Áudio
Camaradas
Um dos contributos importantes para a crise económica e social que se vive em Portugal tem sido a aplicação das orientações e políticas comunitárias, que sucessivos governos do PS e do PSD, com ou sem CDS, apoiaram e, depois, usaram como argumento para mais facilmente entregarem a grupos económicos e financeiros, nacionais e estrangeiros, os sectores estratégicos da nossa economia e as alavancas fundamentais para o desenvolvimento e progresso social. O que foi acelerado pelo actual Governo do PS.
Foi em nome da criação do mercado interno, da livre concorrência e da dita Estratégia de Lisboa que destruíram o sector empresarial do estado, privatizaram os sectores da energia, dos transportes, dos correios e telecomunicações, da banca, dos seguros e insistem na liberalização de serviços públicos essenciais, incluindo na prestação de cuidados de saúde, com as conhecidas e gravosas consequências económicas e sociais, em benefício exclusivo de grupos económicos e financeiros que mantêm lucros escandalosos, apesar da crise, de que são exemplos conhecidos a EDP e a GALP.
Foi em nome das políticas da união económica e monetária, a que atrelaram Portugal sem ter em conta o desigual nível de desenvolvimento face a outros países da zona euro, que foi utilizado o Pacto de Estabilidade e as orientações do Banco Central Europeu, para impor políticas restritivas de cortes orçamentais em investimentos públicos, promover uma política de rendimentos e preços que agravou desigualdades sociais, justificou o congelamento de salários e a desvalorização de reformas e pensões, tornando o nosso país um dos mais desiguais da União Europeia e de piores índices de nível de vida.
Foi em nome da Política Agrícola Comum e da Política Comum de Pescas que destruíram parte substancial da agricultura familiar e da pesca tradicional, aceitaram a redução de quotas de produção, como nas pescas ou o seu desmantelamento como na produção de leite, fomentaram a destruição da frota pesqueira ou o desligamento das ajudas à produção agrícola, abrindo caminho à progressiva destruição destes sectores, o que tornou Portugal um país mais dependente na área alimentar, pondo em causa não só a produção e o emprego com direitos, como a própria reserva estratégica alimentar, que qualquer governo tem obrigação de garantir ao seu povo.
Foi em nome da liberalização do comércio internacional, de acordos bilaterais da União Europeia com países terceiros e das negociações no âmbito da Organização Mundial do Comércio, aliados à política do euro forte que servia interesses da Alemanha e de outras grandes potências europeias, que deixaram definhar sectores industriais tradicionais e estratégicos, como o têxtil, vestuário e calçado, a cerâmica, a metalurgia, a indústria naval, entre outros, tornando a nossa economia mais frágil, mais dependente e menos capaz de resistir a uma crise internacional.
A estas políticas acresceu uma distribuição incorrecta de fundos comunitários, que não teve em conta a estrutura produtiva existente, que desprezou os micro, pequenos e médios empresários, que estrangulou o comércio tradicional, esqueceu cooperativas e associações de produtores, que deu prioridade ao apoio à instalação de multinacionais, as quais ou já abandonaram a região e o País logo que os apoios financeiros diminuíram, ou preparam-se para o fazer na melhor oportunidade, não sem antes usaram mais uns fundos públicos, designadamente através da aplicação do chamado “lay off”, deixando atrás de si um rasto de desemprego que novamente só encontra saída na emigração, enquanto for possível.
Hoje é inquestionável que temos menos indústria, menos pesca, menos agricultores e pescadores e uma muito maior dependência de importações de produtos alimentares e maquinarias, levando-nos, assim, mais de um terço dos apoios comunitários que recebemos, contribuindo para a recessão económica, o agravamento do desemprego e das desigualdades sociais. Actualmente, o PIB per capita português, em paridades de poder de compra da EU, está praticamente ao nível do que tínhamos aquando da adesão de Portugal à União Europeia, depois da divergência que se verifica em relação à média comunitária desde o início desta década. Com a agravante dos responsáveis da União Europeia a 27 persistirem em manter um quadro financeiro comunitário para o período 2007/2013 com um tecto de apenas 1% do PNB comunitário, apesar de se ter verificado o maior alargamento de sempre e da situação de crise que se vive.
Para Portugal esta situação é particularmente desastrosa, não só por ter sofrido uma redução de 15% de fundos comunitários relativamente ao quadro financeiro anterior, mas também por não estar a ser compensado nem pelas novas adesões nem pelas consequências da aplicação das políticas monetárias decorrentes da entrada na zona euro.
Como afirmámos no Encontro Nacional sobre os 20 anos da adesão, hoje parece claro que não foi Portugal que entrou na CEE, mas sim a CEE e os seus potentados económico-financeiros que entraram em Portugal, apropriando-se das nossas riquezas e utilizando a mão-de-obra barata. Em vez do bem-estar do povo e de uma economia para o interesse nacional, temos uma economia cada vez mais subalterna e acessória das economias dos países desenvolvidos da União Europeia.
Na actividade que desenvolvemos no Parlamento Europeu, temos denunciado estas situações, temos pugnada por uma ruptura com estas políticas, temos exigido programas específicos de apoio à economia portuguesa, temos pugnado por cláusulas de salvaguarda das nossas industrias tradicionais, temos insistido no reforço de fundos comunitários e numa verdadeira política de coesão económica e social, temos defendido o fim do Pacto de Estabilidade e da Estratégia de Lisboa, substituindo-os por um Pacto de Progresso Social e uma estratégia de desenvolvimento que aposte no combate ao desemprego, às desigualdades e à exclusão social, virada para o apoio aos sectores produtivos, aos micro e PME, aos agricultores e pescadores, à criação de empregos com direitos, à valorização do trabalho e à promoção de serviços públicos de qualidade.