Exposição de motivos
A atual situação do País está marcada pela acelerada degradação das condições de vida de amplas camadas e setores da população. O aumento dos preços e a perda de poder de compra pesam cada vez mais e os salários e as pensões dão para cada vez menos, ao passo que os grupos económicos acumulam milhares de milhões de euros de lucros.
No centro das preocupações das famílias está, entre outros, o problema da habitação, em particular no que diz respeito aos custos associados às rendas e, em especial, na subida vertiginosa dos valores dos novos contratos de arrendamento.
As famílias estão hoje encurraladas entre a quase inexistente oferta de habitação pública ou a preços comportáveis face aos seus rendimentos, aumentos brutais das taxas de juro que empurram para a pobreza os titulares de créditos à habitação, e aumentos especulativos dos valores das rendas que tornam quase impossível o acesso à habitação a preços que sejam comportáveis para o rendimento médio das famílias portuguesas.
Até ao final do mês de outubro de cada ano, é publicado em Diário da República o coeficiente de atualização das rendas para o ano seguinte apurado pelo Instituto Nacional de Estatística. Em anos recentes, com níveis de inflação e taxas de juro muito baixas e até negativas, o referido coeficiente foi igualmente baixo e também negativo, pelo que, em consequência, o aumento das rendas resultante da aplicação do referido coeficiente não pesou significativamente nas rendas praticadas e na taxa de esforço dos arrendatários.
No entanto, no ano de 2022 a situação tornou-se diferente e preocupante, quer devido aos sucessivos aumentos das taxas de juro, quer com a inflação registada de 7,8%, com a degradação dos salários e pensões e com o forte impacto negativo no seu poder de compra. Este contexto tornou ainda mais gravosas as consequências da especulação imobiliária, da errada política seguida por sucessivos governos e do insuportável e continuado crescimento das rendas.
A Associação de Inquilinos Lisbonenses já sublinhou que a taxa de esforço das rendas, em termos médios, é superior a 40%, mesmo nos contratos antigos, porquanto os respetivos inquilinos têm, em regra, rendimentos reduzidos. Haverá ainda que ter em conta o enorme aproveitamento que se tem verificado e que tem feito aumentar de forma insuportável os valores de arrendamento praticados no mercado livre, já em situação de sobreaquecimento há pelo menos uma década, pelo que não é aceitável que as rendas tenham novos e substanciais aumentos. É até necessário que o valor das rendas baixe consideravelmente.
Importa assim decidir um coeficiente razoável e suportável, em linha não com a estatística da inflação registada (que, na verdade, veio penalizar ainda mais os inquilinos) mas sim em linha com o real rendimento disponível dos trabalhadores, reformados e pensionistas, que mais uma vez está a ser esmagado para suportar os fabulosos lucros dos grupos económicos e das multinacionais. Para satisfazer os seus compromissos com a habitação é necessário simultaneamente o aumento geral dos salários e das pensões e a adoção determinada de outras medidas e de outra política que trave e inverta a escalada dos preços das casas e dos outros bens e serviços essenciais e devolva estabilidade e confiança à vida de milhões de portugueses.
Perante esta situação, e tendo em conta a instabilidade dos contratos que o Novo Regime de Arrendamento Urbano permite, é necessário controlar e impedir o aumento geral do valor das rendas, não apenas nos contratos já celebrados e em vigor, mas também nos novos contratos de arrendamento.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à limitação do aumento das rendas nos contratos em vigor e na fixação de montantes máximos de renda em novos contratos de arrendamento habitacional.
Artigo 2.º
Limitação ao aumento das rendas
- Durante o ano civil de 2024 não se aplica o coeficiente de atualização anual de renda dos diversos tipos de arrendamento previsto no artigo 24.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro.
- O coeficiente de atualização de renda dos diversos tipos de arrendamento urbano e rural abrangidos pelo disposto no número anterior, vigente no ano civil de 2024, é de 1,0043, sem prejuízo de estipulação diferente entre as partes.
- Aos contratos que remetam para a atualização de renda prevista no n.º 1 ou para o respetivo aviso no Diário da República é aplicável o coeficiente de 1,0043.
Artigo 3.º
Limitação à fixação de rendas em novos contratos
- A renda inicial dos novos contratos de arrendamento para fins habitacionais que incidam sobre imóveis relativamente aos quais tenham vigorado contratos de arrendamento celebrados nos cinco anos anteriores à entrada em vigor da presente lei não pode exceder o valor da última renda praticada sobre o mesmo imóvel em anterior contrato, aplicado o coeficiente de 1,0043.
- Quando os imóveis abrangidos pelo artigo anterior tenham tido mais do que um contrato de arrendamento nos cinco anos anteriores à data da última renda praticada, sem que tenham sido comprovadamente realizadas obras de requalificação e melhoria do imóvel, o coeficiente é aplicado sobre o valor da renda mais baixa praticada nesse período.
- Nos casos em que não tenha havido arrendamento anterior é fixado um limite máximo do valor da renda correspondente à aplicação do coeficiente de 1,0043 ao valor da renda mediana praticada na respetiva subsecção estatística, de acordo com a última atualização, divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.