Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Inauguração Praceta Álvaro Cunhal

Inauguração Praceta Álvaro Cunhal

Inauguração Praceta Álvaro Cunhal

Senhor Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos
Senhores Vereadores e senhores Membros da Assembleia Municipal
Senhor Presidente da Junta
Minhas senhoras e meus senhores
Camaradas aqui presentes

Permitam-me que, em nome do meu Partido, saúde a decisão do Município de Matosinhos em distinguir essa personalidade fascinante e multifacetada do nosso Portugal contemporâneo – político e estadista de dimensão nacional e internacional, intelectual, homem da cultura e das artes - que foi Álvaro Cunhal, dando o seu nome a esta Praceta que agora se inaugura.

Uma decisão tomada há algum tempo e que, muito justamente, se concretiza no preciso momento em que comemoramos o 40º. Aniversário da Revolução de Abril, esse empolgante empreendimento do nosso povo, o mais avançado da nossa modernidade e que Álvaro Cunhal definiu como “uma revolução libertadora, com tão profunda transformação da vida nacional que se pode considerar um dos momentos mais altos da vida e da história do povo português e de Portugal”.

Não podíamos ter escolhido data melhor para a homenagem que aqui prestamos àquele que foi, sem sombra de dúvida, uma personalidade central da resistência ao fascismo e do desbravar dos caminhos que nos haveriam de conduzir à Revolução do 25 de Abril, ao seu desenvolvimento e à consolidação do regime democrático.

Homenageamos um homem que foi um protagonista destacado, presente nos mais significativos e importantes acontecimentos da nossa vida colectiva do último século e princípios do presente, combatente intrépido que se entregou com denodada abnegação, resistindo às mais terríveis e duras provas de vida clandestina e prisão, à causa da liberdade, da democracia, da emancipação social e humana, pelos direitos dos explorados e oprimidos.

Num percurso que o haveria de trazer, desde muito cedo, a estas terras do Norte do País que percorreu de lés a lés, tecendo a rede que ligava os grandes centros industriais e o mundo do trabalho à luta pela sua própria emancipação, que tinha em terras como as de Matosinhos uma referência de combate e coragem, particularmente dos seus pescadores, conserveiras, operários têxteis. Esse mundo do trabalho e de dignidade, cujas vidas, problemas e aspirações acompanhou, estudou e procurou, como combatente revolucionário, dar resposta.

Personalidade de invulgar inteligência, homem de firmes convicções, inteireza de carácter; político de acção e autor de uma obra notável, Álvaro Cunhal dedicou toda a sua vida e o melhor do seu saber, como dirigente do PCP, como Deputado, como Ministro da República nos governos provisórios de Abril, como Conselheiro de Estado, à defesa dos interesses do seu povo e do desenvolvimento do seu país.

Álvaro Cunhal assumiu responsabilidades em Órgãos do Poder, nomeadamente no Governo de Portugal, num momento decisivo da vida do nosso país e num quadro de grande complexidade e exigência.

A sua imediata integração no primeiro governo provisório, saído da Revolução de Abril de 1974, significava não apenas o reconhecimento do seu trajecto de lutador antifascista, da sua elevada capacidade política e de liderança, mas o inestimável e inigualável papel que desempenhou na teorização da revolução portuguesa.

Homem de Abril, Álvaro Cunhal, deu um contributo precioso com a sua acção, mas particularmente com essa obra notável que é o “Rumo à Vitória” e que, inquestionavelmente, apontou os caminhos e criou condições para a Revolução libertadora de Abril, a sua defesa e consolidação, e para as profundas transformações revolucionárias operadas na sociedade portuguesa.

Obra marcante que haveria de ter um grande impacto e influência em largos sectores do movimento democrático e na dinâmica e unidade das forças da Oposição ao regime de Salazar e Caetano.

Mas a dimensão política e de estadista não se revela apenas nos períodos da resistência ao fascismo e do período dos grandes avanços revolucionários.

A sua dimensão de político e estadista está patente nos combates em defesa das conquistas e realizações de Abril e dos seus valores, nas batalhas que travou em defesa da Constituição da República e do projecto que transporta.

