os seus pecados com serviços à comunidade... Não há dúvida que o país está bem servido. Os representantes dos grandes interesses não deixarão de aplaudir. E o Presidente da República terá ficado “sossegado”?!

A desgraçada política vai continuar provavelmente com mais demagogia e populismo, com muitas promessas, com muita encenação e política espectáculo. Ainda antes de ser indigitado já Santana Lopes, fazendo da Presidência um não existente, falava do “meu governo”, do meu “estilo de fazer política” e, em poucos dias, deu duas largas entrevistas à RTP e à SIC e a primeira ideia que avançou foi a de colocar vários ministérios em vários pontos do país... É o estilo Parque Mayer no seu melhor. No essencial, tirando o foguetório, o cinto continuará a apertar-se para os trabalhadores e a alargar-se para os mesmos do costume.

Vai continuar a política de concentração da riqueza, das privatizações e das negociatas com os bens públicos, procurando deixar-se cair umas migalhas que a disfarçam.

Portugal vai continuar atrás da Grécia, a distanciar-se da Espanha e da média da União Europeia, com a substituição crescente da produção nacional pela estrangeira.

Alguém tem ilusões que com o velho novo Ministro das Finanças vamos ter mudanças na política de privatizações, na política de benefícios fiscais às actividades financeiras e especulativas, no agravamento dos impostos indirectos, designadamente no IVA, no combate à fuga e à evasão fiscal feita no essencial às pulgas para deixar passar os elefantes?

Alguém tem ilusões que no governo de Santana haverá rectificações ao subsídio de doença, ao código laboral, à entrega às seguradoras privadas das partes mais rentáveis da segurança social?

Alguém tem ilusões que na saúde continuará a estratégia de privatizações do Serviço Nacional de Saúde e que os portugueses vão continuar a ser na União Europeia os que mais gastam directamente com a saúde...

Alguém tem ilusões sobre rectificações nas concepções retrógradas, no ensino e na família, ou em relação ao aborto?

Alguém tem ilusões que em relação à União Europeia continuará o apoio às teses federalistas e a submissão ao “Directório” das grandes potências?

Podemos todos ficar descansados e pelos vistos o Presidente da República também, que a política de concentração de riqueza, de leilão das empresas e do património público, de intensificação da exploração vai continuar, como na política externa vai continuar a política de submissão: aos EUA como se viu na guerra do Iraque e às decisões da União Europeia como também se viu e verá na aceitação acrítica da dita Constituição Europeia e na revisão Constitucional feita para fazer prevalecer a “Constituição Europeia” sobre a Constituição da República Portuguesa.

As políticas do anterior governo com maior ou menor disfarce vão continuar no essencial.

E foi também por isto que, a seguir à decisão do Presidente da República, considerámos muito negativamente o facto deste, com todas as letras, ter vindo invocar a “vantagem e a necessidade da continuação das políticas essenciais do actual governo quando foram precisamente essas políticas essenciais” que tantos prejuízos têm causado ao país e tantas agressões têm desencadeado contra a vida dos portugueses.

Exigir mais do mesmo com novos e velhos protagonistas é uma exigência dos boys e das clientelas do PSD e do PP, mas não é seguramente exigência da maioria do povo português.

O que o país precisa é de uma nova política que relance a produção e o investimento, que defenda e valorize a produção nacional, que mobilize os trabalhadores, que corrija os principais «aleijões» das contra-reformas na saúde, ensino, segurança social e na legislação laboral, que dê resposta ao desemprego, aos baixos salários e reformas, que proceda a uma justa distribuição do Rendimento Nacional e que tenha uma postura de intransigente defesa da soberania e da independência nacional.

Não podemos continuar a deixar hipotecar o futuro das novas gerações e do país.

Os trabalhadores, o povo e o país não precisam de mais propaganda e de mais demagogia, nem dos chamados “pactos de regime”. O grande pacto de regime é a Constituição da República. Os trabalhadores, o povo e o país precisam sim é de respostas concretas para os seus problemas.

Há que agregar forças, energias e vontades e levar à prática uma ampla política de unidade porque vamos ter muita luta pela frente. Pela nossa parte com convicção, determinação e confiança vamos continuar o combate e o que podemos dizer ao povo português é que podem contar com este Partido de luta, protesto e de proposta, o Partido Comunista Português.

E se não for antes encontrar-nos-emos na Festa do «Avante!», festa do povo e dos democratas, festa da juventude e dos comunistas, festa que também será de luta e de intervenção, festa da luta que continua, festa da vontade de conquistar um novo rumo, uma nova política e um novo governo para o país.

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