Dirigente político experimentado, estudioso e conhecedor da realidade portuguesa e das relações internacionais, Álvaro Cunhal combinou sempre uma esforçada intervenção concreta sobre a realidade, com uma profícua produção teórica para responder aos problemas da sociedade portuguesa e à concretização de um projecto de desenvolvimento soberano do país.

Possuidor de uma densa cultura e de uma grande dimensão humanista, deixou-nos um valioso legado teórico de estudos e análise política e histórica, mas igualmente uma importante produção artística.

Um abundante e valioso património que reflecte um pensamento de grande riqueza e actualidade que é uma herança de todos os que aspiram construir um mundo melhor e mais justo, mas também mais belo.

Um acervo de estudos e ensaio político abarcando uma diversidade de objectos e temas e uma abundante análise e um olhar permanente sobre os mais variados problemas do país e da vida internacional de eminente pendor político podem ser encontrados nos seus “Discursos Políticos” editados em 23 volumes, nas “Obras Escolhidas” e muitas outras obras.

Álvaro Cunhal interligou a sua intervenção revolucionária no plano político com um apaixonado interesse por todas as esferas da vida, nomeadamente na actividade de criação artística.

Autor de uma arte comprometida e por onde perpassa o povo que sofre e luta, Álvaro Cunhal, cria uma dezena de obras literárias, como o romance Até Amanhã, Camaradas e a novela Cinco Dias, Cinco Noites, mas igualmente pinturas de quadros e desenhos e importantes ensaios sobre estética.

A vida, o pensamento e a luta de Álvaro Cunhal justificam a homenagem que o país lhe tem prestado.

Uma homenagem que, neste momento de inquietantes fenómenos de regressão social e retrocesso civilizacional, tanto mais se justifica para demonstrar que os políticos não são todos iguais e que a actividade política pode e deve ser uma actividade nobre.

Nesta matéria também Álvaro Cunhal nos deixa um imenso legado.

Deixa-nos, desde logo, esse grande exemplo da entrega desinteressada ao serviço da causa justa que abraçou.

Uma concepção do exercício da actividade política entendida como realizada para servir o povo e o país e não interesses pessoais ou de grupo.

Uma concepção onde está presente a recusa de vantagens sociais e privilégios pessoais.

Uma concepção do exercício da actividade política conduzida por valores políticos éticos, desde logo o valor do respeito pela verdade.

Uma concepção que rejeita a demagogia, a retórica, a política espectáculo e as exibições teatrais ou a política de criação de “factos políticos”. Práticas que conduzem à impunidade, ao abuso do poder, à corrupção.

Dizia Álvaro Cunhal que “política é uma palavra digna. Significa uma orientação, uma proposta e uma intervenção destinada a resolver os problemas que se colocam na vida de qualquer sociedade”.

Álvaro Cunhal foi bem o exemplo do político que dignificou a actividade política, como uma actividade nobre, porque exclusivamente ao serviço da resolução dos problemas do país e do povo.

Neste momento de homenagem, que é também de comemoração, se podemos afirmar que a Revolução de Abril é um momento maior da nossa história, devemos também afirmar, com toda a confiança, que o melhor do caminho histórico de Abril ainda está para vir e que, mais tarde ou mais cedo, a luta dos trabalhadores e do povo, a luta dos democratas, a luta de todos os que sabem que a história está longe de ter chegado ao fim não deixarão morrer o sonho de ver retomados os caminhos de Abril e da concretização dos seus valores.

Os valores da liberdade, da emancipação social, do Estado ao serviço do povo e não da exploração, do desenvolvimento visando a melhoria da qualidade do nível de vida dos portugueses, o pleno emprego, uma justa e equilibrada repartição da riqueza nacional, da soberania e independência nacional.

Nós temos a firme convicção que o generoso projecto de Abril e os seus valores acabarão por se revelar como uma necessidade objectiva na concretização de um Portugal fraterno e de progresso.

É para nós inquestionável que são os povos que fazem a história, mas é inquestionável também que ela precisa do concurso dos homens certos e em cada momento, para lhe dar rumo e movimento. De homens como Álvaro Cunhal que, conhecendo a realidade e os desafios do seu tempo, são capazes igualmente de compreender e interpretar as aspirações mais profundas do povo e lhes dar um sentido!

Mais uma vez, saudamos a decisão do Município de Matosinhos!

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